LUZARDO,
Batista
*rev. 1923; dep. fed. RS
1924-1930; rev. 1930; ch. pol. DF 1930-1932; rev. 1932; dep. fed. RS
1935-1937; emb. Bras. Uruguai 1937-1945; emb. Bras. Argentina 1945; const.
1946; emb. Bras. Argentina 1946-1947; dep. fed. RS 1947-1951; emb. Bras.
Argentina 1951-1953.
João Batista Luzardo nasceu
em Salto, distrito de Uruguaiana (RS), no dia 11 de dezembro de 1892, filho de
Severo Luzardo, coronel da Guarda Nacional, e de Margarida Aspestéguy. Em seu
batismo foi utilizada a letra S na grafia do seu sobrenome, o que explica a
alternância das duas formas. A família Luzardo exercia atividades ligadas ao comércio
na região fronteiriça com o Uruguai. O avô paterno, de origem basca, nascido
nas ilhas Canárias, trabalhava com o coronel Severo Luzardo no transporte de
mercadorias em carretas.
Batista
Luzardo perdeu a mãe durante os primeiros meses de vida, indo morar com uma tia
em Uruguaiana. Em 1904, ingressou no Colégio Santana, onde estudou até 1906,
transferindo-se para o Colégio Marista de Santa Maria (RS). Expulso em 1909 por
indisciplina, juntamente com dois colegas, filhos, respectivamente, do general
Fernando Setembrino de Carvalho e de Fernando Abbott, retornou então à estância
do pai, em Uruguaiana. Em 1910, mudou-se para Porto Alegre, matriculando-se na
sexta série do Colégio Júlio de Castilhos. No mesmo ano em que encerrou os
estudos preparatórios, cursou a primeira série da Faculdade de Medicina de
Porto Alegre na condição de aluno-ouvinte. Em dezembro de 1913, partiu para o
Distrito Federal para terminar os estudos na Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro,
Quando ainda cursava a 4ª série de medicina, Batista Luzardo
ingressou na Faculdade Livre de Direito do Rio de Janeiro, pela qual se
formaria em 1918. Terminando o curso de medicina em 1916, depois de estagiar em
várias instituições, participou, de 1917 a 1919, do combate à peste bubônica e
à gripe espanhola, que assolaram a capital federal.
Em outubro de 1919, Luzardo retornou a Uruguaiana, onde, em
janeiro do ano seguinte, abriu consultório. Em fevereiro, foram detectados
sinais de peste bubônica na cidade. Confirmado o surto da doença, Luzardo
dedicou-se intensamente a combatê-la, aproveitando a experiência obtida no Rio
de Janeiro. Organizou o serviço de visitação sanitária domiciliar, entrando em
contato pessoal com praticamente todas as famílias da cidade e tornando-se
muito popular.
A Revolução de 1923
Em
junho de 1922, Luzardo fundou, juntamente com Fernando Orcy, a Policlínica de
Uruguaiana. Em setembro, esteve prestes a se bater em duelo com José Antônio
Flores da Cunha, líder do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR) na região e
na época intendente de Uruguaiana, cargo equivalente ao de prefeito, que o
desafiou, para depois recuar, em função de críticas que fizera à sua
administração através da imprensa. Por essa época, tornou regular sua
colaboração no jornal oposicionista A Nação, de orientação federalista, onde
exercia crítica sistemática ao intendente. Em novembro de 1922, foi preso por
Flores da Cunha em virtude do violento editorial que escreveu protestando
contra a prisão de alguns federalistas, mas foi logo libertado graças à intermediação
de Sérgio Ulrich de Oliveira, um dos dirigentes republicanos da cidade.
O fim do ano de 1922 foi marcado no Rio Grande do Sul pela
eleição para a presidência do estado no dia 25 de novembro. O PRR pretendia
reeleger seu líder máximo, Antônio Augusto Borges de Medeiros, para um quinto
mandato consecutivo. A oposição, por seu turno, formada por federalistas e uma
ala republicana dissidente, uniu-se em torno da candidatura de Joaquim
Francisco de Assis Brasil, Luzardo, que não mantinha vínculos partidários
formais, votou com a oposição.
Realizado o pleito, foi eleito o candidato republicano.
Considerando o resultado fraudulento, Luzardo, juntamente com Raul Pilla e
Plínio Casado, tentou a sua impugnação. A oposição tentava obter a intervenção
do governo federal e, para isso, Assis Brasil viajou para o Distrito Federal
logo após as eleições, entrando em contato com o presidente Artur Bernardes.
Luzardo também viajou para a capital, onde discutiu com políticos ligados ao
presidente a possibilidade de eclosão de um levante armado para derrubar Borges
de Medeiros. O PRR havia apoiado a candidatura oposicionista de Nilo Peçanha à
presidência da República e por isso a oposição gaúcha contava com o beneplácito
de Bernardes na campanha contra Borges de Medeiros. Segundo o depoimento que
prestou ao seu biógrafo, Glauco Carneiro, foi durante essa estada no Rio de
Janeiro que, diante da vacilação do governo federal em intervir no Rio Grande
do Sul, Luzardo articulou com o deputado Artur Caetano da Silva e com o estancieiro
Adalberto Correia um plano insurrecional que seria deflagrado em Passo Fundo,
Quaraí, Alegrete e Uruguaiana no dia da posse de Borges de Medeiros na
presidência do estado, marcada para o dia 25 de janeiro de 1923.
A
insurreição estourou, no entanto, no dia 8 de janeiro, por iniciativa do
caudilho Leonel Rocha. No dia 24 Artur Caetano tomou Passo Fundo, à frente de
cerca de quatro mil homens que, embora mal armados, se declararam “dispostos a
só largar as armas quando Borges de Medeiros deixar o poder, a não ser que o
chefe da nação resolva intervir para reintegrar o Rio Grande do Sul no sistema
constitucional da União”, conforme telegrama enviado pelos rebeldes ao
presidente da República.
Durante
os três meses que se seguiram, Luzardo não interveio na guerra civil que se
alastrava pelo estado. Permaneceu clinicando e mantendo contatos políticos,
embora sob a vigilância cada vez mais rigorosa de Flores da Cunha, que já se
armara para enfrentar a rebelião em Uruguaiana. Somente em fins de março, diante
da aproximação das forças comandadas pelo “general” revolucionário Honório
Lemes, que já tomara Alegrete e se aproximava de Uruguaiana, Luzardo, depois de
escapar de uma tentativa de prisão encetada pelo intendente, incorporou-se às
tropas daquele caudilho.
A coluna comandada por Honório Lemes concentrou suas
operações na região fronteiriça com o Uruguai, praticando a guerra de
guerrilhas e enfrentando os efetivos legalistas chefiados por Flores da Cunha.
Em junho, Luzardo foi designado chefe do estado-maior da coluna rebelde,
substituindo o coronel Teodoro Meneses, que adoecera. Participou de todos os
combates importantes na zona norte do estado, como os de Ibirapuitã, Vista
Alegre, Poncho Verde, Quaraí, São Francisco de Assis e São Luís.
Enquanto
se desenrolavam os combates, favoráveis, no seu conjunto, aos legalistas, mais
numerosos e bem armados, o governo federal iniciou gestões no sentido de
pacificar a política gaúcha. Iniciadas por Augusto Tavares de Lira, ex-ministro
da Justiça e então juiz do Tribunal de Contas, as negociações resultaram no
acordo obtido pelo marechal Fernando Setembrino de Carvalho, ministro da
Guerra. O Pacto de Pedras Altas, firmado pelos republicanos e os revoltosos em
14 de dezembro de 1923, manteve Borges de Medeiros no poder, mas reformou um
artigo da Constituição estadual, vedando reeleição do presidente do estado, e
garantiu a indicação, por voto popular, do vice-presidente e dos intendentes
municipais. Luzardo, convidado por Assis Brasil e Honório Lemes, participou das
negociações, exercendo importante papel no sentido de convencer os chefes
militares rebeldes, que insistiam em prosseguir lutando, de que a situação
militar lhes era desfavorável e o acordo positivo.
Após
a pacificação do estado, Luzardo voltou a clinicar. A participação
revolucionária aumentara a sua popularidade. Quando as oposições gaúchas
realizaram o congresso de São Gabriel em janeiro de 1924 — durante o qual foi
fundada a Aliança Libertadora —, sua presença como delegado de Uruguaiana foi
alvo de muitas manifestações de simpatia. O congresso escolheu sete candidatos
a deputado federal, dos quais apenas Luzardo representava a corrente de
oposição radical ao presidente Artur Bernardes, estando os demais propensos a
apoiá-lo. Considerando sua eleição garantida, Luzardo integrou uma comissão que
percorreu diversas localidades gaúchas reforçando a campanha dos outros
candidatos. Realizado o pleito, foi o mais votado entre os libertadores eleitos
à Câmara dos Deputados.
O porta-voz dos revolucionários
Batista Luzardo transferiu-se para o Distrito Federal em maio
de 1924. Na Câmara, caracterizou-se por intransigente oposição ao governo
federal, votando contrariamente à decretação do estado de sítio pedida e obtida
por Artur Bernardes para combater o levante militar deflagrado no dia 5 de
julho desse ano. Irrompida em Sergipe, Amazonas e São Paulo, a revolta foi
dominada rapidamente nos dois primeiros estados. Em São Paulo, contudo, os
rebeldes, comandados por Isidoro Dias Lopes, ocuparam a capital por três
semanas, abandonando então a cidade e deslocando-se para o interior. Valendo-se
das imunidades parlamentares, Luzardo era, na Câmara, o divulgador das
atividades e reivindicações dos revolucionários. Durante um intervalo das
atividades parlamentares, reuniu em sua residência em Uruguaiana 17
representantes de guarnições militares sediadas no Rio Grande do Sul, dentre os
quais Luís Carlos Prestes, que tentavam articular um levante em apoio ao
movimento desencadeado em São Paulo. Esse levante seria afinal deflagrado em
outubro.
De volta ao Rio de Janeiro, Luzardo se engajou na conspiração
liderada pelo capitão-de-mar-e-guerra Protógenes Guimarães com o objetivo de
sublevar a Esquadra e depor Artur Bernardes em apoio aos rebeldes paulistas e
gaúchos. Luzardo foi incumbido da prisão do vice-presidente da República,
Estácio Coimbra. Contudo, Protógenes foi preso antes da deflagração do
movimento, prevista para o dia 21 de outubro de 1924, e Luzardo não chegou a
cumprir sua missão.
Embora a chamada Conspiração Protógenes tivesse sido
desarticulada pela prisão de seu líder e de diversos companheiros, outros
oficiais da Marinha deflagraram um levante em novembro seguinte. Liderados pelo
tenente Herculino Cascardo, os jovens oficiais tomaram o encouraçado São Paulo
e rumaram para o Uruguai, de onde foram se juntar aos rebeldes gaúchos.
Em
fevereiro de 1925, como membro da oposição, Luzardo foi convidado pelo deputado
João Simplício, emissário do presidente Artur Bernardes, a participar das
negociações de paz com os revolucionários paulistas, que se haviam concentrado
no Sul, e com os gaúchos. Em março, os dois parlamentares se reuniram com o
general Isidoro Dias Lopes, na cidade argentina de Posadas, mas não foi
possível qualquer tipo de acordo, pois o chefe revolucionário considerou que o
governo fazia propostas muito vagas. Um mês depois, as forças revolucionárias
paulistas e gaúchas se juntaram, sob a liderança de Luís Carlos Prestes e de
Miguel Costa, formando a Coluna Miguel Costa-Prestes, que percorreria o interior
do país através de 13 estados, combatendo as tropas legalistas até internar-se
na Bolívia e no Paraguai no início de 1927.
A
Coluna Prestes teve em Luzardo seu único divulgador e defensor na Câmara dos
Deputados. O jornal O Globo, recém-fundado e opositor do governo federal,
reproduzia em suas páginas os discursos em que eram transmitidas informações
relativas às atividades dos revolucionários, fornecidas pelos próprios a
Luzardo. Em maio de 1925, novamente oficiais identificados com os levantes
revolucionários tentaram depor Artur Bernardes. A ação, agora, tinha como
principal objetivo obter o apoio dos efetivos do 3º Regimento de Infantaria (3º
RI), no Rio de Janeiro. Luzardo, com mais dois companheiros, deveria efetuar
dessa vez a prisão de Estácio Coimbra, aguardando, como sinal para o início da
ação, que os oficiais, depois de tomar o 3º RI, disparassem uma salva de
metralhadoras. No entanto, o assalto à unidade militar foi rechaçado pela
guarda, resultando na morte do tenente rebelde Jansen de Melo. Na ausência do
sinal combinado, o grupo de Luzardo não concretizou a ação. Luzardo e outros
parlamentares foram presos, mas obtiveram em pouco tempo a liberdade por
interferência do ministro da Justiça, Afonso Pena Júnior.
Luzardo manteve-se na oposição ao presidente Artur Bernardes
até o final de seu governo, manifestando-se sistematicamente contra as
iniciativas do Executivo e especialmente contra o comportamento adotado em
relação aos movimentos rebeldes. Assim, votou na Câmara dos Deputados contra a
“moção de aplauso ao governo por ter dominado, em São Paulo, a revolução de
Isidoro Dias Lopes”; denunciou as precárias condições em que eram mantidos os
presos políticos, alguns confinados na ilha da Trindade, e opôs-se ao projeto
que autorizava a promoção, por atos de bravura, dos sargentos e alunos das
escolas militares que se haviam distinguido na repressão à revolta de São
Paulo.
Com
a ascensão de Washington Luís à presidência da República em 1926 e a extinção
do estado de sítio que marcou o governo anterior, Luzardo adotou uma posição
mais moderada. No entanto, permaneceu como porta-voz dos revolucionários na
Câmara, especialmente na discussão acerca da concessão da anistia política.
Reeleito pela Aliança Libertadora em maio de 1927, manifestou-se em agosto,
juntamente com outros parlamentares, contra um projeto de lei de autoria de
Aníbal Toledo que, a pretexto de combater o comunismo, restringia a liberdade
de pensamento. Participou, nessa época, de vários comícios com Joaquim
Francisco de Assis Brasil, Irineu Machado, Maurício de Lacerda, Otávio Brandão,
do então Partido Comunista do Brasil (PCB), e outros, e integrou também o
Núcleo de Defesa dos Princípios Constitucionais, formado, segundo o manifesto
de lançamento, “por elementos esquerdistas da imprensa, do Parlamento, das
profissões liberais, do funcionalismo, do comércio, da indústria, da lavoura,
do trabalho e do ensino secundário e superior” para a “salvaguarda dos
preceitos constitucionais” O Núcleo se engajou na luta contra o projeto de
Aníbal Toledo que, a despeito da campanha oposicionista, acabou sendo aprovado
vindo a ser conhecido como “Lei Celerada”.
Ainda durante o segundo semestre de 1927, alguns grupos de
oposição estaduais iniciaram articulações visando uma atuação conjunta. Luzardo
foi indicado por Assis Brasil para manter a ligação entre os libertadores e o
recém-fundado Partido Democrático (PD) paulista. Em março de 1928, a Aliança
Libertadora transformou-se no Partido Libertador (PL) por decisão do Congresso
de Bajé, com Assis Brasil na presidência, Raul Pilla na vice-presidência e
Luzardo participando do diretório central. O PL nascia ligado ao Partido
Democrático Nacional (PDN), federação de oposições estaduais criada por
iniciativa de Assis Brasil nesse mesmo ano.
Na Aliança Liberal
Enquanto os grupos oposicionistas intensificavam suas
articulações visando as eleições para a sucessão de Washington Luís, marcadas
para março de 1930, no Rio Grande do Sul o PL e o PRR se aproximaram ao longo
do ano de 1928, graças à eleição para presidência do estado (em novembro de
1927) do republicano Getúlio Vargas, considerado mais “liberal” do que a “velha
guarda” comandada por Borges de Medeiros. Na Câmara, porém, libertadores e
republicanos, por vezes, atuavam de maneira desencontrada diante do problema
sucessório. Na sessão de 12 de junho de 1929, por exemplo, o senador fluminense
Feliciano Sodré pronunciou-se contra as candidaturas de Antônio Carlos Ribeiro
de Andrada e de Getúlio Vargas, já lançadas por iniciativas isoladas em Minas
Gerais e no Rio de Janeiro. Na sessão seguinte, Luzardo respondeu a Feliciano
Sodré protestando contra a exclusão do republicano Borges de Medeiros da lista
de possíveis candidatos. Imediatamente, foi aparteado por João Neves da
Fontoura, do PRR, que alegou ser desnecessário o protesto do líder libertador,
já que Borges não era candidato e nem caberia ao Rio Grande do Sul apontar
nomes, mas sim aprovar aqueles indicados pela nação. A partir daí, em grande
parte pela iniciativa de Luzardo, o debate acerca da sucessão presidencial se
avolumou, tanto na Câmara quanto na imprensa.
Ainda
em junho de 1929, os líderes do Partido Republicano Mineiro (PRM) Afrânio de
Melo Franco e Antônio Carlos entraram em contato pessoal com Plínio Casado e
Batista Luzardo, solicitando o apoio do PL à candidatura de Getúlio Vargas à
presidência da República, já que o governo federal insistia em lançar o nome do
paulista Júlio Prestes, rompendo, assim, um dos acordos tácitos fundamentais da
política até então em vigor, pelo qual o próximo presidente deveria ser
mineiro. Consultada, a direção máxima do PL aceitou o acordo, exigindo em troca
a inclusão dos principais pontos de seu programa partidário na plataforma de
Vargas. O PRR e o PL formavam, dessa maneira, a Frente Única Gaúcha (FUG), voltada
para a eleição de um gaúcho à sucessão de Washington Luís. Nesse mesmo mês de
junho, a FUG e o PRM firmaram um pacto, inicialmente secreto, em torno da
candidatura de Vargas, recebendo a adesão da Paraíba, cujo presidente, João
Pessoa, foi lançado candidato à vice-presidência da República.
No
dia 31 de julho, o diretório central do PL reuniu-se em Bajé, oficializando o
seu apoio ao nome de Vargas e ao movimento que se formava em torno da
candidatura gaúcha. Imediatamente, os republicanos gaúchos se congratularam
publicamente com a resolução dos libertadores. Em agosto, formou-se a Aliança
Liberal, para cuja comissão executiva Luzardo foi eleito, juntamente com Afonso
Pena Júnior, Afrânio de Melo Franco, João Neves da Fontoura, Lindolfo Collor,
José Joaquim Seabra e outros. Em convenção realizada em setembro a Aliança
Liberal homologou a chapa Getúlio Vargas-João Pessoa. Também o Partido
Democrático Nacional (PDN), cujo diretório nacional Luzardo integrava, como
representante do PL, em convenção realizada nesse mesmo mês, resolveu apoiar a
chapa liberal.
A campanha eleitoral desenvolveu-se durante o segundo
semestre de 1929. Luzardo viajava constantemente a Minas Gerais, não apenas por
força das articulações políticas, como em virtude de um problema renal que,
iniciado em 1923, agora se agravara. A conselho médico, passava temporadas em
São Lourenço e Caxambu, estâncias hidrominerais mineiras. Também durante essas
estadas, prosseguia a campanha, realizando comícios e contatos políticos.
Na recepção a Vargas no Rio de Janeiro, em 30 de dezembro,
Luzardo foi um dos oradores indicados pela Aliança Liberal para discursar das
sacadas ao longo da avenida Rio Branco, onde não havia alto-falantes. O
discurso que proferiu na ocasião, iniciado com a indagação: “Quem vem lá?”,
tornou-se célebre peça de oratória.
Em janeiro de 1930, Luzardo partiu para o Norte, numa das
caravanas organizadas pela Aliança Liberal, juntamente com João Neves, Augusto
de Lima, Francisco Solano Carneiro da Cunha, Paulo Duarte e outros. A comitiva
foi subdividida em Recife, cabendo a Luzardo chefiar o grupo que percorreria o
interior de Pernambuco e os estados da Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará,
Piauí e Maranhão. As comitivas aliancistas enfrentaram sérios problemas criados
pelas forças situacionistas, que provocaram conflitos muitas vezes violentos.
Realizadas afinal as eleições, saiu vitoriosa a chapa Júlio
Prestes-Vidal Soares. A derrota dos candidatos da Aliança Liberal fez com que
se intensificassem as articulações já iniciadas por setores que, embora
participando da campanha, não acreditavam na possibilidade de vitória da
oposição e pregavam uma insurreição contra o governo federal. Segundo Virgílio
de Melo Franco, em Outubro, 1930, Luzardo, em conversa com ele no dia seguinte
à entrevista que Borges de Medeiros concedeu reconhecendo a legitimidade da
vitória da chapa situacionista, teria afirmado que “o Rio Grande do Sul estava
disposto a enveredar pelo caminho da revolução, uma vez que Minas e Paraíba se
dispusessem a acompanhá-lo”.
Na Revolução de 1930
De
volta ao Rio de Janeiro após as eleições, Luzardo precisou submeter-se a uma
intervenção cirúrgica, realizada em maio por Pedro Ernesto Batista, médico e
correligionário da Aliança Liberal e do PDN. Instalado em Uruguaiana para
recuperar-se, encarregou-se do trabalho de aliciamento das guarnições militares
dessa cidade e das vizinhas, mantendo, também, contatos com oficiais
revolucionários lotados no Sul, como João Alberto Lins de Barros, Osvaldo
Cordeiro de Farias e Newton Estillac Leal. Marcada a data da insurreição para o
dia 3 de outubro pelo comando supremo revolucionário, no qual se destacava
Getúlio Vargas, Luzardo detalhou o plano militar para as operações na
fronteira, responsabilizando-se pelo comando do destacamento de Uruguaiana,
além de unidades de Itaqui e Quaraí. Com ele, alinharam-se os principais chefes
libertadores da Revolução de 1923, à exceção de Honório Lemes, que faleceu no
dia 30 de setembro.
Iniciada a insurreição em Porto Alegre, Uruguaiana foi tomada
tranqüilamente por uma força composta de cerca de três mil homens civis e
militares. Luzardo, investido no posto de coronel por Pedro Aurélio de Góis
Monteiro, comandante militar geral das forças revolucionárias, dirigiu o
levante. No dia seguinte, atravessou a fronteira e foi a Paso de los Libres, na
Argentina, buscar o general Isidoro Dias Lopes, a quem conduziu à capital
gaúcha para encontrar-se com Vargas.
Nos
dias que se seguiram, a revolução foi vitoriosa na maioria dos estados. Em
meados de outubro, na região Sudeste, restavam em mãos do governo apenas o Rio
e São Paulo. Um destacamento comandado por Luzardo, que foi batizado com o seu
nome, foi incumbido de seguir para a fronteira do Paraná com São Paulo, onde,
na localidade de Itararé, preparava-se o confronto decisivo com as forças
governistas, chefiadas pelo coronel Antônio Pais de Andrade e compostas de
cerca de 3.200 soldados da Força Pública paulista e do Exército. O ataque dos
revoltosos estava marcado para o dia 25 e as operações foram distribuídas entre
os destacamentos Batista Luzardo, Flores da Cunha, Silva Júnior e Alexínio
Bittencourt, sob o comando geral de Miguel Costa. O choque, entretanto, não
chegou a ocorrer, pois no dia 24, pouco antes da hora prevista, chegou ao
acampamento revolucionário a notícia da deposição de Washington Luís por uma
junta pacificadora, formada pelos generais Augusto Tasso Fragoso e João de Deus
Mena Barreto e pelo almirante Isaías de Noronha. Informado da queda do
presidente, o coronel Pais de Andrade concordou em render-se.
Mal atravessara a fronteira com São Paulo, Luzardo recebeu um
chamado de Góis Monteiro para que se dirigisse imediatamente ao Distrito
Federal, transferindo a outro o comando do seu destacamento. No Rio de Janeiro,
foi convidado a assumir a chefia de polícia do Distrito Federal em substituição
a Bertoldo Klinger, que a ocupou durante o governo da junta provisória. Luzardo
tomou posse em 4 de novembro, no dia seguinte ao da transferência do poder ao
novo Governo Provisório, presidido por Getúlio Vargas. Pouco depois, no Rio
Grande do Sul, Flores da Cunha era nomeado interventor.
Na chefia de polícia do Distrito Federal
Imediatamente,
Luzardo iniciou a renovação da chefia de polícia. Recompôs o quadro de
delegados auxiliares, mantendo da administração anterior apenas um e nomeando
Joaquim Pedro Salgado Filho para a Delegacia de Ordem Política e Social. Dos 31
delegados distritais em atividade, muitos foram exonerados após visitas
inesperadas de Luzardo e Salgado Filho às delegacias, sob a acusação de prática
de violência ou outras irregularidades.
Luzardo
adotou medidas destinadas a reestruturar o serviço policial, organizando a
Comissão de Reforma da Polícia, para a qual nomeou Afrânio Peixoto, Evaristo de
Morais, Esmeraldino Bandeira e Melquíades de Sá Freire. O trabalho dessa
comissão resultou num projeto de reforma-modelo que chegou a ser entregue e
aprovado pelo ministro da Justiça, mas não foi implementado por força de
injunções políticas posteriores. Outra medida significativa foi a reorganização
do Gabinete de Identificação, para o qual Luzardo designou seu ex-colega da
Faculdade de Medicina, Leonídio Ribeiro, que instalou um Laboratório de
Antropologia Criminal e aí, com uma equipe de especialistas nacionais e
estrangeiros, iniciou pesquisas sobre os biótipos dos negros criminosos e dos
homossexuais que lhe valeriam o Prêmio Lombroso de 1933.
No início de 1931, Luzardo adotou diversas medidas
anticomunistas. Em janeiro, proibiu a realização da Marcha da Fome e de um
comício, ambos organizados pelo PCB. Em março, contratou dois técnicos do
Departamento de Polícia de Nova Iorque para organizar um “serviço especial de
repressão ao comunismo” em moldes norte-americanos. Ainda em abril, determinou
a prisão de vários militantes comunistas para impedir a realização de um
comício anunciado pelo PCB em comemoração ao 1º de maio. Proibiu, também,
qualquer manifestação pública nesse dia. Apesar da proibição, a imprensa
noticiou a ocorrência de conflito entre manifestantes e policiais na zona
portuária do Rio de Janeiro.
Em
novembro de 1931, o PL e o PRR realizaram a Conferência de Cachoeira, durante a
qual Borges de Medeiros, Flores da Cunha e Raul Pilla, contrários ao
prolongamento do poder ditatorial do governo, deliberaram iniciar um movimento
de solidariedade aos setores políticos paulistas que estavam em crescente
oposição ao governo federal e reivindicavam a constitucionalização do país. A
nomeação do tenente João Alberto para interventor em São Paulo, logo após a
revolução, significara a marginalização do segmento da oligarquia política
local que havia participado da revolução, em especial do PD. Esse processo, que
se acirrava progressivamente ao longo de 1931-1932, foi marcado pela oposição
entre as correntes políticas tradicionais no estado, de um lado, e as forças
tenentistas e o governo federal que as apoiava, de outro. Já em março de 1931,
Luzardo e Assis Brasil haviam conseguido que os líderes do PD sustassem a
publicação de um documento de ruptura com João Alberto. No entanto, o
desencadeamento da campanha repressiva contra os democráticos paulistas, que
resultara na prisão de vários dos seus líderes, tornara inevitável a publicação
do manifesto em abril de 1931.
O
empastelamento do Diário Carioca, em fevereiro de 1932, por elementos ligados
ao movimento tenentista, radicalizou o conflito da oposição com o governo
federal. O ministro da Justiça, Maurício Cardoso, e Batista Luzardo, na
condição de chefe de polícia, tentaram levar as investigações à frente, mas
sentiram que Vargas hesitava em punir os responsáveis. Descrentes da
possibilidade de êxito do inquérito, os dois, acompanhados de João Neves da
Fontoura, consultor jurídico do Banco do Brasil, Assis Brasil, ministro da
Agricultura, e Lindolfo Collor, ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, exoneraram-se
dos seus postos no governo em março e retornaram ao Rio Grande do
Sul,engajando-se na campanha pela reconstitucionalização do país. Em junho,
Luzardo, Pilla, João Neves e Collor assinaram um manifesto reafirmando sua
solidariedade aos paulistas. A FUG via na luta armada a única maneira de
garantir a autonomia do governo de São Paulo.
No movimento constitucionalista
Finalmente, em julho de 1932, o conflito entre os
constitucionalistas e o Governo Provisório chegou à luta armada, com a
insurreição deflagrada em São Paulo pelas forças comandadas pelo general
Bertoldo Klinger. No Rio Grande do Sul, não houve consenso em relação à
participação na luta armada. Flores da Cunha, à frente de uma parte do PRR,
manteve-se fiel a Vargas. Assis Brasil, por seu turno, temia que a luta viesse
a servir apenas aos inimigos da Revolução de 1930. Batista Luzardo tentou um
levante em Vacaria, iniciando a mobilização de voluntários para marchar sobre
outras cidades. Era vital para o sucesso da sua ação a adesão de Borges de
Medeiros, a qual, não se concretizando, frustrou o levante. Diante da ausência
de apoio efetivo e cercado pelas tropas de Flores da Cunha, Luzardo aceitou um
acordo, depondo as armas em troca da concessão de liberdade vigiada em Porto
Alegre.
Na capital gaúcha, Luzardo retomou os contatos com Borges de
Medeiros e com outros líderes da FUG. Resolveram, então, tentar abrir novas
frentes de luta para neutralizar o apoio de Flores da Cunha às tropas
legalistas que combatiam os revolucionários em São Paulo. No dia 5 de agosto,
Luzardo, disfarçado, deixou Porto Alegre e juntou-se a Borges de Medeiros e
Raul Pilla, rumando para Santa Maria e São Gabriel, onde conseguiu recrutar
cerca de duzentos homens.
Em
fins de agosto, efetivos comandados por Luzardo, Marcial Terra, Lindolfo Collor
e Glicério Alves tentaram conflagrar Santa Maria, destruindo a linha férrea que
fazia a ligação dessa cidade com Tupanciretã. Pretendiam desviar a atenção das
forças legalistas e, se possível, formar um governo provisório. No início do
mês seguinte, entretanto, os grupos de Marcial Terra, Turíbio Gomes, Collor e
Pilla depuseram as armas e seguiram para a Argentina.
Luzardo e Borges de Medeiros, à frente de duas centenas de
homens, ainda permaneceram no Rio Grande do Sul. Na manhã do dia 20 de
setembro, travaram em São Gabriel violento combate com as forças governistas,
conseguindo dispersá-las. Ainda nesse dia, acamparam na localidade de Cerro
Alegre, onde foram envolvidos de surpresa pelas tropas de Flores da Cunha. Todo
o estado-maior revolucionário gaúcho foi preso, com exceção de Luzardo, que
conseguiu fugir para o Uruguai. Após essa derrota, ainda houve, nos dias
seguintes, algumas tentativas de levantes em unidades militares, sufocadas
prontamente. Terminava, assim, a tentativa de apoio gaúcho aos revolucionários
paulistas que, derrotados, acabariam por assinar o armistício com o governo
federal no dia 2 de outubro de 1932.
Do exílio, Luzardo, Pilla e Collor lançaram, em 15 de
outubro, um manifesto em resposta ao documento divulgado por Flores da Cunha
para explicar seu comportamento durante o movimento constitucionalista. Os
líderes exilados acusavam o interventor de traição aos compromissos assumidos
com os paulistas, responsabilizando-o pela derrota do movimento. Flores negava
ter contraído qualquer compromisso com os revolucionários e convocou um
tribunal de honra para o julgamento da questão. De Buenos Aires, Luzardo,
Collor e Pilla escreveram uma carta explicando aos membros do tribunal de honra
que o exame do problema só seria satisfatório quando “plenamente restabelecidos
os direitos e garantias de espírito”, pelo que se recusavam a participar da
iniciativa.
Luzardo
foi enviado em dezembro de 1932 a Portugal para reatar os contatos com os
revolucionários opositores de Vargas exilados na Europa. Durante certo tempo,
viajou por alguns países europeus. Da Itália, iniciou a viagem de volta ao
Brasil, trazendo como saldo da sua missão o retorno de alguns exilados que não
haviam desistido de tentar a revolução, como o coronel Euclides Figueiredo, o
capitão Mena Barreto e outros militares e civis.
Ainda
no exílio, Luzardo procurou contribuir para a reativação do movimento
antivarguista. O governo federal, contudo, tomou a iniciativa de preparar a
instalação de uma Assembléia Nacional Constituinte, convocando eleições para
maio de 1933. No Rio Grande do Sul, a profunda divisão produzida no interior do
PL e do PRR pela luta armada de 1932 levou Flores da Cunha a formar o Partido
Republicano Liberal (PRL), após uma convenção de prefeitos, chefes dos corpos
provisórios e dissidentes republicanos e libertadores. Realizadas as eleições
para a Constituinte, o PRL elegeu a esmagadora maioria dos deputados gaúchos.
Na Câmara: da oposição ao apoio a Vargas
Com a anistia decretada por Vargas em janeiro de 1934, os
exilados retornaram ao Brasil. Luzardo chegou a Uruguaiana em abril, quando se
desenrolava a campanha para a Assembléia Constituinte estadual. Libertadores e
republicanos revigoraram a FUG, com o objetivo de combater o partido do interventor,
mas as eleições, realizadas em outubro, deram novamente ampla maioria ao PRL.
Nessa mesma eleição Luzardo foi eleito para a Câmara dos Deputados, recebendo a
expressiva votação de 80 mil votos.
Durante os trabalhos da Constituinte estadual, tanto a FUG
quanto Flores da Cunha iniciaram um movimento de pacificação política do
estado. A oposição concordou em votar no interventor para governador
constitucional em troca de participação no governo. As negociações evoluíram no
sentido da implantação de um governo parlamentarista baseado em fórmula
elaborada por Raul Pilla e pelo jurista José Maria dos Santos, mas esbarraram
na hesitação de muitos republicanos e libertadores em apoiar Flores da Cunha.
Finalmente, em janeiro de 1935, a FUG e o PRL firmaram um acordo estabelecendo
um governo misto, o chamado modus vivendi gaúcho. Flores da Cunha aceitava
várias reivindicações da FUG e esta, em contrapartida, cessava a oposição e
concordava em assumir duas secretarias: a da Agricultura, entregue a Raul Pilla,
e a da Fazenda, a Lindolfo Collor.
Com a posse de Raul Pilla na administração estadual, Batista
Luzardo assumiu a presidência do Partido Libertador. Escalado em julho de 1935
para falar sobre os levantes tenentistas de 1922 e 1924, aproveitou para
criticar a prisão de duzentos bancários que, na véspera, haviam realizado uma
assembléia. Contestando a posição do governo federal, que utilizava os
movimentos integralista e comunista como pretexto para o fortalecimento da sua
atividade, negou que alguma força política pudesse estar ameaçando o regime
constitucional, afirmando que todas as correntes políticas expressivas,
particularmente a Ação Integralista Brasileira e a Aliança Nacional
Libertadora, eram movimentos reconhecidos e registrados no Tribunal Eleitoral,
tinham direitos assegurados pela Constituição e deveriam ser defendidas.
Até
fins de 1935, Luzardo pautou seus pronunciamentos em forte oposição a Vargas, a
quem tratava de “grande tapeador” ou “responsável pelo desgoverno do país”. Em
início de 1936, com a abertura dos debates acerca da sucessão presidencial,
prevista para 1938, Vargas, ainda sem candidato oficial, procurou o apoio da
FUG, na luta que começava a travar com Flores da Cunha, que tentava influir no
processo sucessório, ambicionando, senão candidatar-se, indicar um nome com
possibilidade de vitória. A FUG acabou por dividir-se em relação a este
conflito. Luzardo, acompanhando a maioria dos libertadores e republicanos,
acabou por retirar seu apoio a Flores, enquanto um grupo comunitário procurava
sustentá-lo, prevendo a possibilidade de um golpe. Dentro do próprio PRL,
abriu-se uma dissidência que se colocou em oposição ao governador.
Entre
os opositores de Vargas, firmou-se a candidatura de Armando de Sales Oliveira.
Em maio de 1937, oficializou-se a candidatura de José Américo de Almeida,
apoiada pelo governo federal. Luzardo, já identificado com a política
situacionista, foi indicado por Vargas para presidir o comitê de organização da
campanha eleitoral de José Américo. Além disso, na condição de prestigiado
líder da FUG, apoiou a política de Vargas de enfraquecimento de Flores da
Cunha, aprovando diversas medidas, entre as quais a nomeação de um oficial
hostil ao governador, o general Manuel Daltro Filho, para o comando da 3ª Região
Militar; a dissolução dos corpos provisórios, milícias auxiliares da Brigada
Militar gaúcha, e a própria federalização da Brigada, pelo decreto de 14 de
outubro de 1937, que colocou os seus efetivos à disposição do Exército.
Finalmente, Flores da Cunha não resistiu às pressões e renunciou no dia 16,
buscando o exílio no Uruguai.
Após a renúncia do governador gaúcho, o governo federal
interveio no estado, nomeando o general Daltro Filho para o governo.
Imediatamente, o interventor procurou obter o apoio da FUG, oferecendo, em
troca, a pacificação política do estado, garantia aos direitos individuais e a
participação dos partidos oposicionistas na nova administração. A proposta foi
aceita pela maioria dos republicanos e libertadores. Segundo seu depoimento a
Glauco Carneiro, Luzardo, nessa época, visitou o ministro da Guerra, general
Eurico Gaspar Dutra, em companhia de José Américo de Almeida, sendo informado
de que Vargas pretendia interromper o processo eleitoral. O pretexto seria o
recém-divulgado Plano Cohen, pretenso plano de ação comunista apreendido pelo
Exército e tornado público em outubro. Na verdade, conforme seria comprovado
posteriormente, tratava-se de um documento forjado, utilizado pela alta cúpula
militar, de acordo com a chefia do governo, para favorecer a concretização do
seu projeto ditatorial.
Em inícios de novembro, Luzardo partiu para Porto Alegre,
incumbido de transmitir instruções de Vargas anunciando a deflagração de um
golpe no dia 15 daquele mês. De volta ao Rio de Janeiro no dia 9, assistiu na
Câmara ao discurso em que Otávio Mangabeira denunciava a iminência do golpe.
Segundo seu depoimento, procurou Vargas imediatamente, sugerindo que
desfechasse o golpe no dia seguinte, sob pena de dar à oposição tempo de
articular a sua própria revolução. Segundo Hélio Silva, o desfecho do golpe foi
antecipado pela divulgação, entre chefes militares e nos quartéis, do manifesto
redigido por Armando de Sales Oliveira denunciando a trama golpista e
conclamando as forças armadas a preservar a ordem constitucional.
De
fato, forças policiais e militares cercaram na madrugada do dia 10 a Câmara e o
Senado, que foram dissolvidos por decreto de Vargas. Dessa forma, Luzardo
perdeu seu mandato de deputado federal. Nesse mesmo dia, foi promulgada nova Constituição
que formalizava a instalação do regime do Estado Novo. No dia 26, Luzardo
participou, como representante do PL, da reunião da Comissão Mista
Interpartidária, também integrada pelo PRR e pela dissidência do PRL. A ata da
reunião registrou “a boa harmonia reinante no seio da Comissão”, que refletia
“da parte dos seus componentes o elevado propósito de servir lealmente aos
patrióticos intentos que orientam a Frente Única e a dissidência liberal no
sentido do congraçamento definitivo da família rio-grandense sob o regime
outorgado ao país pela Carta de 10 de novembro”. A “distribuição das
prefeituras vagas ou a vagarem” seria feita “mediante meticuloso estudo das
condições políticas e administrativas, de conformidade com os partidos que
apóiam a situação criada pelo golpe de Estado de 10 de novembro”.
Embaixador no Uruguai
Em
dezembro, novo decreto de Vargas dissolveu todos os partidos políticos. Nesse
mesmo mês, Luzardo foi designado embaixador no Uruguai, em substituição a
Lucílio da Cunha Bueno, acusado por Vargas de manter contatos com Flores da
Cunha, asilado naquele país. Em pouco tempo, Luzardo travou boas relações
pessoais com o ditador uruguaio Gabriel Terra, prolongadas depois com o seu
sucessor, general Alfredo Balcomir. Conseguindo que o governo uruguaio
determinasse um regime de liberdade vigiada para Flores da Cunha em Montevidéu,
organizou um dispositivo para vigiá-lo. Suspeito de possuir ligação com os
integralistas e nazistas e de manter contato com os comunistas, Flores foi de
tal maneira cerceado em seus movimentos que acabou retornando ao Brasil em
1942, sendo preso na fronteira. Luzardo controlou também outros refugiados
brasileiros no Uruguai, de orientações políticas diversas, como Armando de
Sales Oliveira, Nestor Contreiras Rodrigues e outros.
No campo diplomático, Luzardo atuou no sentido de acelerar a
aproximação entre os dois países. Logo que chegou a Montevidéu, divulgou
amplamente um plano de ação voltado não apenas para o incremento das relações
comerciais, como para uma vinculação mais estreita na atuação internacional.
Durante a sua gestão, instalou-se em Montevidéu uma agência do Banco do Brasil,
fez-se o acordo postal, telegráfico-telefônico, instalou-se o serviço de trem
internacional ligando diretamente Montevidéu a São Paulo e estenderam-se à
capital uruguaia as linhas da Varig. Foi também iniciativa sua a organização da
Conferência de Ministros da Agricultura, que reuniu em Montevidéu, em 1939,
representantes de quatro países da costa atlântica sul-americana, resultando em
concessões comerciais recíprocas. Em novembro desse mesmo ano, Luzardo promoveu
uma exposição do livro brasileiro, que deu origem à criação do Instituto de
Cultura Uruguaio-Brasileiro. Em 1941, expressou o apoio brasileiro ao ponto de
vista do governo uruguaio no sentido de que, para a manutenção da integridade
territorial das nações americanas, as mesmas, em caso de guerra com países de
outro continente, não deveriam ser tratadas como beligerantes.
Às vésperas da instalação da III Reunião de Consulta dos
Ministros das Relações Exteriores das Repúblicas Americanas, que se realizaria
no Rio de Janeiro em janeiro de 1942, Luzardo precisou enfrentar a ofensiva
diplomática da Argentina, empenhada em formar um bloco que uns consideravam
neutralista e outros favorável às potências do Eixo. Em Buenos Aires, os
argentinos promoveram um encontro dos chanceleres da Bolívia, Uruguai, Paraguai
e Chile, mas esses países não aceitaram a proposta de se colocarem em oposição
aos Estados Unidos. Luzardo manteve contato com os ministros pressionados pelos
argentinos e viajou ao Rio de Janeiro para colocar o governo a par da
estratégia argentina. No último dia da III Reunião, o Brasil e os demais países
favoráveis aos Aliados conseguiram aprovar uma resolução que recomendava o
rompimento de relações com os governos totalitários, recomendação atendida por
todos os países do continente, com exceção da Argentina e do Chile. Ainda em
1942, no mês de agosto, o Brasil declarou guerra aos países do Eixo, depois de
sucessivos ataques alemães a navios mercantes brasileiros.
Em 1943, Luzardo substituiu interinamente o embaixador Mário
Pimentel Brandão nas funções de delegado do Brasil junto à Comissão Consultiva
de Emergência para a Defesa Política do Continente.
Embaixador na Argentina e deputado
Com
a morte do embaixador brasileiro na Argentina, José de Paula Rodrigues Alves,
em maio de 1944, esse cargo não foi ocupado de forma efetiva durante um ano. Em
maio de 1945, Luzardo foi indicado para exercê-lo, sendo substituído na
embaixada no Uruguai por José Roberto de Macedo Soares. Em 29 de outubro, no
entanto, Vargas foi deposto e Luzardo pediu exoneração, retornando a
Uruguaiana.
Luzardo foi um elemento importante para a organização do
Partido Social Democrático (PSD) no Rio Grande do Sul em 1945. Juntamente com
João Neves da Fontoura procurou influenciar Vargas para que apoiasse a
candidatura do general Eurico Gaspar Dutra à presidência da República nas
eleições marcadas para dezembro. Indicado pelo PSD para representar a
agremiação durante a campanha eleitoral, trabalhava, ao mesmo tempo, para
eleger-se à Assembléia Nacional Constituinte, onde tomou posse em fevereiro de
1946. Em maio, porém, já no governo de Dutra, licenciou-se, reassumindo a
embaixada brasileira na Argentina. Travando intensas relações pessoais com o
presidente argentino Juan Domingo Perón, recém-eleito para o cargo, depois de
ter exercido a vice-presidência sob regime ditatorial em 1944, foi
intermediário de várias tentativas de um encontro de Perón com Dutra. A oposição
brasileira, capitaneada pela União Democrática Nacional (UDN), fazia cerrada
campanha contra as relações de Luzardo com Perón, acusado de simpatizante do
varguismo. Com o acordo político estabelecido em setembro de 1946 pelo
presidente Dutra com a UDN, que resultou na composição de um ministério
pluripartidário, Luzardo não permaneceu muito tempo mais em Buenos Aires, sendo
exonerado em fevereiro de 1947.
A Assembléia Constituinte, uma vez promulgada a Constituição
em setembro de 1946, havia-se transformado em Congresso ordinário. De volta ao
Brasil, Luzardo reassumiu seu lugar na Câmara dos Deputados em março de 1947,
mantendo discreta atuação parlamentar até junho de 1950. Nesse momento foi
lançada a candidatura de Vargas à sucessão de Dutra com o apoio do Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB) e do Partido Social Progressista (PSP). O PSD
lançou o nome de Cristiano Machado, abrindo-se grave dissidência na agremiação,
propensa, em conjunto, a apoiar Vargas. Engajado na ala pessedista dissidente,
Luzardo revigorou então sua atuação no Parlamento em defesa do ex-ditador.
A
campanha eleitoral de Vargas iniciou-se em agosto de 1950 e Luzardo integrou a
comitiva que, partindo do Rio Grande do Sul, percorreu São Paulo, Rio de
Janeiro, e as regiões Norte, Nordeste e Centro do país, retornando ao estado
natal do candidato. Vargas aguardou o resultado das eleições, realizadas em
outubro, na estância São Pedro, de propriedade de Luzardo. Declarado eleito, lá
permaneceu até janeiro de 1951.
Embaixador na Argentina segundo período
Com o retorno de Vargas à presidência da República, Luzardo
foi novamente indicado para a embaixada brasileira na Argentina, assumindo o
cargo em agosto de 1951. Esse novo período na Argentina foi marcado pelas
injunções resultantes do aprofundamento das suas relações pessoais com Perón,
que procurava apoiar seu governo no movimento sindical. Da oposição, Luzardo
recebia a acusação de “agente do peronismo no Brasil”. Sua situação se agravou
em 1953, quando o presidente argentino, em visita ao Chile, propôs publicamente
a formação de um bloco sul-americano constituído pela Argentina, Brasil e
Chile, dentro do espírito do Pacto do ABC, firmado pelos três países em 1915,
com objetivos econômicos, mas nunca concretizado. Ao fazer a proposta, Perón
dizia-se autorizado por Vargas a iniciar negociações com o Chile, promovendo,
primeiramente, uma união aduaneira. Imediatamente, João Neves da Fontoura,
ministro das Relações Exteriores, aproveitando a visita do vice-presidente da
Bolívia, rejeitou publicamente a proposta de Perón. Este, então, cobrou de
Luzardo uma posição definitiva de Vargas, que evitou pronunciar-se, passando a
se esquivar das tentativas de contato pessoal feitas pelo presidente argentino
através do embaixador brasileiro.
As
oposições brasileira e argentina caracterizaram a tentativa de revitalização do
Pacto do ABC como um projeto voltado para a construção da hegemonia da
Argentina no continente. Luzardo, visto como o principal emissário de Perón na
articulação do plano, foi duramente atacado. Por outro lado, as negativas de
Vargas aos convites de Perón para um contato pessoal desacreditaram o
embaixador brasileiro junto ao presidente argentino. Assim, Luzardo deixou
definitivamente a Argentina em outubro de 1953, sendo substituído por Orlando
Leite Ribeiro.
Em março de 1954 a imprensa brasileira deu ampla divulgação a
um documento, produzido por refugiados argentinos no Uruguai, que reproduzia um
discurso pronunciado por Perón em novembro de 1953 reafirmando que Vargas
fugira a compromissos assumidos na questão do Pacto do ABC. Indagado, no mês
seguinte, acerca da veracidade dessa afirmação, Luzardo recusou-se a responder,
argumentando tratar-se de informações secretas do Itamarati, a quem caberia
divulgá-las ou não. O governo, por seu turno, negou a existência de negociações
secretas com Perón.
Luzardo foi nomeado presidente da Caixa Econômica Federal em
julho de 1954, em meio à grave crise política gerada pela acirrada campanha que
a oposição movia contra Vargas. O quadro se agravou substancialmente com o
atentado da Toneleros, ocorrido no Rio de Janeiro no dia 5 de agosto visando o
líder udenista Carlos Lacerda e que resultou na morte do major-aviador Rubens
Vaz. As investigações indicaram a ligação dos assassinos com a guarda pessoal
do presidente, o que intensificou a campanha contra Vargas, envolvendo, agora,
importantes setores militares. Vargas era pressionado para que renunciasse ou
se licenciasse. De Luzardo, recebeu a sugestão de retirar-se para São Paulo,
onde o comandante da 2ª RM, general Newton Estillac Leal, o apoiaria, até que
terminasse o inquérito. No dia 24, contudo, Vargas suicidou-se.
Pós-1954
O sucessor de Vargas, o vice-presidente João Café Filho,
exonerou Luzardo da presidência da Caixa Econômica Federal, designando-o para a
direção da Carteira de Consignações do órgão. Luzardo recorreu ao Supremo
Tribunal Federal (STF) contra essa medida.
Eleito
Juscelino Kubitschek para o período presidencial de 1956 a 1961, a oposição
tentou invalidar o resultado do pleito. Em 11 de novembro de 1955, o general
Henrique Teixeira Lott, ministro da Guerra demissionário, liderou um movimento
militar destinado, segundo seus promotores, a barrar uma conspiração em preparo
no governo e assegurar a posse do presidente eleito. O movimento provocou o
impedimento dos presidentes da República Carlos Luz, em exercício, e Café
Filho, licenciado, empossando na chefia da nação o vice-presidente do Senado,
Nereu Ramos. Luzardo apoiou a ação de Lott, propondo, na reunião do Conselho da
Caixa Econômica Federal do dia 17 de novembro, um voto de solidariedade ao novo
presidente e ao ministro da Guerra.
Empossado Juscelino, Luzardo não foi reconduzido à
presidência da Caixa Econômica pelo remanejamento administrativo nem por
decisão do STF. Através de Tancredo Neves, enviou ao presidente seu pedido de
exoneração da diretoria da Carteira de Consignações. O pedido não foi, contudo,
atendido e Luzardo exerceria o cargo até julho de 1959.
Em março de 1958, Luzardo, por intermédio de seu filho Luís
Alberto, entrou em contato com Ademar de Barros, presidente do PSP,
oferecendo-se para ingressar nas fileiras dessa agremiação. Nesse mesmo mês,
enviou carta à direção nacional do PSD comunicando seu desligamento do partido.
No entanto, mesmo tendo se tornado pública essa situação, a intervenção de
Ernâni Amaral Peixoto, Tancredo Neves e outros pessedistas impediu que a
transferência se consumasse.
Aberta a campanha eleitoral para a sucessão de Juscelino Kubitschek,
Luzardo presidiu o comitê parlamentar do marechal Lott, candidato do PSD-PTB.
Realizadas as eleições em outubro de 1960, entretanto, foi eleito Jânio
Quadros. Essa derrota eleitoral marcou a retirada de Luzardo das atividades
político-partidárias. A partir de então, passou a se dedicar exclusivamente aos
seus negócios de pecuária bovina em suas estâncias, que se estendiam pelas duas
margens da fronteira Brasil-Uruguai, e a algumas entidades pecuaristas,
manifestando-se publicamente em relação à política nacional apenas quando da
tentativa de impedimento da posse de João Goulart após a renúncia de Jânio em
agosto de 1961. Nessa ocasião, acompanhado por seu filho Luís Alberto, uniu-se
às forças civis e militares que apoiavam a posse de Goulart e guarneciam a sede
do governo gaúcho, proclamado “o quartel-general da legalidade”. Debelada a
crise depois que o Congresso aprovou a emenda parlamentarista em setembro de
1961, Luzardo e o filho retornaram a Uruguaiana.
Em
1972, Luzardo teve sua fazenda Las Toscas, em Artigas, no Uruguai, fronteira
com o Brasil, cercada por soldados do Exército e da Marinha e por agentes da
alfândega uruguaia. Alegando combater o contrabando de gado, esses agentes
levaram todos os animais e prenderam um capataz por infração aduaneira que
teria causado prejuízo ao Tesouro uruguaio.
Batista Luzardo faleceu em Porto Alegre no dia 1º de janeiro
de 1982.
Era casado com Adelaide Inda Luzardo, com quem teve três
filhos.
Foi biografado por Glauco Carneiro em Luzardo, o último
caudilho (2v., 1977-1978).
Renato Lemos
FONTES: ARQ.
GETÚLIO VARGAS; Boletim Min. Trab. (5/36); CAFÉ FILHO, J. Sindicato; CALMON, P.
História; CÂM. DEP. Deputados; CARNEIRO, G. História; CARNEIRO, G. Luzardo;
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Nacional; DULLES, J. Anarquistas; DULLES, I. Getúlio; ENTREV. PEIXOTO, A.;
FERREIRA FILHO, A. História; FIGUEIREDO, E. Contribuição; FONTOURA, J.
Memórias; FRANCO, A. Escalada; Globo (11 e 12/4/76); HIPÓLITO, L. Campanha;
JARDIM, R. Aventura; LEITE, A. História; LEITE, A. Memórias; LEITE, A. Páginas;
LEVINE, R. Vargas; MAGALHÃES, B. Artur; MIN. REL. EXT. Almanaque; MIN. REL.
EXT. Anuário; MORAIS, A. Minas; NOGUEIRA FILHO, P. Ideais; SÁ, M. Politização;
SILVA, H. 1922; SILVA, H. 1926; SILVA, H. 1930; SILVA, H. 1931; SILVA, H. 1937;
SILVA, H. 1938; TÁVORA, J. Vida; VILAS BOAS, P. Notas.