LANGONI,
Carlos Geraldo
*pres.
Bco. Central 1980-1983.
Carlos Geraldo Langoni nasceu em Nova
Friburgo (RJ), no dia 23 de julho de 1944. Estudou no Colégio
Nova Friburgo, projeto pioneiro da Fundação Getulio Vargas (FGV), com bolsa
custeada pela prefeitura e por Luís Simões Lopes, então presidente da Fundação.
Ingressou no curso de graduação da Faculdade Nacional de Economia, na Praia
Vermelha, Rio de Janeiro, onde lecionavam Octavio Gouvêa de Bulhões, Isaac
Kerstenetzky e Julian Chacel, Formou-se em 1966.
No ano seguinte, fez o
curso de programação e planejamento econômico organizado
por Og Leme no Centro de Treinamento para o Desenvolvimento Econômico Social
(Cendec) do Ministério do
Planejamento. Affonso
Celso Pastore era um dos professores. O curso tinha orientação acadêmica próxima
à da Universidade de Chicago. Leme fez um acordo com a Fundação Ford para
mandar alguns alunos completar os estudos em Chicago. Langoni foi contemplado
com bolsa e tornou-se o primeiro brasileiro a obter o doutorado em Economia na
Universidade de Chicago em 1970.
Ao
retornar ao Brasil, Langoni foi convidado por Affonso Celso Pastore e Antônio
Carlos Rocca para trabalhar no Instituto de Pesquisas Econômicas da
Universidade de São Paulo (Fipe/USP), onde estruturou o programa de
pós-graduação e a Revista de Estudos Econômicos.
Sua tese de doutorado
(1970) “The Sources
of Brazilian Economic Growth”, publicada como livro em
1974 (As Causas do Crescimento Econômico do Brasil),
iniciou um importante debate sobre a relação entre educação, crescimento e,
mais tarde, distribuição de renda no Brasil com outro livro (Distribuição de
Renda e Desenvolvimento Econômico do Brasil, 1973).
Influenciado
pelo trabalho de Theodore Schultz, seu professor em Chicago e orientador de sua
tese, Langoni calculou o retorno do investimento em educação (capital humano),
desenvolvendo uma estimativa a partir de dados sobre custos de educação nos
níveis fundamental, médio e superior. Langoni esperava encontrar uma demanda
muito significativa de mão-de-obra qualificada devido ao processo de
crescimento da indústria brasileira. Seu trabalho constatou que a rentabilidade
social da educação no Brasil era em média de cerca de 25%, enquanto no capital
físico era de 12%. Duas outras conclusões foram que a diferença salarial
daqueles que haviam completado o ensino fundamental em relação aos analfabetos
era de cerca de 32% em 1969. E o ensino fundamental completo, comparado ao
ensino médio completo, dava um retorno de quase 20%.
Os economistas Samuel Pessôa,
William Sumerhill e Edmilson Varejão, em trabalho que dialoga com o de Langoni,
mostraram que os
gastos públicos em todos os níveis de educação representaram apenas cerca de 1%
do PIB nos anos 30. Não ultrapassaram 2% até a década de 60. Suas simulações
evidenciam que o PIB per capita do país teria crescido ao menos 25% a mais de
1933 a 1985, caso o valor investido a partir de 1933 em educação fosse apenas
um ponto percentual maior por ano.
Em
resumo, os principais argumentos de Langoni elaborados durante seu período de
doutoramento em Chicago foram que a
educação é fundamental para o crescimento econômico e é, também, o ingrediente
essencial para conciliar, a longo prazo, crescimento e distribuição de renda.
A partir dos
anos noventa, esses argumentos foram confirmados por pesquisadores
internacionais e brasileiros, como Ricardo Paes de Barros e Marcelo Neri. Mas
no início dos anos setenta instaurou-se um debate acirrado a partir,
principalmente, de declarações do presidente do Banco Mundial, Robert McNamara,
em abril de 1972, criticando a desigualdade econômica no Brasil. Funcionários
desta instituição assistiram uma apresentação do economista Albert Fishlow, da
Universidade da California, na reunião anual da American Economic Association
em dezembro de 1971 em New Orleans. O economista apresentou o artigo “Brazilian
size distribution of income”, no qual defendia que a política salarial
implementada pela ditadura nos anos sessenta, que conferia reajustes abaixo da
inflação para os trabalhadores, havia contribuído para o aumento da
desigualdade. O valor real do salário mínimo – ou seja, já descontada a
inflação – caíra 20% entre 1964 e 1967.
Em outras
palavras, Fishlow identificava as políticas econômicas da época como o grande
fator que explicava o aumento na desigualdade da renda. O modelo de crescimento
levava à concentração, sobretudo devido à política salarial, que tinha uma
indexação parcial, ou seja, baseada na expectativa da inflação futura e não na
correção integral da inflação passada.
Quando
o trabalho do norte-americano foi divulgado, o ministro da Fazenda, Delfim
Netto, considerou que merecia uma discussão à altura. Então o Ministério da
Fazenda solicitou formalmente um comentário sobe o estudo de Fishlow à Fundação
Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) da Universidade de São Paulo e Langoni
foi encarregado de fazer o trabalho.
Langoni
argumentava que, na verdade, a desigualdade no Brasil era estrutural e ligada
ao acesso à educação. Segundo ele, o rápido crescimento da economia na década
de 1960 fez com que a demanda por mão-de-obra qualificada aumentasse mais
rapidamente do que a oferta de trabalhadores suficientemente instruídos. Assim,
o "preço" que empresários estavam dispostos a pagar pela pequena
fração de indivíduos que tinham mais anos de estudo aumentou mais rapidamente
do que os salários dos sem-instrução. A interação entre desenvolvimento
econômico e falta de investimento em educação catapultou a desigualdade no
país. Um resultado extremamente importante da análise é que uma grande parcela
do aumento de desigualdade observado a partir da comparação direta dos perfis
estimados de renda reflete apenas mudanças de proporção na forca de trabalho,
tais como o aumento na participação dos jovens, das mulheres, do pessoal no
setor urbano e os indivíduos com educação acima do ginásio.
Pesquisadores
brasileiros de forte oposição ao regime militar aproveitaram o debate econômico
para criticar o então denominado “milagre brasileiro”. Resenhando o trabalho de
Langoni na revista “Pesquisa e Planejamento Econômico”, publicada pelo Ipea,
Pedro Malan e John Wells afirmavam que “a alta correlação observada entre renda
e educação é um fato, mas não é claro qual é a exata natureza da relação e o
papel cumprido pela ‘educação’ no processo”. Diziam ainda que a “teoria do
capital humano” (aspas dos autores) utilizava “surrealistas abstrações”. Com o
tempo, a academia brasileira (e estrangeira) passou a considerar o capital
humano fundamental para explicar resultados sociais e econômicos.
Após quase
três anos na Fipe, Langoni foi convidado por Edmar Bacha, com o aval de Mário
Henrique Simonsen, para lecionar na Escola de Pós-Graduação em Economia da
Fundação Getulio Vargas (FGV EPGE). Tornou-se subdiretor técnico da Escola
de 1972 a 1973 e diretor, aos 29 anos, entre 1973 e 1979.
Um dos
principais projetos que realizou como diretor da EPGE foi dar início, em 1975,
ao primeiro programa de doutorado em Economia no país. Criou condições para que
a FGV tivesse, pela primeira vez, um grupo de professores em tempo integral.
Com a ida de Simonsen ao Ministério da Fazenda em 1974, o apoio oficial do
governo tornou-se fundamental.
Em agosto de
1979, Langoni assumiu, a convite de Ernane Galvêas, a Diretoria da Área
Bancária do Banco Central. Nesse período, criou o Sistema Especial de
Liquidação e Custódia (Selic), um dos primeiros sistemas no mundo a assegurar a
liquidação virtual de transações com títulos públicos. Criaram-se os títulos
públicos virtuais, com absoluta segurança, e sua liquidação contra reservas
bancárias, acabando com uma fonte de incertezas e riscos (risco zero de
liquidação). A partir disso, surgiu a taxa Selic, formada nesse processo de
liquidação de títulos e reservas bancárias.
Com a
nomeação de Galvêas para o Ministério da Fazenda, em janeiro de 1980, Langoni
assumiu a presidência do Banco Central do Brasil, permanecendo no cargo até
setembro de 1983. Aos 35 anos, foi o mais jovem presidente da instituição na
história. Como
presidente do Banco Central, tornou-se membro do Conselho Monetário Nacional e
do Conselho Nacional de Comércio Exterior (Concex) e, ainda, representante do
Brasil, como governador suplente, no Fundo Monetário Internacional (FMI).
Em sua
gestão, após um início expansionista com a pré-fixação da correção monetária
pelo Ministério do Planejamento, adotou-se uma política monetária ativa de taxa
de juros reais, o que gerou um severo aperto de liquidez, com impacto sobre
diversas instituições financeiras.
No contexto
internacional, o BCB liderou complexas negociações relacionadas à dívida
externa brasileira que envolviam o Fundo Monetário Internacional (FMI), bancos
centrais, governos e bancos privados internacionais.
Em setembro de 1982, o
México declarou moratória das obrigações de sua dívida externa e os bancos
credores responderam com o corte das linhas interbancárias e de comércio dos
países devedores, aumentando a vulnerabilidade dessas nações. Em dezembro, o
Brasil suspendeu o pagamento dos juros da sua dívida e Langoni reuniu-se com o
FMI e os bancos credores, para negociar um acordo e a liberação de quatro bilhões
e quatrocentos mil dólares de recursos emergenciais. A maxidesvalorização da
moeda nacional, ocorrida em fevereiro de 1983, foi a medida tomada para
contornar a crise de estreitamento de liquidez que o país enfrentava desde
junho de 1982, causada sobretudo pelas perdas sofridas pelas agências
brasileiras no exterior no mercado interbancário e pela redução das linhas de
crédito comercial.
Langoni rejeitou a
moratória, alegando que teria as seguintes conseqüências: súbita redução das
transações comerciais com o exterior e bloqueio a uma série de importações
essenciais ao funcionamento da economia. Em julho de 1983, o Conselho Monetário
Nacional estabeleceu o controle total do Banco Central sobre as operações de
câmbio como meio de restringir ao máximo a remessa de recursos ao exterior e
restabelecer uma indispensável liquidez que permitisse maior margem de manobra
nas negociações da dívida.
Um mês depois, Langoni
recusou-se a assinar a terceira carta de intenções ao FMI por considerar
inexeqüíveis o ritmo e a forma de cumprimento das metas traçadas pelos
ministros da Fazenda, Ernane Galvêas, e do Planejamento, Delfim Netto,
especialmente no que se referia à redução da inflação e ao fim do déficit
público. Na base do desentendimento com a equipe econômica estava a avaliação
de que a crise da dívida era uma questão estrutural e não um problema
passageiro de liquidez. Em virtude dessas discordâncias, demitiu-se da
presidência do Banco Central, em setembro de 1983, sendo substituído por
Affonso Celso Pastore.
Antes de sua
passagem pelo Banco Central, Langoni teve importante participação na
reunião da Conferência Nacional das Classes Produtoras
(Conclap) em 1977. Como coordenador técnico do evento - com a presença de
Ernesto Geisel, João Paulo dos Reis Velloso e Mário Henrique Simonsen-,
discutiu alguns assuntos importantes que resultariam, nos anos seguintes, em
mudanças institucionais cruciais no Banco Central e no Banco do Brasil: o fim
da “conta-movimento” e da eliminação das áreas de fomento do Banco Central.
A Conclap de
1977 sediou o primeiro debate sobre desenvolvimento econômico em que os
empresários criticaram abertamente o intervencionismo estatal. Langoni afirmou,
no encontro, que os incentivos fiscais e os subsídios creditícios que o governo
fornecia, além das barreiras protecionistas exageradas, eram uma enorme
distorção, pois privilegiavam a acumulação de capital físico em detrimento do
capital humano. Defendia que os incentivos fiscais fossem concedidos para
atividades como treinamento de mão-de-obra e mais investimento em educação.
Mas a pressão política e de parte dos empresários
para manter subsídios era, além de imensa, institucionalmente garantida. Havia
a conta movimento que, na realidade, era uma conta de redesconto a custo zero
do Banco do Brasil junto ao Banco Central. Isso significava, na prática, que o
Banco do Brasil também era um banco emissor de moeda. A classe política via o
Banco Central não como uma autoridade monetária, mas como um banco de fomento.
Quando
Langoni assumiu a presidência da instituição, verificou que havia dois “Bancos Centrais”:
um formal, que atuava como autoridade monetária; e outro comercial, que atuava
como banco de fomento. Esse foi o grande desafio, pois, para executar a
política monetária, era preciso controlar o Banco do Brasil e a Caixa Econômica
Federal.
O Banco
Central tinha que lidar com uma área de financiamento à agricultura e com as
“contas em aberto”, a conta-petróleo, a conta-trigo e a conta movimento do
Banco do Brasil. Langoni iniciou a reorganização institucional da área
monetária e encontrei resistências dentro e fora do Banco Central. Era preciso
alocar recursos de acordo com a demanda, que era infinita, já que o crédito era
subsidiado, com os juros bem menores do que os de mercado.
Após a
passagem pelo Banco Central, Langoni foi convidado por Simonsen para voltar a
dar aulas e ser o diretor de ensino da EPGE. Mas optou, com total apoio de
Simonsen, por criar o Centro de Economia Mundial (CEM/FGV), totalmente
financiado com recursos privados. O CEM foi o primeiro centro de debates sobre
a abertura da economia brasileira e sobre as implicações do processo de
globalização nas suas dimensões comerciais, tecnológicas e de investimentos.
Na área
privada, foi Chief Executive Officer (CEO) do grupo NM Rothschild no Brasil
entre 1989 e 1997, participando ativamente do processo de privatizações
realizado durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, especialmente nas
privatizações da Vale do Rio do Doce e Embraer.
Tem três filhos de seu
primeiro casamento com Vera Serfaty: Patricia, Eduardo e Bernardo e quatro
netos. Casou-se com Cristiana Dutra em 2001 constituindo família com dois
enteados: Pedro e Juliana.
Publicou, entre outras
obras, As Causas do Crescimento Econômico do Brasil (1974), A economia da
transformação (1978), A política econômica do
desenvolvimento (1978), Distribuição de renda e desenvolvimento
econômico do Brasil (1973), A Crise do Desenvolvimento: uma
estratégia para o futuro (com prefácio de Paul
Volcker) (1985), Trade
reform: lessons from eight countries (1991), A economia em
transformação (1994) e Brasil: a retomada do
desenvolvimento econômico (1995).
Sérgio Praça
Gustavo
Lopes
FONTES: CURRIC. BIOG.;
Estado de S. Paulo (10/10/80,5/8,4/9,8/10/81,23/12/82, 2/9/83, 29/5/87,
9/1, 1/9/88, 18/11 e 12, 29/11/96); Folha de S. Paulo (22/1/80, 20/6/82,
24/5, 15/9/87, 24/1, 16 e 17/9/88, 12/2, 12/3, 21/5, 4 e 17/6/95, 17/3,
12/11/96, 21/8/97); Globo (17/1, 10, 11/10/80, 5/8/81, 3/9/83, 12/4,
28/8/87, 16/1/90, 9/1, 11/3, 5/6/95, 4/9, 23/11/96); Jornal do Brasil
(6/11/77, 21 e 23/1, 31/7, 21/9, 10/10/80, 22/8/81, 6/3, 2, 3/9/83, 23/8,
18/12/87, 19/11/88, 8/4/91, 20/9/92, 20/3/97).
http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT374718-1666-2,00.html
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