ITAIPU BINACIONAL
Empresa
binacional criada pelo tratado celebrado entre o Brasil e o Paraguai em 26 de
abril de 1973 e constituída em 17 de maio de 1974.
Antecedentes
A criação
da Itaipu Binacional selou o compromisso entre o Brasil e o Paraguai para o
aproveitamento do potencial hidrelétrico do rio Paraná no trecho situado entre
os saltos de Sete Quedas e a confluência com o rio Iguaçu, pertencente em
condomínio aos dois países. As negociações começaram em 1962, após várias
manifestações de interesse brasileiro pela construção de uma grande usina em
Sete Quedas.
A
utilização do potencial de Sete Quedas foi postulada originalmente pelo grupo
privado canadense Light, responsável durante mais de meio século pelo
suprimento de energia elétrica às cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. Em
1953, uma das empresas do grupo estrangeiro requereu às autoridades brasileiras
a concessão para o aproveitamento progressivo da energia elétrica da cachoeira.
O governo federal deu preferência a pedido idêntico formulado pela Comissão
Interestadual da Bacia Paraná-Uruguai (CIBPU) em 1956. Entretanto, a comissão
deu prioridade aos estudos sobre os aproveitamentos de Jupiá e Ilha Solteira,
localizados no curso superior do rio Paraná, situado em território brasileiro.
Em 1960, o presidente Juscelino Kubitschek referiu-se com entusiasmo ao projeto
de construção da usina de Sete Quedas, esboçado pelo engenheiro militar Pedro
Henrique Rupp.
A questão
somente ganhou vulto em março de 1962, quando o governo João Goulart contratou
o engenheiro Otávio Marcondes Ferraz para realizar um estudo sobre Sete Quedas.
O engenheiro elaborou anteprojeto de uma usina com dez mil megawatts (MW) de potência, mediante a construção
de uma barragem a montante de Sete Quedas para desviar as águas do rio Paraná
ao longo de um canal na margem brasileira até Porto Mendes, onde seria
instalada a casa de força, devolvendo em seguida as mesmas águas ao curso do
Paraná. O anteprojeto de Ferraz conservava a cachoeira de Sete Quedas, a maior
do mundo em volume de água. A totalidade das obras seria realizada em
território nacional.
O governo
paraguaio protestou contra a ideia da exploração unilateral dos recursos
energéticos de Sete Quedas, advertindo que o trabalho de demarcação de
fronteiras na área em torno da cachoeira não tinha sido concluído. O governo
Goulart admitiu formalmente iniciar negociações sobre o aproveitamento conjunto
de Sete Quedas, mas desistiu de levar adiante o empreendimento.
Em 1965,
o Paraguai voltou a reivindicar seus direitos, reavivando a disputa de
fronteira com o Brasil. Os países buscaram um entendimento diplomático que
culminou com a assinatura da Ata do Iguaçu em 22 de junho de 1966. O documento
firmado pelo chanceler Juraci Magalhães e por seu colega paraguaio, Raul Sapeña
Pastor, estabeleceu o regime de condomínio sobre os recursos hidráulicos do rio
Paraná no trecho de 190 km desde o Salto Grande de Sete Quedas até a
confluência com o rio Iguaçu. A energia elétrica eventualmente produzida pelos
desníveis do rio Paraná nesse trecho seria dividida em partes iguais. A questão
fronteiriça perdeu sentido, pois a área de litígio seria provavelmente inundada
pelo reservatório da usina. O acordo garantiu ao Brasil a prioridade na compra
da considerável quantidade de energia que excederia as necessidades do mercado
paraguaio.
Em
fevereiro de 1967, foi criada a Comissão Mista Técnica Brasileiro-Paraguaia
para a implementação da Ata do Iguaçu, na parte relativa ao estudo sobre o
aproveitamento do rio Paraná. O trabalho dessa comissão só ganhou impulso em
abril de 1970 com a assinatura de um acordo de cooperação entre as Centrais
Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras) e a Administración Nacional de
Electricidad (ANDE), empresa estatal paraguaia responsável pelos serviços de
energia elétrica do país. Em setembro do mesmo ano, o consórcio formado pela
firma norte-americana International Engineering Company (Ieco) e pela italiana
Electroconsult Spa (ELC) venceu a concorrência internacional para a realização
dos estudos de viabilidade e para a elaboração do projeto da obra.
Em
outubro de 1972, o consórcio apresentou relatório preliminar, apontando a
construção de uma grande barragem no local denominado Itaipu como a melhor
alternativa econômica para o empreendimento. Em janeiro de 1973, essa solução foi
aprovada pela Comissão Mista Técnica Brasileiro-Paraguaia.
A criação da empresa
Em 26 de
abril de 1973, os presidentes Emílio Garrastazu Médici e Alfredo Stroessner
assinaram o Tratado de Itaipu, instrumento legal para a construção e a operação
da usina hidrelétrica de mesmo nome no rio Paraná, cerca de 14km ao norte da
cidade de Foz de Iguaçu. O tratado previu a criação de Itaipu Binacional,
entidade incumbida da execução das obras e da exploração da energia elétrica
produzida. A capacidade da usina seria estipulada em 12.600MW, o que fazia de Itaipu o maior
empreendimento do gênero no mundo.
Logo após
a assinatura do tratado, o presidente Médici encaminhou projeto de lei ao
Congresso Nacional, estabelecendo um mercado cativo no Brasil para a energia produzida
por Itaipu, mediante sistema de cotas para as principais concessionárias
atuantes nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. A energia seria repassada por
Furnas Centrais Elétricas e pelas Centrais Elétricas do Sul do Brasil
(Eletrosul), empresas de âmbito regional controladas pela Eletrobras. O projeto
foi aprovado sem demora, dando origem à Lei nº 5.899, sancionada em 5 de julho
de 1973.
Itaipu
Binacional foi constituída com o capital de cem milhões de dólares, divididos
igualmente entre a Eletrobras e a ANDE. A parte paraguaia para a integralização
do capital foi obtida com um empréstimo do Banco do Brasil. A empresa foi
instalada em 17 de maio de 1974, com sedes em Brasília e em Assunção,
obedecendo a um regime jurídico sem similar no setor energético brasileiro. Os
órgãos de administração e o quadro de pessoal foram compostos de forma
paritária. Para cada diretor titular foi nomeado um diretor adjunto de
nacionalidade oposta. O cargo de diretor-geral foi reservado ao Brasil e
ocupado inicialmente pelo ex-ministro José Costa Cavalcanti, tendo como adjunto
o engenheiro paraguaio Enzo Debernardi.
O empreendimento
Em 1974,
a Itaipu Binacional adotou as primeiras medidas para a construção da usina,
como a elaboração do projeto de infraestrutura, a desapropriação e aquisição de
terras, a instalação de acampamento provisório e o levantamento e avaliação da
área do reservatório.
A
primeira grande dificuldade no relacionamento com o Paraguai surgiu no
julgamento da concorrência entre cinco empreiteiras para a construção do
vertedouro. Para a representação brasileira, a proposta de menor custo era da
Andrade Gutierrez e para a paraguaia devia ser contratada a Camargo Correia. A
solução conciliatória consistiu na formação de um consórcio dos cinco
postulantes, denominado União de Construtores (Unicon). Em outubro de 1975, a
Itaipu Binacional assinou contrato para a realização do primeiro estágio das
obras civis com a Unicon e o Consórcio de Empresas Construtoras Paraguaias
(Conempa), constituído por seis empreiteiras.
As obras
foram iniciadas ainda em 1975, com recursos provenientes da abertura de uma
linha de crédito da Eletrobras no valor de 3,5 bilhões de dólares. Os custos
totais foram orçados em 10,3 bilhões de dólares. A segunda dificuldade surgiu
por ocasião da concorrência para os equipamentos principais da usina, por causa
da diferença de frequência entre os sistemas elétricos brasileiro (60 Hz) e
paraguaio (50Hz). O Brasil chegou a propor a completa conversão do sistema
elétrico paraguaio, mas acabou concordando em dividir a usina em duas partes de
igual potência, com nove geradores de 60Hz e outros nove de 50Hz. A parcela não
utilizada pelo Paraguai seria adquirida pelo Brasil e transportada por
intermédio de um sistema de transmissão de corrente contínua de seiscentos
quilovolts (kV) até estações conversoras nas proximidades de São Paulo. A
energia gerada em 60Hz seria transportada por um sistema de corrente alternada
na tensão de 750kV. A construção desse sistema misto de transmissão foi
delegada a Furnas.
A
primeira etapa da obra foi vencida em 14 de outubro de 1978 com a abertura do
canal de desvio do rio Paraná, que permitiu secar o leito original do rio para
a construção da barragem. Ainda em outubro, foi assinado contrato para a
aquisição das 18 turbinas e geradores com 700MW de
potência cada um. Em 1978, o projeto registrou o pico de mão-de-obra,
totalizando mais de 31 mil trabalhadores.
Um marco
importante no campo diplomático foi a assinatura do acordo tripartite pelo
Brasil, Paraguai e Argentina, em 19 de outubro de 1979, para aproveitamento dos
recursos hidráulicos no trecho do rio Paraná desde as Sete Quedas até a foz do
rio da Prata. O acordo estabeleceu os níveis do rio e as variações permitidas
para os diferentes empreendimentos hidrelétricos na bacia comum aos três
países.
No início
da década de 1980, o agravamento da situação econômica do Brasil levou a
Eletrobras a recorrer a vultosos empréstimos de curto prazo no exterior com o
objetivo de manter o cronograma do projeto. Com a conclusão das obras da
barragem, as comportas do canal de desvio foram fechadas em 13 de outubro de
1982 para a formação do reservatório de Itaipu, compreendendo uma superfície de
1.460km2 e 29 bilhões de metros cúbicos de água.
A usina
de Itaipu foi inaugurada em outubro de 1984 pelos presidentes João Batista
Figueiredo e Alfredo Stroessner, dispondo de duas unidades geradoras de 50Hz.
De imediato, grande parte da quota paraguaia foi colocada à disposição do
Brasil. Furnas assegurou o suprimento de energia ao mercado brasileiro,
colocando em operação a primeira das duas linhas do sistema de transmissão em
corrente contínua, ligando diretamente as subestações conversoras de Foz do
Iguaçu (PR) e Ibiúna (SP) ao longo de quase oitocentos quilômetros.
As
unidades geradoras de Itaipu foram instaladas ao ritmo de duas a três por ano.
Em dezembro de 1986, a usina começou a produzir energia em 60Hz, destinada
integralmente ao mercado brasileiro, tendo início o suprimento pelo sistema de
transmissão de 750kV, pioneiro no hemisfério sul. O tronco de transmissão em
corrente alternada foi projetado para funcionar com três linhas entre Foz do
Iguaçu e a subestação terminal de Tijuco Preto (SP), contando em pontos
intermediários com as subestações de Ivaiporã (PR), onde a Eletrosul recebe a
energia destinada à região Sul, e Itaberá (SP).
Em 1988,
a usina completou a instalação das máquinas de 50Hz, entrando em operação a
segunda linha de transmissão de corrente contínua. Em 1989, Itaipu tornou-se a
maior hidrelétrica do mundo tanto em potência instalada como em capacidade de
geração, tendo início a operação da segunda linha de 750kV de Furnas. Em maio de
1991, a usina alcançou a potência máxima de 12.600MW prevista pelo projeto original. Na
época, seu custo foi avaliado em cerca de 16,2 bilhões de dólares.
A Itaipu
Binacional assumiu o compromisso de garantir o transporte fluvial no rio
Paraná, mediante a construção de eclusas ou de um sistema alternativo para
contornar a barragem de 120 metros. O projeto de transposição da barragem por
um conjunto de três eclusas, orçado em dois bilhões de dólares, foi deixado de
lado. A transposição de cargas por via férrea, pela margem paraguaia, despontou
como alternativa mais econômica, mas também não foi levada adiante.
Dolarização da Dívida e Ampliação
da Usina
O preço
da energia de Itaipu foi determinado pelo método chamado “tarifação pelo
passivo”, tendo em vista a cobertura dos custos operacionais da usina e dos
custos financeiros, resultantes dos juros e da amortização da dívida
constituída para a construção da obra. Essa metodologia não impediu que a
empresa apresentasse resultados negativos em vários anos.
A forma
escolhida inicialmente para o pagamento da dívida foi o sistema de prestações
constantes (Price). A escalada dos juros internacionais no auge da construção
da usina e a geração insuficiente de caixa acarretaram o crescimento
exponencial da dívida. A empresa foi obrigada a recorrer a novas captações para
rolagem da dívida e pagamento de encargos financeiros.
No início
da década de 1990, Itaipu enfrentou sérias dificuldades para honrar seus
pesados compromissos financeiros com a Eletrobras, sua principal credora. As
concessionárias estaduais brasileiras atrasaram sistematicamente o pagamento da
energia adquirida de Itaipu e das empresas supridoras federais integrantes do
grupo Eletrobras, acumulando uma dívida da ordem de quatro bilhões de dólares.
Tarifas defasadas e inadimplementos generalizados provocaram a quase completa
desarticulação financeira do setor de energia elétrica nacional durante o
governo Fernando Collor de Melo (1990-1992).
A partir
de 1993, foi possível renegociar parte da dívida vencida da binacional e
reduzir sensivelmente o nível de inadimplência das empresas de energia elétrica
brasileiras. O processo de saneamento foi realizado graças à Lei nº 8.631,
sancionada em março de 1993 pelo presidente Itamar Franco.
Em abril
de 1997, a empresa concluiu a repactuação dos compromissos com a Eletrobras,
que somavam 16 bilhões de dólares de um total de 19,8 bilhões de débitos. A
dívida com a Eletrobras foi dolarizada e refinanciada com juros de 7,5% ao ano.
A tarifa de energia, congelada desde 1991, teve um reajuste de 7%. Foi definida
também a indexação da tarifa aos índices da inflação norte-americana. Vale
notar que dois anos depois os custos da energia comprada pelas concessionárias
brasileiras aumentariam substancialmente por causa da forte desvalorização do
real. O acordo de 1997 exigiu o equacionamento de uma dívida vencida de quatro
bilhões de dólares que, segundo a oposição parlamentar paraguaia, não deveriam
ser pagos à Eletrobras.
Itaipu
mereceu um tratamento diferenciado na reforma do setor elétrico brasileiro,
promovida pelo governo Fernando Henrique Cardoso na segunda metade da década de
1990. Em
1995, as empresas geradoras do grupo Eletrobras foram incluídas no Programa
Nacional de Desestatização (PND). Formalmente, o programa passou a abranger
todo o sistema Eletrobras, com exceção de Itaipu, devido ao caráter binacional
do empreendimento, e do segmento de geração termonuclear, por impedimento
constitucional. A Eletrobras continuou a responder pela participação
da União no capital da empresa binacional. As mudanças no marco regulatório do
setor elétrico brasileiro não alteraram sua estrutura e modus operandi.
Em 2000,
os governos do Brasil e do Paraguai firmaram entendimento sobre a instalação de
mais duas unidades de 700 MW previstas no Anexo B ao Tratado de Itaipu assinado
em 1979. O contrato para instalação das novas unidades, no valor de 184,6
milhões de dólares, foi assinado em novembro de 2000 pelo presidente Fernando
Henrique Cardoso e seu colega paraguaio Luiz Gonzalez Macchi com o Consórcio
Empresarial Itaipu (Ceitaipu), liderado pela multinacional francesa Alstom.
A
ampliação era considerada essencial para reduzir o risco de déficit de energia
no sistema elétrico brasileiro. O desequilíbrio entre a oferta e demanda de
energia elétrica vinha aumentando desde o momento inicial de implementação das
reformas do setor em virtude da insuficiência dos novos investimentos em
geração e transmissão por agentes privados e empresas estatais. Os
investimentos da Eletrobras vinham diminuindo em virtude do programa de
privatização e da política de austeridade fiscal do governo. Em 2001,
entretanto, o agravamento da situação energética no Sistema Interligado
Nacional (SIN) redundou em prolongado racionamento em grande parte do território
nacional. Segundo relatório da comissão constituída pelo presidente Fernando
Henrique Cardoso, a crise foi provocada não apenas pela severa estiagem nas
regiões Sudeste e Nordeste, mas também pelos atrasos em obras de usinas e
linhas de transmissão, como o trecho Itaberá-Tijuco Preto do terceiro circuito
de 750kV do sistema de Itaipu. A entrada em funcionamento desta linha ocorreu
às vésperas do racionamento, com um ano de atraso. Em
consequência, Itaipu verteu um volume significativo de água que poderia ter
sido transformado em energia para reforço do atendimento da região Sudeste, se
o trecho Itaberá-Tijuco Preto do terceiro circuito de 750kV estivesse
disponível.
Por
causa da crise energética, a produção de Itaipu em 2001 caiu para 82 milhões de
MWh, muito abaixo do recorde histórico de 93,4 milhões de Megawatt-hora (MWh)
registrado no ano anterior. Cumpre destacar a participação do diretor-geral brasileiro da
empresa, Euclides Scalco, na Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica
(GCE), órgão responsável pela administração do programa de racionamento.
A partir
de abril de 2002, a comercialização da energia elétrica de Itaipu destinada ao
mercado brasileiro passou a ser feita pela Eletrobras, de acordo com a Lei nº
10.438 que alterou dispositivo da Lei n. 5.899 de 1973 Os compromissos de
aquisição e repasse às distribuidoras dos serviços de eletricidade de Itaipu,
firmados por Furnas e Eletrosul, foram sub-rogados à Eletrobras.
As últimas
unidades geradoras da usina entraram em operação comercial em setembro de 2006
e março de 2007, após sucessivas revisões de cronograma e problemas com o
consórcio Ceitaipu. Além do pagamento de multas por atraso, o consórcio foi
obrigado a promover a substituição integral de peças defeituosas. Integraram o
consórcio as seguintes empresas: ABB Alstom Power Brasil,
ABB, Voith Siemens Hydro Power Generation, Siemens, Voith Paper Máquinas e
Equipamentos, Ivaí Engenharia de Obras, Cesbe Engenharia e Empreendimentos,
Consorcio de Empresas Constructoras Paraguayas, UTC Engenharia, Empresa
Brasileira de Engenharia (EBE), Consorcio de Ingeneria Electromecanica (CIE),
Bardella Indústrias Mecânicas, Themag Engenharia e Gerenciamento, Promon
Engenharia, Inconpar e Tecnipar.
A
inauguração oficial das novas máquinas ocorreu em maio de 2007, em solenidade
que contou com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu colega
paraguaio Nicanor Duarte Frutos. Com vinte unidades geradoras, duas delas em
manutenção periódica, a usina atingiu a capacidade final de 14 mil MW e
garantiu a operação simultânea de 18 máquinas, máximo permitido pelo acordo
entre Brasil, Paraguai e Argentina.
Revisão do Tratado
Desde a construção da usina de Itaipu, houve na
opinião pública paraguaia a percepção de um desequilíbrio de benefícios entre
os dois países-sócios do empreendimento. Essa percepção suscitou demandas pela
revisão do Tratado de Itaipu que ganharam mais força no governo Nicanor Duarte
(2003-2008). Foram entabuladas negociações entre o Brasil e o Paraguai que
resultariam no acordo firmado em 2009, sob os governos Lula e Fernando Lugo,
respectivamente.
Em outubro de 2003, o presidente Nicanor Duarte propugnou
um acordo para redução dos juros da dívida de Itaipu. O presidente Lula
concordou em buscar uma solução de “engenharia financeira”, mas nada de
concreto foi acertado entre os dois países nos anos seguintes.
Em dezembro de 2006, o chanceler Celso Amorim, em
entrevista ao jornal ABC Color, de Assunção, afirmou a disposição brasileira em
negociar “esquemas de pagamento de dívida e de energia de Itaipu” considerando,
porém, “desnecessária” a revisão do tratado. A entrevista não agradou ao governo
Duarte e também provocou duro editorial do jornal paraguaio: “Com uma dívida
criada, manipulada e alentada pelos brasileiros de 20 bilhões de dólares, não é
difícil prever que, em poucos anos mais, o Brasil queira anexar o nosso país ou
tê-lo como um Estado livre associado, como fazem os EUA com Porto Rico”.
Em
janeiro de 2007, o governo brasileiro aceitou retirar
o mecanismo que acrescentava aos juros da dívida da empresa binacional
o impacto da inflação americana. Esse mecanismo (instituído em 1997) deixou de incidir
sobre a dívida paraguaia, mas continuou a ser cobrado no Brasil, adicionado à
tarifa de energia, conforme Medida Provisória convertida em Lei que autorizou a
renegociação dos créditos da União e da Eletrobras junto à Itaipu Binacional. Em
maio de 2007, na sua primeira visita oficial a Assunção, Lula declarou que
seria “muito complicado” renegociar o tratado e que a ruptura dos contratos
internacionais representava “uma ameaça às relações entre os países
sul-americanos”. Em resposta, o presidente Nicanor Duarte reiterou a
necessidade de revisão do tratado, tendo em vista “maior justiça e equidade e
melhor distribuição dos fundos para o desenvolvimento de nossos povos”. A oposição paraguaia fez dura crítica a Duarte, que o
qualificou de “entreguista”, ao não reclamar firmemente do preço “irrisório” pago
pelo Brasil pela cessão da energia elétrica do Paraguai.
Em abril de 2008, o
candidato oposicionista Fernando Lugo venceu as eleições presidenciais
paraguaias com uma plataforma que propugnava a revisão do Tratado de Itaipu e a
recuperação da “soberania energética” do país. No discurso de posse, em agosto,
afirmou que insistiria com o Brasil e a Argentina sobre o aumento do valor recebido
pela energia vendida de Itaipu e Yacyretá, aproveitamento hidrelétrico
binacional também situado no rio Paraná, dividido entre o Paraguai e a
Argentina.
Em setembro de
2008, em encontro em Brasília, os presidentes Lula e Lugo decidiram criar uma
mesa de conversações com técnicos dos dois países para discutir a questão de
Itaipu. Além da revisão da dívida e da livre disponibilidade sobre a energia,
Lugo pedia um “preço justo” a ser pago pelo Brasil, baseado no valor do
petróleo. Segundo o jornalista Guilherme Rios Cardoso, autor de estudo sobre a
política externa do governo Lula na América do Sul, os negociadores brasileiros
do Ministério de Minas e Energia, incluindo a Empresa de Pesquisa Energética
(EPE), diretores de Itaipu Binacional e da Eletrobras, relutaram em ceder às
reivindicações paraguaias.
Após dez meses de
negociação, Lula e Lugo assinaram um acordo em 25 de julho de 2009, justificado
como forma de dinamizar as relações entre os dois países e “superar
gradualmente as assimetrias”. O acordo previa o aumento de 200% da remuneração
relativa à quantidade de energia cedida pelo Paraguai ao Brasil, autorizava a
construção pela Itaipu Binacional de linha de transmissão no território
paraguaio com o objetivo de atender Assunção e reconhecia a possibilidade de
comercialização da cota do Paraguai diretamente no mercado brasileiro, não se
limitando a negociá-la com a Eletrobras. O governo brasileiro não concordou com
a venda no mercado aberto de energia. Sendo assim, até 2023, quando a dívida de
Itaipu for paga, o Paraguai terá de vender a energia excedente para o Brasil.
Em maio de 2011, já
no governo Dilma Rousseff, o Congresso Nacional aprovou as bases financeiras da
revisão do Tratado de Itaipu. Na época, foi estimado que a quantia paga pelo
Brasil ao Paraguai pela cessão de energia da usina binacional passaria de 120
milhões para 360 milhões de dólares anuais. A regulamentação da venda de
energia diretamente no território brasileiro foi objeto de grupos de trabalho,
mas não chegou a termo. A linha de transmissão Itaipu-Assunção, de 500kV, foi
projetada pela Itaipu Binacional, construída sob sua supervisão com recursos do
Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul e inaugurada em outubro de 2013.
No campo
socioambiental, Itaipu tem recebido diversos prêmios pelos seus projetos de
reflorestamento, reprodução de animais silvestres, pesquisa e proteção da fauna
e flora, educação ambiental, monitoramento da qualidade da água do
reservatório, pesquisa e desenvolvimento em energias renováveis, apoio ao
turismo regional e melhoria nas condições de saúde, emprego e renda em sua
região de influência.
Em 2013, a empresa
estabeleceu um novo recorde com a produção de 98.630 GWh, atendendo a 16,8% da
demanda do mercado brasileiro e a 75,1% da demanda do mercado paraguaio. Em 2014,
a usina hidrelétrica chinesa de Três Gargantas, com 22,5 mil MW de potência
instalada, superou pela primeira vez Itaipu na produção de energia elétrica.
Desde
a constituição da Itaipu Binacional em maio de 1974 até o início do segundo
governo Dilma Rousseff em janeiro de 2015, o cargo de diretor-geral brasileiro
da empresa foi ocupado sucessivamente por José Costa Cavalcanti (1974-1985),
Nei Braga (1985-1990), Fernando Xavier Ferreira (1990-1991), Jorge Nacli Neto
(1991-1993), Francisco Luiz Sibut Gomide (1993-1995), Euclides Scalco
(1995-1998), Altino Ventura Filho (1998), novamente Euclides Scalco
(1998-2002), Antônio José Correia Ribas (2002-2003) e Jorge Miguel Samek (a
partir de 2003).
Cláudia Galvão/Paulo Brandi
FONTES: CENT. MEM. ELET. BRAS. Panorama; COTRIM,
J. História de Itaipu; ELETROBRAS. Legislação (1993); Gazeta
Mercantil (14/5/97 e 4/4/98); GAZETA MERCANTIL. Panorama setorial (1997);
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1997. http://infoener.iee.usp.br/infoener/hemeroteca/imagens/18310.gif Novas
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