ALMEIDA,
Sebastião Pais de
*pres. Bco. Bras. 1956-1959; min. Faz.
1959-1961; dep. fed. MG 1963-1966.
Sebastião Pais de Almeida
nasceu em Estrela do Sul (MG) em 22 de novembro de 1912, filho de Gregório Pais
de Almeida e de Orminda Formin Pais de Almeida.
Em 1914, sua família se transferiu para a capital paulista, onde
seu pai fundou a Casa Bancária Almeida e Filho. Nessa cidade, realizou seus
estudos básicos nos ginásios São Bento e São Paulo e no Colégio São Luís. Aos
16 anos de idade, começou a trabalhar no banco de seu pai, renunciando à
intenção de se tornar padre. Ingressou na Faculdade de Direito de São Paulo em
1933 e, no ano seguinte, tornou-se diretor financeiro do banco, que em 1936
passou a se chamar Banco Nacional do Comércio de São Paulo.
Bacharelou-se em 1937 e, no ano seguinte, junto com Celso
Santos, fundou em São Vicente (SP) a primeira fábrica de vidros planos do país,
chamada Companhia de Vidros do Brasil (Covibra), que prosperou rapidamente.
Organizou em seguida uma rede racional de distribuição do produto, formada por
cerca de 40 estabelecimentos comerciais. Com o fim da Segunda Guerra Mundial,
grupos estrangeiros — notadamente os de origem belga — iniciaram operações de dumping,
exportando vidro para o Brasil a preços artificialmente baixos, com o objetivo
de reconquistar o mercado do país. Para resistir a essa manobra, Pais de
Almeida promoveu a fusão da Covibra com duas outras empresas do ramo,
instaladas em São Gonçalo (RJ) e São Paulo, formando assim a Vidrobrás
Indústrias Reunidas. Tornou-se diretor e principal acionista dessa nova
empresa, que dominou o mercado brasileiro nos anos seguintes e veio a
associar-se mais tarde a capitais norte-americanos.
Em 1947, junto com Lineu Gomes, fundou a Real Transportes
Aéreos, uma das maiores companhias de aviação da América do Sul, cuja
presidência ocupou durante cinco anos. Em 1948 e 1949, participou da comissão
de comércio e estudos gerais e da subcomissão bancária vinculadas à Comissão
Mista Brasileiro-Americana de Estudos Econômicos, que atuou sob a direção de
John Abbink e de Otávio Gouveia de Bulhões, com o objetivo de analisar a
situação da economia brasileira e suas possibilidades de desenvolvimento.
Conhecida como Missão Abbink, ela agrupou técnicos, economistas, advogados,
industriais, banqueiros e militares, distribuídos por diversos grupos de
trabalho, mas não obteve nenhum resultado prático devido à falta de
financiamento para os projetos que propôs.
Pais
de Almeida ocupou a presidência do Banco do Estado de São Paulo entre maio de
1953 e janeiro de 1954, sendo então nomeado secretário de Fazenda do governo
paulista, chefiado por Lucas Nogueira Garcez. Exerceu interinamente a chefia da
Secretaria da Agricultura e integrou, ainda em 1954, a Comissão do IV Centenário da Cidade de São Paulo, participando do planejamento e construção
do parque do Ibirapuera. Com a posse de Jânio Quadros no governo do estado em
31 de janeiro de 1955, foi substituído na Secretaria da Fazenda por Carlos
Alberto Carvalho Pinto, retornando à vida privada. Assumiu a presidência do
Banco do Brasil em 16 de fevereiro do ano seguinte, no início do mandato
presidencial de Juscelino Kubitschek, transferindo-se para o Rio de Janeiro,
então Distrito Federal. Em maio, tornou-se membro da secretaria da Federação
das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). Juscelino também o nomeou
Governador do Brasil junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Banco
Mundial.
O aumento da inflação no primeiro semestre de 1958 e a
resistência do FMI em apoiar a política econômica do governo Kubitschek
expuseram o ministro da Fazenda, José Maria Alkmin, a críticas de diversos
setores. Em fins de junho de 1958, ele foi substituído pelo presidente do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), Lucas Lopes, que adotou as
recomendações do FMI, empreendendo uma rigorosa política antiinflacionária.
Depois das eleições legislativas de outubro desse ano, o governo anunciou um
programa econômico baseado na busca da estabilização monetária, que incluía o
congelamento salarial, o fim do incentivo aos cafeicultores, a contenção do
crédito e o aumento dos impostos de renda e de consumo.
A proposta de limitação do crédito provocou protestos dos
empresários paulistas, que denunciaram as maiores facilidades concedidas ao
setor público e aos grupos estrangeiros na obtenção de recursos junto ao
Estado. Pais de Almeida apoiou a reação dos empresários nacionais e, em
dezembro de 1958, recusou-se a cortar o crédito concedido pelo Banco do Brasil
para financiar o capital de giro das indústrias. No início do ano seguinte, a
pedido de Juscelino Kubitschek, examinou a crise do setor bancário de São
Paulo, provocada pela aplicação do Plano de Estabilização Econômica, de autoria
de Lucas Lopes e Roberto Campos, presidente do BNDE. Contrário à política
oficial de contração do crédito que, segundo ele, comprometia as metas de
desenvolvimento econômico acelerado, Pais de Almeida tentou ajudar a
recuperação da economia paulista, repassando recursos do Banco do Brasil para estabelecimentos
privados em dificuldade.
No Ministério da Fazenda
A contradição entre o plano de estabilização e a política
desenvolvimentista do governo, o atrito entre as orientações do Banco do Brasil
e as do Ministério da Fazenda, o aumento da taxa de inflação e a reação
desfavorável dos partidos à política econômica adotada levaram Kubitschek a
recusar o plano de Lucas Lopes e romper as negociações com o FMI. Essa medida
dificultou a obtenção de empréstimos externos, mas criou condições para a
retomada da política desenvolvimentista. Em 4 de junho de 1959, Pais de Almeida
assumiu interinamente a chefia do Ministério da Fazenda em lugar de Lucas
Lopes, que sofrera um enfarte. Foi efetivado nesse cargo em 28 de julho, ao
mesmo tempo em que o ministro da Viação Lúcio Meira assumia a presidência do
BNDE, e Maurício Chagas Bicalho, diretor da Carteira de Redescontos do Banco do
Brasil, passava a ocupar interinamente a presidência desse estabelecimento.
Nesse mesmo ano, Pais de Almeida tornou-se vice-presidente da Companhia
Siderúrgica Paulista (Cosipa), empresa de economia mista.
Durante
sua gestão no ministério, o governo criou a Superintendência de Desenvolvimento
do Nordeste (Sudene) e a Comissão Nacional para Assuntos da Associação
Latino-Americana de Livre Comércio (ALALC), além de reatar, no primeiro
semestre de 1960, as negociações com o FMI, o Banco Mundial e o Banco
Interamericano de Desenvolvimento. Pais de Almeida foi um dos maiores
entusiastas da transferência da capital federal para Brasília, inaugurada em
abril de 1960, no auge da política desenvolvimentista, que conseguiu altas
taxas de crescimento econômico, especialmente na indústria e no setor de
transportes. Entretanto, sua atuação à frente do ministério foi duramente
criticada pela oposição, articulada principalmente em torno da bancada da União
Democrática Nacional (UDN) no Congresso, que apresentou, sem êxito,
requerimento para a formação de uma comissão parlamentar de inquérito sobre o
“truste do vidro plano”. As principais críticas oposicionistas se dirigiam às
políticas cambial, creditícia e agrícola (especialmente no tocante ao setor
cafeeiro) e à emissão de moeda em larga escala, considerada responsável pelo
aumento da inflação,
Com
a posse de Jânio Quadros na presidência da República em 31 de janeiro de 1961,
Pais de Almeida deixou o ministério. Em outubro do ano seguinte, foi eleito
deputado federal na legenda do Partido Social Democrático (PSD), obtendo a
maior votação do estado de Minas Gerais. Seus adversários criticaram os altos
custos da sua campanha eleitoral, denunciando a prática de compra de votos que,
segundo eles, influiu decisivamente no resultado do pleito. A partir desse
episódio, os udenistas passaram a chamar Pais de Almeida de “Tião Medonho”,
apelido do chefe da quadrilha que assaltou um trem pagador em Japeri, no Rio,
em junho de 1960. O ex-ministro se defendeu dessas acusações afirmando que
fazia doações para instituições de vários estados desde muito antes de
concorrer a cargos eletivos e citando o exemplo de sua cidade natal que,
segundo ele, lhe devia vários melhoramentos, como a construção da igreja, do
hospital e do cinema.
A cassação do mandato
Pais
de Almeida assumiu sua cadeira na Câmara Federal em 1º de fevereiro de 1963,
durante o governo do presidente João Goulart. O primeiro ano dessa legislatura
foi marcado pela radicalização da luta política entre forças reformistas e
conservadoras, levando à articulação de um movimento militar que, em 31 de
março de 1964, derrubou o governo e conduziu o general Humberto Castelo Branco
ao poder. Apesar de pressionado pela chamada “linha dura” para adotar medidas
mais radicais, o novo governo manteve inicialmente em vigor (com pequenas
alterações) a Constituição de 1946 e o calendário eleitoral, que previa para
outubro de 1965 a realização de eleições diretas para governador em 11 estados,
inclusive Minas Gerais e Guanabara, considerados de grande importância para o
curso do processo político nacional. A aproximação do pleito produziu um
aumento da tensão em virtude da expectativa de vitória da coligação
oposicionista formada pelo PSD e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB)
naqueles dois estados. Em 18 de julho de 1965, a convenção da seção mineira do PSD lançou Pais de Almeida para disputar o governo estadual
contra Roberto Resende, apoiado pela UDN. Apesar de não ter sofrido nenhuma
acusação formal nos inquéritos instaurados depois da derrubada de Goulart, sua
candidatura foi considerada pela “linha dura” como “uma afronta à revolução”,
devido à sua íntima ligação com o ex-presidente Kubitschek, que tivera seus
direitos políticos suspensos em junho de 1964.
Em 27 de agosto de 1965, os líderes udenistas Pedro Aleixo,
Adauto Lúcio Cardoso e José Bonifácio Lafayette de Andrada assinaram um
memorial intitulado O assalto ao trem pagador, solicitando à
Justiça Eleitoral o impedimento da candidatura de Pais de Almeida por abuso do
poder econômico. O pedido não foi aceito no âmbito estadual, mas o Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), baseado na Lei das Inelegibilidades aprovada em 9 de
julho anterior, acatou a argumentação dos udenistas e negou o registro para o
candidato do PSD, que foi substituído na primeira quinzena de setembro por
Israel Pinheiro. Os candidatos da coligação PSD-PTB, Israel Pinheiro e
Francisco Negrão de Lima, saíram vitoriosos nas eleições de 3 de outubro para
os governos de Minas Gerais e da Guanabara. No final desse mês, Castelo Branco
editou o Ato Institucional nº 2 (AI-2), que reabriu o processo de punições
extralegais aos adversários do regime, extinguiu os partidos políticos
existentes e restaurou as eleições indiretas para a presidência da República.
Em 12 de outubro de 1966, quando o período de vigência do AI-2 estava chegando
ao fim, Pais de Almeida e mais cinco deputados federais tiveram seus mandatos
parlamentares cassados e seus direitos políticos suspensos por dez anos. Essa
medida surpreendeu o próprio presidente da Câmara, Adauto Lúcio Cardoso, que
permaneceu no palácio do Congresso junto com grande número de parlamentares,
inclusive os atingidos, protestando contra as novas cassações e tentando
garantir o mandato dos seus colegas. Essa atitude provocou a invasão do
parlamento por contingentes militares e a edição, em 20 de outubro de 1966, do
Ato Complementar nº 23, que decretou o recesso do Congresso até o dia 22 do mês
seguinte.
Depois da cassação de seu mandato, Pais de Almeida se retirou
da vida pública. Com a edição do AI-5, em 13 de dezembro de 1968, viajou para o
exterior, receoso de ser envolvido em alguma das comissões de inquérito então
constituídas. Esteve nos Estados Unidos e na Europa, retornando ao Brasil em
abril de 1969, quando declarou que a economia do país se encontrava sem nenhuma
perspectiva. Em 1970, foi destituído da Ordem do Mérito Aeronáutico, que
recebera 11 anos antes.
Nessa
época, Pais de Almeida possuía uma das maiores fortunas do país, controlando 15
empresas em São Paulo e uma no Rio. Entretanto, seu grupo começou a enfrentar
sérias dificuldades financeiras nos primeiros anos da década de 1970. O Banco
Nacional do Comércio de São Paulo, de sua propriedade, foi incorporado pelo
Banco Bamerindus do Brasil em janeiro de 1974. Sua indústria de vidro plano
pediu falência em julho de 1975 e, no mês seguinte, a Alumínio e Ferro
Construtora entrou em concordata, seguida por outras sete empresas do grupo,
inclusive a Artefatos Metálicos para Construção.
Pais de Almeida faleceu no Rio de Janeiro em 19 de novembro
de 1975, um dia depois de retornar de uma viagem aos Estados Unidos.
Era casado com Diva Norse Pais de Almeida, com quem teve uma
filha.
Escreveu Análise da conjuntura nacional (conferência
na Escola Superior de Guerra, 1956), Monetary politics of Brazil
(conferência na Georgetown University, 1957) e Capitais e desenvolvimento
econômico (conferência no Fórum Teófilo Otoni, 1957).
Entre as empresas que integravam seu grupo, figuravam a
Companhia Agropecuária e Comercial, a Comércio e Indústrias Oleogases, a
Companhia Brasileira de Máquinas e Metais, a Imobiliária Castor, a Companhia
Importadora Nacional, a Sociedade de Comércio e Indústria Limitada (Socomin), a
Companhia Agrícola e Comercial Santa Rita e a Companhia Comercial e Agrícola
Leiteira. Pais de Almeida detinha também o controle da Companhia Comercial de
Vidros Planos, que dominava cerca de 1/3 do mercado nacional nesse setor,
contando com participação minoritária de capital norte-americano. Seus
investimentos agropecuários compreendiam a criação de bovinos e suínos em
extensas fazendas situadas em Mato Grosso, além de trezentos mil pés de café.
Em sua propriedade na região de Campinas (SP) implantou técnicas avançadas de
recuperação de solos e modernos processos agrícolas e pecuários.
Mônica Kornis
FONTES: ARQ. DEP.
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