RADICAL,
O
Jornal carioca diário e matutino fundado em 1º de junho de
1932 e extinto em 9 de outubro de 1954.
Criação
Durante o primeiro semestre de 1932, a oposição ao Governo
Provisório de Getúlio Vargas cresceu enormemente, reivindicando a
reconstitucionalização do país e criticando o poder excessivo dos “tenentes”,
evidenciado principalmente depois do empastelamento do Diário Carioca no dia 25
de fevereiro daquele ano. Em todo esse período, a esmagadora maioria dos
jornais do Rio de Janeiro — então Distrito Federal — era contrária ao Governo
Provisório. Se a censura conseguia conter os ataques diretos a Vargas, não
tinha poderes por outro lado para fazer com que os jornais o defendessem ou elogiassem.
Preocupado em organizar uma imprensa abertamente favorável a
Vargas e aos “tenentes”, João Alberto Lins de Barros, então chefe de polícia do
Distrito Federal, tutelou a fundação de alguns jornais. Os fundos destinados a
esse tipo de empreendimento, segundo Hílcar Leite, teriam origens diversas,
provindo desde banqueiros do jogo do bicho até de uma “verba secreta” do
governo destinada a melhorar a imagem de Vargas.
Nesse contexto, em junho de 1932 foi lançado O Radical, que
trazia no cabeçalho o subtítulo “A voz da Revolução”, definindo-se como um
órgão destinado a defender e propagar os princípios da Revolução de 1930,
segundo a concepção dos “tenentes”, no seio da classe trabalhadora.
Atuação
Visando tornar o jornal atraente para essa camada social, O
Radical caracterizou-se pela ênfase ao noticiário trabalhista, sindical e
policial. Aberto às reivindicações imediatas dos trabalhadores, dava ampla
cobertura às greves e convocações de assembléias, à atuação dos sindicatos e às
condições de trabalho e de vida dos operários.
A primeira grande campanha de O Radical foi contra as forças
paulistas que se opunham ao governo de Vargas, principalmente contra a Frente
Única Paulista (FUP), criada em fevereiro de 1932 a partir da união do Partido
Republicano Paulista (PRP) e do Partido Democrático (PD). Segundo o jornal,
essa iniciativa tinha como objetivo anular as organizações partidárias já
existentes. A campanha contra os paulistas se acirrou com a eclosão da
Revolução Constitucionalista em julho de 1932, sendo enfatizado o caráter
separatista e antipatriótico do movimento. Durante essa fase, a direção de O
Radical era exercida por André Carrazoni e Trindade Cruz.
Com o término do movimento revolucionário paulista em outubro
de 1932, João Alberto afastou-se de O Radical e o jornal esteve ameaçado de
fechar. No entanto, pouco depois, Rodolfo de Carvalho comprou-o e procurou não
alterar substancialmente sua orientação política, mantendo-o como um órgão de
apoio ao governo de Vargas, e apenas aprofundando sua linha popular, voltada
para as classes trabalhadoras.
Na
preparação das eleições para a Assembléia Nacional Constituinte, marcadas para
maio de 1933, O Radical deu cobertura especial à atuação de Pedro Ernesto
Batista, então interventor no Distrito Federal. Assim, já em novembro de 1932,
noticiou fartamente o I Congresso Nacional Revolucionário, presidido por Pedro
Ernesto, que resultou na formulação de um programa a ser defendido na
Constituinte.
Em
março de 1933, foi fundado na cidade do Rio de Janeiro — por Pedro Ernesto,
entre outros — o Partido Autonomista, tendo como principal meta defender na
Constituinte a autonomia política e administrativa do Distrito Federal. O
Radical foi um dos principais veículos da campanha do novo partido, que obteve
ampla vitória, elegendo seis dos dez representantes cariocas à Assembléia. Nos
meses que antecederam a eleição do presidente da República pela Assembléia, em
julho de 1934, O Radical desempenhou um importante papel, dando grande
cobertura à candidatura de Vargas e elogiando sua atuação política.
Após a promulgação da Constituição em 16 de julho de 1934,
seguida um dia depois da eleição de Vargas, iniciou-se a campanha para as
eleições legislativas marcadas para outubro seguinte. Novamente O Radical deu
ampla cobertura aos candidatos do Partido Autonomista, que obtiveram expressiva
vitória, conquistando oito das dez cadeiras da bancada carioca na Câmara dos
Deputados e 20 das 24 cadeiras na Câmara Municipal. Nos meses seguintes, O
Radical deu também um apoio especial à candidatura de Pedro Ernesto, que, em
abril de 1935, foi eleito pela Câmara Municipal prefeito do Distrito Federal.
Com
a decretação, também em abril de 1935, da Lei de Segurança Nacional, teve
início um processo de endurecimento político que deu origem às primeiras
divergências de O Radical com o governo federal. O jornal passou a criticar as
medidas repressivas contra os sindicatos e as greves, ao mesmo tempo em que
dava cobertura e demonstrava simpatia pela Aliança Nacional Libertadora (ANL),
frente constituída pelos comunistas e demais opositores do governo. O Radical
foi, entretanto, contrário à Revolta Comunista deflagrada em novembro de 1935
pela ANL.
Durante
todo esse período, O Radical acompanhou de perto a obra administrativa de Pedro
Ernesto. Como um jornal preocupado em manter um noticiário voltado para os
interesses das camadas populares, deu grande destaque aos planos de
reformulação nas áreas de educação, legislação social e saúde, que instituíram
a assistência médico-cirúrgica e o montepio para os funcionários municipais,
além de regularizar o pagamento de seus vencimentos.
Com a decretação do estado de guerra em março de 1936, as
divergências de O Radical com o governo se aprofundaram, atingindo o clímax no
mês de maio com a prisão de Pedro Ernesto, acusado de envolvimento na Revolta
Comunista. Em virtude da posição abertamente contestatória do jornal, Rodolfo
de Carvalho e a maioria dos jornalistas foram igualmente presos, o que impediu
a circulação do matutino por algumas semanas.
O
Radical voltou a circular graças à contratação provisória de Mário Martins, a
quem coube organizar precariamente a redação. Com a libertação da equipe e a
normalização da edição do matutino, Mário Martins foi contratado em caráter
permanente, tornando-se secretário e posteriormente redator-chefe do jornal.
Esse episódio não alterou a linha de O Radical. Durante a
ofensiva antiparlamentar que culminou com a apresentação ao Congresso de um
pedido do governo de que fossem suspensas as imunidades dos parlamentares, pedido
esse cuja aprovação em julho de 1936 permitiu processar os deputados Domingos
Velasco, Abguar Bastos, João Mangabeira, Otávio da Silveira e o senador Abel
Chermont, O Radical manifestou-se mais uma vez contrário à onda de repressão
que atingia o país.
Em
setembro de 1936, O Radical sofreu nova punição, tendo sua circulação suspensa
por 60 dias, por ter publicado a foto de uma mulher com uma criança no colo e a
legenda “Nasce uma criança”, numa alusão a Olga Benário, mulher de Luís Carlos
Prestes, que estava sendo deportada grávida para a Alemanha.
Durante essa fase o jornal se caracterizou também pelo seu
antifascismo. Na esfera internacional, posicionou-se em relação à Guerra Civil
Espanhola (1936-1939), apoiando os republicanos que lutavam contra as forças
franquistas. Internamente, fez intensa campanha contra o integralismo,
publicando inúmeros artigos contra a Ação Integralista Brasileira (AIB) e seu
líder supremo Plínio Salgado.
A despeito de sua postura crítica e das punições que sofreu,
O Radical procurou manter seu apoio à pessoa de Getúlio Vargas. A proposta do
jornal era sempre procurar preservar a figura do presidente da República,
reservando todas as críticas para seus auxiliares. Essa atitude se explicava
não só pelo desejo de burlar a censura à imprensa imposta com a decretação do
estado de sítio em novembro de 1935, mas também pela posição de Rodolfo de
Carvalho, que possuía grande admiração pessoal por Vargas.
Com a proximidade das eleições presidenciais previstas para
janeiro de 1938, O Radical apoiou a candidatura situacionista de José Américo
de Almeida e moveu intensa campanha contra Armando Sales, candidato da
oposição, por suas ligações com a firma norte-americana Bond and Share.
Com
a decretação do Estado Novo em novembro de 1937 — que significou a interrupção
do processo eleitoral —, O Radical procurou manter sua estratégia anterior de
criticar o governo em suas medidas repressoras e resguardar a figura de
Getúlio. Além disso, deu ampla cobertura a inúmeros temas que estavam recebendo
a atenção do governo, promovendo várias campanhas de caráter nacionalista, como
as da nacionalização da marinha mercante e da aviação comercial e da criação da
indústria siderúrgica no país. Com o objetivo de divulgar e popularizar esses
temas entre as camadas mais pobres da população, que constituíam seu principal
público, O Radical criou um slogan que dizia “Trigo para o homem, petróleo para
a máquina, siderurgia para a segurança nacional”. Graças a essa orientação de
apoio pessoal a Vargas e a alguns projetos do governo, O Radical foi algumas
vezes poupado.
Em 1941, Amílcar Dutra de Meneses, diretor do Departamento de
Imprensa e Propaganda (DIP), escreveu um livro intitulado O futuro a Deus
pertence e de certa forma coagiu a imprensa a fazer resenhas e comentários
elogiosos sobre a obra. O Radical, contrariando essa tendência, fez uma crítica
impiedosa que obteve grande repercussão. Amílcar de Meneses pediu a punição
do jornal a Getúlio mas não foi atendido.
Ainda em 1941, com o agravamento da Segunda Guerra Mundial, O
Radical tornou-se um dos precursores da luta pelo rompimento do Brasil com os
países do Eixo. No ano seguinte, fez intensa campanha para que o Brasil
ingressasse na guerra ao lado dos Aliados, o que se efetivou no mês de agosto.
Durante todo o Estado Novo, O Radical gozou de grande
prestígio popular, atingindo uma tiragem de 20 mil exemplares, que eram
vendidos principalmente na Zona Norte do Rio de Janeiro. Nesse período, além de
se manter basicamente como um jornal voltado para as massas populares, tratando
de temas trabalhistas e policiais e das condições de vida dos trabalhadores,
passou a publicar duas novas seções, sobre a Marinha Mercante e sobre assuntos
ligados à área militar.
Em 1945, com a luta pela redemocratização do país, O Radical
passou a ser o porta-voz da campanha “queremista”, movimento popular que surgiu
em maio no Rio de Janeiro e defendia a permanência de Getúlio Vargas na
presidência da República, mas sob um regime constitucional. Através de suas
páginas popularizou-se o lema “Constituinte com Getúlio”.
Com
a deposição de Vargas em outubro de 1945 e, a seguir, a eleição de Eurico
Gaspar Dutra para a presidência da República, O Radical assumiu uma posição de
neutralidade, não fazendo críticas ao novo presidente, mas também não dando
apoio ao seu governo.
Nessa
ocasião, faleceu Rodolfo de Carvalho, tendo assumido a direção do jornal seu
genro, George Galvão. Desde então O Radical iniciou uma fase de declínio,
sofrendo acusações, em 1949, de ter sido subornado por Ângelo Mendes de Morais,
então prefeito do Distrito Federal, para dar cobertura à sua administração.
Em 1950, com a eleição de Vargas para a presidência da
República, O Radical deu todo apoio ao novo governo. Contudo, não conseguiu se
recuperar, passando a viver grandes dificuldades financeiras. Finalmente, em
outubro de 1954, foi fechado por ação executiva movida pelo Banco do Brasil por
não ter conseguido saldar seus títulos.
Marieta de Morais Ferreira
FONTES: CARONE, E.
Segunda; ENTREV. LEITE, I.; ENTREV. MARTINS, M.; ENTREV. SANTA CRUZ, R.;
LEVINE, R. Vargas; MALTA, O. Tenentes; Radical.