MARTINS, Mário (2-RJ)
*jornalista; dep. fed. DF
1955-1960; dep. fed. GB 1961; sen. GB 1967-1969.
Mário de Sousa Martins nasceu
em Petrópolis (RJ) no dia 22 de maio de 1913, filho de Rozendo de Sousa Martins
e de Hormezinda Almeida de Sousa Martins. Na época, seu pai, de nacionalidade
portuguesa, estava estabelecido como farmacêutico naquela cidade fluminense.
Cursou
o primário no Colégio Hilda Maduro e no Grupo Escolar Pedro II em sua cidade
natal. Em 1925 matriculou-se no primeiro ano ginasial no Colégio
Luso-Brasileiro, mas logo depois interrompeu os estudos para começar a
trabalhar como vendedor numa agência de automóveis ainda em Petrópolis. Em 1929 tornou-se o gerente da loja, mas, nesse mesmo ano, seu pai vendeu a
farmácia em Petrópolis e transferiu-se com toda a família para o Rio de
Janeiro, então Distrito Federal, onde abriu uma drogaria. No Rio, Mário Martins
empregou-se novamente numa agência de automóveis, porém, pouco tempo depois,
como seu irmão que trabalhava com o pai ingressou na Faculdade de Medicina,
viu-se obrigado a deixar seu emprego para auxiliar o pai na drogaria.
Paralelamente recomeçou a estudar à noite com o objetivo de concluir o curso
secundário.
No jornalismo
Em
1930 ingressou na Escola de Direito do Rio de Janeiro, onde esteve apenas um
ano, abandonando em seguida o curso. Durante seu tempo de estudante
universitário teve seu primeiro contato com o jornalismo, escrevendo artigos
sobre pugilismo para o Diário Carioca e para o jornal A Crítica,
de Mário Rodrigues. Partindo dessa experiência inicial, em 1932 fundou com
Mário Filho o diário O Mundo Esportivo, dedicando-se desde então
integralmente ao jornalismo. Esse período teve a duração aproximada de 18 meses
e contou com a colaboração de expressivas figuras, entre elas Nélson Rodrigues.
Segundo o depoimento do próprio Mário Martins, com a eclosão da Revolução
Constitucionalista de São Paulo em julho de 1932, o interesse pelo esporte
declinou, e o jornal passou a sofrer aguda crise, que culminou com seu
fechamento em meados de 1933.
Ainda
nesse mesmo ano, viajou para Nova Friburgo (RJ) com o objetivo de passar uns
dias na fazenda de seu amigo Válter Ataíde. Naquela cidade tomou conhecimento
de problemas que afetavam a população local, como um tímido movimento
reivindicatório dos operários da Fábrica de Rendas Arp e a existência de um
chefe de polícia que praticava extorsão. Nessas circunstâncias, Mário Martins e
seu amigo resolveram denunciar a situação reinante na cidade e fundaram um
jornal que recebeu o nome de A Esquerda e que abriu seu primeiro número
com a seguinte manchete: “A polícia de Friburgo está cheia de gatunos.” As
autoridades locais passaram então a fazer todo tipo de ameaças ao recém-criado
periódico, chegando inclusive a um atentado contra Mário Martins. As denúncias
de A Esquerda conseguiram promover a substituição do delegado, mas em
contrapartida algumas semanas mais tarde o jornal foi definitivamente impedido
de circular.
Mário Martins regressou então ao Rio, onde recomeçou a
escrever como colaborador artigos para diversos jornais. Em abril de 1936 foi
convidado para trabalhar no jornal carioca O Radical. Na ocasião,
praticamente toda a equipe desse periódico encontrava-se presa por estar
identificada com o ex-prefeito do Distrito Federal, Pedro Ernesto Batista, que
havia sido deposto, acusado de cumplicidade no levante comunista de novembro de
1935. Mário Martins foi chamado para tentar suprir as lacunas existentes e
assim impedir que fosse suspensa a circulação do jornal. Depois da normalização
de O Radical, Mário Martins foi contratado como seu secretário. Nessa
função, acompanhando a linha do jornal, manifestou-se contra o endurecimento
político do governo, combatendo o estado de guerra que havia sido decretado em
março de 1936 e a prisão dos parlamentares oposicionistas que denunciavam as
violências praticadas pelo governo.
A
partir do início de 1937 desencadeou-se a campanha eleitoral com vistas às
eleições presidenciais previstas para o ano seguinte. No mês de fevereiro foi
lançada a candidatura oposicionista de Armando Sales, líder do Partido
Constitucionalista de São Paulo, que acabara de deixar o governo paulista a fim
de se desincompatibilizar para concorrer às eleições. Em maio foi lançada a
candidatura de José Américo de Almeida, considerado o candidato do governo e
apoiado pela maior parte dos governos estaduais e por membros dos principais
grupos de esquerda que não se encontravam presos. Mário Martins apoiou José
Américo e moveu intensa campanha jornalística contra Armando Sales, denunciando
suas ligações com a empresa norte-americana Bond and Share. Ao lado de suas
atividades em O Radical, participou amplamente da
campanha, comparecendo a inúmeros comícios.
Em
outubro de 1937, com a reinstauração do estado de guerra, que fora suspenso em
julho daquele ano, Mário Martins iniciou uma campanha de denúncias em praça
pública dos preparativos de um golpe que viria impedir a realização do pleito
do ano seguinte. Essa atitude resultou na sua prisão em outubro na Vila
Militar. Quando em 10 de novembro suas previsões se efetivaram com o fechamento
do Congresso Nacional, a abolição dos partidos políticos e a instauração do
Estado Novo, Mário Martins ainda se encontrava detido. Poucos dias mais tarde,
porém, foi posto em liberdade, reassumindo em seguida suas atividades
jornalísticas como redator-chefe de O Radical. Nessa função, ainda que
sofrendo a rígida censura imposta pelo novo regime, moveu intensa campanha
contra o integralismo e procurou brechas para fazer algumas críticas ao
governo, o que lhe valeu várias prisões.
Em 1941, paralelamente às suas atividades jornalísticas,
prestou concurso para o serviço público, sendo aprovado e passando a ocupar o
cargo de chefe da Seção de Pesquisas e Estatística do Serviço de Alimentação da
Previdência Social (SAPS), órgão vinculado ao Ministério do Trabalho, Indústria
e Comércio. No final desse ano, com o agravamento da Segunda Guerra Mundial,
incorporou-se através de O Radical à luta pelo rompimento das
relações do Brasil com as potências do Eixo, o que se efetivaria em janeiro de
1942. Participou também das campanhas populares que reivindicavam a entrada do
Brasil na guerra, concretizada em agosto de 1942. Como resultado dessa sua
atuação, ainda nesse ano foi convidado pelo governo inglês para visitar a
frente de guerra naquele país, juntamente com uma delegação de jornalistas
brasileiros, ocasião em que participou de uma entrevista com o
primeiro-ministro Winston Churchill.
De regresso ao Brasil no início de 1943, ao lado de suas
atividades jornalísticas, Mário Martins passou a chefiar o recém-criado Serviço
de Fiscalização dos Preços e Estoques, órgão vinculado à Coordenação da
Mobilização Econômica, entidade governamental destinada a direcionar as medidas
econômicas voltadas para o esforço de guerra.
Quando
começaram a aparecer os primeiros sintomas de crise do Estado Novo, Mário
Martins engajou-se na luta em defesa da reconstitucionalização do país. Em 1944
deixou O Radical para fundar, juntamente com Vítor do Espírito Santo
Cardoso, o jornal Resistência, diário que tinha como objetivo combater o
Estado Novo. Como diretor desse periódico, cargo que exerceria até 1947, lutou
abertamente a partir de 1945 pela destituição de Vargas e a convocação de uma
assembléia nacional constituinte. Ainda em 1945 engajou-se na União Democrática
Nacional (UDN), tornando-se um dos articuladores da seção carioca dessa
agremiação, que foi constituída em torno da candidatura do brigadeiro Eduardo
Gomes à presidência da República. Nesse ano candidatou-se a deputado à
Assembléia Nacional Constituinte, mas não se elegeu, tendo obtido 3.700 votos.
Eduardo Gomes também foi derrotado nesse mesmo pleito pelo candidato Eurico
Gaspar Dutra, apoiado pelo Partido Social Democrático (PSD).
Em 1947, com o fechamento do Resistência, Mário
Martins abandonou temporariamente as atividades jornalísticas, sendo no ano
seguinte indicado para assumir o cargo de adjunto do adido comercial do Brasil
na Argentina, coronel Manuel Parreiras. Em Buenos Aires dedicou-se também a investigar informações relativas a supostas intenções
argentinas de promover uma guerra contra o Brasil. De posse de relatos desse
teor, decidiu-se escrever um livro sobre o assunto e para tal renunciou a seu
cargo em 1950, visto que a publicação dessa obra por um funcionário da
embaixada traria certamente dificuldades diplomáticas para o governo
brasileiro. De volta ao Rio lançou o livro, que recebeu o título de Perón —
um confronto entre o Brasil e a Argentina, e reassumiu depois o serviço
público, tornando-se economista do Ministério do Trabalho, Indústria e
Comércio.
Vereador no Distrito Federal
Com
a proximidade do pleito de outubro de 1950, candidatou-se a vereador no
Distrito Federal na legenda da UDN, participando também da campanha do
candidato de seu partido à presidência da República, brigadeiro Eduardo Gomes.
O brigadeiro foi derrotado por Getúlio Vargas, lançado pelo Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB), mas Mário Martins conseguiu eleger-se com pouco mais de três
mil votos. Empossado vereador em janeiro de 1951, foi escolhido logo depois
líder da bancada udenista e líder da oposição na Câmara de Vereadores, marcando
sua conduta desde o início do mandato pelo combate ao governo de Vargas.
Durante essa legislatura apresentou vários projetos, entre eles um para
controlar o Imposto sobre Vendas e Consignações — atual Imposto sobre
Circulação de Mercadorias (ICM) — no comércio varejista, que deu origem à
criação, em novembro de 1957, do concurso “Seus talões valem milhões” (na
época, “Seu talão vale um milhão”), possibilitando através da fiscalização
popular o crescimento da arrecadação e, adicionalmente, a supressão de uma
série de pequenos impostos. Em 1953 foi também eleito subsecretário nacional da
UDN.
Em janeiro de 1954, com o objetivo de incrementar a oposição
a Vargas, foi formada no Rio de Janeiro a Aliança Popular contra o Roubo e o
Golpe, coligação partidária constituída pela UDN, o Partido Libertador (PL) e o
Partido Republicano (PR), destinada a disputar as eleições legislativas e para
o governo de 11 estados brasileiros fixadas para outubro de 1954. Mário Martins
não só participou ativamente desse movimento como também teve seu nome incluído
na sua lista de candidatos para concorrer à Câmara dos Deputados.
Nos
meses seguintes, a campanha de oposição ao governo intensificou-se, atingindo
seu auge em agosto com a ocorrência do atentado da Toneleros que, tendo como
objetivo eliminar o líder oposicionista Carlos Lacerda, provocou a morte do
major-aviador Rubens Vaz. Desde então aumentaram as pressões sobre o governo, e
as soluções apontadas nos meios políticos para contornar a crise giravam em
torno de uma licença de Vargas ou de sua renúncia. Durante todo esse período
Mário Martins participou ativamente das lutas de seu partido para obter o
afastamento do presidente. Isolado politicamente e diante da iminência de sua
deposição, Vargas suicidou-se em 24 de agosto de 1954, tomando posse na chefia
do governo o vice-presidente João Café Filho.
Com
o desaparecimento de Vargas do cenário político, a UDN passou a tentar adiar as
eleições legislativas previstas para outubro, ao mesmo tempo em que buscava um
candidato de união nacional para a presidência da República no pleito previsto
para o ano seguinte, como forma de impedir que os getulistas voltassem ao poder
através do voto popular. A pregação favorável ao golpe militar para instituir
um governo de emergência, enquanto o país se “reorganizasse”, foi a tônica de
Lacerda e de alguns setores da UDN. O partido, entretanto, estava dividido a
esse respeito, e Mário Martins, juntamente com outros líderes expressivos,
assumiu posição menos radical. Finalmente, apesar de todas as pressões, as
eleições foram realizadas na data marcada e apresentaram um resultado que não
alterou de forma significativa a composição do Congresso. A Aliança Popular
contra o Roubo e o Golpe conseguiu eleger seis dos seus candidatos, entre eles
Mário Martins, que, empossado em fevereiro de 1955, um mês mais tarde foi
indicado para vice-líder da UDN na Câmara Federal.
Deputado federal
A sucessão presidencial tornara-se o tema central dos debates
políticos no país desde novembro de 1954, com o lançamento da candidatura de
Juscelino Kubitschek à presidência da República, que encontrava fortes
resistências nos meios militares e udenistas. A UDN, dadas as dificuldades de encontrar
um candidato de união nacional que tivesse ressonância junto ao eleitorado,
acabou apoiando a candidatura de Juarez Távora, já homologada pelo Partido
Democrata Cristão (PDC) e pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB). Mário
Martins acompanhou essas posições, apoiando a candidatura de Juarez e
engajando-se em sua campanha.
As eleições foram realizadas no dia 3 de outubro de 1955 e
deram a vitória à chapa de Juscelino e João Goulart. Divulgados os resultados
eleitorais, imediatamente setores importantes da UDN liderados por Carlos
Lacerda deram início a uma luta judicial, visando anular o pleito e impedir a
posse dos candidatos eleitos. Sua argumentação respaldava-se na pretensa
corrupção eleitoral, no apoio comunista aos candidatos vitoriosos e no fato de
os mesmos não terem obtido maioria absoluta de votos. Mário Martins,
entretanto, juntamente com uma ala mais liberal do partido, não aderiu a essa
posição. Mais tarde, quando se diluíram as perspectivas de uma vitória
judiciária, a ala golpista da UDN apelou para uma intervenção direta das forças
armadas, de forma a impedir de qualquer maneira a posse dos candidatos eleitos.
Mais uma vez Mário Martins se pronunciaria contra essa proposta, defendendo a
manutenção da legalidade.
Contudo,
quando em novembro de 1955 o ministro da Guerra, general Henrique Lott, chefiou
um movimento militar que depôs o presidente em exercício Carlos Luz, com o objetivo de neutralizar uma suposta conspiração contra a posse
dos eleitos, tramada no interior do próprio governo, Mário Martins
opôs-se a ele, unindo-se à bancada udenista que se negou a votar o impedimento
do presidente no Congresso. Apesar disso, a medida foi aprovada pela maioria.
Quando alguns dias mais tarde Café Filho, então licenciado da presidência da
República por motivo de doença, decidiu reassumir o cargo, foi obstado pelas
tropas do general Lott e teve seu impedimento votado pelo Congresso, que o
considerou envolvido com setores golpistas. Mário Martins mais uma vez votou
contra, ao lado da bancada da UDN.
Em dezembro de 1955 foi escolhido líder do Bloco Parlamentar
de Oposição na Câmara dos Deputados e em maio do ano seguinte teve destacada
atuação nas lutas contra a elevação dos preços das passagens de transportes coletivos
no Distrito Federal. Nessa ocasião, o governo concedeu um aumento de 100% nos
preços das passagens de bonde, suscitando com isso grande descontentamento
popular, uma vez que o funcionalismo público tinha sido aumentado em apenas
22%. Em vários pontos da cidade, especialmente nos bairros do Flamengo,
Copacabana e Penha, os estudantes organizaram manifestações para protestar
contra aquela medida, promovendo a depredação de grande número de bondes. O
movimento sofreu repressão policial, tendo sido a sede da União Nacional dos
Estudantes (UNE) cercada pelo Polícia Militar. Mário Martins, que lá se
encontrava, tentou, juntamente com outro deputado da UDN, Adauto Lúcio Cardoso,
impedir a entrada da polícia no prédio. Como conseqüência desse incidente, sofreu
ferimentos, tendo a mão fraturada.
Em
março de 1957 foi reeleito líder do Bloco Parlamentar de Oposição e, logo a
seguir, fez parte de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI), para apurar
as denúncias feitas por Lacerda sobre um suposto envolvimento do
vice-presidente João Goulart numa negociata de exportação de pinho para a
Argentina. A comissão concluiu que a denúncia não procedia, contrariamente à
posição de Mário Martins. Logo depois, em contrapartida, o governo passou a
acusar Lacerda de ter fornecido elementos para a decifração do código secreto
do Itamarati ao publicar o conteúdo do telegrama que acusava Goulart. O
ministro das Relações Exteriores, José Carlos de Macedo Soares, enviou então à
Câmara dos Deputados uma mensagem acompanhada de um ofício da Procuradoria
Geral da Justiça Militar pedindo licença para processar Lacerda por crime
contra a segurança nacional. O “caso Lacerda” ganhou intensa repercussão, e
Mário Martins, como vice-líder do Bloco Parlamentar de Oposição, articulou a votação
do pedido de licença de maneira a apressá-la e assim excluir os votos dos
deputados situacionistas que estavam fora do Rio. Essa manobra deu resultados,
e em 16 de maio a Câmara negou a licença para que Lacerda fosse processado, por
uma diferença de 12 votos.
Em 1958, Mário Martins integrou as chamadas Caravanas da
Liberdade, criadas por iniciativa do presidente da UDN, Juraci Magalhães, e
compostas por líderes udenistas que percorriam os diversos estados do país
realizando comícios com vistas a popularizar o partido. Nas eleições realizadas
em outubro desse mesmo ano, a UDN obteve grande êxito no Distrito Federal, e
Mário Martins reelegeu-se deputado federal com cerca de 7.400 votos. Durante
essa legislatura, fez parte das comissões de Relações Exteriores e de Segurança
Nacional da Câmara.
No início de 1959, Lacerda começou a articular a candidatura
de Jânio Quadros para concorrer às eleições presidenciais fixadas para outubro
do ano seguinte. Mário Martins, na época presidente da seção carioca da UDN, manifestou-se
contrário por considerar que Jânio não inspirava confiança e que, uma vez
eleito, não iria governar com seu partido. Com essa justificativa foi favorável
à candidatura do líder udenista Juraci Magalhães, que acabou, entretanto, sendo
derrotado por Jânio Quadros na convenção nacional da UDN realizada em 8 de
novembro de 1959.
Ainda
nesse mesmo ano apresentou, juntamente com o deputado Luís Fernando Bocaiúva
Cunha, do PTB, um projeto para a fusão da cidade do Rio de Janeiro com o estado
do mesmo nome, uma vez que o Rio iria proximamente deixar de ser Distrito
Federal, em função da transferência da capital para Brasília, recém-construída.
Esse projeto obteve certa repercussão, mas acabou sendo preterido diante de
outra alternativa, a de transformar o município do Rio de Janeiro no novo
estado da Guanabara.
O rompimento com a UDN
A partir do final de 1959 as divergências entre Mário
Martins, Carlos Lacerda e a UDN — cujos representantes do Distrito Federal na
Câmara privilegiavam o ataque às iniciativas do governo federal no tocante à
política econômica e à transferência da capital para Brasília — aprofundaram-se
cada vez mais. Segundo Isabel Picaluga, nesse momento a UDN em nível nacional
apoiou a bancada carioca na luta contra a mudança da capital. Mário Martins
foi, no entanto, uma voz discordante, pois acreditava que a interiorização da
capital “era um caminho para incorporar a Amazônia economicamente e manter uma
soberania que era alvo da cobiça internacional”.
Em
1960, ainda que divergindo em alguns pontos da corrente lacerdista no Distrito
Federal, foi um dos articuladores da candidatura de Lacerda ao governo do
recém-criado estado da Guanabara, lançando seu nome na convenção estadual do
partido em oposição ao outro pretendente, Geraldo Meneses Cortes. Nessa ocasião
teve também importante papel na articulação da candidatura de Tenório
Cavalcanti ao governo do estado, apoiada pelo Partido Social Trabalhista (PST),
com o objetivo de retirar votos do candidato petebista Sérgio Magalhães, que
disputava a mesma faixa eleitoral de Tenório. As eleições, de fato,
proporcionaram a vitória a Lacerda com pequena diferença de votos sobre Sérgio
Magalhães.
Ainda segundo Isabel Picaluga, a partir de 1961 delinearam-se
na UDN carioca duas correntes diferentes. De um lado pronunciaram-se os
liberais, tendendo a acompanhar as medidas políticas e econômicas do presidente
Jânio Quadros, e, de outro, o governador Lacerda e seus simpatizantes, que
tenderam a radicalizar cada vez mais para a direita, dando início a um processo
de desagregação no interior do partido. Nesse contexto de crise, em maio de
1961 Mário Martins renunciou ao seu mandato de deputado federal por
discordâncias políticas com o partido.
De
volta ao jornalismo, foi trabalhar como diretor do jornal A Noite. Nessa
função teve que enfrentar mais uma vez seu antigo amigo Carlos Lacerda. Por
ocasião da renúncia de Jânio em agosto de 1961, A Noite foi a favor da posse do vice-presidente João Goulart como sucessor legal.
Lacerda, então governador da Guanabara, era um dos líderes da tentativa de veto
à posse de Goulart, tendo sido responsável por intensa repressão às forças
legalistas e ordenado inclusive a invasão e ocupação de A Noite pelas
tropas da Polícia Militar. Nessa ocasião deu-se o rompimento entre Mário
Martins e Carlos Lacerda. Instituído o regime parlamentarista, João Goulart foi
empossado na presidência da República em 7 de setembro de 1961.
No governo Goulart
Pouco tempo depois Mário Martins saiu de A Noite e
tornou-se redator do Jornal do Brasil e da revista Manchete,
escrevendo duas colunas semanais até 1966, e semanalmente daí até 1969. Ao
mesmo tempo foi redator especial da revista Manchete.
Paralelamente, a convite de Evandro Lins e Silva, então chefe
do Gabinete Civil do presidente João Goulart, passou a participar do Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (CADE), órgão governamental criado para
lutar contra a ação dos trustes internacionais e nacionais na economia
brasileira. Ainda que sempre tivesse sido um opositor de Goulart, Mário Martins
apoiou a fase parlamentarista de seu governo, pois acreditava que naquela
conjuntura era importante dar sustentação ao presidente, que se achava
constantemente ameaçado. Nessa época, através de suas colunas no Jornal do Brasil
(JB) e na Manchete, defendeu em tese as reformas de base propostas,
considerando porém que Goulart estava “queimando etapas” e que o processo de
reforma deveria ser conduzido gradualmente.
Com a renúncia de Tancredo Neves ao cargo de primeiro-ministro
em junho de 1962, evidenciou-se a crise do regime parlamentarista, e Goulart e
as forças que o apoiavam desencadearam uma campanha pela antecipação do
plebiscito que decidiria acerca da manutenção do regime, originalmente previsto
para ser realizado em 1965. Mário Martins pronunciou-se contra a antecipação do
plebiscito e favoravelmente à permanência do regime parlamentarista. No seu
entender, se o parlamentarismo tivesse sido mantido, Goulart “teria pacificado
o Brasil e teria sido encontrada a saída histórica para o país”. Nos anos
seguintes, com a radicalização do governo Goulart, Mário Martins assumiu cada
vez mais uma posição de crítica às medidas governamentais, chegando em março de
1964 a apoiar o movimento político-militar que depôs o presidente, por
acreditar que essa era “a forma de manter a ordem no país”. Empossado o
marechal Humberto Castelo Branco na presidência da República, deu seu apoio ao
novo regime. Contudo, assumiu uma postura crítica, principalmente através de
sua coluna no JB, em relação às cassações e prisões que vários
opositores sofreram neste período.
Senador
Já
em julho de 1964, com a prorrogação do mandato de Castelo Branco e o
conseqüente adiamento das eleições presidenciais para outubro de 1966, o que no
seu entender configurava a intenção dos militares de se manterem no poder,
Mário Martins passou para a oposição. A partir de então começou a denunciar
através de sua coluna no Jornal do Brasil que os militares estavam
entregando o Brasil a potências estrangeiras e que a quebra da estabilidade dos
trabalhadores com a criação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)
atendia a interesses externos. Com essa perspectiva, em meados de 1966
ingressou no Movimento Democrático Brasileiro (MDB), sendo posteriormente
lançado candidato a senador pelo estado da Guanabara nas eleições de novembro
desse ano. Nessa ocasião, já tendo se reaproximado de Carlos Lacerda,
participou a seu lado da articulação da Frente Ampla, movimento político
lançado oficialmente em outubro de 1966 que contou com a participação inclusive
de antigos adversários de Lacerda, como os ex-presidentes Goulart e Kubitschek,
e que tinha como objetivo lutar pela pacificação política do país através da
plena restauração do regime democrático. Os resultados eleitorais de novembro
deram ampla vitória aos candidatos do governo. Na Guanabara, no entanto, a
oposição foi vitoriosa, e Mário Martins elegeu-se com mais de 360 mil votos,
tendo para isso decisivo apoio de João Goulart e de Carlos Lacerda. Empossado
em fevereiro de 1967, marcou sua atuação por denúncias de corrupção e de
perseguições políticas praticadas pelo regime.
Em novembro de 1968 denunciou a sonegação de impostos por
parte da firma Sudam Cigarros de São Paulo, da qual o então ministro da Justiça
Luís Antônio da Gama e Silva era advogado e acionista. Com a decretação do Ato
Institucional nº 5 (AI-5) em 13 de dezembro de 1968, foi preso na Vila Militar,
no Rio de Janeiro. Em fevereiro de 1969 seu mandato foi cassado e os direitos
políticos suspensos por dez anos. Em 1970, depois de deixar suas atividades
jornalísticas, afastou-se do Rio de Janeiro para dedicar-se a atividades
agropecuárias em Vitória.
Com
a abertura política já no governo do presidente João Batista Figueiredo e a
criação dos novos partidos a partir de dezembro de 1979, Mário Martins retornou
à vida política, regressando ao Rio em 1981. A partir de então começou a trabalhar pela unidade das oposições com vistas a organizar uma frente ampla contra o
governo. Não tendo conseguido atingir esse objetivo em virtude da decretação do
“pacote eleitoral” de novembro de 1981, que impedia coligações partidárias,
decidiu ingressar no Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), de
cuja seção fluminense logo depois foi eleito vice-presidente e a seguir, com a
saída de Nélson Carneiro, presidente. Com as perspectivas de incorporação do
Partido Popular (PP) ao PMDB, trabalhou ativamente para que ela chegasse a bom
termo no Rio de Janeiro, estado que apresentava maiores dificuldades para a
fusão partidária. Na época esteve à frente do PMDB nas negociações com o grupo
do governador Antônio de Pádua Chagas Freitas, do PP, visando à incorporação.
Efetuada esta última, o deputado Miro Teixeira assumiu a presidência do PMDB no
estado, cabendo a Mário Martins a vice-presidência.
No pleito de novembro de 1982 foi candidato ao Senado pelo
Rio de Janeiro, concorrendo numa sublegenda do PMDB, mas não conseguiu se
eleger. Na ocasião foi escolhido o senador Roberto Saturnino Braga, do Partido
Democrático Trabalhista (PDT), que disputava a reeleição.
No ano seguinte Mário Martins foi eleito presidente do
conselho da Associação Brasileira de Imprensa. Juntamente com Barbosa Lima
Sobrinho, presidente da entidade, integrou a ABI em diversas campanhas
políticas, notadamente a das diretas, em 1984. Com a derrota da emenda Dante de
Oliveira, Mário Martins apoiou a candidatura do ex-governador de Minas Gerais Tancredo
Neves, em oposição ao candidato do Partido Democrático Social (PDS), Paulo
Maluf.
Eleito pela Aliança Democrática, uma união do PMDB com a
dissidência do PDS abrigada na Frente Liberal, no Colégio Eleitoral reunido em
15 de janeiro de 1985, Tancredo não chegou a assumir a presidência. Doente,
faleceu em 21 de abril, sendo substituído pelo vice José Sarney, que já vinha
exercendo interinamente o cargo desde 15 de março.
Com a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte,
Mário Martins foi indicado para participar da Comissão de Estudos
Constitucionais, conhecida como Comissão Afonso Arinos. Em fevereiro de 1987,
com o início dos trabalhos constitucionais, tornou-se assessor de Afonso
Arinos, em Brasília. Mais tarde, integrou o Conselho de Defesa dos Direitos da
Pessoa Humana, vinculado ao Ministério da Justiça, como representante da ABI.
Reeleito diversas vezes presidente do conselho da ABI, deixou
o cargo por motivos de saúde em 1992, vindo a falecer em Vila Velha (ES), no dia 13 de dezembro de 1994.
Casado
com Diná Almeida de Sousa Martins, teve nove filhos, entre os quais a escritora
Ana Maria Machado e o jornalista Franklin Martins. Em segundas núpcias desposou
Jane Rodrigues Rios, com quem teve mais dois filhos.
Além da obra citada, Mário Martins publicou Há dez anos
Hitler guerreia o Brasil (durante a Segunda Guerra), Nos dias de
intolerância (1964) e Valeu a pena — memórias de um jornalista e
político de oposição que nunca foi do contra (obra póstuma, em co-autoria
com Franklin Martins).
Marieta
de Morais Ferreira
FONTES:
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