MACIEL,
Olegário
*dep. fed. MG 1894-1910; sen. MG 1930;
pres. MG
1930; interv. MG 1930-1933.
Olegário Dias Maciel nasceu
em Bom Despacho (MG) no dia 6 de outubro de 1855, filho do coronel Antônio Dias
Maciel e de Flaviana Maciel.
Em 1858 transferiu-se com a família para Patos, atual Patos
de Minas (MG), onde o pai se tornou fazendeiro. Fez os estudos preparatórios no
Colégio Caraça, em Minas Gerais, diplomando-se engenheiro pela Escola Politécnica
do Rio de Janeiro na então capital do Império, em 1878.
De
volta a Minas em 1880, ingressou na carreira política, elegendo-se deputado
provincial pelo Partido Liberal. Cumpriu o mandato até 1883, quando se afastou
para ocupar o cargo de engenheiro superintendente da Companhia Belga de Estrada
de Ferro de Pitangui a Patos, colaborando ainda na construção das ferrovias
Bambu-Patos e E. F. Paraopeba. Responsável pela organização das bases
republicanas no município de Patos, com a proclamação da República elegeu-se
deputado à Assembléia Constituinte mineira (1890), revelando em sua atuação
grandes preocupações com a questão dos transportes e da industrialização.
Em
1894 elegeu-se deputado federal pelo Partido Republicano Mineiro (PRM) e
iniciou uma longa permanência na Câmara dos Deputados, à qual foi reconduzido
por mais cinco legislaturas consecutivas e de onde só se afastou em 1910 por
razões de saúde. Em 1914, com o início do governo do presidente Venceslau Brás,
foi nomeado inspetor-geral do Serviço de Vias Férreas do Ministério da Viação e
Obras Públicas, permanecendo no posto até 1918. Retornou então a Patos,
dedicando-se à administração da fazenda que seu pai deixara.
Em 1922, por ocasião das eleições para a presidência do
estado, o PRM o escolheu candidato à vice-presidência na chapa encabeçada por
Raul Soares de Moura. Eleito, chegou a exercer a presidência de setembro de
1923 a março do ano seguinte por doença de Raul Soares. Com a morte deste em
agosto do mesmo ano, voltou a ocupar a presidência do estado até dezembro,
quando foi empossado Fernando de Melo Viana, eleito em outubro para completar o
quadriênio. Retornando à vice-presidência do estado, ao mesmo tempo em que
ingressava no Senado estadual para preencher a vaga deixada pela renúncia de Basílio
de Magalhães, Olegário Maciel assumiu mais uma vez a presidência interina do
estado entre 20 de fevereiro e 31 de março de 1926, pois Melo Viana se afastara
do cargo para eleger-se vice-presidente da República na chapa encabeçada por
Washington Luís.
Reeleito em 1927 para o Senado estadual com mandato até 1934,
Olegário parecia fadado a lá encerrar sua carreira política, pois já contava 72
anos. Entretanto, com as crises que a política mineira atravessaria nos anos
seguintes, viria a desempenhar papel relevante nos acontecimentos que
antecederam a Revolução de 1930, na própria revolução e nos primeiros anos da
República Nova.
A sucessão mineira e a Revolução de 1930
No decorrer de 1929, três líderes do PRM surgiram como
prováveis candidatos à sucessão de Antônio Carlos de Andrada no governo de
Minas: o vice-presidente Fernando de Melo Viana e os ex-presidentes da
República Venceslau Brás e Artur Bernardes. Também nesse período os governos
dos estados de Minas, Rio Grande do Sul e Paraíba formaram a Aliança Liberal,
lançando em setembro de 1929 a candidatura de Getúlio Vargas às eleições
presidenciais do ano seguinte em oposição a Júlio Prestes, candidato apoiado
pelo presidente Washington Luís.
Antônio
Carlos esperou a consolidação da Aliança Liberal para iniciar as articulações
sucessórias em Minas. Em 21 de outubro de 1929, após uma série de reuniões das
várias facções do PRM, promoveu um encontro com Melo Viana, Venceslau Brás e
Artur Bernardes, sugerindo então uma “fórmula conciliatória”. O candidato à
presidência do estado seria o presidente do Senado estadual e o candidato à
vice-presidência o presidente da Assembléia Legislativa, na época
respectivamente Olegário Maciel e Pedro Marques de Almeida.
Esta solução, além de possibilitar a conciliação das diversas
facções do partido, encobria possivelmente outras intenções. Olegário Maciel
era um homem de idade avançada, podendo-se supor que dificilmente chegaria ao
fim de seu mandato de quatro anos. Assim, ao mesmo tempo em que permitia a
obtenção de um consenso temporário, a adoção desta “fórmula” assegurava
praticamente a continuidade do controle sobre o estado à facção de Antônio
Carlos, sogro do candidato à vice-presidência Pedro Marques de Almeida.
Olegário era amigo de Venceslau Brás e de Bernardes, e
eqüidistante das facções por eles lideradas. Ambos aceitaram sua indicação como
tertius. Melo Viana, porém, recusou-a e, com aprovação unânime das candidaturas
pela convenção do PRM (3/11/1929), afastou-se do partido, aderindo abertamente
à candidatura de Júlio Prestes à presidência da República e ingressando na
organização que se constituía em Minas para conduzir a oposição à Aliança
Liberal, a Concentração Conservadora. A indicação da candidatura de Olegário
Maciel provocou, portanto, uma crise sem precedentes na história do PRM, da
qual o partido não conseguiria se recuperar e de que resultaria em poucos anos
a perda da hegemonia que detinha sobre a política mineira.
Embora
candidato praticamente eleito à presidência do estado — o que efetivamente se
deu — Olegário Maciel figurou como postulante ao Senado Federal na chapa
apresentada pelo PRM às eleições de março de 1930. Em Minas, o processo de
apuração dos votos foi bastante tumultuado, sendo encerrado sem a proclamação
dos candidatos eleitos para a Câmara e o Senado Federal. Dessa forma, o
Congresso reiniciou seus trabalhos em maio sem a presença da bancada mineira,
uma vez que não havia um único candidato diplomado.
Em 21 de maio, a Câmara Federal discutiu o parecer da
comissão de inquérito sobre as eleições mineiras, concluindo pela depuração de
14 candidatos do PRM e a diplomação em seus lugares de representantes da
Concentração Conservadora. Em seguida, a Concentração Conservadora pretendeu
impugnar a eleição de Olegário para o Senado sob a alegação de que teria de
renunciar ao mandato para assumir o governo de Minas. Segundo Bruno de Almeida
Magalhães, o presidente eleito Júlio Prestes teria se oposto à depuração de
Olegário, garantindo o reconhecimento de sua eleição para o Senado.
Nessa
altura ainda não era do conhecimento de Olegário o movimento articulado em
Minas e nos demais estados aliancistas com o objetivo de derrubar o presidente
Washington Luís. Retirado em Patos, Olegário permaneceu à margem da trama
revolucionária até o final de junho de 1930. Nessa ocasião foi chamado por
Antônio Carlos, principal líder do movimento em Minas, para comparecer com
urgência a Belo Horizonte. Antônio Carlos passara a defender uma ação pacífica
ao invés da solução armada e, segundo Virgílio de Melo Franco, desejava
transferir a Olegário a responsabilidade pelo recuo de última hora.
Nesse
meio-tempo, Virgílio de Melo Franco convenceu Cristiano Machado, futuro
secretário de governo de Olegário, a escrever-lhe uma carta sugerindo a
resposta a ser dada a Antônio Carlos. Olegário não atendeu ao chamado de
Antônio Carlos e entrou em contato com Artur Bernardes, solicitando uma
“orientação segura” sobre os rumos da política federal e mineira. Na carta
enviada a Bernardes, Olegário reputava “uma grande calamidade para o país e
especialmente para Minas qualquer movimento armado”. Bernardes respondeu
declarando que a “revolução se tornara a única saída digna deixada pelo
inimigo”. Devido à adesão de Bernardes ao movimento revolucionário, Olegário
redefiniu seu ponto de vista, passando a concordar com a revolução.
Em
26 de julho, quando veio ao Rio de Janeiro para tomar posse do Senado, Olegário
assumiu perante Lindolfo Collor e Joaquim Maurício Cardoso, emissários gaúchos
da Aliança Liberal, o compromisso de apoiar a revolução, impondo porém a
condição de que o movimento fosse deflagrado antes de sua posse no governo de
Minas, marcada para 7 de setembro. A partir desse momento e até a vitória da
revolução, Olegário manteve-se em contato com Getúlio Vargas e Osvaldo Aranha. Em
18 de agosto obteve de Vargas a garantia de que o governo do Rio Grande do Sul
assumiria a responsabilidade ostensiva pela iniciativa do movimento. Em
seguida, várias datas foram fixadas para a eclosão do levante, decidindo-se
afinal esperar pela mudança de governo em Minas.
A
posse de Olegário no governo do estado, em 7 de setembro de 1930, deu ao
governo federal a impressão de que Minas abandonaria o caminho da Revolução.
Havia efetivamente em torno do novo presidente de Minas uma expectativa
pacifista. Com base nessa suposição, Washington Luís ordenou a imediata
retirada de vários contingentes do Exército estacionados em Belo Horizonte
desde o incidente entre aliancistas e concentristas ocorrido na campanha
eleitoral em fevereiro de 1930 em Montes Claros (MG), no qual saiu ferido o
vice-presidente Fernando de Melo Viana. Na capital mineira permaneceu apenas o
12º Regimento de Infantaria (12º RI), que tinha ali a sua sede.
Logo
após a instalação de seu governo, Olegário autorizou a emissão de trezentos mil
contos em apólices do Tesouro do estado para fazer frente à grave situação
financeira de Minas. Desde 1929 Minas vinha enfrentando sérias dificuldades de
ordem financeira em virtude da decisão do governo federal de suspender a
entrega dos recursos provenientes do imposto de exportação do café. A medida
fora tomada em evidente represália ao governo de Minas, após o rompimento de
Antônio Carlos com o presidente Washington Luís. Destinadas ao pagamento do
funcionalismo e da Força Pública, as apólices passaram a ser conhecidas como as
“olegárias”, pois tinham no centro a figura em meio corpo de Olegário Maciel.
Em
meados de setembro, Olegário entrevistou-se com Lindolfo Collor em Belo
Horizonte, aprovando os planos militares da revolução e a imediata fixação da
data do levante contra o governo de Washington Luís. Em 3 de outubro, logo após
o início da sublevação em Porto Alegre e Belo Horizonte, Olegário comunicou aos
prefeitos do interior de Minas a adesão de seu governo à insurreição. Em 48 horas,
forças revolucionárias assumiram o controle do Rio Grande do Sul e de várias
capitais do Nordeste do país. Em Belo Horizonte, o 12º RI resistiu durante
cinco dias, retardando o avanço do movimento no estado.
Após
a rendição do 12º RI, o governo mineiro transferiu-se para Barbacena,
estabelecendo nessa cidade a base das operações militares contra as guarnições
federais aquarteladas em Três Corações, São João del Rei e Juiz de Fora.
Olegário permaneceu em Belo Horizonte, continuando a exercer, pelo menos
formalmente, a chefia do movimento em Minas. Em 15 de outubro, as forças
revolucionárias já controlavam a maior parte do estado, após alguns combates
com as poucas tropas federais fiéis a Washington Luís. Tornou-se então evidente
que os combates decisivos seriam travados na faixa de fronteira de Minas com o
estado do Rio, ocupada por tropas paulistas. Na ocasião, Olegário comunicou a
Osvaldo Aranha que as forças mineiras não dispunham de munição suficiente para
prosseguir o avanço em direção ao sul e o alertou para o perigo de uma
contra-ofensiva paulista em território mineiro. Aranha prometeu redobrar a
ofensiva contra São Paulo, a fim de obrigar o recuo das forças que ameaçavam
Minas. Em 23 de outubro, o regimento federal de Juiz de Fora rendeu-se finalmente
às forças rebeldes após um prolongado cerco. As tropas paulistas ainda
ocupavam, porém, importantes posições do sul do estado.
Em
24 de outubro, Olegário foi informado da deposição de Washington Luís no Rio de
Janeiro, reagindo com surpresa e desorientação ao novo curso dos
acontecimentos. Somente no dia seguinte, após receber instruções de Osvaldo
Aranha, assumiu posição em relação à junta governativa que tomara o poder,
conclamando a população mineira a prosseguir a luta até a posse de Vargas na presidência
da República. Em 3 de novembro, Vargas assumiu o cargo de presidente
provisório, na condição de chefe do movimento revolucionário vitorioso.
Reconhecido
como o “general civil” da revolução, Olegário foi o único presidente de estado
que se manteve no cargo após a mudança do regime, apesar do empenho de Osvaldo
Aranha em nomear Virgílio de Melo Franco interventor federal em Minas. Durante
as conversações para a formação do novo governo, Olegário reivindicou a
nomeação do ex-secretário do Interior de Minas, Francisco Campos, para o
Ministério da Educação e Saúde Pública, criado em 14 de novembro por Vargas.
Embora a escolha de Campos tivesse sido acertada desde então, sua posse no
ministério só ocorreria em 6 de dezembro de 1930.
A Legião Mineira
A manutenção de Olegário Maciel no Executivo estadual não
assegurou maior estabilidade política a Minas no período que se seguiu à
Revolução de 1930. Desde sua posse, ele vinha se defrontando com sérias
dificuldades para constituir dentro do PRM um grupo que pudesse servir de base
de apoio ao seu governo. Em novembro de 1930, a ofensiva desencadeada pelos
“tenentes” contra o predomínio oligárquico veio agravar esse quadro de
instabilidade. Por outro lado, Artur Bernardes, o principal chefe oligárquico
visado pelos “tenentes”, intensificou, àquela altura, sua agressiva política de
consolidação de bases no estado. Sua força política chegou inclusive a
sobrepujar as relações e ligações de Olegário com Antônio Carlos. Diante desse
quadro, os “tenentes” passaram a denunciar, por meio da imprensa carioca, a
situação de aparente subordinação de Olegário a Bernardes. A facção bernardista
contava efetivamente com a anuência de Olegário para chegar ao controle do
Executivo estadual. Em 21 de novembro, os secretários Cristiano Machado
(Interior e Justiça), Alaor Prata (Agricultura) e José Carneiro de Resende
(Finanças) tentaram convencer Olegário a renunciar ao cargo.
Nessa
mesma ocasião, Olegário recebeu um telegrama assinado por Francisco Campos,
pelos ministros Osvaldo Aranha (Justiça), José Fernandes Leite de Castro
(Guerra) e Isaías de Noronha (Marinha), o chefe de polícia do Distrito Federal,
João Batista Luzardo, e o ex-chefe do Estado-Maior das Forças Revolucionárias,
Pedro Aurélio de Góis Monteiro, sugerindo a criação em Minas da Legião de
Outubro, como instrumento de defesa e propagação dos ideais da Revolução de
outubro de 1930.
Em 25 de novembro, Olegário formalizou com o porta-voz do
Governo Provisório, Francisco Campos, o acordo para criar a Legião de Outubro
em Minas, desferindo o primeiro golpe contra a facção bernardista. No dia
seguinte à visita de Campos, Olegário demitiu os secretários Cristiano Machado,
José Carneiro de Resende e Alaor Prata, nomeando em seus respectivos lugares
Gustavo Capanema (Interior e Justiça), Amaro Lanari (Finanças) e Cincinato
Noronha Guarani (Agricultura). Segundo Helena Bomeny, a Legião de Outubro
apresentou-se para Olegário como uma “porta aberta para a aliança com o Governo
Provisório”, imprescindível à recuperação econômica e financeira do estado,
seriamente abalado pela crise de 1929 e pelos custos com a Revolução de 1930.
Representava ainda a “garantia de seu fortalecimento como chefe de governo e a
possibilidade de se firmar politicamente através da criação de uma nova base social
de poder”.
A Legião de Outubro foi fundada em Minas em 27 de fevereiro
de 1931, com o lançamento do Manifesto ao povo mineiro, assinado por Francisco
Campos, Gustavo Capanema e Amaro Lanari. Inicialmente, a Legião encontrou
receptividade das diferentes facções perremistas. Em pouco tempo, porém,
configurou-se como séria ameaça ao predomínio do PRM, vale dizer, à corrente
liderada por Artur Bernardes. Com o beneplácito de Olegário, Gustavo Capanema,
Amaro Lanari e Francisco Campos moveram violenta perseguição aos elementos
bernardistas, utilizando-se dos instrumentos típicos de pressão da política
tradicional. Além disso, criaram um cargo para-militar semelhante ao das
organizações fascistas européias, adotando inclusive o uniforme cáqui que
envergavam os nazistas em ascensão na Alemanha.
Olegário
procurou inicialmente não tornar ostensivo seu apoio à União, mas, em 21 de
abril de 1931, compareceu com a camisa cáqui da organização ao comício-parada
por ele promovido em Belo Horizonte. Alguns dias mais tarde, Olegário anunciou
a dissolução do PRM e sua absorção pela Legião. A partir desse momento, suas
relações com o PRM, basicamente identificado com a facção bernardista,
tornaram-se cada vez mais difíceis. Em junho de 1931, o ministro da Justiça,
Osvaldo Aranha, rompeu publicamente com a Legião de Outubro, criando dentro do
Governo Provisório um centro de oposição a Olegário Maciel. Paralelamente, em
Minas, o PRM tentou reaglutinar suas forças com a organização de um congresso
partidário em Belo Horizonte.
Em
15 de agosto, o congresso do PRM foi inaugurado com uma série de
pronunciamentos e denúncias contra atos do governo de Olegário Maciel, dentre
os quais as facilidades concedidas à Cia. Estrada de Ferro e Força e Luz
Leopoldina-Cataguases, de propriedade de José Monteiro Ribeiro Junqueira,
antigo perremista que aderira à Legião. O deputado Djalma Pinheiro Chagas
propôs que o Congresso se declarasse em sessão permanente em claro desafio a
Olegário. Em meio a esse clima de tensão, ocorreu a fracassada tentativa de
deposição do presidente mineiro articulada por alguns congressistas e o
ministro Osvaldo Aranha, com o apoio velado de Getúlio Vargas.
Em 18 de agosto, o coronel Júlio Pacheco de Assis, comandante
do 12º RI, intimou Olegário a renunciar, alegando ter recebido ordens do Rio de
Janeiro para assumir o governo do estado. Olegário repeliu o golpe com
facilidade devido à pronta intervenção da Força Pública, controlada por seu
secretário Gustavo Capanema, e as gestões de Antônio Carlos, Venceslau Brás e Francisco
Campos junto ao Governo Provisório. Na tarde de 18 de agosto, o coronel Pacheco
de Assis recebeu ordens do ministro da Guerra, Leite de Castro, para
desmobilizar suas tropas. Osvaldo Aranha apressou-se em considerar o episódio
como um simples “equívoco”, mas nem por isso as relações de Minas com o governo
federal deixaram de ser afetadas.
Após
a crise de agosto, Vargas reorientou sua estratégia de ação em Minas,
procurando reforçar seus vínculos com o governo estadual e promover ao mesmo
tempo um acordo entre as forças políticas mineiras. A essa altura, Vargas
passara a considerar como fundamental o apoio integral de Minas a fim de fazer
frente progressiva à oposição de São Paulo ao Governo Provisório. Com a ajuda
de Capanema, Vargas foi capaz de recompor relações com Olegário, bastante
abaladas em decorrência de sua participação nos acontecimentos de agosto.
Olegário
impôs como principal condição para a efetivação do acordo a fusão da Legião
Mineira com o PRM num partido único de apoio aos governos estadual e federal.
Essa fórmula, batizada como “Acordo Mineiro”, foi acertada em fevereiro de 1932
através da formação do Partido Social Nacionalista (PSN). Nessa mesma ocasião,
Olegário concedeu ao antigo PRM duas secretarias — Agricultura e Finanças —, comprometendo-se
ainda a manter intactas as situações municipais. O PSN — também conhecido como
a Frente Única Mineira — reuniu durante um curto período os dirigentes das
distintas facções políticas mineiras, dissolvendo-se em julho de 1932 com a
eclosão da Revolução Constitucionalista de São Paulo.
O movimento constitucionalista
No
primeiro trimestre de 1932, Olegário chegou a endossar o movimento pela
reconstitucionalização do país, liderado pelas frentes únicas de São Paulo e do
Rio Grande do Sul, mas, em abril de 1932, colocou-se, juntamente com os demais
líderes de Minas, ao lado de Vargas, ajudando-o a vencer a crise ministerial
provocada pelas demissões de Maurício Cardoso e Lindolfo Collor, titulares das
pastas da Justiça e do Trabalho, respectivamente, de Batista Luzardo, chefe de
polícia do Distrito Federal, e de João Neves da Fontoura, consultor jurídico do
Banco do Brasil. Francisco Campos preencheu a pasta da Justiça, apesar das
pressões dos partidos gaúchos sobre Minas para que o estado não participasse da
formação do novo ministério. Ainda em abril de 1932, Olegário, Antônio Carlos,
Virgílio de Melo Franco e Artur Bernardes lançaram manifesto declarando ser
“dever do povo mineiro apoiar com firmeza o governo originado da revolução” e
comunicando que emissários mineiros entrariam em contato com os líderes de São
Paulo, do Rio Grande do Sul e do movimento tenentista para tentar um acordo que
garantisse a estabilidade do Governo Provisório.
Em
maio, Vargas resolveu afinal convocar as eleições para a Assembléia Nacional
Constituinte para maio de 1933. Essa decisão não impediu, todavia, o
aprofundamento da crise política nacional. São Paulo, o principal centro de
resistência ao novo regime, intensificou a oposição ao Governo Provisório. Em
junho, após o fracasso das negociações entre Vargas e João Neves da Fontoura,
representante da Frente Única Gaúcha (FUG), São Paulo decidiu lançar-se à luta
armada, recebendo a promessa de adesão de numerosos chefes políticos gaúchos e
do grupo de Bernardes, em Minas. No princípio de julho, Olegário conduziu uma
última tentativa de conciliação, propondo a realização de um encontro dos
dirigentes de São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas em Belo Horizonte. Em 9 de
julho, São Paulo rompeu as negociações, deflagrando o levante contra Vargas.
Durante
os primeiros dias da conflagração, o governo mineiro permaneceu indeciso frente
à Revolução Constitucionalista, hesitando inclusive em ordenar a mobilização da
Força Pública. Em 15 de julho, Olegário definiu afinal a posição de Minas,
manifestando apoio ao Governo Provisório. Logo em seguida, as tropas mineiras
foram enviadas para o sul do estado a fim de conter o avanço das forças
paulistas na região. No decorrer de julho, Olegário recebeu vários apelos de
Mário Brant, Djalma Pinheiro Chagas e Venceslau Brás para defender a causa
paulista, mantendo porém inalterado seu compromisso de solidariedade com
Vargas.
Em meados de agosto, o governador de São Paulo, Pedro de
Toledo, e o chefe militar da rebelião, general Bertoldo Klinger, entraram em
contato com Olegário, propondo a abertura de negociações de paz. Olegário
respondeu afirmativamente, encarregando Gustavo Capanema de entrevistar-se com
o emissário paulista, Fernando Costa, em Três Corações (MG). A proposta
paulista tinha por base a derrubada de Getúlio e a instituição de um governo
presidido por Olegário. Capanema rejeitou a fórmula, reafirmando o compromisso
do presidente mineiro com Vargas e a convicção de que as promessas de
reconstitucionalização seriam cumpridas.
Nesse
mesmo mês, as tropas mineiras penetraram em São Paulo pelo eixo da Mogiana com
destino a Campinas, enquanto outros pontos do estado eram ocupados por tropas
federais. Em Juiz de Fora (MG) Bernardes tentou organizar um grupo de resistência
armada a Olegário logo desbaratado pela polícia. Bernardes refugiou-se em
seguida numa fazenda de Viçosa (MG), sendo descoberto e preso pelas autoridades
mineiras em 23 de setembro. Após a capitulação de São Paulo em 2 de outubro,
Olegário reivindicou a Vargas a deportação dos principais implicados no
levante, em especial a de Artur Bernardes, como principal garantia para a
reconstitucionalização do país e a reorganização partidária em Minas.
O PP e a Constituinte
Em janeiro de 1933, juntamente com Antônio Carlos, Venceslau
Brás, José Monteiro Ribeiro Junqueira, Gustavo Capanema e Virgílio de Melo
Franco, Olegário fundou o Partido Progressista (PP) de Minas Gerais. O PRM se
tornou definitivamente um partido de oposição, bastante enfraquecido em virtude
do exílio de suas principais lideranças: Artur Bernardes, Djalma Pinheiro
Chagas e Mário Brant.
Em
abril de 1933, Olegário encontrou-se com Vargas na Chácara da Floresta, perto
de Juiz de Fora, assegurando o apoio irrestrito da futura bancada progressista
na Assembléia Constituinte ao chefe do Governo Provisório. Vargas prometeu, por
sua vez, apoiar a indicação de um candidato mineiro para a presidência da
Assembléia Constituinte. Em maio, o PP obteve uma ampla vítória nas eleições
constituintes, conquistando 31 cadeiras contra seis dadas ao PRM. Nos meses
seguintes, Minas ascendeu ao primeiro plano da política nacional. Detentora da
maior bancada estadual na Constituinte, constituía-se numa poderosa aliada para
o Governo Provisório e os estados. Em princípio de agosto, Carlos de Lima
Cavalcanti e Juraci Magalhães viajaram a Belo Horizonte, assegurando apoio à
candidatura de Antônio Carlos à presidência da Assembléia Nacional Constituinte
em troca do apoio mineiro às reivindicações específicas de seus estados.
Em 10 de agosto, Olegário participou da reunião da comissão
executiva do PP com os deputados eleitos para definir a plataforma do partido
na Constituinte. Apesar dos entendimentos firmados anteriormente com Vargas, o
programa aprovado pelo PP nesse encontro colidia em vários pontos com o projeto
de constituição elaborado pela Comissão do Itamarati, por incumbência de
Vargas. Foram aprovadas teses como a manutenção do regime federativo, a
autonomia de um regime representativo com duas câmaras eleitas pelo sufrágio
popular e universal e finalmente a oposição à representação de classes na
Assembléia Nacional Constituinte.
Em 5 de setembro de 1933, Olegário Maciel faleceu subitamente
em Belo Horizonte. Com seu desaparecimento, Gustavo Capanema assumiu interinamente
o cargo de interventor estadual e postulou de imediato sua efetivação no posto,
contando para tanto com o apoio do interventor gaúcho José Antônio Flores da
Cunha. Virgílio de Melo Franco também lançou sua candidatura, recebendo o apoio
de vários dirigentes do PP e do ministro da Fazenda, Osvaldo Aranha. Em 12 de
dezembro de 1933, Vargas deu uma solução inteiramente inesperada ao caso,
nomeando Benedito Valadares interventor estadual.
Olegário Maciel foi general-de-brigada honorário do Exército
brasileiro.
Permaneceu
solteiro até o fim de sua vida. Três de seus sobrinhos seguiram a
carreira política. Adélio Dias Maciel e Leopoldo Dias Maciel atuaram na
política mineira. O primeiro foi deputado estadual de 1919 a 1930, constituinte
em 1934 e deputado federal de 1935 a 1937, ao passo que o segundo foi deputado
estadual de 1947 a 1951, deputado federal de 1951 a 1955. Já Lisânias Dias
Maciel trilhou carrreira no Rio de Janeiro. Foi deputado federal de 1971 a
1976, candidato derrotado ao governo fluminense em novembro de 1982,
constituinte em 1987-1988, novamente deputado federal de 1987 a 1991 e de 1991
a 1992 e, finalmente, vereador à Câmara Municipal do Rio de Janeiro, de 1997 a
1999.
Paulo Brandi
FONTES: ABRANCHES,
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