ARANHA,
Luís
*rev. 1930.
Luís de Freitas Vale Aranha nasceu
em Itaqui (RS) no dia 18 de dezembro de 1902, filho de Euclides Egídio de Sousa
Aranha e de Luísa de Freitas Vale Aranha. Seu pai, ao receber como herança
paterna uma fazenda, tornou-se estancieiro, e foi também chefe político do
Partido Republicano Rio-Grandense (PRR). Entre seus irmãos, destacaram-se Ciro
Aranha, que atuou na Revolução de 1930, e especialmente Osvaldo Aranha,
igualmente revolucionário e, por diversas vezes, ministro de Estado. Luís
Aranha tornou-se também conhecido como Lulu Aranha.
Iniciou seus estudos em Itaqui. Fez o curso secundário em vários colégios, entre os quais o São José, em Canoas (RS),
e o Dom Bosco, em Bajé (RS), e ainda o Pedro II, o Franco-Anglais, o Instituto
Lafayette e o Ginásio Pio-Americano, todos no Rio de Janeiro, então Distrito
Federal. Matriculou-se depois na Faculdade de Direito de Porto Alegre, pela
qual se bacharelou em 1926.
Ainda acadêmico, combateu, como membro das forças
governistas, a Revolução de 1923, movimento federalista liderado por Joaquim
Francisco de Assis Brasil. Os federalistas, ou “maragatos”, opunham-se ao
governo do republicano Antônio Augusto Borges de Medeiros e contestavam sua
reeleição. O conflito foi encerrado com a assinatura, em dezembro de 1923, do Pacto
de Pedras Altas, que não chegou a promover a total pacificação do estado, pois
os maragatos continuaram a reclamar de perseguições movidas pelo governo de
Borges de Medeiros. Assim, em fins de 1924, eclodiu novo movimento, desta vez
vinculado ao dos “tenentes” de São Paulo, e Luís Aranha voltou a integrar as
forças legalistas.
Em 1926, após formar-se, passou a exercer a advocacia em
Alegrete (RS), onde morou com seu irmão Osvaldo. Ao lado de Júlio de Castilhos
e Borges de Medeiros, Osvaldo Aranha teve grande influência sobre sua formação
política. Ainda em 1926, no dia 14 de novembro, irrompeu no Sul um movimento
revolucionário de protesto contra a posse de Washington Luís como presidente da
República. Esse movimento, denominado Coluna Relâmpago, era integrado
principalmente por exilados que haviam participado da Coluna Prestes. Osvaldo
Aranha, então comandante de uma força legalista, foi ferido nos primeiros
combates. Em dezembro, organizada a reação legalista, Luís Aranha ficou
encarregado de um contingente de “provisórios” (tropas irregulares, compostas
de civis recrutados).
No dia 25 de dezembro de 1926, chegou a Alegrete a notícia de
que uma coluna de rebeldes, vinda do Uruguai e chefiada por Estênio Caio de
Albuquerque Lima, penetrara no Brasil e se dirigia àquela cidade. Os
provisórios de Luís Aranha partiram, então, para dar-lhe combate. O confronto
ocorreu no dia seguinte. A força legalista conseguiu aprisionar metade dos
rebeldes, enquanto os restantes fugiram, tendo ido ao encontro das tropas de
Newton Estillac Leal, também integrante da Coluna Relâmpago.
Mais tarde, Luís Aranha transferiu-se para Itaqui, onde
também exerceu a advocacia.
Na Revolução de 1930
Em março de 1930, as eleições em que foi derrotado Getúlio
Vargas, candidato oposicionista apoiado pela Aliança Liberal, foram
consideradas fraudulentas pelos vencidos. Assim, intensificaram-se as
articulações revolucionárias que já se vinham desenvolvendo desde antes do
pleito. No início de abril, Luís Aranha foi enviado, como emissário de seu
irmão Osvaldo, ao Distrito Federal. Ali procurou Virgílio de Melo Franco e
Batista Luzardo, ao lado dos quais encontrou-se com o senador Epitácio Pessoa,
ex-presidente da República. Ao senador, Luís Aranha explicou a decisão gaúcha
de recorrer às armas caso o governo federal persistisse, segundo afirmou, “em
sua política de ataque e anulação dos direitos constitucionais da Aliança
Liberal”. Informou ainda a Epitácio Pessoa que Osvaldo Aranha já fizera uma
vultosa encomenda de armas à Tchecoslováquia e que, agora, pedia ao governo da
Paraíba uma contribuição em dinheiro. Tais notícias foram logo transmitidas a
João Pessoa, presidente da Paraíba (1928-1930), que respondeu afirmativamente.
Findos os entendimentos, Aranha, Melo Franco e Luzardo viajaram para Minas
Gerais, onde se encontraram com Artur Bernardes e com o presidente mineiro
Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, que concordou com o movimento revolucionário
e determinou a ida de Francisco Campos ao Sul, como seu emissário.
Segundo João Neves da Fontoura, Luís Aranha foi um dos
conspiradores mais lúcidos da articulação da Revolução de 1930, cabendo-lhe
grande parte do êxito do movimento.
A
organização dos revolucionários no Rio Grande do Sul incluía um grupo de
comando e núcleos diversos. O conjunto formava a chamada Coluna-Mestra da
Revolução. Luís Aranha participou do Grupo de Comando, sob a coordenação de
Osvaldo Aranha e Pedro Aurélio de Góis Monteiro, chefe militar do movimento. No
mês anterior ao da revolução, especializou-se em criptografia, tendo decifrado
os códigos usados pelos estados-maiores do Exército e da Região Militar e
codificado todas as mensagens para a deflagração da revolta.
Na
tarde de 3 de outubro de 1930, eclodiu em Porto Alegre o movimento revolucionário. A tomada do quartel-general do Exército ficou a
cargo da Guarda Civil estadual, acrescida de algumas pessoas, entre as quais
Luís Aranha e seus irmãos Ciro e Euclides. Apesar da surpresa do ataque, os
poucos elementos que se encontravam no quartel ofereceram forte resistência
durante quase uma hora, após o que o prédio foi ocupado pelos revolucionários.
Assim
que se consolidou a situação militar no Rio Grande do Sul, as forças rebeldes
iniciaram sua marcha para o norte e, em poucos dias, atingiram os arredores de
São Paulo. Em 12 de outubro, Getúlio Vargas, assumindo o comando da revolução,
decidiu partir de Porto Alegre rumo ao Distrito Federal. Além de seu
estado-maior, seguiu com ele toda uma comitiva, da qual também fazia parte Luís
Aranha. Pouco antes do ataque a São Paulo suspenderam-se os preparativos, já
que Washington Luís fora deposto (24/10/1930) por uma junta provisória. Vargas,
então, enviou à capital paulista um grupo de representantes seus, liderado por
João Neves da Fontoura e no qual se incluía Luís Aranha, com a missão de
preparar o terreno para a sua chegada e para a solução do problema político do
estado. Para isso, Getúlio determinou que não fosse reconhecida a investidura
do general Hastínfilo de Moura no governo paulista e que se desse posse a João
Alberto Lins de Barros como seu delegado especial.
Membro do novo regime
Depois da revolução, com a ida de seu irmão Osvaldo para o
Ministério da Justiça e Negócios Interiores, Luís Aranha tornou-se seu
secretário particular. No início de 1931, com a criação de diversas agremiações
revolucionárias no país, foi um dos fundadores do Clube 3 de Outubro, a mais
importante delas. Organização de cunho nacional, o Clube 3 de Outubro tinha por
finalidade reunir os revolucionários de 1930 que pretendiam o aprofundamento
das reformas promovidas pela revolução. Entre seus membros, figurava com
destaque a jovem oficialidade revolucionária, conhecida como os “tenentes”, e
alguns políticos, como Osvaldo Aranha, que compartilhavam seus pontos de vista.
Ao
mesmo tempo, criavam-se nos estados organizações semelhantes. No Rio Grande do
Sul, a idéia de se criar a Legião de Outubro gerou muitos temores, vinculados
basicamente ao medo do desequilíbrio que poderia gerar na vida partidária do
estado, ameaçando a existência dos partidos políticos vigentes. Luís Aranha
alertou seu irmão para a situação do estado, afirmando contudo não acreditar
que a Legião sobrevivesse no Rio Grande do Sul. Ainda no desempenho de suas
funções, procurava manter Osvaldo constantemente informado sobre a situação em São Paulo, onde as correntes políticas tradicionais criticavam com vigor crescente o governo
de João Alberto, de inclinações tenentistas. João Alberto acabou renunciando à
interventoria em julho de 1931.
A partir de dezembro de 1931, quando Osvaldo Aranha trocou a
pasta da Justiça pela da Fazenda, Luís Aranha deixou o cargo de secretário
particular do irmão para tornar-se chefe de gabinete do Ministério da Justiça,
ocupando essas funções até 1934 sob diferentes gestões ministeriais.
Em
1932, intensificaram-se as pressões pela constitucionalização do país,
exercidas por São Paulo e pelo Rio Grande do Sul junto ao Governo Provisório,
contra a opinião dos “tenentes”. Em 24 de fevereiro, Vargas assinou a nova Lei
Eleitoral, uma das exigências da Frente Única Gaúcha (FUG), representada no
governo pelo ministro da Justiça, Joaquim Maurício Cardoso. No dia seguinte,
foi empastelado o jornal Diário Carioca, um dos órgãos de oposição ao
tenentismo e o que mais lutara por essa lei. Ante a relutância do Governo
Provisório em determinar a apuração das responsabilidades, o ministro da
Justiça pediu demissão (29/2/1932), tendo, sido acompanhado nessa atitude por
vários outros gaúchos que ocupavam funções importantes na administração
federal.
No
início de março, com o agravamento da situação no Rio Grande do Sul, Luís
Aranha foi enviado a Porto Alegre como emissário de Vargas e Osvaldo Aranha.
Deveria mantê-los informados e, ao mesmo tempo, procurar com Maurício Cardoso
um entendimento que evitasse a ruptura definitiva. Embora houvesse participado
de várias reuniões com os líderes políticos gaúchos, nas quais tentou garantir o
retorno de Cardoso à pasta da Justiça, não obteve sucesso. Ainda em 1932,
recusou o convite para ocupar a chefia de polícia do Rio de Janeiro.
Com a convocação de eleições para a Assembléia Nacional
Constituinte em 1933, criou-se o Partido Autonomista do Distrito Federal, de
cuja organização Luís Aranha participou ativamente. Por esse partido, teve seu
nome incluído em várias chapas, mas retirou-o em todas as ocasiões: na chapa de
deputado federal, abriu mão em favor de Henrique Laje; na da senatoria, em favor
de Jones Rocha; finalmente, na da Prefeitura do Distrito Federal, indicou para
substituí-lo o nome de Pedro Ernesto Batista. Pouco mais tarde, em abril,
durante o I Congresso dos Interventores, realizado em Recife, foi criada a
União Cívica Nacional (UCN), presidida por Juarez Távora e secretariada por
Luís Aranha. Resultante da ação de amplos setores tenentistas, a UCN teve por
objetivo principal a federação de todos os partidos vinculados aos
interventores, inclusive o Autonomista do Distrito Federal, de modo a
submetê-los na Constituinte à orientação do governo.
Já em maio, em entrevista ao Correio da Manhã do Rio
de Janeiro, Luís Aranha declarou que, embora as idéias defendidas pela UCN
tivessem um caráter transitório, a agremiação tendia a transformar-se em
partido nacional, o que não chegou a ocorrer.
Em 1934, quando Vargas o chamou para chefiar a Casa Civil da
Presidência, vaga devido à morte do coronel Gregório Porto da Fonseca, também
não aceitou.
No
ano seguinte, tornou-se nítida a divisão do Partido Autonomista em duas
facções. Luís Aranha e o cônego Olímpio de Melo passaram a fazer oposição a
Pedro Ernesto, o prefeito do Distrito Federal e líder do outro grupo. Ambos
criticavam duramente o programa apresentado pelo prefeito, acusando-o de inspiração
socialista. A prisão de Pedro Ernesto em 1936, acusado de vinculação com o
levante comunista do ano anterior, renovou a cisão no Partido Autonomista, mais
uma vez dividido em torno do ex-prefeito Olímpio de Melo, o novo prefeito,
liderava o grupo de oposição a Pedro Ernesto. Mais tarde, Luís Aranha, aliado
ao deputado Augusto Amaral Peixoto Júnior e ao senador Cesário de Melo,
procurou eliminar a importância política do cônego. Este acabou perdendo o
apoio da Câmara Municipal e o controle do partido, o que o levou a renunciar ao
cargo. Logo depois da posse do prefeito seguinte, Henrique Dodsworth (julho de
1937), a ala do Partido Autonomista liderada por Luís Aranha e João Alberto
aproximou-se do Partido Economista Democrático de Dodsworth.
Em
novembro de 1937, poucos dias após a implantação do Estado Novo, Luís Aranha
manteve com seu irmão Osvaldo — então embaixador do Brasil nos Estados Unidos —
uma conversa telefônica na qual se disse favorável ao golpe e à nova
Constituição, alegando que a situação política os tornara inevitáveis. Por
outro lado, já em dezembro o Estado Novo extinguiu o Partido Autonomista,
juntamente com todas as agremiações políticas do país.
No
início de 1938, Luís Aranha assumiu a presidência do Instituto de Aposentadoria
e Pensões dos Marítimos (IAPM). Depois da tentativa de golpe integralista
(11/5/1938), o interventor federal no estado do Rio de Janeiro, Ernâni Amaral
Peixoto, propôs a criação da Legião Nacional, que seria um partido de cunho
corporativista, sem influências militares ou estrangeiras. Em junho, Luís
Aranha informou a Amaral Peixoto que o ambiente no Rio Grande do Sul era
desfavorável à criação de tal partido. No mesmo mês, enviou a Vargas um
telegrama em que pedia demissão da presidência do IAPM. Essa atitude foi
motivada pela reforma de seu irmão, capitão Manuel Aranha, sem que houvesse
antes qualquer inquérito policial ou militar. O capitão dera proteção ao
comandante do ataque integralista ao palácio Guanabara, Severo Fournier, para
que se asilasse na embaixada italiana.
Luís
Aranha ingressou, então, na iniciativa privada, tendo sido diretor da firma
Behring Cia. S.A., durante mais de dois anos. Mais tarde, em sociedade com
Augusto Frederico Schmidt, João Neves da Fontoura e outros, criou a Sociedade
de Expansão Comercial (Sepa), na qual permaneceu até o fim da vida.
Em 1945, retomou, embora discretamente, a atividade política,
tendo apoiado o brigadeiro Eduardo Gomes, candidato das oposições à presidência
da República, nas eleições de 2 de dezembro daquele ano.
Na área empresarial, Luís Aranha foi, ainda, presidente da
Meridional Acidentes de Trabalho, membro do conselho consultivo do Banco Safra
S.A. e do Grupo Safra e um dos fundadores da cadeia de lojas Ponto Frio e dos
laboratórios Nova Técnica. Atuou, também, na área desportiva, como presidente
da Confederação Brasileira de Desportos (CBD), de 1936 a 1943, do conselho deliberativo do Botafogo de Futebol e Regatas, clube da cidade do Rio de
Janeiro, e do Conselho Nacional de Desportos (CND). Nesse setor, foi um dos
responsáveis pela introdução do profissionalismo no futebol brasileiro.
Em 26 de outubro de 1967, sofreu um acidente automobilístico
no bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro, em conseqüência do qual ficou
paraplégico. Sem ter conseguido recuperar-se, morreu em 28 de março de 1978.
Foi casado com Heloísa Palmério Aranha, com quem não teve
filhos.
O arquivo de Luís Aranha encontra-se depositado no Centro de
Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (Cpdoc) da Fundação
Getulio Vargas.
Regina
da Luz Moreira
FONTES: ARQ. CLUBE
3 DE OUTUBRO; CASTRO, M. Rio; CONSULT. MAGALHÃES, B.; COUTINHO, A. Brasil,
ENTREV. BIOG.; FLYNN, P. Legião; FONTOURA, J. Memórias; Grande
encic. Delta; HIRSCHOWICZ, E. Contemporâneos; INST. NAC. LIVRO. Índice;
Jornal do Brasil (29/1 e 27/7/76); NOGUEIRA FILHO, P. Ideais;
SILVA, H. 1926; SILVA, H. 1930; SILVA, H. 1931; SILVA, H. 1932;
SILVA, H. 1937; SILVA, H. 1938; SILVA, H. 1945.