VALE,
Amorim do
*militar; min. Mar. 1954-1955.
Edmundo Jordão Amorim do Vale nasceu no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, em 1º de
janeiro de 1933, filho de Luís Gonzaga Amorim do Vale e de Zeferina Jordão
Amorim do Vale.
Cursou o secundário no Colégio Abílio, no Rio de Janeiro, e
ingressou na Escola Naval em 1909. Concluído o curso, foi promovido a
segundo-tenente em janeiro de 1913 e designado para o navio-escola Benjamim
Constant. Em setembro de 1917, após ter servido em vários navios, foi promovido
a primeiro-tenente. Com a entrada do Brasil na Primeira Guerra Mundial em
outubro desse mesmo ano, passou a integrar o serviço de operações de guerra a
bordo do navio Carlos Gomes, encarregado da defesa do Porto do Rio de Janeiro.
De outubro de 1920 a julho de 1921, cursou a Ford Instrument School, em Nova
Iorque.
Participou
da repressão à revolta tenentista de 5 de julho de 1922 que envolveu, no Rio de
Janeiro, o forte de Copacabana, a Escola Militar e efetivos da Vila Militar.
Atuou no bombardeio ao forte a bordo do encouraçado Minas Gerais.
Promovido
a capitão-tenente em fevereiro de 1923, ingressou na Escola Profissional de
Artilharia. Concluiu o curso no ano seguinte e voltou a servir no Minas Gerais,
integrando uma expedição de forças da Marinha que desembarcou em Santos (SP)
para reprimir o movimento tenentista de 5 de julho de 1924. Os revoltosos
ocuparam a capital paulista e resistiram até o dia 27 de julho, quando se
deslocaram para o interior em direção ao Paraná. Nesse momento, organizou-se no
Distrito Federal um esquema de sublevação destinado a apoiar os paulistas.
A chefia do movimento na Esquadra caberia ao capitão-de-mar-e-guerra
Protógenes Guimarães, que, entretanto, foi descoberto e preso. Mesmo fracassada
a Conspiração Protógenes, no mês de novembro amotinou-se o encouraçado São
Paulo sob o comando do tenente Herculino Cascardo. Por se recusar a combater o
navio amotinado, Amorim do Vale foi preso, só sendo posto em liberdade em abril
de 1927.
Em
agosto de 1928, passou a servir na Diretoria de Portos e Costas, embarcando,
dois meses depois, no cruzador Barroso. No ano seguinte, tornou-se imediato do
contratorpedeiro Rio Grande do Norte. Nomeado capitão dos portos do estado do
Piauí em agosto de 1930, permaneceu nesse posto por três meses.
Com a vitória da Revolução de 1930, Amorim do Vale foi
designado para o cargo de ajudante-de-ordens do novo chefe do Estado-Maior da
Armada (EMA), o almirante Francisco de Matos. Em janeiro de 1931, tornou-se
oficial-de-gabinete do ministro da Marinha, o vice-almirante Conrado Heck.
Permaneceu no gabinete ministerial mesmo após o mês de junho, quando Conrado
Heck foi substituído pelo vice-almirante Protógenes Guimarães, de volta à ativa
beneficiado pela anistia.
Amorim
do Vale participou das comemorações do IV Centenário da cidade de São Vicente
em janeiro de 1932, acompanhando Protógenes Guimarães em viagem oficial a São
Paulo. Assumiu a subchefia do gabinete ministerial em novembro desse ano e foi
promovido a capitão-de-corveta em agosto de 1933. No mês de novembro seguiu
para a Inglaterra para se incorporar, como imediato, à tripulação do
recém-construído navio-escola Almirante Saldanha, que atracou no Rio em outubro
de 1934. Voltou a integrar a subchefia de gabinete do ministro Protógenes
Guimarães de março a novembro de 1935, ingressando, a seguir, na Escola de
Guerra Naval. Concluiu o curso de comando em fevereiro de 1937, passando a
servir na Missão Naval norte-americana, criada em 1922 através de acordo entre
os governos do Brasil e Estados Unidos, com o objetivo de aperfeiçoar a Marinha
brasileira. Em fevereiro de 1938, foi nomeado comandante do contratorpedeiro
Maranhão, retornando um ano depois à Missão Naval norte-americana, onde
permaneceu até dezembro de 1940.
Em
janeiro de 1942, Amorim do Vale foi nomeado adido naval junto à embaixada
brasileira em Washington e em junho foi promovido a capitão-de-fragata. No mês
de dezembro, representou a Marinha do Brasil nas reuniões convocadas para
definir a aplicação do acordo firmado em outubro entre os governos brasileiro e
norte-americano estipulando a transferência para o Brasil de armamentos e
munições no valor de cem milhões de dólares. Esse acordo se baseava na Lei de
Empréstimo e Arrendamento (Lend and Lease Act), que autorizava o presidente
Franklin Roosevelt a estender a ajuda militar a qualquer país cuja defesa fosse
considerada essencial para os Estados Unidos. Em março do ano seguinte, Amorim
do Vale representou a Marinha brasileira na Junta Interamericana de Defesa.
Retornando ao Brasil em janeiro de 1944, assumiu o comando do
cruzador Rio Grande do Sul, que integrou a Força Naval do Nordeste, organizada
para escoltar comboios em tráfego no litoral norte do país durante a Segunda
Guerra Mundial.
Promovido
a capitão-de-mar-e-guerra em fevereiro de 1945, exerceu o comando do
encouraçado Minas Gerais de janeiro a agosto do ano seguinte. Assumiu a chefia
do Estado-Maior da Esquadra em outubro de 1946, ocupando o cargo até março de
1949, quando foi designado para a segunda subchefia do Estado-Maior da Armada.
De abril de 1950 a janeiro de 1951, foi subchefe do Estado-Maior das Forças
Armadas (EMFA), deixando esse posto para ocupar o comando do 2º Distrito Naval,
sediado em Salvador, até julho de 1952. Em janeiro de 1953, tornou-se
diretor-geral de Hidrografia e Navegação da Armada e nos meses de janeiro e
março do ano seguinte foi promovido respectivamente a vice-almirante e a
contra-almirante. De março de 1954 até o final do ano, cursou a Escola Superior
de Guerra (ESG).
No Ministério da Marinha
Ao
longo do ano de 1954, intensificou-se a campanha de oposição ao presidente
Getúlio Vargas, iniciada desde o começo de seu governo em janeiro de 1951 sob a
liderança da União Democrática Nacional (UDN). A situação tornou-se crítica ao
ser comprovada a participação de elementos ligados ao presidente no atentado da
Toneleros, desferido em 5 de agosto de 1954 no Rio de Janeiro contra o
jornalista udenista Carlos Lacerda, e no qual perdeu a vida o major-aviador
Rubens Vaz. Congregando além da UDN correntes militares conservadoras
favoráveis a uma solução ditatorial transitória, a oposição tentou forçar a
renúncia de Vargas. Amorim do Vale teve papel de destaque nessa campanha e, após
o suicídio do presidente, no dia 24 de agosto, e a posse do vice-presidente
João Café Filho, foi nomeado ministro da Marinha, assumindo o cargo em 26 de
agosto. No dia 18 de setembro foi divulgado um manifesto das forças armadas,
redigido ainda em agosto e assinado entre outros por Amorim do Vale.
O documento propunha o afastamento de Vargas como a única solução capaz de
manter a união das forças armadas e de garantir as instituições democráticas e
a Constituição.
Em
novembro, a sucessão presidencial passou a constituir a questão prioritária da
política nacional. Nesse momento, o Partido Social Democrático (PSD) lançou
extra-oficialmente a candidatura do então governador de Minas Gerais, Juscelino
Kubitschek, à presidência da República. As principais autoridades militares e
os udenistas, que defendiam a tese de um candidato único de união nacional às
eleições presidenciais, passaram a desenvolver forte oposição a essa
candidatura. Em janeiro de 1955, Amorim do Vale entregou a Café Filho um
documento sigiloso assinado pelos três ministros militares — além dele próprio,
o general Henrique Lott, da Guerra, e o brigadeiro Eduardo Gomes, da
Aeronáutica — e por destacados oficiais das forças armadas. Ressaltando a
conveniência de um candidato único e civil, que deveria ser aprovado pelos
militares, e apelando aos dirigentes dos principais partidos políticos para
solucionarem a questão “em um nível de colaboração interpartidária”, o
documento logo começou a transpirar na imprensa. Café Filho, então, com a
concordância dos signatários, divulgou-o na íntegra no dia 27 de janeiro,
através do programa radiofônico A voz do Brasil. Nessa mesma época, udenistas
radicais iniciaram uma campanha visando a promover um golpe militar para
impedir a eleição de Kubitschek, criando um sério impasse à sucessão
presidencial. Diante desses acontecimentos, em reunião realizada no dia 10 de
fevereiro com a participação de Amorim do Vale, do general Henrique Lott, do
general Canrobert Pereira da Costa, chefe do EMFA, e de alguns líderes pessedistas,
ficou decidido o apoio das forças armadas à manutenção da legalidade e à
realização das eleições presidenciais na data prevista — 3 de outubro de 1955.
Por
outro lado, em 4 de março de 1955, o Conselho de Segurança Nacional reuniu-se
com o objetivo de avaliar a possibilidade de revisão do tratado, firmado entre
os governos brasileiro e boliviano em 1938 estabelecendo que empresas estatais,
com capitais dos dois países, participariam da exploração do petróleo da
Bolívia. O presidente boliviano, Victor Paz Estensoro, reivindicava o reexame
do acordo com base no argumento de que o governo brasileiro não tinha, até
então, iniciado os trabalhos de exploração petrolífera, dificultando o
empreendimento por parte da Bolívia. Com o parecer favorável de Amorim do Vale,
a reunião aprovou a revisão do tratado por considerar o governo brasileiro sem
condições financeiras para atender às exigências estabelecidas. A questão,
entretanto, permaneceria em suspenso até 1958, quando foi firmado, entre os
dois países, o acordo conhecido como Ata de Roboré.
Em abril de 1955 Amorim do Vale integrou a comitiva do
presidente da República em viagem a Portugal.
Em meados do ano, descartada a possibilidade da candidatura
única à presidência nas eleições de outubro, a ala udenista radical liderada
pelo jornalista Carlos Lacerda passou a preconizar mais abertamente o golpe
militar. No dia 23 de agosto, o comandante do Corpo de Fuzileiros Navais,
almirante Sílvio Camargo, enviou um relatório a Amorim do Vale denunciando a
conspiração no seio das forças armadas. O documento revelava a existência de um
grupo de oficiais golpistas, conhecido como Grupo dos Coronéis, que dizia
contar com o apoio de quase todos os oficiais da Esquadra, com parte da
Aeronáutica e uma pequena parcela do Exército.
Afinal, em 3 de outubro, Juscelino Kubitschek e João Goulart,
candidatos da aliança entre o PSD e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB),
elegeram-se presidente e vice-presidente da República, derrotando os candidatos
da chapa udenista Juarez Távora e Mílton Campos. Objetivando impedir a posse
dos eleitos, a UDN desencadeou uma campanha para anular as eleições, com base
em três argumentos: a existência de fraude, a invalidade dos votos dos
comunistas e, finalmente, a não obtenção pelos eleitos da maioria absoluta. Na
área militar, Amorim do Vale e o brigadeiro Eduardo Gomes tentaram persuadir o
general Henrique Lott a pressionar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em nome
das forças armadas, para que este acatasse as teses udenistas. Lott, entretanto,
foi contra a interferência dos ministros militares na questão, afirmando seu
apoio à posse dos candidatos eleitos.
No dia 3 de novembro, Café Filho foi internado no Hospital
dos Servidores acometido de um distúrbio cardiovascular. Na manhã do dia 8,
decidiu transferir o governo a seu sucessor legal, o presidente da Câmara
Federal Carlos Luz, empossado neste mesmo dia.
Em
10 de novembro, diante da negativa de Carlos Luz em autorizar a punição do
coronel Jurandir de Bizarria Mamede, que no dia 1º se pronunciara contrário à
posse de Juscelino e Goulart, Lott pediu demissão do Ministério da Guerra. Na
madrugada do dia seguinte, após intensa movimentação do setor militar e do
Congresso, o ministro demissionário assumiu a liderança de um movimento
deflagrado com o objetivo de depor Carlos Luz e barrar a conspiração
governamental. A capital federal foi ocupada por tropas do Exército, forçando o
presidente e outras autoridades civis e militares a se abrigarem no Ministério
da Marinha. Amorim do Vale e Eduardo Gomes emitiram, então, uma nota deplorando
a atitude tomada pelo general Lott — que contava com o apoio de todas as
unidades do Exército — e afirmando que a Marinha e a Aeronáutica estavam ao
lado de Carlos Luz. Devido à situação no Rio, já definida a favor de Lott,
Carlos Luz, acompanhado por vários civis e militares, rumou a bordo do cruzador
Tamandaré para Santos, onde pretendiam instalar o governo da República. Amorim
do Vale permaneceu no Rio com o objetivo de organizar a esquadra que se deslocaria
para Santos na noite de 11 de novembro. Ao mesmo tempo, Eduardo Gomes
dirigiu-se para a IV Zona Aérea, em São Paulo, onde tentou concentrar os
pilotos e aviões de combate sediados no Rio.
Ainda
no dia 11, o Congresso Nacional reuniu-se para tentar solucionar o impasse
político. Apoiando a atitude de Lott, a Câmara e o Senado aprovaram o
impedimento de Carlos Luz, designando para substituí-lo Nereu Ramos,
vice-presidente do Senado e elemento seguinte na ordem de sucessão. O novo
presidente nomeou em seguida seu ministério, destituindo Amorim do Vale e
conduzindo à pasta da Marinha o almirante-de-esquadra Antônio Alves Câmara.
Após reunir-se com seus ex-ministros, em 21 de novembro Café Filho decidiu
reassumir a presidência da República. No dia seguinte, entretanto, o Congresso
decretou o seu impedimento, confirmando Nereu Ramos como presidente até a posse
de Juscelino em janeiro de 1956.
Em fevereiro de 1957, Amorim do Vale foi transferido para a
reserva no posto de almirante-de-esquadra.
Em
1959, foi processado por ordem do ministro Alves Câmara, em conseqüência de
declarações prestadas ao jornal Diário de Notícias a respeito dos
acontecimentos de novembro de 1955. Na mesma ocasião, foi também processado o
diretor do jornal, João Duarte Filho.
Amorim do Vale faleceu no Rio de Janeiro em 6 de novembro de
1971.
Era casado com Nair de Sá Amorim do Vale, com quem teve três
filhos.
Vilma Keller
FONTES: ANDREA, J.
Marinha; CAFÉ FILHO, J. Sindicato; CONSULT. MAGALHÃES B.; CORRESP. SERV. DOC.
GER. MAR.; CORTÉS, C. Homens; COSTA, M. Cronologia; COUTINHO, A. Brasil; Encic.
Mirador; Grande encic. Delta; Histórico; Jornal do Brasil; MACHADO, F. Últimos;
MIN. GUERRA. Subsídios; MIN. MAR. Almanaque (1957); SERV. DOC. GER. MARINHA.