SANTOS,
Epaminondas
*militar; comte. V ZA 1942; comte. III ZA
1952-1954; min. Aer. 1954; dep. fed. GB 1964.
Epaminondas Gomes dos Santos nasceu no Rio de Janeiro no dia 4 de novembro de 1891, filho
de Domingos Gomes dos Santos e de Maria Paulina Pereira.
Fez o curso secundário no Colégio Abílio, no Rio de Janeiro,
então Distrito Federal. Sentou praça em abril de 1908, ingressando na Escola Naval,
de onde saiu guarda-marinha em dezembro de 1911. Em janeiro de 1916 foi
promovido a segundo-tenente e, em janeiro de 1919, a primeiro-tenente. Nesse
mesmo ano, fez na Itália um curso de observador e de aviador militar. No ano
seguinte formou-se em aviação naval em Taranto, na Real Escola da Marinha
Italiana. De volta ao Brasil, foi designado, em 1923, instrutor da Escola de
Aviação Naval, assumindo, um ano depois, o comando da Esquadrilha de Aviões de
Caça.
Em
janeiro de 1927 foi promovido a capitão-tenente. Depois da Revolução de 1930,
que promoveu a deposição de Washington Luís e levou Getúlio Vargas ao poder,
tornou-se, em 1931, primeiro vice-presidente do Clube 3 de Outubro. Esse clube,
organização criada em maio de 1931, congregava as correntes tenentistas
partidárias da manutenção e do aprofundamento das reformas preconizadas pela
Revolução de 1930. Ainda em 1931 passou para o quadro de aviadores navais e, em
fevereiro do ano seguinte, foi promovido a capitão-de-corveta. Deixou a
vice-presidência do Clube 3 de Outubro em abril de 1935, quando este foi
extinto.
Em junho de 1937, assumiu o comando do Centro de Aviação
Naval de Santa Catarina, de onde saiu em 1941. Nesse mesmo ano, com a fundação
do Ministério da Aeronáutica, foi transferido para esse novo órgão das forças
armadas, sendo promovido em dezembro a tenente-coronel-aviador. Passou então a
comandar a base aérea de Florianópolis e, entre abril e julho de 1942, comandou
a V Zona Aérea (V ZA), sediada em Porto Alegre. Em março de 1944 deixou o
comando da base aérea de Florianópolis e, em maio desse mesmo ano, foi
promovido a coronel-aviador. Entre 1944 e 1946 foi adido aeronáutico junto à
embaixada do Brasil no Chile. Em novembro de 1948 foi promovido a
brigadeiro-do-ar e, em março de 1952, durante o governo de Getúlio Vargas, foi
nomeado comandante da III ZA, sediada no Rio de Janeiro, em substituição ao
brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo.
No comando da III Zona Aérea
Exerceu o cargo de comandante da III Zona Aérea em período
especialmente crítico. O Exército como um todo não apoiava a volta do varguismo
ao poder. Havia, entre os generais e outros oficiais de alta patente, um
sentimento de repúdio à manifesta aproximação de Vargas com a ala nacionalista
e esquerdizante das forças armadas. As divergências políticas tinham como base
a questão do desenvolvimento econômico do país: àqueles que defendiam uma
posição ligada ao desenvolvimento autônomo e à exploração pelo próprio país de
suas riquezas nacionais, opunham-se os que advogavam a causa do desenvolvimento
associado ao capital externo. A primeira posição atraía a simpatia das massas
urbanas, dos militares nacionalistas, dos comunistas, da maioria do Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB) e até mesmo de setores do Partido Social Democrático
(PSD). Em compensação, a idéia de um desenvolvimento associado com o capital
internacional era uma das crenças da União Democrática Nacional (UDN), aferrada
a uma fórmula capitalista liberal.
Em
fins de 1951, o projeto de lei criando uma empresa para a exploração do
petróleo no país foi um dos sérios divisores de água entre nacionalistas e
defensores da entrada de capitais estrangeiros. A definição, dada pelo
Congresso, em favor do monopólio estatal e a criação da Petrobras acabaram por
constituir um fator de desgaste para Getúlio Vargas perante muitos setores,
inclusive militares. Mas o conflito não se estabelecia apenas no nível da
contradição entre dois modelos de desenvolvimento. O problema do aumento dos
índices do salário mínimo aparecia, no início de 1954, como elemento-chave dos
debates políticos.
Ao
se iniciar o ano de 1954, o descontentamento e a conspiração atingiam novamente
os quartéis, onde especialmente a média oficialidade — majores,
tenentes-coronéis e inclusive coronéis — protestava contra seus baixos salários
e contra a incapacidade governamental de modernizar o equipamento militar. A
aproximação entre o ministro do Trabalho, João Goulart, e os sindicatos também
preocupava os oficiais, no seu arraigado espírito anticomunista. Em fevereiro,
um grupo de 80 coronéis e tenentes-coronéis entregou ao general Ciro do
Espírito Santo Cardoso, ministro da Guerra, um manifesto — que ficou conhecido
como Manifesto dos coronéis — onde era externada sua contrariedade diante da
situação geral do país e da situação específica do Exército.
Objetivando
recuperar as posições perdidas entre os militares, Vargas destituiu os
ministros do Trabalho e da Guerra, colocando em seus lugares, respectivamente,
Hugo de Faria e o general Zenóbio da Costa, conhecido por sua franca posição
anticomunista nas forças armadas, mas que fora também um resoluto defensor da
posse de Getúlio Vargas na presidência da República. A substituição de João
Goulart não amainou, no entanto, o trabalho da oposição. A UDN, acusando Vargas
de pretender estabelecer no país uma “república sindicalista”, apresentou ao
Congresso um pedido de impeachment do presidente. A tentativa dos udenistas
falhou, pois Vargas podia contar ainda com uma ampla maioria no Legislativo,
que lhe era fornecida pela aliança entre o PTB e o PSD.
Essas iniciativas, apoiadas por oficiais ultradireitistas,
obrigaram o presidente a uma nova guinada à esquerda. Em discurso proferido no
dia 1º de maio, depois de elogiar o seu ex-ministro do Trabalho, João Goulart,
Vargas pediu o apoio da classe operária ao seu governo e anunciou um aumento do
salário mínimo de 100%, conforme a proposta de seu ex-ministro. Nesse momento,
Vargas colocou contra si oposicionistas de vários matizes: udenistas,
militares, industriais, banqueiros. As conspirações ativaram-se nos quartéis,
enquanto a imprensa redobrava seus ataques.
A
crise político-militar agravou-se depois do atentado desfechado contra Carlos
Lacerda na madrugada do dia 5 de agosto de 1954 na rua Toneleros, no Rio de
Janeiro. Desse atentado, resultou a morte do major da Aeronáutica Rubens Vaz,
integrante de um grupo de militares que costumava escoltar Lacerda. Subitamente
a Aeronáutica foi colocada no centro dos acontecimentos. No mesmo dia, Nero
Moura, ministro da Aeronáutica, designou o coronel-aviador João Adil de
Oliveira para acompanhar o inquérito policial então instaurado, que rapidamente
reuniu provas que envolviam no atentado membros da guarda pessoal do
presidente. Começou, nesse momento, a fase decisiva do confronto entre o
governo e a oposição. A posição do ministro Nero Moura perante seus comandados
tornava-se cada vez mais delicada, pois o antigetulismo tradicional da força
aérea evoluía para uma aberta contestação ao governo, claramente expressa nas
reuniões que se sucediam no Clube da Aeronáutica desde a morte do major Vaz.
No
dia 9 de agosto, o ministro Nero Moura convocou todos os brigadeiros do Rio de
Janeiro para uma reunião no ministério. Durante a reunião, o ministro deu conta
de que tinha ordem do presidente da República para assegurar o empenho do
governo em descobrir a verdade sobre o atentado da rua Toneleros. Terminada a
reunião, o brigadeiro Eduardo Gomes, o chefe militar mais popular entre a
oficialidade da força aérea, declarou que, na sua opinião, deveria ser dada
publicidade a uma nota através da qual os demais oficiais tomassem conhecimento
do assunto, afirmando inclusive já possuir um texto pronto. Havendo a sugestão
de que tal nota fosse aclamada de imediato, já que fora redigida pelo líder da
classe, o brigadeiro Epaminondas Gomes dos Santos protestou, afirmando que não
tinha líderes nem era liderado por ninguém: segundo ele, essa nota era política
e estava sendo aproveitada para fins eleitorais pela UDN.
A 10 de agosto, os oficiais antigetulistas, encabeçados por
Eduardo Gomes e Juarez Távora, comandante da Escola Superior de Guerra,
exigiram que o ministro da Guerra, general Zenóbio da Costa, solicitasse a
renúncia do presidente. O ministro da Guerra recusou-se, comprovando, assim, a
divergência de opiniões existentes entre a oficialidade.
Na noite de 12 de agosto, por sugestão do coronel Adil, o
ministro Nero Moura baixou uma portaria instaurando um inquérito
policial-militar (IPM), sobre o atentado da Toneleros a ser conduzido
diretamente pela Força Aérea Brasileira (FAB) e dirigido pelo próprio coronel
Adil. A partir daí, militares da Aeronáutica passaram a atuar de maneira cada
vez mais incisiva na elucidação do atentado, prendendo e interrogando membros
da guarda pessoal de Vargas, e revistando dependências do palácio do Catete.
Tal foi a desenvoltura com que o IPM agiu, que ficou conhecido como República
do Galeão, em alusão à base aérea onde estava sediado.
Em
meio à crise político-militar, Nero Moura, no dia 16 de agosto, pediu demissão
do ministério. Sua saída foi atribuída ao fato de que, por manter vínculos
pessoais com Vargas, encontrava-se desprestigiado na FAB. Para substituí-lo,
Vargas chamou o brigadeiro Altair Rozsanyi, que declinou do convite.
Acreditando que o clima de tensão reinante na Aeronáutica só poderia ser
dissipado, ou pelo menos atenuado, caso o seu substituto fosse alguém não
identificado com o governo e, de preferência, detentor da confiança de Eduardo
Gomes, Nero Moura sugeriu a Vargas o nome do brigadeiro Henrique Dyott Fontenelle,
muito considerado entre seus companheiros de farda. O presidente concordou com
a indicação, desde que Fontenelle mantivesse em seus postos os oficiais que
integravam o gabinete anterior. Procurado pelo ministro demissionário,
Fontenelle aceitou os termos da proposta.
Entretanto, na manhã de 18 de agosto, o chefe do Gabinete
Civil da Presidência da República, Lourival Fontes, informou a Nero Moura que
Vargas, contrariando a combinação anterior, convidara o brigadeiro Epaminondas
Gomes dos Santos para assumir a pasta. Além de inimigo pessoal de Eduardo
Gomes, o ministro escolhido era extremamente impopular dentro da corporação. Em
depoimento ao Cpdoc, Nero Moura atribuiu essa repentina mudança de Vargas às
pressões exercidas por elementos do governo — entre os quais o ministro da
Guerra, general Zenóbio da Costa — contrários a qualquer entendimento com a
oposição. Nesse mesmo dia, o brigadeiro Epaminondas Gomes dos Santos deixou o
comando da III Zona Aérea, sendo substituído pelo major-brigadeiro Álvaro
Hecksher, para assumir o ministério.
No Ministério da Aeronáutica
A
crise político-militar agravou-se ainda mais com a nomeação do novo ministro da
Aeronáutica, pois ela foi interpretada como uma provocação à oposição e um
desafio ao brigadeiro Eduardo Gomes e às classes armadas.
No dia 22 de agosto, um grupo de oficiais da Aeronáutica
liderado por Eduardo Gomes lançou um manifesto exigindo a renúncia de Vargas.
Zenóbio da Costa contava ainda poder organizar uma resistência contra os
oficiais-generais rebelados, que agora representavam a quase totalidade da
Aeronáutica e da Marinha e grande parte do Exército.
Nessa ocasião, Epaminondas Gomes dos Santos reiterou
publicamente seu empenho na defesa dos poderes constituídos e,
conseqüentemente, da pessoa de Vargas. Afirmou mais uma vez que a UDN estava se
apoderando do episódio ocorrido na rua Toneleros para fins eleitorais e que,
assim sendo, não apoiaria a proposta de renúncia do presidente. Após o
manifesto dos oficiais da Aeronáutica, Epaminondas Gomes dos Santos, a mando de
Zenóbio da Costa, foi até o Catete informar os auxiliares de Vargas sobre a
situação.
Ainda
no dia 22, o chefe do Gabinete Militar, general Aguinaldo Caiado de Castro, distribuiu
à imprensa uma nota informando que as forças armadas respeitariam seus deveres
constitucionais. Esse propósito foi reafirmado pelo ministro da Aeronáutica
durante seu encontro com Vargas, a quem assegurou que, salvo algum imprevisto
incontrolável, a força aérea se manteria em ordem e solidária ao presidente. No
entanto, ao contrário do que ele acreditava, a Aeronáutica fugira inteiramente
ao seu controle e estava coesa em torno de Eduardo Gomes. Quando não conseguiu
sequer entrar no prédio do seu ministério, controlado pelos oficiais hostis ao
governo, o ministro da Aeronáutica sugeriu que a solução poderia estar na
prisão de Eduardo Gomes e de Juarez Távora, mas Zenóbio da Costa repeliu essa
hipótese.
Depois de recusar-se a renunciar, Vargas declarou que iria
convocar seu ministério para que esse deliberasse a respeito. Reunindo o
ministério no dia 23, as opiniões se polarizaram: de um lado, os ministros
militares opinaram que a única saída seria mesmo a renúncia, enquanto outros,
como o ministro da Justiça, Tancredo Neves, e a filha do presidente, Alzira
Vargas do Amaral Peixoto, exortaram à resistência a qualquer custo. Epaminondas
Gomes dos Santos e Zenóbio da Costa finalmente convenceram-se da necessidade do
afastamento temporário de Vargas, que aceitou a proposta e retirou-se para seus
aposentos, onde se suicidou às primeiras horas da manhã de 24 de agosto.
Após o suicídio de Vargas, foi solicitada a presença do
ministro da Aeronáutica no palácio das Laranjeiras, onde João Café Filho, que
assumira a presidência da República, comunicou-lhe sua exoneração. Epaminondas
Gomes dos Santos transmitiu a pasta da Aeronáutica para Eduardo Gomes ainda no
dia 24, quando completava apenas sete dias no cargo de ministro, e passou para
a reserva, no posto de marechal-do-ar.
Mais tarde, começou a exercer atividade político-partidária,
ingressando no PTB, cuja comissão executiva nacional integrou a partir de 1958.
Em outubro de 1962 concorreu às eleições para deputado federal pelo estado da
Guanabara na legenda do PTB, mas obteve apenas a terceira suplência. Após o
desfecho do movimento político-militar de março de 1964, que depôs o presidente
João Goulart, e a cassação, entre outros parlamentares, de vários integrantes
da bancada do PTB da Guanabara na Câmara dos Deputados, tentou no dia 10 de
abril assumir o mandato. Proferiu na Câmara um discurso em que se dizia
trabalhista e fiel aos ideais de Vargas, mas foi cassado no dia 14. Em carta ao
então presidente Humberto Castelo Branco, protestou contra a medida de exceção.
Mais tarde, tentou inutilmente reaver o mandato na Justiça.
Faleceu na cidade do Rio de Janeiro no dia 11 de julho de
1978.
Foi casado com Letícia Mattano Gomes dos Santos, com quem
teve um filho.
FONTES: ALMEIDA
JÚNIOR, A. Declínio; ARQ. CLUBE 3 DE OUTUBRO; ARQ. DEP. PESQ. JORNAL DO BRASIL;
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