MEDEIROS,
Borges de
*const. 1891; dep. fed. RS
1891-1892; gov. RS 1898-1908, 1913-1915 e 1916-1928; rev. 1930; rev. 1932; dep.
fed. RS
1935-1937.
Antônio Augusto Borges de Medeiros nasceu em Caçapava do Sul (RS) no dia 19 de novembro de
1863, filho do desembargador Augusto César de Medeiros e de Miquelina de Lima
Borges de Medeiros.
Seu pai era originário de Pernambuco, de onde saíra em 1859
por motivos profissionais. Na década de 1860, foi transferido para Pouso Alegre
(MG), onde Borges de Medeiros iniciou o curso primário, concluído em Cachoeira
do Sul (RS), sempre em companhia da família. Entre 1878 e 1880, fez os estudos
secundários no Colégio Sousa Lobo, em Porto Alegre, tornando-se colega de
Fernando Setembrino de Carvalho (ministro da Guerra do governo Artur Bernardes,
entre 1922 e 1926) e de Germano Hasslocher (deputado federal pelo Rio Grande do
Sul de 1900 a 1911).
Viajando
em seguida para São Paulo, Borges de Medeiros ingressou na Faculdade de Direito
dessa cidade, um dos principais centros de propaganda republicana do país.
Atraído por essa pregação e pelos ideais positivistas de Augusto Comte, logo se
filiou ao Clube Republicano Acadêmico de São Paulo, participando de vários
debates. Em setembro de 1882, ajudou a fundar em Porto Alegre o Centro
Rio-Grandense 20 de Setembro, adepto das idéias republicanas e dos princípios
defendidos por Bento Gonçalves durante a Revolução Farroupilha (1835-1845). Em
1883, junto com Alberto Torres, Germano Hasslocher e outros, tornou-se redator
da revista A República, ligada ao Clube Republicano Acadêmico, e em fins do ano
seguinte transferiu-se para a Faculdade de Direito de Recife, pela qual se
bacharelou em 1885 em ciências jurídicas e sociais.
Formado, Borges de Medeiros retornou a Cachoeira do Sul, onde
abriu banca de advogado. Desde o início, procurou conciliar sua atividade
profissional, nos municípios da região, com a divulgação da propaganda
republicana, a participação em conferências, a organização de clubes e a
arregimentação de adeptos para essa causa. Assim, em pouco tempo, passou a
chefiar a seção do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR) em sua cidade,
função que exerceria até 1892.
Em
1888, participou do congresso do PRR realizado em Santa Maria (RS), ocasião em
que não ficou definida qualquer tática para a implantação da República. Esse
passo só foi dado no ano seguinte, quando o novo encontro se realizou na
fazenda da Reserva, pertencente a Júlio de Castilhos, importante líder do
partido.
Borges de Medeiros casou-se com sua prima, Carlinda Gonçalves
Borges, em janeiro de 1889. A partir de junho seguinte, a ação anti-monárquica
ganhou novo impulso em virtude da posse do gabinete do visconde de Ouro Preto,
ligado ao Partido Liberal, e da nomeação de seu correligionário Gaspar da
Silveira Martins para o governo provincial gaúcho. Afastados há muito tempo do
poder no Rio Grande do Sul e temerosos ante a expansão do republicanismo, os
liberais procuraram exercer o controle absoluto do governo, afastando toda a
oposição, inclusive o Partido Conservador. Com isso, o PRR recebeu a adesão de
um grande número de conservadores, justamente no momento em que Júlio de
Castilhos, Joaquim Francisco de Assis Brasil, Borges de Medeiros e Ramiro
Barcelos, entre outros, se dedicavam intensamente à propaganda antimonárquica
nas regiões da campanha gaúcha e da fronteira. Essa pregação foi muito
bem-sucedida, fazendo com que os republicanos obtivessem a segunda maior
votação do estado nas eleições parlamentares realizadas em 31 de agosto,
suplantando o Partido Conservador. Mesmo assim, os republicanos gaúchos não
chegaram a ter qualquer participação direta na proclamação da República, em 15
de novembro de 1889. Três dias depois, Borges de Medeiros foi nomeado delegado
de polícia de Cachoeira do Sul.
Na Constituinte de 1891
Ao assumir o Governo Provisório da República, o marechal
Deodoro da Fonseca marcou eleições para a Assembléia Nacional Constituinte para
o dia 15 de setembro de 1890. Em meados de julho desse ano, Júlio de Castilhos
incluiu o nome de Borges de Medeiros nas chapas de candidatos a deputado
federal e senador pelo Rio Grande do Sul, que seriam submetidas à apreciação
das executivas municipais. Seu nome foi confirmado e, no pleito de setembro,
Borges de Medeiros foi eleito deputado à Constituinte.
O grupo de representantes do Rio Grande do Sul viajou em fins
de outubro para o Rio de Janeiro, então Distrito Federal, para participar das
reuniões preparatórias destinadas ao exame dos documentos eleitorais e à
diplomação dos eleitos. No dia 9 de novembro, o plenário da Constituinte,
reunido em sessão preparatória, aprovou parecer favorável ao reconhecimento dos
16 deputados gaúchos, liderados por Júlio de Castilhos.
Durante
os trabalhos, a bancada gaúcha teve destacada participação no combate ao
convênio tarifário com os Estados Unidos, que eliminava ou reduzia em 25% as
taxas de importação sobre diversos artigos industriais e agrícolas provenientes
desse país em troca da isenção para o café, o açúcar bruto e o couro cru
brasileiros. A bancada gaúcha concentrou sua argumentação nos prejuízos que
esse convênio acarretava para a economia do seu estado e para a incipiente
indústria nacional, mas suas moções, apresentadas em fevereiro de 1891, foram
derrotadas por manobras protelatórias que impediram a votação dentro do prazo
legal.
A Constituição foi promulgada em 24 de fevereiro de 1891 e no
dia seguinte o marechal Deodoro foi eleito presidente da República. Nessa
ocasião, verificaram-se os primeiros sintomas de ruptura na liderança exercida
por Castilhos sobre a bancada gaúcha, pois um grupo de quatro deputados,
liderado por Joaquim Francisco de Assis Brasil, votou em Prudente de Morais.
Borges de Medeiros se manteve fiel à orientação castilhista, votando em Deodoro.
No início de março, os deputados gaúchos retornaram a seu
estado, onde permaneceram pouco tempo, pois os mandatos de todos os
constituintes eram válidos também para a legislatura ordinária que seria
iniciada em 15 de junho de 1891. Nos meses seguintes, a relação entre os
poderes Legislativo e Executivo foi tensa, culminando no fechamento do
Congresso, decretado no início de novembro pelo marechal Deodoro com o apoio de
Henrique Pereira de Lucena, o barão de Lucena, ministro da Fazenda e principal
personalidade do governo. Ambos pretendiam assim garantir o veto presidencial
ao projeto, aprovado pouco antes pelo Legislativo, que limitava os poderes do
Executivo. A notícia do golpe provocou forte reação entre os gaúchos, mas Júlio
de Castilhos, já então presidente eleito do Rio Grande do Sul, evitou no
primeiro momento qualquer pronunciamento definitivo sobre o episódio,
posicionando-se em seguida a favor do presidente da República.
Na capital federal, Borges de Medeiros foi um dos signatários
do manifesto à nação encabeçado por Prudente de Morais, acusando as medidas
adotadas por Deodoro de inconstitucionais. Retornou depois ao Rio Grande do
Sul, onde uma dissidência republicana articulava junto com os federalistas um
movimento rebelde contra o governo estadual. Na seqüência dos acontecimentos,
Castilhos foi obrigado a renunciar e, uma semana depois, Deodoro foi
substituído pelo vice-presidente Floriano Peixoto, que decretou a reabertura do
Congresso. Borges de Medeiros retornou então ao Rio de Janeiro para reassumir
seu lugar, enquanto em Porto Alegre o poder passava para uma junta governativa
composta por Assis Brasil, João de Barros Cassal e o general Domingos Barreto
Leite. Cinco dias depois, os dois primeiros renunciaram em favor deste último,
que passou a governar sozinho.
De volta ao Rio Grande do Sul
O general Barreto Leite foi substituído na presidência do
estado por José Antônio Correia da Câmara, visconde de Pelotas, o qual por sua
vez foi derrubado em junho de 1892 por um movimento articulado por Júlio de
Castilhos, que entregou o poder a Vitorino Monteiro. No dia 31 de dezembro,
Borges de Medeiros foi nomeado desembargador do recém-criado Superior Tribunal
do Estado do Rio Grande do Sul, transferindo-se então para Porto Alegre.
Castilhos foi novamente eleito presidente do estado em janeiro de 1893 com o
apoio de Floriano Peixoto, mas o novo governo teve que enfrentar logo depois a
Revolução Federalista, que começou no Rio Grande do Sul e chegou a conflagrar
também Santa Catarina e Paraná durante mais de dois anos e meio, envolvendo
ainda remanescentes da Revolta da Armada (1893-1894).
Borges de Medeiros interrompeu o exercício das suas funções
no tribunal em maio de 1893 e viajou para Cachoeira do Sul, a fim de ajudar na
organização de uma brigada civil, comandada pelo coronel Joaquim Tomás dos
Santos Filho. Borges participou dos combates até a dissolução dessa brigada em
6 de julho de 1894 e recebeu de Floriano Peixoto, em outubro seguinte, a
patente de tenente-coronel do Exército. De volta ao tribunal ainda durante o
conflito, exerceu as funções de desembargador até fevereiro de 1895, quando foi
nomeado chefe de polícia do estado, passando a auxiliar Júlio de Castilhos na
elaboração de leis ordinárias e na redação do anteprojeto do Código de Processo
Penal. A revolução terminou em agosto de 1895 com a vitória dos republicanos.
A sucessão de Castilhos
Júlio de Castilhos deu início às articulações dentro do PRR
para a escolha do seu sucessor em 1897, quando se aproximava o fim do seu
mandato. Durante a fase de profunda instabilidade havida na política estadual,
muitos líderes da campanha republicana no Rio Grande do Sul haviam abandonado o
partido ou se afastado da política, mas Castilhos ainda contava com o apoio dos
políticos mais expressivos, como o senador José Gomes Pinheiro Machado e Ramiro
Barcelos. Sua escolha, no entanto, recaiu sobre Borges de Medeiros, o mais
jovem dos republicanos tradicionais.
Segundo Sérgio da Costa Franco, os adversários de Castilhos e
de Borges afirmavam que a escolha “decorrera da circunstância de ser o último
mais acessível e mais dócil à continuidade da liderança do ‘patriarca’” . Além
dessa versão, o autor aponta também a afinidade ideológica existente entre os
dois líderes gaúchos — ambos de formação positivista — como um fator importante
nessa definição. Candidato único ao pleito de 25 de novembro de 1897, Borges de
Medeiros foi eleito e tomou posse em janeiro de 1898. Poucos dias antes da
sucessão, Castilhos enviou carta ao coronel João Francisco Pereira de Sousa
demonstrando a certeza de que sua liderança no PRR não seria afetada com a
posse do novo governo, o que veio a ser confirmado. O antigo presidente
continuou como principal chefe político do estado e manteve relativo controle
sobre a administração até falecer em 1903.
Primeira experiência de governo
Ao assumir a presidência do Rio Grande do Sul, Borges de
Medeiros encontrou a administração e a economia estaduais desorganizadas pelas
revoluções e golpes havidos desde a proclamação da República. Júlio de
Castilhos construíra uma nova estrutura política no estado, cabendo ao novo
governo consolidá-la. Segundo Joseph Love, Borges procurou atingir esse
objetivo através do fortalecimento do federalismo e da utilização da ortodoxia
financeira, e, segundo Hélgio Trindade, utilizou nesse processo um grande
“senso de equilíbrio político” acoplado a um rígido controle da máquina
partidária. Sua atuação garantiu um longo período de estabilidade no Rio Grande
do Sul, que só seria rompido em 1923.
Borges
de Medeiros teve que enfrentar desde logo as repercussões da crise econômica e
financeira do país, agravada durante o mandato presidencial de Prudente de
Morais (1894-1898). Para isso, aperfeiçoou a estrutura administrativa e
financeira do estado, fixando também os princípios básicos que orientaram a
política tributária gaúcha durante toda a República Velha. O sistema de
impostos e taxas então adotado facilitou a exportação de produtos locais e
criou as bases de uma arrecadação considerada por João Neves da Fontoura
“racional e elevada”. Tudo isso contribuiu para que, já em 1901, se verificasse
um significativo crescimento da legitimidade institucional do regime, cuja
origem se encontrava no sólido apoio dado a Borges pela Câmara estadual, onde
os deputados republicanos se mostravam profundamente articulados às suas bases
locais.
Pela
Constituição de 1891, cabia ao governo da União fixar os impostos sobre a
importação, e aos estados, sobre a exportação. Esse sistema beneficiava os
estados cuja economia estivesse baseada em produtos voltados para o mercado
internacional, mas a produção gaúcha ficava onerada em demasia, dificultando a
sua comercialização no exterior. Com base no princípio defendido por Augusto
Comte, da superioridade dos impostos diretos sobre os indiretos, Borges
instituiu em 25 de novembro de 1902 o imposto territorial, até então existente
apenas em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. Pretendia obter assim uma receita
capaz de compensar a redução progressiva e a posterior supressão das taxas que incidiam
sobre os produtos de exportação. O novo imposto foi majorado com alguma
freqüência no período seguinte, de maneira a compensar também a diminuição das
taxas de transmissão de propriedades.
Borges de Medeiros procurou sempre, ao longo de seu governo,
aplicar o princípio positivista que defendia a conciliação entre uma política
de equilíbrio orçamentário com o estímulo ao crescimento de todos os ramos da
economia. Nesse sentido, evitou conceder privilégios a qualquer setor,
concentrando os investimentos públicos em áreas que beneficiassem todas as
atividades produtivas do estado, como os transportes, cujo desenvolvimento foi
uma das metas básicas de sua administração. Borges teve que enfrentar o
problema da estrada de ferro Porto Alegre-Novo Hamburgo, de pequeno percurso
mas de grande importância para a economia estadual. Segundo o contrato de
construção assinado durante o Império, a companhia inglesa responsável pela
obra teria sua concessão assegurada até 1960 e deveria receber do governo
gaúcho juros anuais à taxa de 7%. Júlio de Castilhos fracassara na tentativa de
obter novo acordo com a concessionária e, diante do impasse, Borges de Medeiros
solicitou a intervenção do governo federal nas negociações, o que só viria a
ocorrer muito mais tarde.
Ainda
nesse seu primeiro mandato à frente do governo gaúcho, Borges cuidou também de
implantar o plano de migração e colonização esboçado por Castilhos para atrair
e fixar elementos considerados assimiláveis, incorporando-os às atividades
normais da região. No setor de instrução superior, sua primeira administração
foi responsável pela criação da Faculdade de Medicina em 1898 e, em seguida, da
Faculdade Livre de Direito. Implantou também os códigos de Processo Penal e de
Processo Civil e Comercial, obedecendo assim ao que ficara definido pela
Constituição de 1891.
A primeira reeleição
Em outubro de 1902, Júlio de Castilhos, na condição de
presidente do PRR, lançou longo manifesto elogiando a atuação de Borges de
Medeiros na chefia do governo estadual. Depois de se referir à “continuidade de
vistas e de ação” existente entre ambos, recomendou sua reeleição. Em novembro
seguinte, Borges foi novamente eleito sem enfrentar qualquer adversário, pois
os federalistas se recusaram a participar do que consideravam uma fraude
eleitoral e os dissidentes do PRR ainda estavam fracos e desorganizados. O
candidato único recebeu o voto de mais de 314 do eleitorado gaúcho,
ultrapassando assim o mínimo exigido pela Constituição castilhista. Iniciou seu
novo mandato em janeiro de 1903, sendo obrigado a afastar-se definitivamente do
Superior Tribunal do Estado.
Júlio de Castilhos morreu em outubro de 1903. No manifesto do
ano anterior, havia indicado Borges como seu sucessor na presidência do PRR,
mas nem todos os líderes republicanos estavam de acordo com essa indicação,
muito embora não chegassem a vetá-la explicitamente. No máximo, alguns
defendiam a volta à direção colegiada. Mesmo assim, Borges não chegou a ter
competidores ostensivos em sua indicação como sucessor de Castilhos na liderança
do PRR, já que a própria existência de vários pretendentes em potencial acabou
por levá-los a se excluírem uns aos outros. O acordo feito com o senador
Pinheiro Machado também foi decisivo para esse desfecho, pois estabeleceu duas
esferas de atuação política: ficou sob a responsabilidade do senador a
orientação dos assuntos do estado no âmbito federal, cabendo a Borges cuidar
das questões de governo e do partido no nível estadual. Esse acordo, que
resguardava o grau de autonomia dos estados existente durante toda a República
Velha, expressava em termos gaúchos a chamada “política dos governadores”,
instituída pelo presidente Manuel de Campos Sales (1898-1902).
Assumindo
a direção suprema do PRR, Borges de Medeiros encontrou problemas crescentes e potencialmente
capazes de produzir, no futuro, riscos à estabilidade política do estado. O
mais importante deles era a desagregação do partido, mas sua gravidade era
parcialmente atenuada pela debilidade das oposições gaúchas, cuja rigidez de
princípios e de atuação vinha impossibilitando qualquer tipo de absorção dos
elementos dissidentes do PRR. A consciência da crise interna latente, contudo,
levou Borges de Medeiros a considerar a presidência do partido como um encargo
temporário. Ele percebia que o problema era especialmente grave nos municípios,
onde as dissidências dentro do próprio PRR ameaçavam mais do que as oposições.
Os federalistas não dispunham de eleitorado suficiente para conquistar as
prefeituras, mas o mesmo já não ocorria com os dissidentes republicanos, que
poderiam mobilizar a insatisfação existente com as sucessivas reeleições de
prefeitos indicados pelos chefes locais do partido.
O
controle pessoal de Borges sobre a máquina do PRR tornou-se, com o tempo,
absoluto. Já em fevereiro de 1905, estava em suas mãos o poder decisório sobre
a escolha dos candidatos ao legislativo estadual, até então incumbência da
comissão executiva do partido. Além disso, assim como Castilhos, intervinha
diretamente nas eleições locais e nos assuntos administrativos, pois, como
presidente do estado, detinha o poder constitucional de anular as resoluções de
autoridades locais que desafiassem as diretrizes da comissão executiva do PRR.
Em
1904, o Congresso Nacional aprovou uma reforma que garantia o direito de voto nas
eleições estaduais aos cidadãos alistados de acordo com as disposições
previstas no nível federal. Entretanto, Borges e outros chefes de executivos
estaduais se recusaram a adotar essa modificação, alegando que o artigo 1º da
nova lei era inconstitucional. Um dos mecanismos previstos pela lei federal era
o voto cumulativo, que permitia ao eleitor escolher um número de candidatos
correspondente às vagas do seu distrito ou concentrar todos os seus votos em um
só nome, prática comum nas correntes de oposição. Borges modificou esse sistema
e, numa medida conciliatória em relação à oposição, garantiu a entrega, sem
disputa, de 1/4 das cadeiras do Congresso estadual às minorias, já que sem esse
mecanismo os republicanos continuariam no obter a quase totalidade das
cadeiras. Borges deixou de lado também o critério adotado no nível federal para
a organização das comissões de alistamento, argumentando que ele privilegiava
os maiores contribuintes. Para substituí-lo determinou a utilização dos
conselhos municipais. Essas modificações alcançaram grande repercussão na
política estadual e levaram o Partido Federalista a não apresentar candidatos
no pleito seguinte, sob a alegação de que o presidente gaúcho teria que se
curvar às disposições da lei federal. A questão só foi decidida no Supremo
Tribunal Federal, que se manifestou pela inconsistência do recurso dos
federalistas.
As eleições de 1907
Em 1906 havia uma clara divisão no interior do PRR, em
virtude do aumento do número de descontentes com a rigidez das diretrizes da
política positivista adotada pela corrente ortodoxa do partido. Logo no início
dos debates sobre a sucessão de Borges de Medeiros apareceu a candidatura do
republicano dissidente Fernando Abbott, chefe político do município gaúcho de
São Gabriel. Procurando evitar uma cisão que abalasse o partido, Borges de
Medeiros desistiu de concorrer à segunda reeleição consecutiva, decidindo
adotar uma solução intermediária. No início de 1907, escolheu como seu sucessor
Carlos Barbosa Gonçalves, chefe político de Jaguarão, ex-presidente da
Assembléia Constituinte estadual em 1891 e ex-vice-presidente do estado. Por
outro lado, a oposição oficializou a candidatura de Abbott, que recebeu o apoio
de Assis Brasil, das dissidências republicanas e de uma considerável facção do
Partido Federalista, cuja adesão só não foi completa pela recusa do grupo de
Francisco Antunes Maciel em apoiar um republicano.
Durante a campanha eleitoral, os estudantes da Faculdade de
Direito de Porto Alegre, favoráveis a Carlos Barbosa Gonçalves, criaram o Bloco
Acadêmico Castilhista, que foi a primeira experiência política de Getúlio
Vargas, João Neves da Fontoura, Firmino Paim Filho, Maurício Cardoso e outros,
que alcançariam projeção nacional a partir, sobretudo, da Revolução de 1930.
Também participaram dessa entidade alguns estudantes da recém-criada Escola de
Guerra de Porto Alegre, como Eurico Dutra, Pedro Aurélio de Góis Monteiro e
Salvador César Obino, que obteriam mais tarde renome no Exército e na política.
Carlos
Barbosa Gonçalves venceu o pleito de novembro de 1907 por larga margem de
votos. No dia 24 de janeiro seguinte, véspera da posse do novo governo, Borges
de Medeiros inaugurou a Escola Técnica Profissional, ligada ao Instituto de
Engenharia, e, afastando-se em seguida do cargo de presidente estadual,
permaneceu na chefia do PRR. Fixou residência em Cachoeira do Sul, onde se
dedicou ao cultivo de arroz na fazenda de Irapuazinho, que comprara de seu
cunhado através de empréstimos. Arrendou ainda outras terras mais próximas de
Porto Alegre, mas os lucros obtidos não foram suficientes para cobrir as
dívidas contraídas no início do empreendimento.
Apesar da situação precária que passou a enfrentar depois
dessa experiência fracassada com o cultivo de arroz, Borges se recusou sempre a
reabrir sua banca de advogado por considerar inadequado defender causas perante
os tribunais e, ao mesmo tempo, chefiar o partido situacionista do estado. A
manutenção do controle sobre a política rio-grandense também o levou a declinar
dos convites para ocupar o Ministério da Agricultura, feito por Nilo Peçanha em
1909, e o da Fazenda, feito por Hermes da Fonseca ao organizar seu gabinete no
ano seguinte.
O retorno ao governo do estado
No
início de 1912, quando se aproximava o fim do mandato de Carlos Barbosa
Gonçalves, o senador Pinheiro Machado lançou o nome de Borges de Medeiros para
chefiar o novo governo. Detentor de grande influência junto ao presidente
Hermes da Fonseca e líder do Partido Republicano Conservador (PRC), formado em
1910 com o apoio de várias forças situacionistas de outros estados, o senador
gaúcho tentava assim mobilizar o eleitorado do seu estado para neutralizar a
disposição de um grupo de oficiais do alto escalão do Exército que, desde a
posse de Hermes, se mostrava decidido a entrar na vida política com o objetivo
de “salvar” seus estados nativos das oligarquias dominantes. Nessa época,
circulava a notícia de que o novo ministro da Guerra, general Antônio Adolfo
Mena Barreto, iria candidatar-se ao governo do Rio Grande do Sul, seu estado
natal, com o apoio dos federalistas. Sentindo-se ameaçado, Pinheiro Machado
conseguiu de Hermes da Fonseca a substituição de Mena Barreto por um oficial da
sua confiança, o general Vespasiano de Albuquerque e Silva.
A
indicação de Borges de Medeiros como candidato do PRR recebeu apoio imediato da
representação republicana no Congresso Federal e dos deputados da Assembléia
estadual. Novamente concorrendo como candidato único, Borges foi eleito no
pleito de novembro de 1912 e tomou posse em 25 de janeiro do ano seguinte.
Segundo João Neves da Fontoura, começou então o período áureo dos 25 anos em
que permaneceu à frente do governo do Rio Grande do Sul, tendo ele promovido
durante esse mandato a consolidação das leis orgânicas do estado, decretado o
Estatuto dos Funcionários e solucionado os principais problemas de transportes.
Apesar de ter sido obrigado a aumentar o imposto territorial, que recaía sobre
os pecuaristas, foi menos atacado nesse período pelas oposições, pois seu
programa de governo atendia aos interesses dos grupos dominantes da economia
gaúcha, o que lhe garantiu legitimidade e colocou o uso da força num plano
secundário. Por outro lado, Borges procurou aproveitar as vantagens decorrentes
da influência de Pinheiro Machado sobre o presidente Hermes da Fonseca,
angariando maior auxílio da União para o estado e garantindo aos gaúchos um
número maior de postos importantes na administração federal.
Borges incentivou a introdução de melhoramentos e a expansão
da pecuária, e apoiou a realização de congressos e a formação de entidades de
classe. Empenhou-se ainda na criação do Frigorífico Rio Grande, principal
reivindicação dos pecuaristas gaúchos, e ofereceu vantagens tributárias a
companhias estrangeiras desse ramo, como a Armour e a Swift, que montaram suas
instalações no Rio Grande do Sul antes do fim da Primeira Guerra Mundial. Para
compensar a constante elevação do imposto territorial, determinou a redução das
taxas de exportação para vários produtos originários da pecuária, como o
charque, produtos frigoríficos e couros.
Para melhorar o desempenho de todos os setores da economia,
Borges dedicou grande esforço à solução dos três principais pontos de estrangulamento
do sistema de transportes do estado, a saber: o atraso das obras da barra e do
cais de Rio Grande, a precariedade do cais de Porto Alegre e a deficiência dos
serviços prestados pela Viação Férrea.
As obras da barra e do cais da cidade do Rio Grande estavam a
cargo da Compagnie Française du Port de Rio Grande do Sul, contratante dos
serviços junto à União mediante onerosas concessões, inclusive a
obrigatoriedade do pagamento de pesadas taxas pelo comércio local. Pretendendo
livrar a economia gaúcha destes encargos, desde o início do novo mandato Borges
de Medeiros empreendeu insistente campanha junto ao governo federal para
garantir a transferência da administração daqueles serviços para o estado. A
campanha obteve êxito, levando à encampação das obras pela União, que pagou as
despesas da barra e transferiu os contratos para o estado, o qual arcou com os
custos do porto.
Nessa época, a capital estadual não possuía nenhum porto
aparelhado para receber navios de maior calado, o que dificultava o comércio e
o escoamento da produção estadual. Borges de Medeiros ordenou então a leitura
de um projeto para a construção do porto e sua infra-estrutura, abrindo em
seguida concorrência pública para sua execução. Essa iniciativa provocou
protestos da Compagnie Française du Port de Rio Grande do Sul, que, com base
nos contratos de concessão para as obras do porto de Rio Grande, julgava-se no
direito à construção dos portos de Pelotas e da capital. O assunto foi levado
para a alçada federal e várias vezes Borges de Medeiros argumentou junto ao
Ministério da Viação que Porto Alegre estava localizada no estuário do Guaíba,
rio estadual, devendo a exploração do seu cais ficar, portanto, sob jurisdição
local. Depois de ganhar a causa, o governo gaúcho iniciou as obras, que se
estenderam por dois mandatos consecutivos de Borges.
Com a solução desse impasse, Borges de Medeiros baixou
decreto estabelecendo o Plano de Viação Geral, que incluía as vias fluviais e
as estradas de rodagem e de ferro. Estas últimas, administradas pela Compagnie
Auxiliaire de Chemins de Fer au Brésil, estavam em estado precário e suas
freqüentes paralisações eram responsáveis por grandes prejuízos à produção
local. Sua recuperação era uma das metas do plano.
Durante essa administração de Borges de Medeiros foram
construídos também o Hospital São Pedro, o Arquivo Público, o Colégio Júlio de
Castilhos, a Biblioteca Pública, o quartel-general da Brigada Militar e os
prédios das secretarias da Fazenda e de Obras Públicas, entre outros.
Em maio de 1915 Borges foi obrigado a afastar-se do governo
por motivo de doença, sendo substituído pelo vice-presidente, general Salvador
Pinheiro Machado, irmão do senador Pinheiro Machado. Apesar de permanecer em
sua fazenda não se afastou por completo da chefia do PRR, tendo contado, para
isso, com a colaboração do secretário do Interior, Protásio Alves, que se
encarregava da maior parte das questões do partido. Nesse período, a política
rio-grandense tornou-se novamente agitada, com a disputa de uma vaga no Senado
Federal. Seguindo sugestão do senador Pinheiro Machado, Borges aceitou a
indicação do ex-presidente da República, marechal Hermes da Fonseca, o que
provocou várias manifestações de desagrado entre seus próprios
correligionários. Dias depois, Ramiro Barcelos, ex-senador pelo Rio Grande do
Sul e membro da Assembléia Nacional Constituinte de 1891, decidiu concorrer
contra Hermes. Não tendo obtido o apoio de Borges, Barcelos rompeu com o líder
republicano e acusou o PRC de ser um veículo da ambição política de Pinheiro
Machado. Depois das eleições, vencidas por Hermes, Ramiro Barcelos escreveu um
poema épico-satírico intitulado Antônio Chimango, dirigido a Borges e sua
máquina política. O personagem-título era um senhor todo-poderoso da “estância
de São Pedro” (o Rio Grande do Sul), que elegia e depunha deputados e
senadores. A Brigada Militar procurou impedir a circulação da obra, mas não
pôde evitar sua divulgação clandestina. Como conseqüência, o termo “chimango”
(ou “chimangada”) passou a ser empregado genericamente para designar Borges de
Medeiros e seus liderados. Chimango ou ximango, nome de uma ave de rapina do
Rio Grande do Sul, já havia designado no Império uma facção do Partido Liberal.
No
âmbito da política nacional, o assassinato do senador Pinheiro Machado em
setembro provocou um maior isolamento do Rio Grande do Sul e privou Borges do
principal defensor dos interesses gaúchos junto ao governo federal.
Em maio de 1916, Borges reassumiu o governo.
As greves de 1917 no Rio Grande do Sul
A
redução do nível de vida do operariado brasileiro durante a Primeira Guerra
Mundial atingiu seu ponto mais agudo em 1917, provocando a eclosão de
movimentos grevistas em diferentes estados. Em março, ocorreu a greve dos
calceteiros gaúchos, ocasião em que Borges de Medeiros insistiu junto ao chefe
de polícia de Porto Alegre, Firmino Paim Filho, para que recebesse uma
delegação da Federação Operária e se oferecesse como mediador do conflito.
O vasto movimento grevista deflagrado em São Paulo no mês de
junho teve ampla divulgação no Rio Grande do Sul, principalmente através do
órgão republicano A Federação. No dia 26 do mês seguinte chegou a Porto Alegre
a notícia de que um grupo de operários de Santa Maria, principal entroncamento
ferroviário do estado, se apossara de uma locomotiva e saíra propagandeando uma
greve. O movimento chegou à capital no dia 1º de agosto, com a adesão dos
empregados da Companhia Força e Luz, do Centro de Choferes e da maior parte das
outras categorias profissionais, sob a liderança da Liga de Defesa Popular
(LDP), cuja principal preocupação era desautorizar qualquer violência.
As autoridades estaduais reagiram de forma pouco comum para a
época. Nesse mesmo dia, Borges recebeu uma comissão de representantes da LDP e
prometeu estudar as reivindicações contidas em um memorial que lhe entregaram.
No dia seguinte, baixou dois decretos, imediatamente publicados, atendendo
parte das reivindicações dos trabalhadores: o primeiro estipulava aumento
salarial para todos os servidores do estado e o segundo regulava a exportação
dos produtos alimentícios gaúchos, de modo a garantir a distribuição no mercado
interno de uma quantidade suficiente para atender à demanda. Tratava-se,
portanto, neste último caso, de uma medida contrária ao liberalismo clássico,
então dominante na orientação econômica oficial.
Segundo
Miguel Bodea, “embora o decreto tivesse um efeito direto apenas em relação aos
empregados do próprio governo, o seu efeito de demonstração na verdade
avalizava as reivindicações operárias, induzindo, desta forma, o setor privado
a ceder também”. A fundamentação teórica das medidas adotadas pelo governo foi
apresentada na edição de 2 de agosto de A Federação, onde se reconhecia a
legitimidade de movimentos grevistas que, como o de Porto Alegre, buscavam
finalidades justas, ligadas à melhoria das condições de vida do operariado. O
mesmo artigo afirmava, entretanto, que as greves legais deveriam ser curtas e
rápidas, para não desorganizar o funcionamento da sociedade como um todo, o que
afetaria também os interesses da classe operária.
Apesar
das medidas adotadas pelo governo, a greve continuou, pois as concessões haviam
atingido apenas os funcionários estaduais. O patronato organizou então duas
comissões: uma para estudar a possibilidade de baixar os preços dos alimentos e
outra para procurar Borges de Medeiros, que pediu a colaboração dos empresários
no esforço de negociação. No dia 4 de agosto foi estabelecido o tabelamento dos
gêneros de primeira necessidade e a Companhia de Força e Luz estendeu o aumento
salarial a todos os seus funcionários, o que levou a LDP a propor aos
trabalhadores, em assembléia, o retorno ao trabalho.
Quando
o movimento grevista de Porto Alegre estava próximo do fim, surgiram novas
mobilizações, ainda mais fortes, em várias cidades do interior do estado, como
Santa Maria, Pelotas, Rio Grande, Bajé, Gravataí, Passo Fundo e Rio Pardo.
Nessas cidades, contudo, os trabalhadores tiveram que retomar às atividades
após violenta intervenção das tropas federais, solicitada pela direção da
Compagnie Auxiliaire.
Em outubro de 1917, estourou novo movimento grevista entre os
ferroviários de Santa Maria, mais longo e violento do que o anterior. Devido à
precariedade dos serviços prestados pela concessionária belga — cujas ações já
estavam sendo transferidas para o grupo norte-americano Brazil Railway — os
grevistas adotaram desde o início a bandeira do nacionalismo e obtiveram a
simpatia da opinião pública, especialmente do setor comercial. Passaram então a
pedir o apoio do próprio governo para o movimento, pois Borges de Medeiros já
defendia nessa época a encampação da ferrovia pelo estado. O presidente gaúcho
condicionou seu apoio à manutenção da ordem durante a paralisação.
A greve estava no auge quando, em 25 de outubro de 1917, as
bancadas parlamentares estadual e federal do PRR lançaram um manifesto pedindo
a reeleição de Borges à presidência do estado. No dia seguinte, obedecendo à
orientação traçada pela chefia do partido, A Federação defendeu a adoção de
“soluções radicais” — como a estatização proposta por Borges — para o problema
da rede ferroviária gaúcha. Segundo Miguel Bodea, o movimento dos ferroviários
ajudou o governo estadual a sensibilizar a população para suas teses favoráveis
à estatização dos serviços públicos.
No dia 27, a Federação Operária do Rio Grande do Sul ameaçou
convocar uma greve geral no estado se as reivindicações dos ferroviários não
fossem atendidas. Borges enviou então um emissário a Santa Maria para negociar
como representante dos grevistas junto aos delegados do governo federal e da
Compagnie Auxiliaire. Diante dessa intermediação, a Federação Operária
comunicou a desistência da greve. Quatro dias depois, a comissão negociadora
chegou a um acordo que contemplava quase todas as reivindicações, inclusive a
substituição do inspetor-geral da companhia por um engenheiro brasileiro e a
concessão de aumentos salariais entre 10% e 15% (inferiores à escala
inicialmente pedida pelos operários, que variava entre 10% e 30%).
Nas eleições realizadas em 25 de novembro de 1917, Borges de
Medeiros concorreu novamente como candidato único ao governo estadual,
renovando seu mandato até 1923.
Em julho de 1920 Borges conseguiu que o estado arrendasse a
viação férrea, que pouco antes fora encampada pela União. A partir daí, foi
implementada a parte mais importante de seu antigo Plano de Viação Geral, com a
remodelação das redes, a aquisição de novas locomotivas e vagões, a construção
de variantes, a substituição de trilhos e a instalação de grandes oficinas
ferroviárias em Santa Maria.
A participação na Reação Republicana
Em fins de abril de 1921, Borges de Medeiros foi consultado
oficialmente pelo Partido Republicano Mineiro (PRM) sobre a possível
candidatura de Artur Bernardes à sucessão de Epitácio Pessoa na presidência da
República. Ao contrário das outras ocasiões, o governo gaúcho evitou qualquer
pronunciamento sobre essa indicação, aproveitando a ocasião para criticar o
processo de escolha de candidatos à chefia do governo federal, os quais só
divulgavam seu programa depois da homologação da candidatura. Reagindo à
chamada “política do café-com-leite” (que garantia a alternância de mineiros e
paulistas na presidência da República), Borges passou a defender a prévia
divulgação do programa de cada candidato, de modo que a convenção pudesse
escolher o melhor, sem beneficiar necessariamente Minas ou São Paulo.
Segundo Joseph Love, as principais preocupações de Borges
nessa época eram a estabilização da moeda, a manutenção de um preço competitivo
para o charque em relação ao bacalhau e o desenvolvimento da rede nacional de
transportes, para diminuir o peso relativo das estradas e ferrovias federais
construídas nos dois estados tradicionalmente hegemônicos no governo da União.
Politicamente, Borges temia que Artur Bernardes tentasse realizar uma reforma
constitucional para fortalecer o governo federal, reduzindo a autonomia
estadual e a força das correntes políticas dominantes em cada região.
A
oposição gaúcha apoiou a indicação de Bernardes, dando nova dimensão à campanha
presidencial no estado. A escolha do maranhense Urbano Santos para compor a
chapa junto com o político mineiro provocou uma ruptura entre o governo federal
e os estados da Bahia e de Pernambuco, os mais importantes do Nordeste, que se
sentiram marginalizados. As forças dominantes desses dois estados se uniram
então às do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, formando a Reação
Republicana, que lançou a chapa oposicionista composta pelo fluminense Nilo
Peçanha (indicado por Borges) e o baiano José Joaquim Seabra.
Nas eleições realizadas em 1º de março de 1922, Bernardes foi
vitorioso em nível nacional, apesar de derrotado no Rio Grande do Sul por larga
margem (11.632 votos contra 96.051 dados à Reação Republicana).
As eleições estaduais de 1922 e a Revolução de 1923
A disputa travada no Rio Grande do Sul entre os republicanos
e as oposições na campanha para o governo federal em 1922 esteve sempre ligada
à questão estadual, pois em novembro desse ano seria realizado o pleito para
escolher o sucessor de Borges de Medeiros. A vitória de Bernardes garantiu o
apoio do governo central às oposições gaúchas interessadas em derrotar o PRR.
Borges evitou qualquer pronunciamento sobre a questão sucessória até meados de
1922, quando, devido à pressão das lideranças locais, foi obrigado a fazê-lo.
Em agosto, constituiu uma comissão para avaliar as tendências de seus
correligionários sobre esse assunto. Essa comissão lançou um manifesto no dia
25 de setembro, expondo as razões pelas quais o PRR concordara em reapresentar
o nome de Borges como candidato à reeleição: tratava-se, em última instância,
de “proteger” o Rio Grande do Sul contra Bernardes.
Decidida a enfrentar a candidatura do líder republicano, a
oposição buscou um nome capaz de unir suas três correntes principais: os
federalistas, os antigos democratas de Assis Brasil e os republicanos
dissidentes. Segundo Hélgio Trindade, a reunificação das oposições, “embora
tendo origem nos descontentamentos oriundos da crise na pecuária”, decorreu
“muito mais de um esgotamento do sistema político autoritário do que da
incapacidade do modelo de desenvolvimento republicano de enfrentar novos
desafios da crise econômica mundial”. Ainda segundo o mesmo autor, a
estruturação das oposições já estava em curso desde antes da crise que atingiu
a economia agromercantil gaúcha depois da Primeira Guerra Mundial. Com a
retração do mercado então ocorrida, os produtores solicitaram a intervenção do
estado em sua defesa. Entretanto, Borges manteve sua orientação positivista,
contrária ao protecionismo estatal e à concessão de privilégios a setores
específicos da produção. Procurado ainda em 1922 por um grupo de pecuaristas
que solicitavam a adoção de medidas protetoras de sua atividade econômica, o
presidente gaúcho se limitou a receber o memorial que traziam e prometeu
encaminhá-lo ao governo federal e à bancada do estado na Câmara.
O insucesso da intermediação de Borges de Medeiros junto ao
governo de Epitácio Pessoa e as notícias de execuções de títulos de fazendeiros
endividados criaram um descontentamento entre os criadores gaúchos em relação
ao presidente do estado, favorecendo a atuação das oposições gaúchas, que já
contavam com o apoio de setores urbanos significativos. Segundo Maria Antonieta
Antonacci, a arregimentação política oposicionista foi grandemente facilitada
por esse desencontro verificado entre os setores ligados à pecuária e o governo
de Borges de Medeiros.
Em meados de outubro de 1922, as oposições gaúchas divulgaram
manifesto lançando a candidatura de Assis Brasil. O pleito, realizado no mês
seguinte, foi precedido de boatos sobre a iminência de um levante contra Borges
de Medeiros, e surgiram em seguida acusações de fraude partidas de ambos os
lados. Foi a primeira eleição governamental contestada desde 1907 e a apuração,
conduzida por uma comissão de três deputados (Getúlio Vargas, Ariosto Pinto e
José de Vasconcelos Pinto), só foi concluída em 17 de janeiro, quando Borges
foi declarado vencedor por 106.360 votos contra 32.216 dados a Assis Brasil. A
maioria republicana na Assembléia reconheceu rapidamente este resultado e
proclamou a reeleição do antigo líder. Oficialmente, Assis Brasil só obteve
maioria no município de São José, mas recebeu votação expressiva na região da
campanha gaúcha (onde os federalistas sempre tiveram força) e na capital (onde,
segundo Joseph Love, a fraude era mais difícil).
Logo após a divulgação dos resultados, Assis Brasil ainda
tentou a criação de um tribunal arbitral constituído de quatro deputados
estaduais, um federal e um senador de cada facção, e presidido por Artur
Bernardes, para julgar a validade do pleito. Borges de Medeiros aceitou esse
julgamento, exigindo entretanto que ele ficasse a cargo apenas de Bernardes, o
qual, por sua vez, considerou seu envolvimento incompatível com o exercício da
presidência da República. Assim, a sugestão da oposição foi afastada, mas Assis
Brasil e seus partidários continuaram a alegar fraude e se rebelaram contra o
governo a fim de provocar uma intervenção federal no estado. O movimento
começou no dia da nova posse de Borges de Medeiros (25/1/1923), com uma série
de levantes regionais que visavam a deposição do governo, o afastamento dos
republicanos de todos os cargos e a anulação da Constituição castilhista.
Entretanto, desde o início a relação de forças militares era desfavorável aos
rebeldes, que reuniram seis mil homens contra os 12 mil mobilizados por Borges
de Medeiros nos efetivos da Brigada Militar e dos corpos provisórios. Assis
Brasil viajou então ao Rio para tentar conseguir ajuda dos governos federal,
paulista e mineiro, mas não obteve êxito. Os presidentes dos dois estados se
recusaram a intervir diretamente na política interna de um outro, e Artur
Bernardes manteve-se evasivo porque sua relação com a oficialidade do Exército
estava abalada desde o episódio das “cartas falsas”, publicadas em outubro de
1921, e havia divergências nos altos escalões militares quanto à situação do
Rio Grande do Sul.
Isolados, os rebeldes tiveram que adotar a guerra de
movimentos, evitando os combates diretos. Pretendiam, assim, sustentar a luta
até a decretação da intervenção federal. Entretanto, a partir do momento em que
se certificaram de que essa medida não viria e de que a derrota militar se
aproximava, passaram a buscar uma paz honrosa que o próprio governo federal se
empenhou em propor. Em fins de outubro de 1923, Bernardes nomeou o general
Fernando Setembrino de Carvalho (ministro da Guerra) e Augusto Tavares de Lira
(ex-ministro da Justiça) para atuarem em seu nome como pacificadores, visando
com isso exercer maior controle sobre Borges (sem, contudo, tirá-lo do poder),
evitar o alastramento do conflito e proporcionar aos rebeldes um acordo de paz
que levasse em conta as suas reivindicações.
Setembrino
de Carvalho procurou inicialmente Assis Brasil, que se encontrava na capital
federal e cuja principal exigência, em nome das oposições gaúchas, foi o
afastamento de Borges de Medeiros do governo estadual. O ministro, contudo, lhe
mostrou que Bernardes havia reconhecido a legitimidade das eleições e, por
isso, seria obrigado a sustentar o governo de Borges. Depois desses contatos
iniciais, Setembrino viajou para o Rio Grande do Sul, onde constatou o
pessimismo dos chefes militares rebeldes, pois suas forças estavam
desarticuladas depois de sucessivas derrotas. No início de novembro, o
emissário do governo federal conferenciou com Borges de Medeiros.
As negociações chegaram a um impasse nos primeiros dias de
dezembro, ocasião em que Setembrino de Carvalho apelou para o deputado Antunes
Maciel, partidário de Assis Brasil mas favorável à busca de um acordo que
mantivesse Borges no poder. Segundo Hélio Silva, a intervenção de Maciel foi
decisiva para a aceitação, por parte dos rebeldes, da nova proposta de paz
apresentada pelo governo federal, que resultou na assinatura do Pacto de Pedras
Altas em 14 de dezembro de 1923. O acordo, ratificado no dia seguinte por
Borges de Medeiros, garantia sua permanência no governo, mas proibia nova
reeleição e aceitava todas as outras exigências dos rebeldes, como a reforma da
Constituição estadual no capítulo referente à reeleição de presidentes, o fim
do voto às claras e da nomeação dos vice-presidentes e vice-intendentes
municipais.
O último período de governo
Segundo
Hélgio Trindade, a Revolução Gaúcha de 1923 foi responsável pela
institucionalização da oposição liberal, que até então ocupava um espaço
marginal ao sistema político dominante. Ainda sob a liderança de Assis Brasil,
as oposições gaúchas se uniram formalmente na Aliança Libertadora, em janeiro
de 1924, para concorrerem às eleições de deputados federais, tendo como
objetivo principal a luta pela liberdade política e o combate ao domínio do PRR
no Rio Grande do Sul. Por outro lado, o Pacto de Pedras Altas não conseguiu pôr
fim à crise no estado. Os elementos oposicionistas, sentindo-se ainda
perseguidos por Borges, passaram a ingressar no Exército e a estabelecer
ligações com a jovem oficialidade revolucionária, isto é, o grupo dos
“tenentes”.
Em
5 de julho de 1924, eclodiu em São Paulo, Sergipe e Amazonas a segunda revolta
tenentista, ocasião em que os principais veteranos da Revolução de 1923
passaram a discutir, no exílio, a possibilidade de um novo levante no Rio
Grande do Sul. Borges enviou batalhões de caçadores da Brigada Militar para
auxiliar na repressão aos rebeldes que haviam ocupado a capital paulista.
Depois de três semanas de combates, os revolucionários se retiraram para o
interior e, em seguida, estabeleceram contato com os oposicionistas gaúchos
para apressar a deflagração de novo levante que forçasse a divisão das forças
legalistas. As articulações evoluíram e, no início de agosto, irrompeu a
revolta do 2º Batalhão de Engenharia, sediado em Cachoeira do Sul. No dia 29 de
outubro sublevaram-se elementos das guarnições federais sediadas nas cidades de
Santo Ângelo, São Luís, São Borja, Uruguaiana e Alegrete, sob a coordenação do
capitão Luís Carlos Prestes. Borges de Medeiros determinou então a mobilização
imediata da Brigada Militar e de todos os corpos provisórios (tropas
irregulares compostas de civis), que foram comandados por Firmino Paim Filho,
Osvaldo Aranha e José Antônio Flores da Cunha, entre outros.
As forças rebeladas conseguiram manter durante dois meses uma
base de apoio na região noroeste do estado, sendo forçadas em janeiro de 1925 a
marchar para o norte. A junção, em abril seguinte, desses contingentes com as
tropas paulistas rebeladas em julho de 1924 formou a Coluna Miguel
Costa-Prestes, que percorreu o país em guerra de movimento até fevereiro de
1927, quando se internou em território boliviano.
Em fins de junho de 1925, Artur Bernardes apresentou aos
líderes das bancadas parlamentares um anteprojeto de reforma da Constituição de
1891, visando fortalecer o Poder Executivo e limitar certas franquias
estaduais. Começou então uma série de contatos entre o presidente da República
e os representantes das forças estaduais, realizada no palácio do Catete, na
qual Borges de Medeiros foi representado pelo deputado federal Getúlio Vargas.
Os pontos da reforma impugnados pelo líder republicano gaúcho diziam respeito
principalmente aos casos de intervenção federal nos estados, à fixação dos
princípios constitucionais, à liberdade de ensino e de profissão, à competência
para legislar sobre direito processual e às garantias do funcionalismo.
Ainda em 1925, Bernardes e os partidos republicanos de São
Paulo e de Minas Gerais decidiram lançar a chapa Washington Luís-Fernando Melo
Viana para concorrer à sucessão presidencial prevista para o ano seguinte. Ao
contrário das vezes anteriores, contudo, o chefe do governo determinou que a
convenção nacional fosse precedida de convenções municipais em cada estado. No
Rio Grande do Sul, Borges de Medeiros orientou o PRR para aceitar a fórmula
paulista-mineira, visando assim preservar a política interna gaúcha de maiores
atribulações. Também havia razões de ordem econômica e financeira para adotar
esse posicionamento. Apesar de Artur Bernardes ter concedido algumas vantagens
temporárias à indústria gaúcha do charque no mercado interno, os pecuaristas,
os plantadores de arroz e os próprios produtores de charque estavam
descontentes porque não contavam com apoio federal para enfrentar a crise que
atingia seus setores. Borges de Medeiros já havia expressado diversas vezes seu
interesse pela estabilidade dos preços no mercado interno, item que constava,
ao lado da estabilização do câmbio, como ponto básico do programa econômico de
Washington Luís.
Por esses motivos, a convenção gaúcha reunida em 30 de agosto
de 1925 aprovou com facilidade a chapa oficial, homologada na convenção
nacional em meados de setembro. No fim desse mês, contudo, eclodiu no Rio
Grande do Sul mais uma revolta, comandada pelo caudilho Honório Lemes, visando
derrubar Borges de Medeiros e hostilizar Artur Bernardes, considerado traidor
pelos rebeldes por não ter decretado a intervenção federal no estado em 1923.
As forças legalistas sufocaram rapidamente esse movimento.
Pretendendo fortalecer as relações entre o Rio Grande do Sul
e a aliança São Paulo-Minas Gerais, Washington Luís escolheu Getúlio Vargas
para ocupar o Ministério da Fazenda de seu governo, o que tornaria mais fácil a
assistência econômico-financeira àquele estado. Na condição de presidente
eleito, viajou em junho de 1926 a Porto Alegre, onde foi recebido por Borges de
Medeiros e reafirmou sua solidariedade ao PRR. Em novembro, em protesto contra
a posse do novo governo federal, o tenente Alcides Etchegoyen conseguiu
sublevar sua guarnição, localizada no sudoeste do Rio Grande do Sul, território
tradicionalmente “libertador”, mas, sem receber adesões, esse movimento foi
debelado no mesmo dia pelas tropas de Borges e passou a ser conhecido como
“Coluna Relâmpago”.
Em
1927 tiveram início as articulações visando a sucessão do presidente gaúcho.
Embora impossibilitado pelo Pacto de Pedras Altas e pela emenda constitucional
de se candidatar à reeleição, Borges conservava a chefia do PRR, o que lhe
garantia a escolha do seu substituto. Em agosto, ele comunicou oficialmente a
Getúlio Vargas (então ministro da Fazenda) e a João Neves da Fontoura a escolha
dos seus nomes para compor a chapa que seria apresentada pela direção do PRR à
convenção estadual. Poucos dias depois, com a concordância desses políticos, o
presidente gaúcho anunciou oficialmente a composição da chapa aos chefes locais
e à bancada gaúcha na Câmara e no Senado.
Os libertadores se recusaram a apresentar uma chapa para
concorrer com os republicanos. Candidato único, Getúlio Vargas foi eleito,
tendo tomado posse em 25 de janeiro de 1928. Logo depois da transmissão do
cargo, Borges de Medeiros deixou Porto Alegre para uma rápida estada em Torres
(RS), antes de seguir para a fazenda de Irapuazinho. Apesar de afastado do
poder e da capital, continuou a exercer a chefia do PRR.
A formação da Frente Única Gaúcha e da Aliança Liberal
Em
março de 1928, os libertadores se organizaram em partido político, o Partido
Liberal (PL), que foi atraído para colaborar com o governo de Vargas, mais
liberal do que o anterior. A aproximação definitiva entre o PL e o PRR ocorreu
em 1929, quando começaram a ser escolhidos os candidatos à sucessão de
Washington Luís. Discordando da candidatura do paulista Júlio Prestes, as
forças dominantes de Minas Gerais se aproximaram dos gaúchos para lançar uma
chapa de oposição. Durante as negociações, Borges de Medeiros manteve intensa
correspondência com João Neves da Fontoura (vice-presidente do estado e líder
da bancada republicana na Câmara dos Deputados), que, em 17 de junho de 1929,
assinou um acordo com Francisco Campos e José Bonifácio de Andrada e Silva,
representantes do PRM. Conhecido como Pacto do Hotel Glória, esse documento
definiu o veto de Minas ao nome de Júlio Prestes, a retirada da candidatura
mineira de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada e o lançamento de um gaúcho —
Borges de Medeiros ou Getúlio Vargas — para encabeçar a chapa oposicionista.
Para referendar esse acordo, que viria a servir de base para a formação da
Aliança Liberal, Borges estabeleceu algumas condições entre as quais: Vargas
deveria ser o candidato oposicionista, cabendo a Minas Gerais a iniciativa do
seu lançamento público; Washington Luís deveria ser oficialmente avisado dessa
articulação, e a homologação da chapa seria feita em uma convenção nacional.
Posteriormente, o líder gaúcho abriu mão das duas últimas exigências,
concordando com a realização de uma convenção normal do PRM em Belo Horizonte.
No dia 30 de julho, a comissão executiva do PRM lançou a
chapa Getúlio Vargas-João Pessoa (presidente da Paraíba) para concorrer ao
governo federal. Vargas condicionou sua indicação à obtenção do apoio do PL
gaúcho, o que foi garantido através da formalização da Frente Única Gaúcha
(FUG), integrada pelo PRR e pelo PL, no início de agosto. No dia 21 desse mês
foi lançada a Aliança Liberal, que uniu o situacionismo dos estados do Rio
Grande do Sul, Minas Gerais e Paraíba, e as oposições locais dos outros estados
em torno da candidatura de Getúlio Vargas. Essa iniciativa contou com o apoio
público de Borges de Medeiros, que, em setembro, quebrou seu silêncio e
concedeu entrevista negando qualquer conotação revolucionária nesse projeto.
Entretanto,
a vitória de Júlio Prestes nas eleições de 1º de março de 1930 foi considerada
fraudulenta por setores da Aliança Liberal, que passaram a organizar um levante
armado contra o governo federal. Discordando desse projeto, outros
oposicionistas achavam que as tarefas da coalizão estavam encerradas, opinião
compartilhada por Borges de Medeiros. Sua entrevista publicada na edição de 19
de março do jornal A Noite, considerando o resultado eleitoral como um fato consumado,
provocou forte reação de João Neves da Fontoura, Osvaldo Aranha e outros
integrantes do PRR, que manteve uma posição indefinida.
A crise então vivida pelo PRR e a falta de definição da
posição de Vargas dificultavam a atuação dos aliancistas e desorientavam a
maioria da bancada parlamentar gaúcha, que tendia dessa forma a aceitar o
resultado da eleição. A existência de duas correntes antagônicas no interior do
PRR se tornava cada vez mais visível, mas Borges de Medeiros insistia em buscar
uma solução conciliatória capaz de evitar a cisão. Com o propósito de contornar
a crise, Paim Filho sugeriu ao líder republicano a realização de uma convenção
com a presença de senadores, deputados estaduais e federais, intendentes (que
correspondiam aos atuais prefeitos) e chefes locais. Borges preferiu discutir
diretamente com Vargas a atuação da bancada republicana gaúcha na Câmara
Federal. Nesse encontro, ficou decidido que João Neves — um dos políticos que
defendiam abertamente a preparação de um levante armado — continuaria como
líder da bancada, mas só poderia agir daí em diante com o consenso dos seus
liderados. Em caso de divergências políticas entre os parlamentares, Borges de
Medeiros seria consultado, e, em caso de dúvidas sobre problemas administrativos,
as consultas seriam feitas a Vargas.
A situação do PRR se complicou quando Borges, em nome da
comissão central, enviou aos chefes locais do partido uma carta-circular
comunicando a extinção da FUG e ameaçando reprimir as manifestações em
contrário. Ao mesmo tempo em que Luís Aranha viajava para o Rio de Janeiro e
Belo Horizonte a fim de informar aos líderes aliancistas que o PRR e o governo
gaúcho estavam “decididos à luta até as últimas conseqüências”, Borges afirmava
que deveriam ser feitos todos os esforços para evitar a deflagração da
revolução e aconselhava Vargas a não apoiar o governo federal, mas também a não
envolver o Rio Grande do Sul no movimento, mantendo em relação aos
revolucionários uma “atitude passiva, porém simpática”. Para ele, qualquer tentativa
de luta armada pelo poder colidia com a finalidade básica do Estado, isto é,
manter a lei e a ordem.
A preparação do levante foi intensificada depois do
assassinato de João Pessoa, ocorrido em Recife em 26 de julho. No início de
agosto, o político gaúcho Maurício Cardoso foi enviado a Porto Alegre a fim de
tentar obter a adesão de Borges de Medeiros ao movimento. Segundo João Neves,
só em 25 de agosto o velho líder republicano decidiu apoiar o levante, cuja
data foi marcada para 3 de outubro, com início simultâneo no Rio Grande do Sul,
Minas Gerais e Paraíba.
A insurreição teve início em Porto Alegre às 17:30h do dia
combinado, no exato momento em que terminava o expediente do general Gil de
Almeida, comandante da 3ª Região Militar. Depois de dois dias de combates, o
estado passou para o controle total dos revolucionários, que iniciaram então
sua marcha para o norte, atingindo em poucos dias os arredores de São Paulo. Os
preparativos para o ataque a essa cidade foram suspensos no dia 24 de outubro, com
a chegada da notícia da deposição de Washington Luís por um golpe desfechado
pela alta hierarquia militar lotada no Distrito Federal. Formou-se então uma
junta governativa provisória que transferiu o poder para Getúlio Vargas em 3 de
novembro seguinte.
O Governo Provisório e a Revolução Constitucionalista
de 1932
Depois da vitória da revolução, a atuação dos partidos
gaúchos ainda permaneceu estreitamente ligada à FUG. O interventor federal no
estado, José Antônio Flores da Cunha, tentou evitar a todo custo a formação de
um movimento de oposição que viesse a receber apoio de grupos oposicionistas
existentes em outros estados. Mesmo assim, desde logo começaram a aparecer
divergências dentro do PRR em relação ao encaminhamento do processo político
nacional. Borges de Medeiros, ainda na chefia do partido, queria apressar o fim
do regime de exceção implantado com a vitória da revolução, mas Flores e uma
ala do PRR encaravam com otimismo os rumos do Governo Provisório chefiado por
Vargas, e acreditavam que a volta ao regime constitucional ocorreria em pouco
tempo.
No início de 1931, foram criadas em diversos estados do país
as chamadas legiões revolucionárias, entidades voltadas para a defesa e o
aprofundamento das reformas instituídas a partir da Revolução de 1930. No Rio
Grande do Sul, a idéia de fundar a Legião de Outubro gerou muitos temores,
devido ao desequilíbrio que poderia gerar na vida política estadual, ameaçando
a existência dos partidos. Para Borges de Medeiros, o regime democrático não
poderia existir sem essas agremiações, que organizavam as correntes de opinião
e formavam as maiorias indispensáveis ao funcionamento do sistema
representativo e à estabilidade: “longe de combater os partidos, sejam quais forem
suas tendências e objetivos, devemos estimular sua formação”. Enquanto isso,
Flores da Cunha apoiava incondicionalmente a formação de legiões
revolucionárias e afirmava não considerá-las uma ameaça à existência dos
partidos.
Ao longo do ano, esse debate sobre o papel dos partidos
esteve relacionado, de forma crescente, com o tema da convocação de uma
assembléia nacional constituinte, reivindicada por importantes setores da
política nacional. No Rio Grande do Sul, o PRR e o PL defendiam a
reconstitucionalização do país, mas não chegaram a hostilizar o Governo
Provisório durante quase todo o ano de 1931. Em novembro, Borges de Medeiros,
Flores da Cunha e Raul Pilla (representante do PL) reuniram-se na cidade de
Cachoeira do Sul e decidiram iniciar um movimento de solidariedade ao Partido
Democrático de São Paulo, que se opunha há vários meses ao poder dos “tenentes”
ligados ao governo federal, reivindicando a devolução da autonomia estadual e a
convocação de uma constituinte. Ao mesmo tempo, os três líderes gaúchos
resolveram solicitar ao governo federal providências jurídicas e políticas para
o início do processo de reconstitucionalização do país. Flores da Cunha
escreveu a Vargas comunicando essas posições e, dias depois, sua iniciativa foi
seguida por Borges de Medeiros e Raul Pilla, que relataram também a preocupação
da FUG com a evolução dos acontecimentos em São Paulo e com as notícias acerca
das pressões exercidas sobre Lindolfo Collor (ministro do Trabalho), Assis
Brasil (ministro da Agricultura) e João Batista Luzardo (chefe de polícia do
Distrito Federal). Segundo o documento, o afastamento desses representantes
gaúchos no governo federal acarretaria o rompimento da FUG com Vargas e a
renúncia de Flores da Cunha à interventoria no Rio Grande do Sul. Pouco depois,
Borges concedeu entrevista defendendo a união de gaúchos, paulistas e mineiros
na luta pelo fim do regime de exceção. Mesmo assim, Vargas manteve seu ponto de
vista de que a constitucionalização só deveria ser iniciada quando o Governo
Provisório houvesse resolvido alguns problemas básicos, como a organização
administrativa, o controle financeiro e a manutenção da ordem.
Diante
desse posicionamento de Vargas e do agravamento da crise política em São Paulo,
o PD divulgou um manifesto em janeiro de 1932 rompendo com o Governo
Provisório. O PL lançou então uma nota de solidariedade aos democráticos
paulistas, sendo imediatamente seguido pelo PRR. No mês seguinte, o
empastelamento do jornal Diário Carioca por elementos ligados aos “tenentes” do
Rio de Janeiro provocou o imediato pedido de demissão dos representantes
gaúchos no governo federal, que desde algum tempo vinham mantendo uma posição
crítica em relação a Vargas no tocante à necessidade de acelerar a
constitucionalização.
A partir desse episódio, a liderança gaúcha decidiu assumir
definitivamente uma aliança com as forças políticas paulistas, iniciando,
inclusive, preparativos para um enfrentamento militar com o governo federal,
sem prejuízo da continuação das negociações. Na tentativa de apaziguar os dois
lados, Assis Brasil sistematizou as exigências da FUG em um Heptálogo, que
destacava a abertura de inquérito para punir os autores do atentado ao Diário
Carioca, a garantia de liberdade de imprensa e a promulgação de um decreto
restaurando os preceitos constitucionais de 1891 no tocante aos direitos do
cidadão.
Diante da resposta evasiva de Vargas, Borges de Medeiros e
Raul Pilla lhe enviaram um Decálogo, que reiterava as exigências já feitas e
incluía o afastamento de Pedro Ernesto Batista da prefeitura do Distrito
Federal e a realização de eleições para uma assembléia constituinte até 31 de
dezembro de 1932. A atitude conciliadora de Flores da Cunha em relação ao
governo federal nesses episódios mereceu a desaprovação dos políticos do PRR e
do PL. Mesmo assim, com o objetivo de manter a FUG unida, os dois partidos
lançaram um manifesto reafirmando sua solidariedade ao interventor e declarando
que, se Vargas não atendesse às suas propostas, seriam rompidos todos os
vínculos com o governo federal.
O agravamento das tensões acabou resultando na eclosão, em 9
de julho de 1932, da Revolução Constitucionalista de São Paulo, que,
rapidamente vitoriosa nesse estado, deu início a uma guerra civil contra as
forças do Governo Provisório deslocadas de outras regiões do país. Verificando
que o interventor gaúcho não iria aderir ao movimento, Borges de Medeiros e
Raul Pilla decidiram enviar uma carta aos paulistas, em nome da FUG, propondo o
armistício. Os revolucionários, contudo, rejeitaram a sugestão gaúcha.
Flores da Cunha enviou tropas da Brigada Militar do Rio
Grande do Sul para combater a revolução, rompendo assim, definitivamente, o
compromisso assumido pelos gaúchos junto aos paulistas. Borges de Medeiros,
Raul Pilla, Lindolfo Collor e Batista Luzardo discordaram dessa decisão, e,
recusando a posição de espectadores do esmagamento dos constitucionalistas,
articularam a eclosão no Rio Grande do Sul de um movimento capaz de reter as
forças legalistas do estado e diminuir a pressão sobre os paulistas. Promoveram
então levantes em diversas localidades, como Santa Maria, Soledade e Júlio de
Castilhos, mas não obtiveram o esperado apoio da Brigada Militar, conseguindo
reunir apenas algumas centenas de homens mal armados. No dia 20 de setembro, os
constitucionalistas gaúchos foram derrotados em Cerro Alegre, ocasião em que
Borges de Medeiros foi aprisionado e os demais líderes da FUG tiveram que se
exilar. Pouco antes de ser preso, o ex-presidente gaú- cho passou a chefia do
PRR e a direção do jornal A Federação a Maurício Cardoso.
Por decreto de Vargas, todos os chefes republicanos e
libertadores de maior destaque foram banidos e tiveram seus direitos políticos
cassados, ficando impedidos de concorrer a cargos eletivos. Flores da Cunha
intercedeu junto ao chefe do Governo Provisório para evitar o banimento de
Borges de Medeiros, pois essa medida causaria um profundo mal-estar em todo o
estado. As próprias tropas gaúchas que haviam combatido em São Paulo estavam
retornando ao Rio Grande do Sul com um “espírito borgista muito acentuado”,
chegando a comentar-se em Porto Alegre que elas pretendiam libertar o velho
líder republicano. Flores da Cunha alegou também junto a Vargas que Borges,
sendo um homem sem recursos, enfrentaria inevitavelmente grandes dificuldades para
se manter em um país estrangeiro. Ao mesmo tempo, liderando os dissidentes da
FUG que se haviam oposto aos constitucionalistas, Flores fundou o Partido
Republicano Liberal (PRL).
Após breve confinamento na ilha Rasa, no litoral do Rio de
Janeiro, Borges de Medeiros, devido à interferência do interventor gaúcho, foi
transferido para Pernambuco, onde foi inicialmente confinado na ilha do Rijo e
depois permaneceu em liberdade vigiada na capital do estado. Nessa época, no
decorrer de 1933, publicou o livro O poder moderador na República presidencial.
Depois
de derrotar os paulistas e seus aliados, o Governo Provisório confirmou para
março de 1933 eleições para a Assembléia Nacional Constituinte, que se reuniu a
partir de 15 de novembro seguinte. Em 28 de maio de 1934, durante os trabalhos
dessa assembléia, Vargas decretou a anistia para os revolucionários de 1932,
devolvendo a Borges de Medeiros seus direitos políticos. Mesmo assim, Maurício
Cardoso permaneceu na chefia e na direção de A Federação, dedicando-se a
articular a candidatura do antigo líder gaúcho para a presidência da República,
com o apoio da bancada paulista. Na eleição indireta, realizada pelos deputados
constituintes em 17 de julho de 1934, Vargas recebeu 175 votos e Borges de
Medeiros ficou em segundo lugar com 59 votos.
Borges
de Medeiros foi eleito deputado federal em 14 de outubro desse ano na legenda
da FUG. A vitória das forças situacionistas nessas eleições reforçou a aliança
entre as oposições de vários estados, levando à criação na Câmara, em janeiro
de 1935, das Oposições Coligadas (ou Minoria Parlamentar), articulada havia
três meses por Borges e João Neves, da FUG, Artur Bernardes, do PRM, e Otávio
Mangabeira, da Liga de Ação Social e Política (LASP) da Bahia, que procuravam
criar um partido de âmbito nacional. Em maio, no início da legislatura, João
Neves foi escolhido líder dessa coalizão, cujo diretório nacional passou a ser
composto por Borges de Medeiros, Artur Bernardes, Otávio Mangabeira, Roberto
Moreira, José Sampaio Correia, Sebastião do Rego Barros e José Bezerra de
Menezes.
A Constituinte estadual e a política interna gaúcha
Durante os trabalhos da Assembléia Constituinte do Rio Grande
do Sul, desenvolvidos no primeiro semestre de 1935, tanto a FUG quanto Flores
da Cunha e seu PRL iniciaram um movimento de pacificação política no estado.
Com o desenvolvimento das negociações, a oposição concordou em apoiar o
interventor na eleição indireta para a chefia do nosso governo constitucional,
que seria organizado de forma parlamentarista, conforme uma proposta elaborada
por Raul Pilla e pelo jurista José Maria dos Santos. A chamada “Fórmula
Pilla-Santos”, no entanto, teve que enfrentar muitos obstáculos, pois havia
republicanos e libertadores hesitando em apoiar Flores da Cunha, cujas relações
com o governo federal começavam a tornar-se conflituosas. Borges de Medeiros
defendia enfaticamente um governo de coalizão no Rio Grande do Sul e a adoção
do parlamentarismo também no nível nacional, afirmando que o regime
presidencial havia fracassado no Brasil e se tornara o “criador de ditaduras
ilegais”.
Em 16 de janeiro de 1936, Borges de Medeiros, Raul Pilla e
Flores da Cunha assinaram um acordo entre a FUG e o PRL. Formou-se um governo
de coalizão, que inaugurou o chamado modus vivendi gaúcho, a partir da
aceitação por Flores da Cunha de várias reivindicações da FUG, como a liberdade
de imprensa e de reunião, e a recontratação de funcionários públicos removidos
por motivos políticos. Em contrapartida, a FUG aceitava colaborar na manutenção
da ordem política e concordava em participar do governo estadual, com Raul
Pilla na Secretaria de Agricultura e Lindolfo Collor, do PRR, na Fazenda.
Em
fins de maio de 1936, a discussão na Assembléia Legislativa gaúcha sobre o
projeto de criação de uma guarda portuária desencadeou nova crise política no
estado. Em seu violento combate a esse projeto, Maurício Cardoso atacou também
o governo de Flores, cuja resposta provocou o pedido de demissão de Pilla.
Junto a essas questões ligadas à política estadual, também o problema da
sucessão presidencial prevista para janeiro de 1938 interferiu nos
desentendimentos que se sucederam. Flores atuava de modo a influir
decisivamente na escolha do sucessor de Vargas, ao mesmo tempo em que este
incentivava as dissidências da política interna estadual a fim de enfraquecer o
governador. Os principais contatos entre o presidente e as oposições gaúchas
eram feitos através de João Neves (líder da minoria na Câmara), Maurício
Cardoso e Luzardo, contrários ao acordo entre a FUG e Flores.
Borges de Medeiros chegou a ser anunciado como um dos
possíveis candidatos à presidência na edição do dia 22 de junho de 1936 do
jornal gaúcho O Correio do Povo. O sentido das negociações em curso entre a FUG
e o governo federal era buscar a “pacificação nacional” através de uma
candidatura capaz de unir Vargas e as oposições, mas os outros partidos que
compunham a Minoria Parlamentar discordavam desse projeto, levando João Neves a
renunciar à liderança da bancada oposicionista na Câmara. O nome de Borges
Medeiros foi cogitado para substituí-lo, mas a escolha recaiu sobre Batista
Luzardo.
O modus vivendi gaúcho foi finalmente rompido em outubro de
1936, ocasião em que Lindolfo Collor lançou um manifesto acusando a FUG
(especialmente a direção do PRR) pela crise e rompendo com a cúpula
republicana. Chamado a interferir, Borges de Medeiros assegurou seu apoio à
direção do partido e, em resposta às acusações de Collor, contestou que o PRR
tivesse esquecido o princípio antiintervencionista. Em seu manifesto, afirmou
que, a partir do segundo semestre de 1936, “o governador começou subitamente a
criar corpos provisórios e toda uma série impressionante de circunstâncias
graves que gerou no espírito público a convicção de que o Rio Grande do Sul se
preparava para agredir o governo federal”. Enquanto isso, ainda segundo Borges,
“a FUG, por força de deliberação coletiva com a qual Collor esteve plenamente
de acordo, parlamentava no Rio de Janeiro com Vargas, por intermédio de
Maurício Cardoso, no sentido da formação de um governo nacional que pacificasse
as correntes políticas do Brasil”.
Durante o ano de 1937, o problema da sucessão presidencial
foi o catalisador de todos os debates, alianças e crises políticas do país. As
correntes de oposição a Vargas se articularam em torno da candidatura de
Armando de Sales Oliveira, lançada pelo Partido Constitucionalista de São
Paulo, enquanto as forças situacionistas lançavam José Américo de Almeida. No
Rio Grande do Sul, a campanha sucessória encontrou o modus vivendi rompido e os
três partidos cindidos. O PRR e o PL, que desde 1932 se opunham abertamente a
Vargas, passaram a apoiar, junto com dissidentes do PRL, as decisões do governo
federal e o candidato situacionista. Por outro lado, Flores da Cunha, o PRL e
dissidentes dos dois outros partidos defendiam o nome de Armando Sales. Durante
o ano, a bancada do PRR na Câmara Federal votou ao lado dos partidos
situacionistas e apoiou as medidas tomadas por Vargas contra Flores, que em
meados de outubro renunciou ao governo do estado.
Com
a implantação do Estado Novo por Vargas em 10 de novembro de 1937, as eleições
foram suspensas e os órgãos legislativos suprimidos. Borges de Medeiros perdeu
com isso seu mandato de deputado federal mas, mesmo assim, divulgou cinco dias
depois um manifesto a seus correligionários recomendando o apoio a Vargas,
medida idêntica à que já havia sido tomada pela direção do PRR. Em seguida o
velho líder decidiu afastar-se definitivamente da política retornando ao Rio
Grande do Sul, onde se fixou na fazenda de Irapuazinho.
Com
a reorganização dos partidos políticos em 1945, Borges de Medeiros foi aclamado
presidente de honra da seção gaúcha da União Democrática Nacional (UDN), que
agrupava a oposição liberal ao Estado Novo. Permaneceu, entretanto, afastado
das atividades políticas.
Em 1960, aos 97 anos de idade, Borges recebeu a condecoração
de Grande Oficial da Ordem Nacional do Mérito, entregue pelo comandante do III
Exército, general José Machado Lopes, a seu genro, Sinval Saldanha.
No ano seguinte, viúvo desde 1957, Borges de Medeiros faleceu
em Porto Alegre no dia 25 de abril.
De seu casamento com Carlinda Gonçalves Borges não teve
filhos. O casal adotou uma sobrinha, Dejanira Godói de Medeiros, mais tarde
casada com Sinval Saldanha, secretário do Interior do Rio Grande do Sul na
época da Revolução de 1930 e interventor federal no estado de 27 de outubro a
18 de novembro desse ano.
A seu respeito, foram publicadas, entre outras, as seguintes
obras: Borges de Medeiros, subsídios para o estudo de sua vida e de sua obra
(1928), de João Pio de Almeida, e Memórias: Borges de Medeiros e seu tempo
(1958), de João Neves da Fontoura.
Regina da Luz Moreira
FONTES: ABRANCHES,
J. Governos; ALMANAQUE DA BRIG. MILITAR; ALMEIDA, A. Vultos; ARQ. GETÚLIO
VARGAS; BODEA, M. Greve; BRAGA, R. Dic.; CÂM. DEP. Anais; CÂM. DEP. Deputados;
CARONE, E. Estado; CARONE, E. República nova; Correio do Povo (27/7/77);
CORTÉS, C. Gaúcho; CRUZ, E. História do Pará; Diário de Notícias, Rio
(26/4/61); Efemérides paulistas; Encic. Mirador; FERREIRA FILHO, A. História;
FIGUEIREDO, E. Contribuição; FLYNN, P. Legião; FONTOURA, J. Memórias; FRANCO,
S. Júlio; Grande encic. Delta; Grande encic. portuguesa; Jornal (26/4/61);
Jornal do Comércio, Rio (26/4/61); LEITE, A. História; LEVINE, R. Vargas; LOVE,
J. Regionalismo; MAGALHÃES, B. Artur, Moeda e Finanças; MORAIS, A. Minas;
NOGUEIRA FILHO, P. Ideais; Novo dic. de história; OLIVEIRA, C. Biografias;
PESAVENTO, S. Política; REIS JÚNIOR, P. Presidentes RS; SILVA, H. 1889; SILVA,
H. 1922; SILVA, H. 1931; SILVA, H. 1932; SILVA, H. 1945; SILVA, R. Notas; SOC.
BRAS. EXPANSÃO COMERCIAL. Quem; SPALDING, V. Construtores; TÁVORA, J. Vida;
VAMPRÉ, S. Memórias; VELHO SOBRINHO, J. Dic.