GUIMARÃES,
Napoleão de Alencastro
*militar; rev. 1930; sen. DF
1951-1954; min. Trab. 1954-1955; sen. DF 1955-1959.
Napoleão de Alencastro Guimarães nasceu em São Sebastião do Caí (RS) no dia 29 de março de
1899, filho do capitão Pedro de Alencastro Guimarães e de Leopoldina Cardoso de
Alencastro Guimarães. Seu irmão Adolfo Cardoso de Alencastro Guimarães foi
embaixador brasileiro na Itália de 1956 a 1960.
Após cursar o Colégio Militar de Porto Alegre, sentou praça
em 1918, ingressando em seguida no curso de infantaria da Escola Militar do
Realengo, no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, pela qual foi declarado
aspirante-a-oficial em janeiro de 1921. Promovido a segundo-tenente em maio
desse ano e a primeiro-tenente no final de 1922, cursou ainda a Universidade
Técnica de Porto Alegre, pela qual se diplomou engenheiro geógrafo,
matriculando-se em 1929 no curso da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais do
Exército.
Com
a derrota da Aliança Liberal nas eleições de 1º de março de 1930, tiveram
início as articulações para preparar em vários pontos do país a revolta armada,
finalmente iniciada em 3 de outubro. As sucessivas vitórias no Sul do país
levaram as forças revolucionárias a marcharem em direção à capital federal. No
Rio de Janeiro, em 24 de outubro, três oficiais de alta patente — os generais
Augusto Tasso Fragoso e João de Deus Mena Barreto e o almirante Isaías de
Noronha —, antecipando-se aos rebeldes, depuseram o presidente Washington Luís,
formando então a junta provisória que passou a governar o país.
Deposto
Washington Luís, o tenente Alencastro Guimarães assumiu a chefia da Repartição
Geral dos Telégrafos do Rio de Janeiro, departamento que vinha sendo dirigido
interinamente por Conrado Müller Campos. Ainda nos primeiros momentos de
atuação da junta provisória, as notícias sobre a situação no Rio de Janeiro
eram contraditórias: ora anunciavam completa ordem na cidade, ora alertavam
para a “interferência perturbadora de elementos comunistas”, que procuravam
provocar choques entre as unidades da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros,
de um lado, e as do Exército, de outro. No dia 26 de outubro, Alencastro
Guimarães, juntamente com o tenente Artur da Costa e Silva, telegrafou para
Salvador a fim de colocar o “tenente” Juarez Távora, comandante militar da
revolução no Norte e Nordeste do país, a par dos acontecimentos, concitando-o a
vir para o Rio de Janeiro. Na verdade, reinava na coluna revolucionária
proveniente do Sul, sob o comando de Getúlio Vargas, grande desconfiança sobre
as intenções da junta governativa, que afinal concordou — sob pressão da
superioridade bélica dos gaúchos — em entregar o poder a Vargas no dia 3 de
novembro.
Estabelecido o Governo Provisório de Vargas, Juarez Távora
assumiu provisoriamente a pasta da Viação e Obras Públicas. Encontrando-se à
disposição deste ministério, o tenente Alencastro Guimarães foi designado chefe
do gabinete do diretor dos Telégrafos e representante do ministro junto à diretoria
dos Correios tendo feito sempre, em ambas as funções, o controle das
comunicações.
Nos primeiros meses de 1931 criaram-se diversas agremiações
revolucionárias e, em maio, foi fundado o Clube 3 de Outubro, congregando as
correntes tenentistas partidárias da manutenção e do aprofundamento das
reformas instituídas pela Revolução de 1930. Alencastro Guimarães tornou-se um
dos primeiros membros da organização e, em outubro do mesmo ano, foi promovido
a capitão.
Em 1932, a oposição entre as correntes políticas tradicionais
de São Paulo, de um lado, e as forças tenentistas e o governo federal que as
apoiava, de outro, atingiu o seu clímax. Com a eclosão da Revolução
Constitucionalista em julho, Alencastro Guimarães reintegrou-se ao Exército,
participando dos combates contra os rebeldes no destacamento de Parati (RJ). O
conflito terminou em outubro, com a derrota das forças constitucionalistas.
Em junho do ano seguinte, foi criado o Instituto de
Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM), do qual Alencastro Guimarães foi
o primeiro presidente e organizador. A criação do IAPM foi responsável pela
introdução de uma nova sistemática no âmbito previdenciário, ou seja, a do
agrupamento de profissões afins em um mesmo órgão. Logo em seguida surgiram
novos institutos, como o dos comerciários (maio de 1934) e o dos bancários
(julho de 1934), entre outros.
A
partir de 1934 Alencastro Guimarães tornou a ficar à disposição do Ministério
da Viação e Obras Públicas, só interrompendo a licença em 1935, por ocasião da
Revolta Comunista de novembro desse ano: nessa oportunidade apresentou-se como
voluntário, tendo combatido integrado ao 2º Batalhão de Caçadores. Durante o
período em que esteve em disponibilidade, atuou ainda como depositário judicial
(liquidante) da frota penhorada da empresa de navegação comercial Lóide
Brasileiro — encampada pela União em 1937 —, como membro do Conselho Consultivo
do Distrito Federal e como diretor técnico do Lóide Nacional.
Missão nos Estados Unidos
Promovido
a major em maio de 1939, Alencastro Guimarães foi nomeado no ano seguinte chefe
de gabinete do ministro da Viação e Obras Públicas, João de Mendonça Lima. No
exercício desse cargo viajou por diversas vezes aos Estados Unidos a fim de
adquirir material ferroviário, rodoviário e navios-tanques. Entre junho e
agosto do ano seguinte escreveu de Nova Iorque várias cartas a Getúlio Vargas,
abordando não apenas a repercussão do discurso do presidente brasileiro —
pronunciado no dia 11 de junho e considerado favorável ao nazismo — e as
questões relativas à sua missão, mas também a posição dos Estados Unidos em
relação ao Brasil e a preocupação norte-americana com a influência nazista na
América do Sul. Transmitiu também a informação de Herman Greenwood —
representante da United States Steel ligado às negociações para o financiamento
da siderurgia brasileira — acerca da disposição dos Estados Unidos em conceder
créditos para a indústria brasileira do aço. A partir de agosto, dedicou-se a
traçar as linhas gerais da posição a ser defendida pelo Brasil na Conferência
Interamericana de Navegação, junto com o representante brasileiro no conclave,
capitão Mário Celestino. Para tanto, manteve ainda diversos contatos com a
embaixada brasileira em Washington.
Entre
1940 e 1943, atuou como membro do Conselho Federal de Comércio Exterior,
integrando ainda o seu conselho pleno, de 1941 a 1943, e o conselho da Câmara
de Produção, em 1941. Nomeado em 1942 diretor da Estrada de Ferro Central do
Brasil (EFCB), em novembro desse ano ficou acertada sua viagem aos Estados Unidos
para resolver diversos assuntos de interesse da EFCB, como o fornecimento de
trilhos e material para a conexão das linhas da Central com as do Leste
brasileiro e destas com as da Great Western. O estabelecimento desta ligação
assumiu naquele momento — poucos meses após a declaração de guerra do Brasil
aos países do Eixo grande importância e urgência, já que asseguraria o tráfego
interno, ameaçado pela incursão de submarinos alemães nas costas brasileiras,
criando sérios entraves à navegação de cabotagem.
Na realidade, a missão de Alencastro Guimarães, decidida pelo
próprio presidente da República, destinava-se basicamente a apressar uma
decisão por parte dos norte-americanos, uma vez que o problema da ligação
ferroviária do Sul com o Norte do país já fora definido anteriormente como
contrapartida da colaboração prestada pelo governo brasileiro no âmbito do
esforço de guerra: 13 navios brasileiros, além de alguns vapores de passageiros
— estes para o transporte de tropas — já haviam sido cedidos aos Estados
Unidos. Já no início de 1943, Alencastro Guimarães escrevia a Vargas para
colocá-lo a par do andamento de sua missão. Embora tivesse resolvido
satisfatoriamente questões como a do carvão, dos seguros e de diversos outros
equipamentos, estava encontrando certa dificuldade em obter os trilhos para
Montes Claros.
Retornando ao Brasil ainda em 1943, foi designado membro da
Câmara de Intercâmbio de Comércio, Crédito, Câmbio e Propaganda do Conselho
Federal de Comércio Exterior, função que acumulou com a diretoria da Central do
Brasil. Nesse período serviu na Comissão da Carta Geral da República,
encarregada do mapeamento dos territórios brasileiros pouco (ou nada)
conhecidos. Em 1945 tornou-se membro da Câmara de Distribuição e Mercado
Interno do Conselho Federal de Comércio Exterior. No dia seguinte à deposição
de Vargas, em 29 de outubro desse ano, deixou a diretoria da Central do Brasil
e apresentou ao Exército seu pedido de transferência para a reserva, sendo
reformado poucos dias depois no posto de tenente-coronel e designado em
seguida, mais uma vez, membro do conselho pleno do Conselho Federal de Comércio
Exterior.
No PTB
Tendo assumido o governo no mesmo dia da deposição de Vargas,
José Linhares, presidente do Supremo Tribunal Federal, manteve a data das
eleições presidenciais, já marcadas para 2 de dezembro de 1945. O início de
novembro foi marcado pela intensificação de esforços dos aliados de Vargas no
sentido de que este se pronunciasse em favor da candidatura do general Eurico
Dutra pelo Partido Social Democrático (PSD): segundo esses políticos, Dutra
somente teria possibilidade de derrotar o candidato da União Democrática
Nacional (UDN), o brigadeiro Eduardo Gomes, caso obtivesse o apoio de Vargas.
No dia 8 de novembro de 1945, Alencastro Guimarães, agora
filiado ao Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), aproveitando a ida de Hugo
Borghi à fazenda da família Vargas em São Borja (RS), escreveu a Getúlio
fazendo a avaliação das possibilidades dos partidos diante da próxima eleição
presidencial. Em sua análise, defendeu a idéia de que qualquer resultado
eleitoral dependeria do que Vargas decidisse quanto às candidaturas: caso
permanecesse neutro, ou contra Dutra, o pleito seria ganho por Eduardo Gomes, e
dificilmente os trabalhistas fariam a maioria, ou mesmo um grupo ponderável, no
Congresso. Defendendo a realização de um acordo formal com Dutra, afirmou ainda
que somente assim os getulistas poderiam obter a maioria no novo ministério,
bem como as funções correspondentes, além do apoio para a conquista dos
governos estaduais. Vargas deu uma resposta evasiva, afirmando que seus
correligionários deveriam manter os compromissos assumidos e ressaltando a
necessidade de reforçar o PTB, de modo a que o partido tivesse condições
próprias para lutar e subsistir, muito embora ele, Vargas, estivesse disposto
apenas a acompanhá-lo, e não a dirigi-lo.
Poucos dias depois, Alencastro Guimarães escreveu nova carta
a Vargas renovando seu pedido de apoio à candidatura de Dutra. Informou também
ter sido visitado no dia 12 de novembro pelo general Dutra, o embaixador João
Neves da Fontoura — coordenador do apoio de Vargas à candidatura do militar —,
João de Segadas Viana — líder da ala petebista favorável ao apoio à candidatura
de Eduardo Gomes, sem qualquer consulta prévia a Getúlio —, e Paulo Baeta
Neves, presidente do diretório do PTB, entre outros.
Nesse encontro, pressionados pelo tempo — já que naquele
mesmo dia o PTB se reuniria para decidir o registro da candidatura presidencial
—, discutiram a possibilidade do apoio do PTB a Dutra. Durante a reunião,
segundo a carta enviada por Alencastro Guimarães a Vargas, foi proposto que em
troca de simples adesão do PTB a Dutra, este assegurasse ao partido a pasta do
Trabalho em seu ministério além de um número de pastas proporcionais ao número
de votos obtidos pelo partido em comparação com os que receberia o PSD, e o
direito de escolha dos prefeitos e interventores onde o PTB obtivesse maioria.
Essa proposta, defendida por Alencastro Guimarães e João Neves da Fontoura, não
encontrou receptividade entre os demais líderes petebistas, que preferiram
deixar a decisão para a convenção do partido. Esta deliberou, por fim, não
registrar candidato próprio.
Em sua carta, Alencastro Guimarães afirmou a Vargas que,
embora fosse grande a dificuldade da maioria do partido em aceitar a
candidatura Dutra, ela deveria receber o apoio petebista, já que Dutra e o PSD
“apoiariam o PTB contra as perseguições do ‘governicho’ atual”, além de evitar
o banimento e a cassação dos direitos políticos de Vargas, que estariam sendo
planejados pela UDN e por alguns membros do governo. Como último argumento,
enfatizou a necessidade de dar ao PTB o tempo necessário para sua articulação e
organização: caso fosse eleito, Dutra necessitaria de apoio no Congresso, o que
possibilitaria aos trabalhistas negociar num mesmo plano. Poucos dias depois,
Getúlio Vargas divulgou um manifesto no qual determinava a seus
correligionários que apoiassem a candidatura de Dutra, finalmente eleito no dia
2 de dezembro.
O primeiro ano do governo Dutra foi marcado politicamente
pela elaboração da nova Constituição, finalmente aprovada em 17 de setembro de
1946. Marcaram-se então para 19 de janeiro do ano seguinte as eleições para a
escolha de governadores, deputados estaduais, prefeitos e vereadores. Nessa
oportunidade, Alencastro Guimarães apresentou sua candidatura na legenda do PTB
à Câmara de Vereadores do Distrito Federal, tendo sido eleito com 4.842 votos.
Iniciadas
as articulações visando à definição das candidaturas que concorreriam ao pleito
presidencial de 1950, começou a ganhar força a candidatura Vargas. Seu
lançamento oficial na legenda do PTB ocorreu em junho desse ano, mas em agosto,
às vésperas do prazo de encerramento para o registro das candidaturas, ainda
não havia sido escolhido seu companheiro de chapa. Já em fins desse mês, Vargas
mostrava-se inclinado a convidar o general Pedro Aurélio de Góis Monteiro que
participara de sua deposição em 1945 para a vice-presidência, visando com isso
a neutralizar a campanha que se vinha fazendo, inclusive entre os militares,
para impedir sua eleição. Alencastro Guimarães, segundo Café Filho em suas
memórias, alertou Vargas para a possibilidade de um desgaste do PTB carioca
caso insistisse nessa escolha. A divulgação pelos jornais do dia 1º de setembro
da notícia do convite feito ao general Góis Monteiro acabou por provocar um
início de dissidência, que forçou a direção trabalhista a decidir-se pela
adoção do nome do representante do Partido Social Progressista (PSP), o
deputado federal João Café Filho, como candidato à vice-presidência.
No Senado
O pleito de 3 de outubro de 1950, que deu a vitória a Vargas
e Café Filho, escolheu também os chefes dos executivos estaduais e os
representantes ao Congresso. Candidato ao Senado na legenda do PTB, Alencastro
Guimarães foi eleito com 282.874 votos, tomando posse em fevereiro do ano
seguinte.
Em dezembro de 1951, ao final do primeiro ano de seu governo,
Vargas enviou ao Congresso um projeto propondo a criação de uma sociedade de
economia mista como solução para o problema do petróleo. Esse projeto, contudo,
só veio a receber a aprovação do Congresso após um longo período de debates:
embora Vargas e seus assessores já esperassem reações desfavoráveis à solução
proposta, não lhes foi possível prever o comportamento que assumiriam seus
adversários políticos, membros da UDN, e muito menos que o projeto original da
Petrobras encontraria oposição até mesmo dentro do PTB. Por outro lado, mesmo
contando com a maioria nominal na Câmara, Vargas preferiu aceitar as emendas da
oposição, que propunham a adoção do monopólio estatal.
O projeto da Petrobras foi enviado ao Senado em setembro de
1952. Aí, os senadores Alencastro Guimarães, Francisco de Assis Chateaubriand,
do PSD da Paraíba, e Oton Mäder, da UDN do Paraná, dentre outros, colocaram-se
contra o monopólio estatal no setor do petróleo, insistindo na adoção de uma
terceira fórmula, baseada no regime das concessões. Ao serem formadas as
comissões técnicas, coube a Alencastro Guimarães — que desde o início dos
debates discordara da diretriz traçada pela direção do PTB — presidir a de
Transportes, Comunicações e Obras Públicas. Após detalhada discussão, essa
comissão emitiu parecer favorável à emenda apresentada pelo senador Oton Mäder
no sentido de fixar-se a possibilidade de admissão de empresas privadas na
exploração do petróleo no Brasil. De modo geral, durante a discussão do projeto
no Senado predominou a concepção empresarial do problema do petróleo, ao
contrário do que ocorrera na Câmara dos Deputados, onde foram mais discutidos
os aspectos técnicos e políticos. Sendo enviado de volta à Câmara em julho de
1953, o projeto apresentava 32 emendas que lhe alteravam o caráter em pontos
básicos. A Câmara, no entanto, insistiu no princípio do monopólio estatal
finalmente incorporado à lei sancionada por Vargas em 3 de outubro de 1953.
Em
1954, Alencastro Guimarães colaborou com o jornal O Mundo, então sob a
influência peronista. Entre abril desse ano e setembro de 1955 presidiu a Comissão
de Imposto Sindical.
Ministro do Trabalho
O governo constitucional de Vargas foi pontilhado de crises,
que concluíram numa grande ofensiva contra o presidente depois do atentado
praticado na madrugada de 5 de agosto de 1954, quando elementos ligados à
guarda pessoal de Getúlio, tentando alvejar o jornalista Carlos Lacerda,
assassinaram o major-aviador Rubens Vaz. O Ministério da Aeronáutica avocou a
si a realização do inquérito sobre o atentado, instaurando a chamada “República
do Galeão”. À medida que se desenrolava o inquérito, aumentavam as pressões
sobre o presidente, principalmente por parte de determinados setores militares.
Na madrugada do dia 24, Vargas realizou a última reunião com o ministério, na
qual anunciou sua decisão de pedir licença do cargo. Na manhã seguinte, chegou
a notícia de que seu irmão Benjamim Vargas fora intimado a depor no inquérito
do Galeão. Poucas horas depois, Vargas se suicidava.
A
grande mobilização popular então ocorrida em todo o país, especialmente no Rio
de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, desarticulou a ofensiva contra o governo
e inviabilizou a concretização da propalada intervenção militar: Café Filho
tomou posse no próprio dia 24 de agosto. No Senado, neste mesmo dia, Alencastro
Guimarães proferiu veemente discurso de exaltação a Vargas, tendo-lhe cabido a
leitura da carta-testamento deixada pelo presidente.
Enquanto
isso, nos primeiros momentos de seu governo, Café Filho tomava conhecimento de
que os sindicatos operários estavam sendo percorridos pelo que considerou
“agitadores”, que lhe atribuíam a decisão de nomear um dos diretores da
Associação Comercial para o Ministério do Trabalho com a incumbência de revogar
a legislação social existente. Segundo suas memórias, Café Filho, ao perceber
os efeitos que esse tipo de boato poderia provocar no meio operário, decidiu
afastar Hugo de Faria — que, desde o início do ano, por ocasião do afastamento
de João Goulart, ocupava interinamente a pasta — do Ministério do Trabalho,
substituindo-o por uma figura mais ligada ao trabalhismo. Por intermédio do
senador Artur Bernardes Filho, Café Filho entrou em contato com Alencastro
Guimarães, convidando-o para a pasta. No mesmo dia 24 de agosto, foi assinado o
decreto de sua nomeação. Como ministro, Alencastro passou a integrar o Conselho
de Segurança Nacional (CSN).
No início de janeiro de 1955, Café Filho viajou à Bolívia,
onde, junto com o presidente boliviano Victor Paz Estensoro, inaugurou o último
trecho da estrada de ferro Corumbá (Brasil-Santa Cruz de la Sierra, Bolívia).
Nessa ocasião, Estensoro, considerando a reiterada inadimplência do Brasil,
propôs a completa revisão do tratado de 25 de fevereiro de 1938 sobre o
petróleo boliviano: a assinatura do acordo já completara 17 anos, e nada havia
sido feito com relação à exploração do produto. Com o reexame do tratado,
pretendia liberar a faixa de terra que havia sido reservada por aquele
documento para a prospecção e exploração de petróleo por empresas mistas de
ambos os países, possibilitando assim que empresas unicamente bolivianas
atuassem também nessa área.
No dia 4 de março de 1955, o CSN debateu a revisão do tratado
de 1938. O chefe do Gabinete Militar, general Juarez Távora — também
secretário-geral do CSN —, sustentou que, antes de se tomar qualquer decisão,
era preciso avaliar se o país possuía condições financeiras para iniciar os
trabalhos. O ministro da Fazenda, Eugênio Gudin, declarou então ser
praticamente impossível desviar recursos para o setor, já que as emissões de
dinheiro haviam sido restringidas e as reservas cambiais eram insuficientes. Em
vista disso, o ministro da Guerra, general Henrique Teixeira Lott,
manifestou-se a favor da desistência da garantia geográfica obtida com o
tratado e do estabelecimento de um outro, que assegurasse a compra do petróleo
excedente ao preço do mercado internacional.
Alencastro
Guimarães, assim como a maioria dos ministros, votou favoravelmente à revisão.
Aprovada a medida, Café Filho autorizou o ministro das Relações Exteriores a
desenvolver as gestões junto ao governo boliviano, após o que o CSN tornaria a
reunir-se. Por ocasião da queda do governo, em novembro de 1955, o exame do
assunto ainda não havia sido concluído, e somente em 1958 seria assinado o
chamado Acordo de Roboré, atualizando o tratado de 1938. No entanto, por abrir
espaço à atuação de empresas privadas na exploração do petróleo boliviano, o
ajuste suscitou grande controvérsia nos meios políticos do país, deixando de
ser implementado.
Pressionado pelo regime de contenção de despesas, Alencastro
Guimarães, ao contrário dos últimos titulares de sua pasta, concentrou sua
atenção no setor de indústria e comércio, embora não descuidasse dos assuntos
trabalhistas. Como ministro, visitou o Japão em missão de intercâmbio comercial
e concedeu integral apoio à “missão dos caixeiros-viajantes”, que visitou a
Europa para promover a venda de produtos brasileiros, objetivando o aumento das
exportações. No setor trabalhista, além de integrar a comissão técnica de
orientação sindical, regularizou a situação dos conselhos fiscais dos
institutos de aposentadoria e pensões, unificando ainda os serviços médicos da
previdência.
Em 1955, o Ministério do Trabalho teve de enfrentar
importantes greves no Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Em decorrência,
foi decretada a intervenção no Sindicato dos Ferroviários da Leopoldina, com
grande número também de prisões entre os trabalhadores da Light, reunidos em
sua sede no Sindicato dos Trabalhadores em Carris do Distrito Federal e a
anulação das eleições no Sindicato dos Trabalhadores Têxteis de São Paulo.
Ainda nesse ano, Alencastro Guimarães tornou pública a decisão do Poder
Judiciário relativa ao decreto de maio de 1947, pelo qual o então presidente
Dutra declarava suspenso o funcionamento da Confederação dos Trabalhadores do Brasil
e das uniões sindicais. Ainda em 1954, João Goulart, então titular da pasta do
Trabalho, Indústria e Comércio, contribuíra para o renascimento daquelas
organizações sob o nome de União Geral dos Trabalhadores (UGT). A decisão do
Judiciário em 1955, entretanto, determinou o fechamento definitivo da UGT e de
suas filiadas.
Em 3 de outubro de 1955, Juscelino Kubitschek e João Goulart
foram eleitos, respectivamente, para a presidência e a vice-presidência da
República. Predominava então a insistente suspeita de estar em articulação um
golpe de Estado contra a posse dos eleitos, e o súbito ataque cardíaco sofrido
por Café Filho, seguido de sua substituição por Carlos Luz, presidente da
Câmara dos Deputados, aumentou a agitação política. A tensão atingiu o auge
quando Carlos Luz demitiu do cargo de ministro da Guerra o general Lott, que
desencadeou uma contra-ofensiva através da mobilização militar e da deposição
do próprio Carlos Luz em 11 de novembro seguinte. No mesmo dia foi empossado na
presidência interina Nereu Ramos, substituto legal de Carlos Luz. Nessa
ocasião, o ministério se demitiu, e com ele Alencastro Guimarães, que reassumiu
então sua cadeira no Senado. Segundo o Diário de Notícias de 12 de novembro de
1955, o ministro do Trabalho, juntamente com o senador Nereu Ramos e o deputado
José Antônio Flores da Cunha, presidente da Câmara, foi um dos primeiros a
manifestar seu apoio ao ministro da Guerra. Este, contudo, em seu depoimento à
11ª Vara Criminal, em 27 de agosto de 1959, declarou que a presença de
Alencastro Guimarães, acompanhado do deputado Danton Coelho, visava apenas à
obtenção de maiores informações sobre a situação.
No
dia 20 de novembro de 1955, o general Lott entrevistou-se com Café Filho — que
ainda se encontrava internado — e comunicou-lhe que, na opinião do esquema
militar vitorioso, sua volta à presidência da República não seria conveniente.
Na tarde do dia seguinte, Café Filho deixou a casa de saúde onde se encontrava,
dirigindo-se para sua residência seguido de pequena comitiva, integrada, entre
outros, pelo brigadeiro Eduardo Gomes, o almirante Edmundo Amorim do Vale,
Alencastro Guimarães, Bento Munhoz da Rocha e José Eduardo do Prado Kelly.
Encontrou o local cercado por tropas do Exército, dada a sua insistência em
reassumir a presidência. Na madrugada do dia 22, o Congresso aprovou o
impedimento de Café Filho. Nessa ocasião, Alencastro Guimarães manifestou-se
contrário à medida.
Com o término de seu mandato em janeiro de 1959, retirou-se
da vida pública passando a escrever crônicas políticas para um matutino
carioca.
Durante sua vida pública, representou o governo brasileiro
junto ao Convênio de Navegação de Buenos Aires.
Faleceu no Rio de Janeiro no dia 21 de setembro de 1964.
Era casado e teve dois filhos.
O arquivo de Napoleão Alencastro Guimarães encontra-se
depositado no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do
Brasil (Cpdoc) da Fundação Getulio Vargas.
Regina da Luz Moreira
FONTES: ARQ. CLUBE
3 DE OUTUBRO; ARQ. GETÚLIO VARGAS; ARQ. MIN. EXÉRC.; CAFÉ FILHO, J. Sindicato;
CISNEIROS, A. Parlamentares; COHN, G. Petróleo; CORRESP. MIN. TRAB.; COSTA, M.
Cronologia; Encic. Mirador; ENTREV. GUEDES, P.; Grande encic. Delta; Grande
encic. portuguesa; HIRSCHOWICZ, E. Contemporâneos; MIN. GUERRA. Almanaque
(1932); MIN. GUERRA. Subsídios; MIN. TRAB. Documentário; NÉRI, S.16; Panfleto;
SENADO. Relação; SILVA, H. 1939; SILVA, H. 1945; SILVA, H. 1954; TÁVORA, J.
Vida; VÍTOR, M. Cinco.