ALBERTO,
Álvaro
*militar; pres. CNPq 1951-1955.
Álvaro Alberto da Mota e Silva nasceu no Rio de Janeiro, então capital do Império, em 22 de
abril de 1889, filho do professor Álvaro Alberto da Silva e de Maria Teixeira da Mota e Silva. Sua irmã, Armanda Álvaro Alberto, educadora, foi responsável
pela introdução de novos métodos de ensino no país e, em 1935, exerceu a
presidência da União Feminina do Brasil, movimento filiado à Aliança Nacional
Libertadora (ANL).
Álvaro Alberto recebeu a educação primária e secundária na
casa de seus pais. No período de 1906 a 1910, cursou a Escola Naval,
tornando-se guarda-marinha em 1909. Ingressou em seguida na Escola Politécnica
do Rio de Janeiro, onde se diplomou engenheiro, completando posteriormente seus
estudos na École Centrale Technique, em Bruxelas.
Promovido a segundo-tenente em janeiro de 1910, tomou parte,
em novembro desse ano, na repressão à Revolta da Chibata, liderada pelo
marinheiro João Cândido em protesto contra a utilização de castigos corporais
nos navios da Armada e reivindicando melhoria de vencimentos para a marujada.
Depois de receber a patente de primeiro-tenente em março de 1914, Álvaro
Alberto permaneceu junto à Esquadra por mais dois anos, tendo servido no
navio-escola Benjamim Constant, na Escola Modelo de
Aprendizes-Marinheiros, situada no Rio Grande do Norte, nos encouraçados Deodoro,
Floriano e Minas Gerais, no cruzador Rio Grande do Sul e no
destróier Alagoas.
Em 1916 foi indicado para integrar o corpo docente da Escola
Naval, tornando-se instrutor e depois catedrático do Departamento Físico-Químico
desse estabelecimento, lecionando pólvora e explosivos, química e noções de
metalurgia. Em 1919, enviado para servir em Angra dos Reis (RJ), começou a
colaborar com os trabalhos pedagógicos iniciados por sua irmã nessa localidade,
que resultaram na criação, em 1921, da Escola Proletária de Meriti — depois
denominada Escola Regional de Meriti. Situada em território de Nova Iguaçu (RJ)
que hoje pertence ao município de Duque de Caxias, a escola utilizava métodos
modernos de ensino e era voltada para atender à população pobre.
Álvaro Alberto foi presidente da Sociedade Brasileira de
Química de 1920 a 1928. Nesse período, integrou a delegação que representou o
Brasil nas comemorações do centenário da Independência do México em agosto de
1921, sendo promovido a capitão-tenente três meses depois. De 1924 a 1936, foi delegado brasileiro na Union Internationale de Chimie Pure et Appliquée, com sede em Paris. Promovido a capitão-de-corveta em 5 de julho de 1932, lecionou na Escola Técnica do
Exército entre 1935 e 1937, período em que ganhou a patente de
capitão-de-fragata. Durante a Segunda Guerra Mundial, desenvolveu um método
para a fabricação dos estabilizantes químicos contralite e acordite, até então
dominada exclusivamente pelos alemães.
Álvaro Alberto e a política nuclear brasileira
Estudioso das questões relativas à utilização da energia
nuclear e de suas implicações sobre as relações internacionais, depois da
Segunda Guerra Mundial, Álvaro Alberto formulou sua tese das “compensações
específicas”, defendendo que os países possuidores de matérias-primas nucleares
não deveriam negociá-las apenas em troca de compensações financeiras, devendo
exigir o fornecimento de reatores e outras instalações atômicas, além do acesso
à tecnologia necessária à sua fabricação e manejo.
Representante brasileiro na Comissão de Energia Atômica da
Organização das Nações Unidas (ONU), seu nome foi indicado por unanimidade para
a presidência desse organismo no biênio 1946-1947. No ano seguinte, de volta ao
Brasil, recebeu do Congresso Nacional o posto honorário de contra-almirante e
assumiu a chefia da comissão incumbida pelo presidente da República, Eurico
Gaspar Dutra, de elaborar um anteprojeto para a criação do Conselho Nacional de
Pesquisas (CNPq), incorporando a produção científica à área de controle do
Estado. Apresentado como um “estado-maior da ciência, da técnica e da
indústria”, “capaz de traçar rumos seguros aos trabalhos de pesquisas
científicas e tecnológicas no país, desenvolvendo-os e coordenando-os de modo
sistemático”, o CNPq teve sua formação aprovada pelo Parlamento e sancionada em
1951 pelo presidente Getúlio Vargas. Sua criação esteve desde o início
explicitamente relacionada com o desenvolvimento de pesquisas na área da
energia nuclear, considerada “imperativo da segurança nacional” e sujeita ao
monopólio estatal. Por outro lado, a tese das “compensações específicas” foi
aceita oficialmente pelo governo brasileiro e passou a orientar toda a política
de exportações de minérios atômicos do país.
Nomeado para presidir o novo órgão diretamente subordinado à
Presidência da República, Álvaro Alberto desenvolveu uma ativa campanha de
defesa da nacionalização de todas as minas de tório e urânio, minerais
radioativos de uso mais freqüente na produção de energia nuclear. Esse conjunto
de orientações, definido em pleno curso da guerra fria, contrariava
frontalmente a política norte-americana de concentração dos recursos estratégicos
do bloco ocidental nos Estados Unidos. Esse país, alertado pela explosão da
primeira bomba atômica da União Soviética em 1949 e a eclosão da guerra da
Coréia em junho de 1950, endureceu suas posições, declarando Álvaro Alberto persona
non grata e apelando para que a Organização dos Estados Americanos
intercedesse junto ao Brasil.
Essas pressões obtiveram resultados, com a criação, em
fevereiro de 1952, da Comissão de Exportação de Materiais Estratégicos (CEME)
que, vinculada ao Ministério das Relações Exteriores, absorveu as atribuições
do CNPq em relação à venda de urânio, tório e seus compostos, contornando assim
o bloqueio desse órgão a operações deste tipo sem que ocorressem “compensações
específicas”. Com efeito, essa transferência de responsabilidades — realizada
durante uma viagem de Álvaro Alberto aos Estados Unidos, interinamente
substituído pelo coronel Armando Dubois Ferreira — criou as condições para a
assinatura de um acordo de exportação de minerais atômicos sem que fossem
observadas as exigências defendidas pelo titular do CNPq, sob a alegação de que
aqueles materiais eram imprescindíveis para o esforço de guerra desenvolvido
pelos Estados Unidos na Coréia. Mais tarde, comentou-se ter sido essa a solução
conciliatória encontrada para evitar o envio de tropas brasileiras ao teatro da
guerra, solicitado pelos norte-americanos.
O Conselho de Segurança Nacional só tomou conhecimento desse
acordo sete meses depois de sua assinatura, que implicava o fornecimento pelo
Brasil, no período de três anos, de um total de 7.500 toneladas de monazita,
além de igual quantidade de minerais conhecidos como terras-raras,
especialmente sais de cério. Pouco depois do início das exportações oficiais,
noticiou-se a existência de contrabando de grande quantidade de areias
monazíticas de Guarapari (ES), o que levou à aprovação de medidas
disciplinadoras pelo governo federal em 3 de julho de 1952.
Em 12 de outubro desse ano, o CNPq definiu seu ponto de vista
sobre combustíveis nucleares, escolhendo o urânio enriquecido como
matéria-prima fundamental dos reatores atômicos a serem implantados no Brasil
para fins de pesquisa e produção de energia. Em novembro de 1953, o presidente
Vargas aprovou a política de implantação da indústria nuclear no país. Diante
das dificuldades existentes para o estabelecimento de uma colaboração nesse
campo com os Estados Unidos, que não aceitavam as medidas nacionalistas
adotadas pela Comissão de Energia Atômica do Brasil, o governo buscou
diversificar seus contatos no exterior.
Álvaro Alberto realizou entendimentos secretos com cientistas
alemães, que resultaram na compra de três ultracentrifugadores destinados à
produção de urânio enriquecido e na formação de uma comissão de cientistas e
industriais desse país para estudar a hipótese de desenvolver no Brasil a
fabricação desses aparelhos. Em gestão reservada junto ao presidente Vargas,
Álvaro Alberto chegou a levantar 80 mil dólares para financiar esse projeto. Na
mesma época, outra missão do CNPq, chefiada pelo químico Alexandre Girotto,
conseguiu obter na França tecnologia e financiamento para a extração de urânio
na região de Poços de Caldas (MG).
Nessa ocasião, as relações com os Estados Unidos no terreno
de energia nuclear tornaram-se mais tensas porque, depois de receber as 7.500
toneladas de monazita no primeiro ano de vigência do acordo celebrado em 1952,
esse país desinteressou-se pela aquisição das terras-raras, desdobramento
previsto para os dois anos seguintes. Álvaro Alberto protestou, invocando a
“responsabilidade moral da outra parte signatária”, e os dois governos
reabriram o processo de negociações que resultou, por proposta do Departamento
de Estado norte-americano, na troca de mais cinco mil toneladas de monazita e
igual quantidade de sulfato sódico e terras-raras brasileiras, a serem
entregues em dois anos, por cem mil toneladas de trigo norte-americano,
embarcadas imediatamente. A assinatura desse novo acordo foi feita no dia 20 de
agosto de 1954, durante a grave crise política que levaria, dias depois, ao
suicídio do presidente Getúlio Vargas.
O CNPq só tomou conhecimento da operação contratada no dia 3
de setembro — depois da posse de Café Filho na presidência da República — e,
protestando violentamente contra ela, propôs sua revogação, ao mesmo tempo que
o governo norte-americano anunciava novamente que não se interessava pela
aquisição das terras-raras. Diante dos protestos brasileiros, o Departamento de
Estado fez nova proposta, que incluía a venda de quinhentas mil toneladas de
trigo norte-americano. Entretanto, o produto chegou deteriorado ao Brasil, o
que provocou enorme indignação no Congresso e na imprensa do país.
Em fins de 1954, Álvaro Alberto pediu autorização ao governo
brasileiro para importar os três ultracentrifugadores recém-concluídos,
encomendados à Alemanha de maneira sigilosa. O Itamarati foi encarregado de
coordenar a operação de transporte, mas o vazamento do segredo provocou a
mobilização, em menos de 12 horas, de forças militares norte-americanas
estacionadas na Alemanha, que impediram o embarque dos aparelhos. Eles ficaram
retidos até o fim da ocupação desse país pelas forças anglo-franco-americanas,
em 1956.
Em 2 de março de 1955, em pleno curso desses acontecimentos,
que tiveram enorme repercussão no Brasil, Álvaro Alberto foi promovido a
vice-almirante. No intenso debate parlamentar estabelecido em torno desses
fatos, surgiram denúncias sobre a interferência estrangeira nos negócios
internos do Brasil e as pressões para a assinatura de acordos contrários aos
interesses nacionais, além de acusações de que funcionários do Estado teriam
sido subornados. No auge dessas discussões, Álvaro Alberto demitiu-se da
presidência do CNPq.
Os ultracentrifugadores, depois de passarem longo tempo
encaixotados, foram levados para o Instituto de Pesquisas Tecnológicas, em São Paulo, onde chegaram a produzir urânio puro. Depois, ficaram abandonados e foram
emparedados em reforma ocorrida nas instalações desse centro. O projeto de
construção de usinas em Poços de Caldas também foi abandonado.
Inventor dos explosivos rupturita e alexandrinita e das
tintas antivegetativas polivalentes, Álvaro Alberto introduziu no Brasil a
análise dimensional e foi presidente da Academia Brasileira de Ciências.
Faleceu no Rio de Janeiro, no dia 31 de janeiro de 1976.
Era casado com Teresa Otero Álvaro Alberto.
Publicou Racionalização das equações a “n” radicais
quadrados sem termos racionais. (1916), O problema das palavras e sua
solução atual (1939, 2v.), A contribuição dos jesuítas para
as ciências físicas (1940), À margem da ciência (1960-1972,
4v.), Ciência e tecnologia (1962) e Notas e comunicações (1962).
A seu respeito, foi publicado no ano 2000 o ensaio biográfico
Álvaro Alberto, de Elias dos Santos Bigio.
FONTES: COUTINHO,
A. Brasil; Grande encic. Delta; HIRSCHOWICZ, E. Contemporâneos;
Jornal do Brasil (15/12/75, 1/2/76); VELHO SOBRINHO, J. Dicionário.