CARAS
PINTADAS
Denominação
dada aos jovens e estudantes que se reuniram em manifestações públicas durante
o processo de impeachment do presidente Fernando Collor em agosto e setembro de
1992. A principal característica desse movimento, que lhe deu o nome, foi o
uso das cores preto, verde e amarelo pintadas nos rostos de todos que foram
para as ruas pedir o impeachment do presidente e a prisão do empresário Paulo
César Farias — tesoureiro da campanha eleitoral e principal articulador do
esquema de corrupção montado no governo.
Em 1991, Pedro Collor, irmão de Fernando, começou a organizar
um dossiê com documentos que incriminavam Paulo César Farias por uso de
informações privilegiadas, tráfico de influência, cobrança de “pedágio”
(comissão) a empresas e entidades para a realização de obras públicas,
corrupção, enriquecimento ilícito, remessa ilegal de divisas para o exterior,
sonegação de impostos etc.
A revista Veja, em 13 de maio de 1992, publicou a primeira
parte desse dossiê. No dia 18, o Jornal do Brasil publicou entrevista com Pedro
que incriminava Fernando por cumplicidade com Paulo César Farias.
No Congresso, a repercussão das declarações de Pedro levou, a
princípio, a um acordo dos líderes adiando, pelo menos por 30 dias, a
possibilidade de formação de uma comissão parlamentar de inquérito, como forma
de preservar o presidente até que houvesse indícios mais seguros da probidade
das acusações. No entanto, o Partido dos Trabalhadores (PT) rompeu esse acordo
e iniciou a coleta de assinaturas em favor da abertura da CPI destinada a
investigar as denúncias de enriquecimento ilícito de Paulo César Farias.
Em 24 de maio, a Veja publicou uma entrevista exclusiva de
Pedro que envolvia Fernando no que passou a ser chamado de esquema PC,
confirmando as declarações publicadas no Jornal do Brasil. Uma das mais fortes
afirmações tornou-se o título da reportagem: “O PC é o testa-de-ferro de
Fernando”.
A repercussão das novas denúncias foi imediata. Pedro foi
afastado definitivamente da direção das Organizações Arnon de Melo, o grupo de
comunicação da família. O palácio do Planalto, por meio do ministro da Justiça,
Célio Borja, encaminhou a estratégia de defesa do presidente, que pediu à
Polícia Federal a abertura de inquérito para apurar responsabilidades sobre as
denúncias e o início de uma ação penal, acusando Pedro de “crime contra a
honra”. No Congresso teve início a defesa geral da abertura da CPI.
Nesse mesmo dia, o Banco Central decidiu investigar as contas
de Paulo César Farias. E, ainda na mesma noite, por meio de requerimento
apresentado por José Dirceu e Eduardo Suplicy, ambos do PT, o Congresso
decidiu-se pela instalação de uma CPI mista para investigar as acusações de
Pedro.
A decisão foi tomada após uma longa sessão, na qual os
líderes do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) no Senado,
Humberto Lucena, e do Partido Democrático Trabalhista (PDT), Maurício Correia,
anteriormente contrários, defenderam veementemente a CPI.
Em 27 de maio, Pedro apresentou à imprensa o resultado de
exames que afirmava sua completa saúde mental e responsabilizou Fernando e
Paulo César Farias por sua integridade física.
Na noite do mesmo dia, o presidente do Senado, Mauro
Benevides (PMDB-CE), formalizou a criação da CPI, composta de 11 senadores e 11
deputados.
Com a crescente indignação pública provocada pelas denúncias
de corrupção no Executivo, 18 entidades civis, entre elas a Central Única dos
Trabalhadores (CUT), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Central Geral dos
Trabalhadores (CGT), a Força Sindical, a Confederação Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB), a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), a Comissão Nacional
de Justiça e Paz, o Movimento Nacional dos Direitos Humanos e a Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) reuniram-se e deram início ao
Movimento pela Ética na Política, preparando um documento conjunto no qual era
exigida rigorosa apuração das acusações.
Em 29 de maio, na ABI, teve lugar o Fórum pelo Impeachment. O
Fórum, organizado pelo Movimento pela Ética na Política, contou com a
participação de entidades da sociedade e de partidos (PT, Partido Comunista do
Brasil [PCdoB], Partido Socialista Brasileiro [PSB], Partido Popular Socialista
[PPS], Partido da Social Democracia Brasileira [PSDB], PMDB, representado
parcialmente, CUT, Sindicato Estadual dos Profissionais do Ensino [SEPE], União
Nacional dos Estudantes [UNE], União Brasileira de Estudantes Secundaristas
[UBES] e União da Juventude Socialista [UJS]).
Instalada em 1º de
junho, a CPI começou a atuar no dia 4, com o depoimento de Pedro. Até o fim de
julho, a CPI recolheu fortes indícios de ligação das atividades ilegais de
Paulo César Farias com o governo.
A CPI iniciou os trabalhos em clima de descrédito. O
secretário de Governo, Jorge Bornhausen, afirmou que, como todas as CPIs, essa
também não levaria a nada.
No entanto, o trabalho da CPI, que contou com ampla cobertura
da imprensa, foi ganhando credibilidade e, paralelamente, o palácio do Planalto
foi perdendo o controle das investigações, aumentando os indícios de
comprometimento do Executivo.
Desde 1961, quando da eleição de Jânio Quadros, e após 25
anos de ditadura militar, Fernando Collor era o primeiro presidente eleito pelo
voto direto.
Sua campanha, que conquistara 35 milhões de votos, baseara-se
num discurso ético que propunha “o fim dos marajás”, fundamentando-se no
slogan: “Ladrão vai para a cadeia.”
Com
o desenvolvimento das investigações da CPI e da grande cobertura da imprensa,
um clima de perplexidade tomou conta do país, ao mesmo tempo em que aumentou a
perda de credibilidade e autoridade do presidente.
Em
várias declarações, tanto no Congresso quanto para a imprensa, políticos de
diversas tendências, entre eles, Luís Inácio Lula da Silva (PT), Tasso
Jereissati (PSDB) e Orestes Quércia (PMDB), afirmaram a necessidade de o povo
pedir o processo do impeachment do presidente.
A falta de ética na estrutura de governo, que, com a CPI,
tornava-se cada vez mais evidente, sensibilizou e mobilizou uma parcela
considerável dos jovens. A partir de agosto a juventude tomou as ruas. Em São Paulo, uma passeata reuniu dez mil jovens, a maioria estudantes de colégios privados, que
reivindicavam o impeachment do presidente e a prisão de Paulo César Farias.
Convocados pela UBES, por meio de panfletos e cartazes, os jovens partiram do
Museu de Arte de São Paulo, na avenida Paulista, e chegaram ao largo de São
Francisco, em frente à Faculdade de Direito, acompanhados de um carro de som
que tocava Alegria, Alegria, canção de Caetano Veloso revivida com a minissérie
da Rede Globo Anos Rebeldes, de Gilberto Braga. A minissérie abordava o
envolvimento de jovens de esquerda nos movimentos de contestação e luta armada
contra o regime militar instalado em 1964.
A
mobilização dos jovens facilitou a organização de uma vigília dos estudantes da
Fundação Cásper Líbero, em São Paulo, como forma de pressão contra o aumento
das mensalidades da escola, já que uma das medidas do governo havia sido
liberar as mensalidades escolares.
Novamente a bandeira da UNE, que tivera importante papel nos
movimentos de resistência à ditadura militar, tomava as ruas e chegava à mídia.
Lindberg Farias, paraibano de 22 anos, filiado ao PCdoB, filho de um
ex-militante da Ação Popular e vice-presidente da UNE em 1961, era o
presidente.
Coberta pela grande imprensa, a manifestação dos estudantes
de São Paulo foi comparada com o movimento estudantil de 1968, cuja história
romanceada ocupava as telas de televisão. Sem deixar escapar as diferenças
entre os dois movimentos, as reportagens sobre as manifestações pró-impeachment
reforçavam o caráter irreverente e apartidário dos jovens do início dos anos
1990, que saíram para as ruas não para revolucionar o mundo, mas para exigir
ética ao poder público.
Em 14 de agosto de 1992, com o crescimento contínuo da
pressão popular e, em especial, da parcela jovem da população, Mauro Benevides
convocou as lideranças do movimento do impeachment, incluindo o presidente da
UNE, para discutir o apoio às decisões da CPI do caso PC.
Nesse mesmo dia, na tentativa de reaver seu prestígio junto à
população, Collor falou em rede nacional de rádio e TV para convocar a
população a se manifestar no domingo seguinte, 16 de agosto, em seu apoio, indo
para as ruas vestindo verde-e-amarelo, que havia usado como marca durante sua
campanha.
Como resposta à convocação, o 16 de agosto de 1992 ficou
conhecido como “domingo negro”. As pessoas foram para as ruas conforme a
convocação do presidente, mas com roupas negras e rostos marcados de tinta
preta, simbolizando o luto e a indignação que semtiam pela corrupção no
governo.
A
ampla participação dos jovens no processo de impeachment de Collor foi
caracterizada por espontaneidade, pluralidade de pensamentos políticos e
irreverência da juventude. O tom de deboche e bom humor das manifestações podia
ser visto nos slogans usados na campanha e amplamente divulgados pela imprensa:
referências a personagens de desenhos animados, ao lado de emblemas da ex-União
Soviética, slogans críticos e irreverentes, versões de canções populares e
gritos de guerra de torcidas esportivas: “ Rosane que coisa feia. Vai com
Collor pra cadeia.” “ Fora Collor já.” “PC, PC vai pra cadeia e leva o Collor
com você”. “Ai, ai, ai, empurra ele que ele cai.” “É Fernandinho/vê se te
orienta/já sabem do teu furo/no imposto de renda” (alteração do refrão da
música Al Capone, de Raul Seixas).
Do
mesmo modo, cerca de 20 mil jovens, vestidos de negro e com os rostos pintados
de verde-e-amarelo foram para as ruas de Salvador.
No
Rio de Janeiro, foram ouvidas as vozes de milhares de jovens que manifestavam
seu repúdio à crise moral instalada no poder. Estudantes de duzentas escolas e
universidades públicas e privadas de Rio de Janeiro, Niterói e Baixada
Fluminense participaram de uma passeata que teve início na Candelária e
percorreu toda a avenida Rio Branco até a praça Mahatma Gandhi, na Cinelândia.
Acompanhando a passagem da passeata, uma chuva de papel picado caía sobre os
jovens como manifestação de apoio da população.
Também
no Rio de Janeiro a participação dos estudantes secundaristas foi fundamental
na organização da manifestação. Em reunião no pátio do Colégio São Vicente,
alunos dos colégios Santo Inácio, Zaccaria, Senador Correia e Santa Úrsula
decidiram por uma identificação de seus integrantes através do uso de tiras
pretas nos braços, feitas com saco de lixo. Além disso, foi também decidido que
os partidos não deveriam levar suas bandeiras para as ruas. Não se queria que o
movimento pela ética e pró-impeachment se confundisse com a concomitante
campanha eleitoral para a prefeitura e Câmara de Vereadores.
Para a organização do movimento, a UBES conseguiu levar seis
mil estudantes que atravessaram a baía de Guanabara, gratuitamente, em quatro
barcas. No Rio, vários grupos de estudantes organizaram um “arrastão” que desde
as sete horas percorreu os portões de vários colégios, levando milhares de
jovens para a Candelária.
No
palanque montado, além dos líderes do movimento estudantil, estiveram presentes
três candidatos à prefeitura: Sérgio Cabral Filho (PSDB), Benedita da Silva
(PT) e Técio Lins e Silva (PST); a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ); os
deputados estaduais Carlos Minc (PT) e Heloneida Studart (PT) e o vereador
Alfredo Sirkis (PV). Mas a presença dos políticos não agradou inteiramente aos
manifestantes.
Durante
o mês de agosto, ampliou-se o número de manifestações dos caras-pintadas.
Em
21 de agosto, cinco mil estudantes saíram em passeata pelas ruas de São José
dos Campos (SP); em Mato Grosso do Sul, dez mil jovens tomaram as ruas de Campo
Grande; em Cuiabá, a Universidade Federal de Mato Grosso organizou um ato
anti-Collor; trezentos manifestantes saíram às ruas de São Luís do Maranhão em
manifestação pró-emprego e pró-impeachment; em Brasília, na Câmara, foi
organizado um ato de apoio à CPI seguido de uma passeata pró-impeachment que se
estendeu até a praça dos Três Poderes; em Curitiba e Londrina foram montados
painéis que marcavam a posição dos deputados e senadores do Paraná em relação ao
processo de impeachment. As passeatas se espalharam ainda por Gramado (RS),
João Pessoa, Juiz de Fora (MG) e por outras cidades.
A
entrega do relatório da CPI estava marcada para 26 de agosto. Coube ao senador
Amir Lando (PMDB-RO) a responsabilidade pela redação das conclusões. Após a
entrega do relatório, qualquer cidadão poderia entrar, na Câmara, com pedido de
impeachment do presidente por corrupção e quebra do decoro.
Para
25 de agosto, o Movimento pela Ética na Política propôs a realização de manifestações
públicas em favor do impeachment.
De
manhã, cerca de quatrocentos mil estudantes de São Paulo, aos gritos de
“ladrão, ladrão, ladrão”, participaram de uma das maiores passeatas estudantis
da história do Brasil. A concentração teve início por volta de nove horas, em
frente ao Museu de Arte Moderna de São Paulo, na avenida Paulista. Prevista
para seguir em direção à praça da Sé, a passeata teve seu curso alterado devido
ao enorme contingente de participantes, seguindo pela avenida Brigadeiro Luís
Antônio até o vale do Anhangabaú. Terminada a manifestação por volta das 16
horas, em torno de seis mil manifestantes permaneceram para se unir às
quinhentas mil pessoas que compareceram à manifestação organizada pelo
Movimento pela Ética na Política, marcada para as 17 horas.
Em Recife, cem mil pessoas foram para as ruas, fazendo uma
manifestação que, segundo declarações da polícia, foi maior do que as
organizadas pelo movimento das Diretas Já. No centro de Belo Horizonte,
passeatas espalhadas por diferentes ruas se encontraram, formando uma multidão
que se dirigiu ao palácio da Liberdade.
Em
Maceió, terra de Paulo César Farias e Fernando Collor, uma passeata levou os
manifestantes para um comício em frente à Prefeitura.
Cerca de 80 mil pessoas ocuparam o Centro de Salvador.
Em Teresina, os manifestantes se concentraram na praça da
Liberdade, dirigindo-se em passeata até a praça Pedro II, onde aconteceu um ato
público pró-impeachment.
Em Macapá, 20 mil pessoas saíram às ruas, fazendo uma das
maiores manifestações públicas da cidade.
Em Belém, 10 mil pessoas ocuparam a praça do Relógio.
Em Florianópolis, cinco mil manifestantes se concentraram no
largo da Catedral.
Partidos da oposição, a CUT-MT e os estudantes de Cuiabá
organizaram uma concentração na praça da República.
Em Manaus, foi organizada uma carreata (passeata de carros) e
uma manifestação na praça da Matriz.
No
Rio de Janeiro, o Movimento pela Ética na Política organizou sua manifestação
um dia após a promovida pelo PDT. Essa foi a forma de se manifestar contra a
partidarização do movimento, além de ser uma crítica ao então governador Leonel
Brizola, que se mantivera em defesa do presidente e contra a CPI até 16 de
agosto.
A
passeata seguiu da Calendária até os Arcos da Lapa, onde foi montada uma
vigília pela saída de Collor da presidência.
Em Brasília, cerca de 60 mil pessoas aguardaram, em frente ao
Congresso, a votação do relatório do senador Amir Lando.
Aprovado
o relatório da CPI, por 16 votos a cinco, suas conclusões continham fortes
indícios do envolvimento do presidente em cinco delitos: corrupção passiva,
prevaricação, advocacia administrativa, formação de quadrilha, estelionato.
O relatório destacou também o “alto grau de periculosidade de
Paulo César Farias” observado em suas atividades desde a década de 1970. E,
incluía a primeira-dama, Rosane Collor, no crime de peculato, acusada de
desviar 1,1 bilhão de cruzeiros da Legião Brasileira de Assistência (LBA) para
a Associação Pró-Carente de Canapi.
Aprovado o relatório, o pedido de processo de impeachment era
uma certeza. Previsto nos artigos 85 e 86 da Constituição, estipulava a sua
apresentação com a assinatura de dois cidadãos.
O documento, redigido por 18 advogados e juristas, tomou como
base os resultados da investigação da CPI, afirmando que o presidente “pecou
por grave omissão” ao permitir que sua conta corrente fosse abastecida por
depositantes fantasmas, o que constitui “clara sonegação fiscal” e “evidente
falsidade documental”. Diante dessas condições afirmava ainda que o presidente
“perdera toda a autoridade moral para governar a nação”.
Barbosa Lima Sobrinho, presidente da ABI, e Marcelo Lavènere
Machado, presidente da OAB, assinaram o documento solicitando a abertura, no
Congresso, de processo de impeachment contra o presidente.
O documento foi entregue ao presidente da Câmara, Ibsen
Pinheiro, na terça-feira, 1º de setembro, na forma que previa a lei. Na mesma
noite, Collor fez novo pronunciamento em cadeia nacional de rádio e televisão,
afirmando que não renunciaria.
Em 14 de setembro, os caras-pintadas de Curitiba iniciaram
uma série de três grandes manifestações pró-impeachment. Na noite desse mesmo
dia, 15 mil pessoas compareceram ao espetáculo de música e luzes Chama Brasil,
para assistir aos shows do cantor Gilberto Gil e do grupo Kid Abelha.
Em 15 de setembro, 45 mil caras-pintadas fizeram a maior
concentração da cidade a favor do impeachment.
Na noite desse mesmo dia, o Movimento Pró-Brasil organizou
uma manifestação na Boca Maldita que contou com a participação de políticos
como o governador Roberto Requião, o presidente do PT, Luís Inácio Lula da
Silva, e o governador de São Paulo, Luís Antônio Fleury.
Em
Maceió, uma passeata levou às ruas cinco mil pessoas que se dirigiram à praça
Palmares para assistir a um comício pró-impeachment.
Em
15 de setembro, mais de 50 mil caras-pintadas tomaram novamente as ruas do Rio
de Janeiro em manifestação organizada pela UNE, percorrendo a avenida Rio
Branco, no Centro, de 11 às 13 horas.
Mais tarde, juntaram-se à manifestação organizada pelo Movimento
pela Ética na Política e desfilaram, sambando, da Candelária à Cinelândia. O
toque de partida dessa manifestação foi dado pelo samba-enredo da Escola de
Samba Mocidade Independente Sonhar não custa nada.
Em Brasília, no dia 16, a UNE e a UBES organizaram uma manifestação no gramado em frente ao Congresso, que reuniu estudantes dos colégios
do Plano Piloto e das cidades-satélites.
Na
quinta-feira, 17 de setembro, Collor teve que ir ao Rio de Janeiro às pressas
pois Leda Collor, sua mãe, sofrera um ataque cardíaco. Ao chegar à clínica,
enfrentou uma manifestação da oposição, que o acompanhou por todo o percurso
entre Botafogo e o palácio Laranjeiras, onde se hospedou. Os vizinhos da
residência oficial prepararam-lhe uma anti-recepção estendendo panos e
bandeiras negras no alto dos prédios, protesto continuado com um “panelaço”
(batida em panelas) noite adentro.
Em 18 de setembro, os caras-pintadas voltaram às ruas de São
Paulo. A manifestação, com a presença dos estudantes, se estendeu das nove às
21horas no vale do Anhangabaú, onde 750 mil pessoas, de diferentes gerações, se
misturaram, assistindo a uma queima de fogos com a inauguração de um painel
pelo impeachment riscado com letras de fogo.
No Rio de Janeiro, uma manifestação organizada por partidos e
centrais sindicais levou 30 mil pessoas a participarem de uma passeata que
percorreu o Centro, da Candelária até a Cinelândia.
Em 24 de setembro, o relator da comissão especial recomendou
a aceitação pela Câmara do pedido de impeachment, aprovado por 32 votos a um.
Em mais uma tentativa de evitar o afastamento do presidente,
o Planalto enviou novo mandado de segurança contra as regras do impeachment ao
Supremo Tribunal Federal (STF), que, por oito votos a um, considerou que o
presidente já havia sido suficientemente atendido 15 dias antes, quando da
concessão do aumento de prazo para sua defesa de cinco para dez sessões da
Câmara.
Pelos
mesmos oito votos a um foi aprovado que o impeachment fosse decidido pelo voto
aberto, em sessão marcada para as 14 horas de 29 de setembro. Essa sessão
histórica do Supremo, transmitida pela televisão, durou de 13:40h às 22 horas,
com o comparecimento de nove dos 11 ministros. Francisco Rezeck, ex-ministro de
Collor, e Marco Aurélio de Melo, primo do presidente, sentiram-se impedidos e
não votaram.
Em
9 de setembro, uma sessão histórica da Câmara, em transmissão direta por
televisão e rádio, aprovou a admissibilidade do impeachment. Dos 503 deputados,
448 votaram a favor, 38 contra, 23 estiveram ausentes e um absteve-se.
Por
força da abertura do processo de impeachment no Senado, em 2 de outubro, Collor
deixou a Presidência, substituído interinamente pelo vice Itamar Franco.
Só em 29 de dezembro, depois de esgotadas todas as formas
jurídicas de defesa, em sessão do Senado que o afastaria definitivamente do
poder, condenando-o à inelegibilidade e inabilitação, por oito anos, para o
exercício de cargos públicos, Collor renunciou e, quatro horas depois, Itamar
foi efetivado.
Maria
Ester Lopes Moreira
FONTES: ALENCASTRO,
L. F. Relatório; Estado de S. Paulo (27/5, 5, 8, 22/7, 17, 22,
26/8, 28 e, 30/9/92); Folha de S. Paulo (27/5, 30/6, 1, 22, 31/7, 16,
17, 22, 26/8, 6, 30/9, 31/12/92); Globo (24/6, 3, 10/7, 22, 26/8, 30/9,
31/12/92); Jornal do Brasil (18, 27/5, 24/6, 22, 26/8, 30/9, 31/12/92);
LATTMAN, F. Imprensa; Veja (13, 24/5, 17/6, 12, 19, 26/8, 2, 9,
16, 23, 30/9, 7/10/92).