MELO,
Márcio de Sousa
*militar; comte. III ZA 1961; comte. IV ZA
1964; min. Aer. 1964-1965 e 1967-1971; junta mil. 1969.
Márcio de Sousa e Melo nasceu
em Florianópolis no dia 26 de maio de 1906, filho do contra-almirante Francisco
Agostinho de Sousa e Melo e de Maria dos Anjos Malheiros de Melo.
Fez os estudos primários em diversas cidades do Rio Grande do
Sul, onde o pai serviu como militar. Em 1918, transferiu-se com sua família
para o Rio de Janeiro, então Distrito Federal, matriculando-se no Colégio
Militar dessa cidade.
Em março de 1925 sentou praça, ingressando na Escola Militar
do Realengo, no Rio. Em janeiro de 1928 foi declarado aspirante-a-oficial da
arma de aviação militar — quinta arma do Exército, criada no ano anterior e, em
agosto seguinte, foi promovido a segundo-tenente. Dois anos mais tarde recebeu
a patente de primeiro-tenente, passando a integrar a primeira unidade de
combate aéreo do Exército, criada após a Revolução de 1930 e comandada pelo
major Eduardo Gomes. Com este e outros oficiais, foi um dos pioneiros da
criação, em 1931, do Correio Aéreo Militar (CAM), serviço de transporte de
correspondência, de pessoal e de carga por via aérea, além de treinamento de
aviadores militares, e que teve grande importância no desenvolvimento da
aviação nacional e na integração do país. O CAM foi posteriormente denominado
Correio Aéreo Nacional (CAN) e integrado à Força Aérea Brasileira (FAB).
Promovido a capitão em junho de 1933, recebeu em setembro de 1938 a patente de major, diplomando-se no mesmo ano no curso de aperfeiçoamento de oficiais da
Aviação. Com a criação do Ministério da Aeronáutica em janeiro de 1941, foi
transferido do Exército para o novo ministério, sendo promovido em dezembro
seguinte ao posto de tenente-coronel-aviador. De 1942 a 1943 foi incumbido de acompanhar o processo de nacionalização da empresa de aviação alemã
Condor, em virtude da declaração, em 1942, do estado de guerra entre o Brasil e
a Alemanha, resultando daí a criação da Companhia Cruzeiro do Sul. Designado
comandante da Base Aérea de Santos (SP) em janeiro de 1944, foi responsável,
durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), por operações de patrulhamento no
Atlântico Sul. Deixando o cargo em outubro desse mesmo ano, viajou aos Estados
Unidos, encarregado de trazer para o Brasil aeronaves militares adquiridas
naquele país. Durante o ano de 1945 fez nos Estados Unidos os cursos de air
staff, em Fort Leavenworth, na Geórgia, e de tática aplicada, na base de
Jacksonville, na Flórida.
Regressando
ao Brasil em 1946, foi promovido em novembro a coronel-aviador. Nesse mesmo ano
fez o curso de estado-maior da Aeronáutica. Instrutor da Escola de Comando e
Estado-Maior da Aeronáutica (Ecemar) de 1947 a 1948, em dezembro deste último ano foi designado adido aeronáutico junto às embaixadas do Brasil em Buenos Aires e Montevidéu. No exercício dessa função conheceu e estreitou laços de amizade com
o coronel Artur da Costa e Silva, na época adido militar. Voltando ao Brasil em
abril de 1951, foi classificado para servir no Estado-Maior da Aeronáutica,
onde permaneceu até 1953. Neste último ano fez o curso da Escola Superior de
Guerra (ESG), sendo designado para servir na Inspetoria Geral de Aeronáutica.
Em abril de 1954 foi promovido a brigadeiro-do-ar. Com o suicídio de Getúlio
Vargas (24/8/1954) e a sua substituição pelo vice-presidente Café Filho, foi
nomeado chefe de gabinete do ministro da Aeronáutica, brigadeiro Eduardo Gomes,
função que exerceu até 1955. Comandante da Ecemar em 1957 e 1958, deixou-a para
desempenhar a função de assistente do comando da ESG.
Em
fevereiro de 1961, logo após a posse de Jânio Quadros na presidência da
República, assumiu o comando da III Zona Aérea (III ZA), sediada no Rio de
Janeiro, substituindo o major-brigadeiro Inácio de Loiola Daher. Promovido a
major-brigadeiro em abril seguinte, permaneceu no cargo até setembro do mesmo
ano após a renúncia de Quadros (25/8/1961) e a posse do vice-presidente João
Goulart (7/9/1961) —, sendo substituído pelo major-brigadeiro Armando Perdigão.
Após o movimento político-militar de março de 1964, que depôs o presidente João
Goulart, foi designado, em abril seguinte, comandante da IV ZA, sediada em São Paulo.
No Ministério da Aeronáutica
Em
agosto de 1964, durante a Operação Unitas — manobra aeronáutica reunindo forças
de diversos países latino-americanos, inclusive o Brasil, sob a coordenação dos
Estados Unidos — reavivou-se a crise latente entre a Marinha e a Aeronáutica,
iniciada desde a compra do porta-aviões Minas Gerais durante o governo
de Juscelino Kubitschek (1956-1961) pelo fato de ambos os ministérios
reivindicarem a responsabilidade pela aviação embarcada. Um documento redigido
pelo próprio presidente da República, marechal Humberto Castelo Branco, sugeriu
diretrizes para a aviação em operações navais, definindo atribuições para a
Marinha e para a FAB. Em dezembro do mesmo ano, o episódio do metralhamento de
um helicóptero da Marinha por elementos da Aeronáutica em Tramandaí (RS) levou
Castelo Branco a convocar os ministros da Marinha e da Aeronáutica,
respectivamente almirante Ernesto de Melo Batista e brigadeiro Nélson Lavenère
Wanderley, para discutir o incidente. Inconformado com a decisão presidencial
de resolver o assunto por ato do próprio Executivo, Lavenère Wanderley pediu
exoneração de seu cargo no dia 10 de dezembro.
Convidado a assumir a pasta, Sousa e Melo tomou posse no dia
15 seguinte. A crise, entretanto, prosseguiu, sem possibilidade de conciliação
entre os dois ministérios. Sabedor de que o presidente da República
inclinava-se a entregar à Marinha os aviões do Minas Gerais, Sousa e
Melo lhe transmitiu sua decepção e a de seus comandados, atitude que o
incompatibilizou com o presidente, levando-o a pedir exoneração no dia 6 de
janeiro de 1965, depois de apenas 22 dias à frente da pasta. Assumiu, então, o
Ministério da Aeronáutica o brigadeiro Eduardo Gomes. Ainda em janeiro, o
ministro da Marinha, almirante Melo Batista, também se exonerou, sendo
substituído por Paulo Bosísio.
Designado inspetor-geral da Aeronáutica, Sousa e Melo foi
promovido em 1966 a tenente-brigadeiro-do-ar. Em meados desse ano transferiu-se
para a reserva com a patente de marechal-do-ar.
Em
março de 1967 foi empossado novamente na pasta da Aeronáutica, aceitando
convite do marechal Artur da Costa e Silva, que assumia a presidência da
República naquele momento.
A gravidade da situação política do país, agitada por
movimentos estudantis de protesto de crescente intensidade, chegou ao clímax em
setembro de 1968, quando os ministros militares solicitaram à Câmara dos
Deputados licença para processar o deputado Márcio Moreira Alves, do Movimento
Democrático Brasileiro (MDB), partido de oposição. Moreira Alves havia
proferido um discurso considerado ofensivo às forças armadas, no qual, entre
outras coisas, conclamava a população a não comparecer às comemorações do Dia
da Independência, no dia 7 daquele mês.
No
dia 13 de dezembro seguinte, a Câmara rejeitou o pedido de concessão da licença
necessária para processar o deputado. Nesse mesmo dia, Costa e Silva reuniu-se
com os ministros militares — além de Márcio de Sousa e Melo, o general Aurélio
Lira Tavares, do Exército, e o almirante Augusto Rademaker, da Marinha — e os
comandantes de exércitos, determinando prontidão de todas as forças armadas e
da Polícia Federal. Dessa reunião resultou a edição do Ato Institucional nº 5
(AI-5), assinado por Sousa e Melo e pelos demais ministros militares, que
decretou a suspensão das garantias constitucionais e atribuiu ao presidente da
República poderes excepcionais para intervir nos estados e municípios,
suspender direitos políticos, confiscar bens, decretar o estado de sítio sem
anuência do Congresso Nacional e promulgar leis e atos complementares. Pelo Ato
Complementar nº 38, do mesmo dia, foi decretado o recesso do Congresso por
tempo indeterminado.
Durante
sua gestão no Ministério da Aeronáutica foi criada, por decreto-lei de agosto
de 1969, a Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer), sociedade de economia
mista com o objetivo inicial de instalar a indústria aeronáutica no país e cujo
primeiro passo foi a produção do avião Bandeirante, em São José dos Campos (SP). Diversos outros modelos de aviões foram produzidos desde então pela
Embraer.
Em
fins de agosto de 1969, o presidente Costa e Silva adoeceu gravemente e foi
obrigado a afastar-se do cargo. Reunido o Alto Comando das Forças Armadas para
exame da situação, foi decidida a constituição de uma junta militar, de caráter
provisório, composta pelos três ministros militares, para assumir a direção do
país enquanto durasse o impedimento do presidente, afastando, dessa forma, o
vice-presidente Pedro Aleixo da linha sucessória. No dia 31 de agosto de 1969,
o jurista Carlos Medeiros, por solicitação dos chefes militares, elaborou o Ato
Institucional nº 12, instaurando a junta militar na chefia do governo, e
redigiu uma proclamação ao país, divulgada através de uma cadeia de rádio e
televisão, expondo à nação os motivos daquela atitude, tendo em vista que o
Congresso estava em recesso. A junta militar governou o país dentro de um clima
de intranqüilidade social, política e militar, tendo que enfrentar, no início
de setembro, os problemas criados com o seqüestro do embaixador dos Estados
Unidos, Charles Burke Elbrick, cuja libertação foi condicionada pelos
seqüestradores à libertação de 15 presos políticos e à divulgação, pela
imprensa, de um comunicado à nação com pesadas críticas ao governo. Cedendo à
pressão do governo norte-americano, a junta negociou com os seqüestradores e
enviou os presos relacionados por estes para o México, país que concordara em
lhes dar asilo. Imediatamente, Elbrick foi libertado.
No
dia 8 de setembro, procurando acalmar a forte reação entre os oficiais chamados
“duros”, que a acusavam de capitular diante das organizações da esquerda, a
junta baixou o Ato Institucional nº 13, que instituiu o banimento das “pessoas
perigosas para a segurança do Estado”, e o Ato Complementar nº 64, que impunha
essa sanção aos presos exilados no México. No dia seguinte, o Ato Institucional
nº 14 permitia a aplicação da pena de morte ou de prisão perpétua em caso de
“guerra de oposição psicológica, de guerra revolucionária ou de luta
subversiva”. No dia 27 seguinte, foi publicada a nova Lei de Segurança Nacional
(Decreto-Lei nº 898), que incorporava todas as medidas de exceção tomadas pela
junta.
Diante da incerteza do restabelecimento das condições de
saúde de Costa e Silva e das articulações realizadas na esfera do Alto Comando
para encontrar uma solução que debelasse a crise vigente, em 14 de outubro de 1969 a junta editou o Ato Institucional nº 16, que declarava a vacância dos cargos de presidente e
vice-presidente da República. O ato determinava que a presidência seria ocupada
provisoriamente pelos ministros militares e marcava para o dia 25 daquele mês a
eleição, por via indireta, do presidente e vice-presidente e, para o dia 30, a posse dos novos governantes. No dia 15 de outubro, a junta editou o Ato Complementar nº 72, que
suspendia o recesso do Congresso a partir do dia 22, e o Ato Complementar nº
73, convocando os congressistas para as eleições do dia 25. Eleito pelo
Congresso, foi empossado na chefia do governo o general Emílio Garrastazu
Médici, tendo como vice-presidente o almirante Augusto Rademaker, escolhidos
depois de uma consulta à alta cúpula militar.
Sousa
e Melo permaneceu à frente do Ministério da Aeronáutica durante os dois
primeiros anos da gestão Médici (1969-1974). Nesse período foi intenso o
combate entre os órgãos de repressão e os movimentos armados de esquerda, tendo
a Aeronáutica dado importante contribuição no desbaratamento dessas
organizações. No dia 25 de novembro de 1971, foi exonerado do cargo, por
motivos não esclarecidos, mas que, segundo a revista Veja, na época
submetida à censura prévia, prendiam-se a um “não-esclarecido conflito de
doutrina na direção da Aeronáutica, envolvendo a legendária figura do
brigadeiro Eduardo Gomes” ou “a atos administrativos do governo ligados à
Aeronáutica”. Substituído pelo brigadeiro da reserva Joelmir Campos de Araripe
Macedo, Sousa e Melo retirou-se da vida pública. Recém-empossado, Araripe
Macedo procedeu a uma série de substituições nos principais cargos do
Ministério da Aeronáutica. No início de dezembro, o brigadeiro João Paulo
Moreira Burnier foi afastado do comando da III ZA, substituído pelo brigadeiro
Faber Cintra. Mais tarde, jornais e familiares de presos políticos denunciaram
a ocorrência de torturas e até mesmo de assassinatos no interior da III ZA
durante a gestão do brigadeiro Burnier.
Em dezembro de 1978, dez anos após a assinatura do AI-5,
Sousa e Melo declarou em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo que
assinara aquele documento “porque sabia de sua transitoriedade ou, pelo menos,
assim imaginava... Não se pode negar que foi desvirtuado e que serviu a
propósitos fora dos ideais revolucionários. Ele não foi criado para os fins com
que o utilizaram depois”.
Faleceu no Rio de Janeiro no dia 31 de janeiro de 1991.
Era casado com Zilda Andrade de Sousa e Melo, com quem teve
duas filhas.
FONTES: CHAGAS, C.
113; ENTREV. BIOG.; Estado de S. Paulo (13/12/78); FIECHTER,
G. Regime; Folha de S. Paulo (7/9/77); Grande encic. Delta; Jornal do
Brasil (31/12/77 e 13/12/78); MIN. AER. Almanaque (1963); SOUSA,
J. Ministros; Veja (3 e 10/9/69, 1 e 8/12/71); VIANA FILHO, L. Governo;
WANDERLEY, N. História.