GUILHEM,
Aristides
*militar; ch. EMA 1934-1935; min. Mar. 1935-1945.
Henrique Aristides Guilhem
nasceu no Rio de Janeiro, então capital do Império, em 26 de dezembro de 1875,
filho de Domingos Aristides Guilhem e de Teresa Francisca Fontes Guilhem.
Concluiu os cursos primário e secundário no Rio de Janeiro,
ingressando em novembro de 1891 na Escola Naval com o posto de aspirante a
guarda-marinha.
Interrompeu
os estudos quando eclodiu a Revolta da Armada, movimento de oposição ao governo
de Floriano Peixoto iniciado em 6 de setembro de 1893, no Rio de Janeiro, sob a
liderança do contra-almirante Custódio José de Melo. Em dezembro, o
contra-almirante Luís Filipe Saldanha da Gama, comandante da Escola Naval,
aderiu ao movimento, assumindo sua liderança e lançando um manifesto aos
camaradas da Marinha. O aspirante Aristides Guilhem também se engajou na
rebelião, participando, inicialmente, de ações na baía de Guanabara. Mais
tarde, zarpou, com a parte revoltada da Esquadra, rumo ao Rio Grande do Sul,
onde combateu ao lado dos federalistas também rebelados contra o governo de
Floriano Peixoto. No Sul, participou em junho de 1895 da batalha de Campo Osório,
em que morreu Saldanha da Gama.
Derrotada a revolta, foi considerado desertor e desligado da
Escola Naval. Entretanto, o governo concedeu anistia em agosto de 1895, e assim
Aristides Guilhem pôde retornar a seus estudos em fevereiro do ano seguinte. Em
novembro, foi promovido a guarda-marinha-aluno e, em 1897, seguiu para o
exterior, integrado à missão naval brasileira incumbida de negociar a
construção de novas unidades para a Esquadra em Newcastle, na Inglaterra.
Em
novembro de 1897, graduou-se no posto de guarda-marinha, embarcando, em
dezembro, no cruzador Almirante Barroso. Ainda em dezembro, foi promovido a
segundo-tenente. Um ano mais tarde, em dezembro de 1898, recebeu os galões de
primeiro-tenente e foi destacado para servir no cruzador Tiradentes. Em
seguida, serviu na flotilha de Mato Grosso, onde esteve embarcado no couraçado
Bahia e no navio Fernandes Vieira. Alcançou o posto de capitão-tenente em
dezembro de 1900.
Em
seguida, exerceu vários cargos e comissões. Em 1901, comandou o aviso (navio
auxiliar) Jutaí, a serviço da Comissão de Limites do Brasil com a Guiana
Francesa, o Peru e a Bolívia. Dois anos depois, em São Paulo, integrou a
Comissão de Levantamento das Plantas Hidrográficas do canal de São Sebastião e
da ilha do Bom Abrigo. Entre 1904 e 1906, esteve encarregado do trabalho de
levantamento da planta do porto do Rio de Janeiro, e depois foi
ajudante-substituto da Comissão de Reconhecimento do Alto Juruá, no Amazonas.
Em 1906, exerceu o comando geral das torpedeiras e o cargo de
instrutor de navegação da turma de segundos-tenentes embarcados no navio-escola
Benjamim Constant, com os quais partiu em viagem de circunavegação. Comandou,
no ano seguinte, a torpedeira Bento Gonçalves. Em 1910, viajou para a Europa em
missão de exame de torpedos, minas submarinas e submersíveis. Ainda na mesma
viagem, representou o Brasil no Congresso de Pesca realizado em Bordéus, na
França, em 1910, e no Congresso Internacional de Pesca, reunido em Roma no ano
seguinte.
Primeiro-diretor
da oficina tipográfica do Ministério da Marinha, criada em 1911 e depois
denominada Imprensa Naval, foi promovido a capitão-de-corveta, por merecimento,
em dezembro de 1912. De 1913 a 1914 comandou o contratorpedeiro Pará e, entre
1914 e 1915, esteve encarregado de estudar o código de sinais então em vigor,
apresentando um projeto substitutivo. Nesse mesmo período, foi designado
assistente e, mais tarde, chefe da 2ª e da 4ª seções do Estado-Maior da Armada.
Em 1915, presidiu a comissão incumbida de elaborar um projeto de regulamento
para o corpo de práticos dos rios da Prata, baixo Paraná e Paraguai.
Promovido a capitão-de-fragata em dezembro de 1917, comandou,
no ano seguinte, o cruzador Barroso e a Flotilha de Aviões de Guerra, além de
dirigir a Escola de Aviação Naval. Durante o governo de Delfim Moreira
(1918-1919), chefiou o gabinete do ministro da Marinha, almirante Antônio
Coutinho Gomes Pereira. Nessa condição, representou o Brasil nos festejos das
datas de independência da Argentina e do Uruguai.
De
1919 a 1920, foi assistente do Estado-Maior da Armada e comandante do
lança-minas Carlos Gomes. Durante a visita do rei Alberto, da Bélgica, ao
Brasil, em julho de 1920, Aristides Guilhem esteve à sua disposição como
ajudante-de-ordens. Em maio de 1921, foi promovido a capitão-de-mar-e-guerra,
tendo cursado a Escola Naval de Guerra e servido como oficial de ordens do
embaixador do Chile, Jorge Marta. Comandou até 1922 o encouraçado São Paulo e,
em 1923, a Flotilha de Lança-Minas. De 1924 a 1925, dirigiu a Escola de
Grumetes e a Escola de Aprendizes Marinheiros, em Angra dos Reis (RJ),
assumindo o comando da Escola Naval em 1926. Desempenhou interinamente, em
1928, a função de chefe do Estado-Maior da Armada e, de 1929 a 1930, a de
comandante da Flotilha de Contratorpedeiros. Entre 1931 e 1934, ocupou a
Direção Geral da Fazenda da Armada, período em que foi promovido a
contra-almirante, em outubro de 1932, e a vice-almirante, em agosto de
1934. No biênio 1934-1935, chefiou o Estado-Maior da Armada (EMA).
Ministro da Marinha
No
dia 19 de novembro de 1935, Aristides Guilhem foi nomeado ministro da Marinha
em substituição ao almirante Protógenes Guimarães, eleito para o governo do
estado do Rio de Janeiro. Alguns dias após a sua posse, ocorreu o levante da
Aliança Nacional Libertadora (ANL). Em face dos acontecimentos, exigiu, em
reunião ministerial ocorrida no dia 7 de dezembro, a punição dos implicados,
reclamando também a adoção de medidas de saneamento para evitar que tais fatos
se repetissem.
Juntamente com Getúlio Vargas, Francisco Campos, o general
Eurico Dutra, ministro da Guerra, e Newton Cavalcanti, compareceu em 22 de
setembro de 1937 à homenagem aos mortos da Revolta de 1935. Em seguida, foi
encarregado de examinar, com o ministro da Guerra, o Plano Cohen, suposto
projeto de conspiração comunista. O informe que os dois ministros militares
elaboraram acerca desse plano instruiu o pedido feito por Vargas ao Congresso,
no dia 1º de outubro, no sentido de reinstaurar o estado de guerra por 90 dias.
Tratava-se, como mais tarde se tornaria público, de um documento forjado pelo
Estado-Maior do Exército e por integralistas. Entretanto, serviu de pretexto
para que o presidente da República, alegando a iminência de um golpe comunista,
obtivesse do Congresso (2/10/1937) a decretação do estado de guerra.
Em
1º de novembro de 1937, em meio à conturbada situação político-militar
precipitada pela decretação do estado de guerra, assistiu, ao lado de Vargas e
de outras autoridades, a um desfile de militantes integralistas, no Rio de
Janeiro. Era grande, na ocasião, o número de simpatizantes do integralismo nas
fileiras da Marinha. Oficiais desta força participavam da Câmara dos 40 —
principal órgão político do movimento — e promoviam reuniões para ouvir Plínio
Salgado, chefe nacional integralista. Segundo Hélio Silva, 70% da Marinha
estavam inscritos na Ação Integralista Brasileira.
No dia 5 de novembro, participou no palácio Guanabara de uma
reunião com Getúlio Vargas, o general Dutra, o general Pedro Aurélio de Góis
Monteiro, chefe do Estado-Maior do Exército, e o capitão Filinto Müller, chefe
de polícia do Distrito Federal, em que o presidente da República comunicou aos
demais a exoneração do ministro da Justiça, José Carlos de Macedo Soares, e a
escolha de Francisco Campos para assumir a pasta.
Francisco Campos ocupava desde janeiro de 1934 o cargo de
consultor-geral da República, e havia preparado um texto constitucional para
ser apresentado como substitutivo à Assembléia Nacional Constituinte de 1934, o
que todavia não ocorrera. Entretanto, guardara o texto, de caráter autoritário,
e sua nomeação para o Ministério da Justiça em 8 de novembro de 1937 estava
diretamente ligada à imposição dessa Carta constitucional, imposição que seria
uma das iniciativas do golpe de Estado planejado por Getúlio Vargas.
Na noite do mesmo dia 8 de novembro, o almirante Guilhem
participou, na residência de Francisco Campos, de uma reunião com o novo
ministro da Justiça e os generais Dutra e Góis Monteiro para o exame da nova
Constituição, a fim de fazerem sugestões quanto ao texto referente às forças
armadas. Aprovada, a nova Constituição foi imposta no dia 10 de novembro, ao
mesmo tempo em que se fechava o Congresso, instituindo-se o Estado Novo.
Segundo Jatir de Carvalho Serejo, em Meu depoimento, após o
fechamento da Ação Integralista Brasileira em dezembro de 1937, Guilhem
solicitou a colaboração do comandante Aurélio de Azevedo Falcão e de outros
elementos integralistas da Marinha na organização da Casa do Marinheiro de
acordo com os moldes do “Departamento de Marinha Nacional”, seção naval
integralista que cuidava da doutrinação e da assistência social entre os seus
simpatizantes nessa corporação.
Em
1941, foi transferido para a reserva, continuando entretanto à frente do
Ministério da Marinha até a deposição de Vargas, pelos chefes militares, em
outubro de 1945, quando então, José Linhares, presidente do Supremo Tribunal
Federal e chefe provisório do governo que em janeiro do ano seguinte passaria
às mãos do general Eurico Gaspar Dutra — eleito ainda em dezembro de 1945
—, nomeou para o ministério o almirante Jorge Dodsworth Martins.
Guilhem
foi o ministro que mais tempo permaneceu nessa pasta. Em sua gestão, a
construção naval, paralisada desde os últimos anos do Império, recebeu
considerável impulso: os estaleiros da Marinha construíram lança-minas,
destróieres, embarcações classe “C” e contratorpedeiros condutores de flotilhas
da classe “M”. Além disso, providenciou a remodelação do encouraçado Minas
Gerais e do submarino Humaitá, adquirindo, no estrangeiro, submarinos e
navios-tanques para o transporte de óleo.
O conjunto dessas iniciativas possibilitou a intervenção da
Marinha brasileira na Segunda Guerra Mundial, em operações de defesa no
Atlântico Sul. A esquadra desincumbiu-se do policiamento da costa e dos portos
brasileiros, escoltou até a Europa a Força Expedicionária Brasileira (FEB) e
participou, em cooperação com a 4ª Esquadra norte-americana, de serviços de
comboios internacionais, encarregando-se sozinha dos comboios brasileiros. Com
a guerra, a Marinha teve 381 mortos, entre praças e oficiais, perdendo, em
atividade bélica, o navio-auxiliar Vital de Oliveira, a corveta Camaquã e o
cruzador Bahia.
No setor da aviação naval, sua administração cuidou da
instalação de campos de pouso ao longo de todo o litoral e deu início à
instrução de pouso cego e noturno. Construiu numerosas bases aéreas e preparou
cerca de 70 aviões Fock Wulff. Estendeu as linhas do Correio Aéreo Nacional,
edificou novos hangares e o aeródromo da Base do Rio Grande.
Guilhem
criou novos quadros de oficiais e subalternos, novos cursos para oficiais
intendentes e fuzileiros navais, e aumentou a lotação das Escolas de Aprendizes
Marinheiros. Inaugurou o edifício da Escola Naval, na ilha de Villegaignon, e
criou a Divisão de História Marítima, até então fora do âmbito de sua pasta.
Faleceu no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, no dia 3
de janeiro de 1949. Foi promovido post mortem a almirante-de-esquadra em 1951 e
a almirante de cinco estrelas em 1958.
Foi casado com Maria da Glória Carvalho Guilhem, com quem
teve um filho.
Escreveu o livro Conselho aos jovens oficiais (1951).
Renato Lemos
FONTES: ANDREA, J.
Marinha; ARQ. GETÚLIO VARGAS; CARONE, E. República nova; CONSULT. MAGALHÃES,
B.; CORRESP. SERV. DOC. GER. MAR.; Encic. Mirador; Grande encic. Delta;
Histórico; LEITE, A. História; LEVINE, R. Vargas; MACEDO, R. Efemérides; MIN.
GUERRA. Almanaque (1942); MIN. MAR. Almanaque (1934, 1939, 1941, 1944 e 1949);
PEIXOTO, A. Getúlio; SEREJO, J. Meu; SERV. DOC. GER. MARINHA; SILVA, H. 1935;
SILVA, H. 1937; VELHO SOBRINHO, J. Dic.