TV RIO
Emissora de televisão que foi ao ar pela primeira vez no dia
15 de julho de 1955, através do canal 13, no Rio de Janeiro, então Distrito
Federal. Foi extinta a 6 de abril de 1977.
Seu surgimento deveu-se à iniciativa de membros das famílias
Batista do Amaral e Machado Carvalho, que eram sócias em empresas de
radiodifusão desde 1931, quando fundaram a Rádio São Paulo e posteriormente, na
década de 1940, a Rádio Record, a Rádio Pan Americana e o jornal O Tablóide.
A
criação da TV Rio, antes mesmo de a emissora ir ao ar, resultou no fim da
sociedade existente entre João Batista do Amaral, conhecido como Pipa, e Paulo
Machado Carvalho, então seu cunhado, nas emissoras de televisão. Com a
separação do grupo, Amaral ficou com parte das ações da TV Record e com a TV
Rio, sendo 50% das ações desta última emissora legalmente divididas entre seus
dois filhos.
A
TV Rio começou como uma emissora local, seguindo um estilo empresarial
familiar. Não obstante as dificuldades financeiras e a precariedade das
condições técnicas da época, manteve sempre programas líderes de audiência.
A programação diurna era reservada para a educação pela TV,
pois o objetivo de João Batista do Amaral era comercializar os telecursos junto
a outras emissoras de rádio e televisão, bem como junto ao governo federal e à
iniciativa privada. Este projeto da telescola foi dirigido por Alfredina de
Paiva e Sousa, tendo o governo e a iniciativa privada mantido uma rede de
telepostos conectados à emissora e às suas afiliadas. A transmissão dos
telecursos perdurou até 1964, quando a Fundação João Batista do Amaral encerrou
as suas atividades por falta de recursos financeiros.
Os programas noturnos eram feitos pelos próprios anunciantes
e pelas agências de publicidade, responsáveis pelo seu financiamento e pela sua
produção. As agências, à época, criavam, produziam, dirigiam e, inclusive,
contratavam os artistas e as chamadas garotas-propaganda.
Péricles do Amaral (substituído por João Loredo entre 1956 e
1963) e Aristides Cerqueira Leite foram os seus primeiros diretores,
respectivamente nas áreas artística e comercial.
Em
1956 Válter Clark foi contratado para ser assistente de Cerqueira Leite e
idealizou um modelo de organização empresarial e de produção que posteriormente
seria utilizado pelas demais emissoras de televisão. Clark introduziu o
conceito de grade de programação vertical e horizontal, ou seja, uma
programação padronizada e segmentada por faixas de horário, apresentando
programas com características semelhantes e dirigidos a um mesmo tipo de
público em cada faixa. Também introduziu a idéia de padronização do intervalo
comercial, estabelecendo o preço do comercial de acordo com o tempo (em
segundos) e a faixa de horário ocupada dentro da programação.
Tendo inovado, seja na linha de programação, seja na produção
e na relação com os anunciantes, a TV Rio levou ao ar programas que alcançaram
altos índices de audiência e contribuíram para a atual linguagem da televisão.
É o caso dos humorísticos O riso é o limite (líder de audiência em
1962), Praça da alegria, Chico Anísio show, Noites cariocas (que obteve
recorde de audiência entre 1961 e 1963) e os programas de auditório TV Rio
ring (com lutas de boxe), Noite de gala (que teve início em 1955
e ficou 11 anos no ar, tendo lançado Flávio Cavalcanti como apresentador na
televisão) e Discoteca do Chacrinha, entre outros.
Válter Clark também lançou o Jornal nacional,
noticiário que ia ao ar às 20 horas e que, apesar de o nome ter sido fruto de
exigências do patrocinador, foi considerado o primeiro telejornal de cunho
nacional, devido à ligação pioneira por microondas entre Rio de Janeiro e São
Paulo. O uso da ligação por microondas foi viabilizado por João Batista do
Amaral, que tinha criado a companhia Rádio Comunicações, que fez a primeira
ligação de microondas para áudio, vídeo, telefonia e teletipo.
A TV Rio foi a precursora do uso de temas políticos como
atração em programas de auditório, inicialmente no programa de Murilo Melo
Filho e, posteriormente, em Preto no branco (com Sargentelli), Pingo
nos is e Encontro com a imprensa. Os programas da emissora eram
constantemente utilizados por Carlos Lacerda, para tratar de assuntos da
política nacional e local.
No dia 16 setembro de 1955, semanas antes da eleição
presidencial da qual foi vencedor Juscelino Kubistchek, Lacerda utilizou o
programa de sexta-feira, às 22 horas, para ler um documento que ficou conhecido
como Carta Brandi. Tratava-se de uma carta datada de 5 de agosto de
1953, endereçada a João Goulart (que nessa época era ministro do Trabalho) e
atribuída ao deputado argentino Antônio Jesus Brandi. Esta carta fazia alusões
a supostas articulações de Goulart, candidato à vice-presidência de Juscelino,
com o governo peronista, para a deflagração de um movimento armado com vistas a
implantar uma república sindicalista no Brasil. Posteriormente, através de
inquérito, ficou comprovado que se tratava de um documento forjado e vendido
aos opositores de Goulart.
No dia em que Lacerda fez a denúncia, os leitores do jornal A
Tribuna da Imprensa haviam sido convidados através de uma chamada na
primeira página, a assistirem ao programa na TV Rio.
Nos programas que se seguiram, Lacerda continuou a atacar
Juscelino Kubitschek e, depois que este foi eleito, passou a liderar uma
campanha tentando evitar que ele tomasse posse juntamente com o vice-presidente
eleito, João Goulart. Este processo desembocou na crise de 11 de novembro de
1955, na qual Lacerda viu frustrada a sua tentativa de golpe para impedir a
posse de Juscelino.
Em 1957, o programa Noite de gala foi censurado porque
Hélio Fernandes, um de seus apresentadores, freqüentemente criticava a política
do presidente Juscelino Kubitschek. As pressões exercidas sobre a emissora, com
o objetivo de que fosse alterado o conteúdo do programa, fizeram com que o
produtor Abraão Medina, partidário de Carlos Lacerda, em 1958 levasse o Noite
de gala para a TV Tupi. Um ano depois, o programa voltou à TV Rio.
Em 1960, a TV Rio introduziu o aproveitamento dos recursos do
vídeotape na televisão brasileira, no programa Chico Anísio show.
No mesmo ano, no período de campanha eleitoral para a
presidência da República, Lacerda voltou a fazer intenso uso da programação da
emissora para lançar e consolidar a candidatura de Jânio Quadros.
No início da década de 1960, a TV Rio começava a conviver com certo declínio financeiro e de público, o que resultou no
reordenamento de sua programação e em investimentos na linha de telenovelas.
Mas as mudanças foram insuficientes para manter em atividade o quadro de
profissionais que possuía, pois os salários que oferecia já não eram
condizentes com o emergente mercado televisivo. Além disso, seus proprietários
tinham deixado de investir na manutenção e na modernização dos equipamentos.
Em
1961, com a renúncia de Jânio Quadros, em 25 de agosto, novamente Lacerda
usaria a emissora para tentar impedir que o vice-presidente João Goulart, que
se encontrava em viagem ao exterior, assumisse a presidência.
Em janeiro de 1962, Leonel Brizola utilizou um dos programas
da emissora para fazer um pronunciamento contra uma tentativa de invasão de
Cuba patrocinada pelos Estados Unidos. No mesmo ano a emissora vendeu espaços
em sua programação para candidatos a cargos políticos, dentre os quais se
destacava o próprio Brizola, assim como para entidades que tinham envolvimento
político.
Em 1963, devido ao agravamento da crise financeira da TV Rio,
a Excelsior contratou parte significativa dos seus principais artistas e
técnicos, o que resultou no cancelamento de diversos programas.
Em 1º de abril de 1964 a TV Rio exibiu a adesão do forte de Copacabana ao movimento militar que depôs João Goulart da presidência da
República, e transmitiu uma mensagem telefônica do então governador Carlos
Lacerda que, no dia 31 de março, havia se entrincheirado no palácio Guanabara
com o objetivo de se defender de supostos ataques de partidários de Goulart.
Em
agosto de 1964, pressionada por Carlos Lacerda através da Secretaria de
Segurança Pública, a TV Rio demitiu o jornalista e escritor Carlos Heitor Cony,
que escrevia a novela Comédia carioca, sob a acusação de que ele era
simpatizante do comunismo, devido aos artigos que havia escrito contra o regime
militar quando trabalhava no jornal Correio da Manhã. Cony escreveu
cerca de 30 capítulos da novela e foi substituído por Oduvaldo Viana.
Ainda em 1964, a novela de maior sucesso da época, O
direito de nascer, teve seu horário de transmissão alterado porque a trama
não era do agrado do Departamento Estadual de Censura, pois as personagens
principais eram uma mãe solteira (Helena) e uma mulher negra (mamãe Dolores). A
novela alcançou 73 pontos de audiência, tendo sido encerrada no Maracanãzinho,
em agosto de 1965, com festas e sob o aplauso do público. Na mesma época, outra
novela que sofreu com a censura foi A morta sem espelho, de Nélson
Rodrigues, a primeira novela diária da televisão carioca, que teve que ser
cancelada devido às restrições do Juizado de Menores ao seu horário de
transmissão.
Em 1965, a recém-inaugurada TV Globo absorveu muitos artistas
e técnicos da TV Rio. Do quadro de diretores foram contratados inicialmente
José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, que estava na emissora desde 1963
e, posteriormente, Válter Clark, que levou consigo diversos profissionais.
Com o declínio da TV Record, que formava junto com a TV Rio a
Rede de Emissoras Independentes, a crise financeira e administrativa aumentou
significativamente. Apesar de constituírem uma rede de emissoras com filiais em Belo Horizonte, Brasília, Guaratinguetá, Conselheiro Lafaiete, Juiz de Fora e Nova Friburgo, os
proprietários da emissora não conseguiram mantê-la em funcionamento.
No
final da década de 1960, a família Batista do Amaral vendeu a empresa para a
família Machado Carvalho (seus sócios na TV Record e em outras empresas de
radiodifusão) e Murilo Leite. Estes renegociaram a emissora com a Televisão
Difusora de Porto Alegre, pertencente aos padres capuchinhos, que a revenderam
para o grupo Scorzelli e o Banco Halles. O banco foi posteriormente liquidado
pelo governo e deixou dívidas para Roberto Scorzelli, dono da agência Artplan.
O grupo Scorzelli negociou a emissora com o grupo Vitória-Minas, que também foi
liquidado por problemas com negócios imobiliários e bancários.
Essas transações foram efetuadas sem a autorização do
governo, o que levou o Sindicato dos Trabalhadores em Radiodifusão a mover uma
ação judicial contra as transferências ilegais de responsabilidade entre os
diversos proprietários. Em 1975, devido a essas ações, o Ministério das
Comunicações exigiu que a TV Difusora de Porto Alegre reassumisse a empresa. As
ações foram, então, divididas entre Augusto Amaral de Carvalho, José Salimeri,
Valmor Bergesch, frei Cirilo Mattiello, frei Antônio Guizzardi, frei Osébio
Borghetti e frei José Pagno.
Contudo, a intervenção não impediu a falência da TV Rio. As
dívidas com fornecedores e funcionários superavam o lucro obtido com programas
e publicidade. Quando a emissora estava para ser fechada, a sua programação era
constituída em cerca de 80% de programas ao vivo, dada a falta de técnicos e de
equipamentos adequados. Exibindo basicamente forrós, sambas e serestas, em
programas que sorteavam produtos como colchões e cobertores, a emissora atingia
somente um público de baixo poder aquisitivo.
No início de 1976, a TV Rio ficou fora do ar por quase uma
semana devido a uma ação judicial movida pela RCA contra a falta de pagamento
de equipamentos. Em fevereiro de 1977 novamente ficou fora do ar por 30 dias,
ocasião em que seus diretores solicitaram ao Dentel uma prorrogação de mais 15
dias para o restabelecimento da programação, prazo este que foi insuficiente.
No dia 6 de abril de 1977, a TV Rio teve cassada a concessão de seu canal e seus transmissores foram definitivamente lacrados pelo Dentel. Os
arquivos e centros de documentação ficaram de posse dos padres capuchinhos da
Televisão Difusora de Porto Alegre.
Heloísa
Silva Dias
FONTES: CLARK, W.
Campeão; COL. NOSSO SÉCULO (1980); COSTA, A. TV Rio; INF.
Carlos Heitor Cony; Jornal do Brasil (1/5/76, 7/4/77); LACERDA, C.
Depoimentos; ORTIZ, R. Moderna tradição; Tribuna da
Imprensa (16 e 17/9/55).