OSÓRIO,
Jefferson Cardim de Alencar
*militar; líder guerrilheiro 1965.
Jefferson Cardim de Alencar Osório nasceu no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, no dia 17
de janeiro de 1912, filho do oficial da Marinha Roberto de Alencar Osório e da
professora e poetisa Corina Cardim de Alencar Osório.
Sentou
praça em março de 1930 na Escola Militar do Realengo, no Rio, mas em 1932,
juntamente com outros alunos, requereu sua exclusão em solidariedade a seis
colegas expulsos por haverem iniciado um movimento contra a participação da
escola no combate às forças rebeldes durante a Revolução Constitucionalista de
São Paulo deflagrada em julho e sufocada em outubro do mesmo ano. Diante dessa
reação dos cadetes, as punições foram revistas e os alunos readmitidos. Em
janeiro de 1934, Jefferson Osório saiu aspirante-a-oficial da arma de artilharia,
sendo promovido a segundo-tenente em agosto do mesmo ano.
Ainda
em 1935 filiou-se à Aliança Nacional Libertadora (ANL), frente política que
defendia um programa nacionalista e antifascista, em setembro de 1936 foi
promovido a primeiro-tenente. Em novembro de 1937, por ocasião do advento do
Estado Novo, exercia a função de subcomandante do Forte Rio Branco, em Niterói
(RJ), onde a maioria da oficialidade, inclusive o comandante, era integralista.
Embora ferrenho opositor do integralismo, foi então detido junto com a
guarnição.
Promovido a capitão em dezembro de 1941, participou em 1943
da fundação de um subdiretório da Sociedade Amigos da América (SAA) em Santa Maria (RS), onde servia. Essa organização, idealizada pelo general Manuel Rabelo e
fundada em janeiro daquele ano, na capital federal, com o objetivo declarado de
apoiar a luta dos países aliados durante a Segunda Guerra Mundial na
preservação dos “ideais democráticos” ameaçados pelo totalitarismo nazi-fascista,
era na verdade um núcleo de oposição ao governo de Getúlio Vargas. Jefferson
Osório promoveu a ampliação da SAA em diversos municípios gaúchos, e participou
das passeatas e dos comícios por ela organizados. Em agosto de 1943 foi preso
por ter feito um discurso contra o Estado Novo, sendo mais tarde libertado. Em 1944 a SAA foi fechada pelo governo.
Foi transferido posteriormente para Cruz Alta (RS), onde
servia em janeiro de 1948, quando viajou ao Uruguai para se casar com Rosa
Lopetegui. Ao retornar ao Brasil foi preso em virtude de o comandante da sua
corporação ter associado a viagem que fizera às homenagens que estavam sendo
prestadas na ocasião ao líder comunista Luís Carlos Prestes naquele país.
Esclarecida a situação foi posto em liberdade e em setembro do mesmo ano foi
promovido a major.
Ao lado de militares nacionalistas, tomou parte na campanha
pelo monopólio estatal da exploração do petróleo, que resultou na criação da
Petrobras em outubro de 1953. Ainda nesse mês foi promovido a tenente-coronel e
em fins de 1956 foi designado subcomandante do 2º Regimento Antiaéreo, em
Quitaúna (SP), sob o comando do então coronel Ernesto Geisel.
Em 1959, por ocasião dos debates em torno da sucessão
presidencial, integrou-se à campanha do general Henrique Teixeira Lott,
candidato lançado pelo Partido Social Democrático (PSD) com o apoio do Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB) às eleições de outubro de 1960. Realizado o
pleito, saiu vitorioso Jânio Quadros, candidato do Partido Democrata Cristão
(PDC), apoiado pela União Democrática Nacional (UDN), que em janeiro do ano
seguinte assumiu o governo em substituição a Juscelino Kubitschek. Após a
renúncia de Jânio em agosto de 1961, Jefferson Osório engajou-se na campanha em
favor da posse do vice-presidente constitucional João Goulart, vetada pelos
ministros militares, sendo novamente preso. Com a superação da crise mediante a
aprovação da Emenda Constitucional nº 4, em 2 de setembro de 1961, que
instituiu o regime parlamentarista no país permitindo a posse de Goulart no dia
7 do mesmo mês, foi posto em liberdade.
Em 1962, serviu em Belém como comandante interino da 8ª
Região Militar. De volta ao Rio de Janeiro, passou o primeiro semestre do ano
de 1963 sem função até ser nomeado para o cargo de diretor-técnico no Lóide
Brasileiro, em Montevidéu. Encontrava-se na capital uruguaia, já no posto de
coronel, quando ocorreu o movimento político-militar de 31 de março de 1964,
que depôs o presidente João Goulart. Opondo-se ao novo regime, regressou
clandestinamente ao Brasil na expectativa de encontrar algum movimento de
resistência. Após passar oito dias escondido retornou ao Uruguai. Em abril de
1964 foi transferido para a reserva por força do Ato Institucional nº 1
(9/4/1964), com base no qual teve seus direitos políticos suspensos por dez
anos em setembro seguinte.
De acordo com seu depoimento, apresentou ao ex-presidente
Goulart, também exilado no Uruguai, um plano de tomada da região do Chuí (RS),
a ser realizado ainda em 1964, mas a operação não foi levada a cabo por falta
de infra-estrutura. Em seguida, em contato com políticos ligados ao presidente
deposto, com Leonel Brizola e Darci Ribeiro, iniciou planejamento de outro
movimento armado junto com o ex-sargento da Brigada Militar do Rio Grande do
Sul, Alberi dos Santos Vieira. O objetivo dessa operação era servir de estopim
para um levante popular contra o novo governo e, caso falhasse, iniciar então
uma guerra de guerrilhas.
Em 19 de março de 1965, Jefferson Osório e Alberi
atravessaram a fronteira do Brasil com o Uruguai em Santana do Livramento (RS)
e deram início à operação, contando com apenas 23 homens, pouco dinheiro e
armamento precário. Seguiram todos para o norte do estado de táxi, trocando de
carro em cada cidade. No dia 25 do mesmo mês atacaram o presídio e o
destacamento militar de Três Passos (RS), tendo Jefferson, na condição de
comandante da operação, lido pela rádio local um manifesto defendendo as
reformas de base e conclamando o povo à luta armada. Atingiram em seguida Tenente Portela (RS), onde tomaram o destacamento local e se apoderaram de armas.
Atravessaram Santa Catarina e, no dia 26 de março, chegaram ao Paraná. Logo no
dia seguinte, nas proximidades de Leônidas Marques, começaram a surgir diversas
unidades do Exército que estavam no seu encalço, mas os rebeldes emboscaram uma
das patrulhas a fim de escapar ao cerco e dispersaram, sendo depois capturados.
Jefferson
Osório, segundo seu próprio depoimento, foi espancado no dia de sua prisão
pelos soldados comandados pelo capitão Dorival Suamini, que integravam a mesma
unidade a que pertencia um sargento que fora morto na emboscada. Os maus-tratos
continuaram no dia seguinte, 28 de março, durante os interrogatórios conduzidos
pelo comandante de Foz do Iguaçu (RS), tenente-coronel Marques Curvo. Após
passar por várias prisões militares, foi condenado pela 5ª Auditoria Militar a
oito anos de prisão, pena aumentada para dez anos pelo Superior Tribunal
Militar (STM) em face de recurso interposto pela promotoria.
Preso
em Curitiba no 5º Regimento de Obuses (5º RO) no início de 1968, planejou sua
fuga com o auxílio do ex-major Joaquim Pires Cerveira, que respondia a processo
em liberdade e com quem teve alguns encontros na Auditoria Militar. Finalmente
conseguiu evadir-se junto com o cabo Luís Vítor Papandreou, e asilou-se na
embaixada do México no Rio de Janeiro. Seguindo para esse país, esteve mais
tarde em Cuba e na Argélia, em cuja capital, Argel, havia uma grande comunidade
de exilados brasileiros. Entre 1968 e 1970 fez diversas viagens, inclusive ao
Chile, buscando o apoio de outros exilados para seu plano de ação militar
contra o governo brasileiro. Contatou sem êxito Miguel Arrais, ex-governador de
Pernambuco, Almino Afonso, líder do extinto PTB, Apolônio de Carvalho, que fora
líder do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e do Partido Comunista Brasileiro
Revolucionário (PCBR), e Joaquim Cerveira, entre outros.
Retornando ao Uruguai em setembro de 1970 para buscar a
família e seguir para o Chile, decidiu viajar de carro através da Argentina,
onde no dia 11 de dezembro foi seqüestrado, tendo ao lado seu filho Jefferson
Lopetegui de Alencar Osório e um sobrinho uruguaio, Eduardo Lopetegui Buadas.
Após cinco dias, três dias depois de o seu sobrinho ter sido repatriado para o
Uruguai, foi entregue com seu filho a oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB)
e ambos foram embarcados para o Rio. Chegando ao aeroporto do Galeão ficaram
presos, segundo seu relato, no Centro de Informações e Segurança da Aeronáutica
(CISA) e foram torturados por ordem do brigadeiro João Paulo Moreira Burnier.
Transferido em fevereiro de 1971 para a fortaleza de Santa Cruz, ali passou
quatro anos e meio. Continuou cumprindo pena no presídio da ilha Grande, de
onde foi removido em maio de 1975, após uma greve de fome de 15 dias realizada
pelos presos políticos. Em janeiro de 1976 foi novamente transferido, dessa vez
para a Divisão Especial de Presos Políticos no presídio da rua Frei Caneca, no
Rio de Janeiro, sendo libertado em novembro de 1977.
No
início de novembro do ano seguinte, juntamente com Alberi, concedeu entrevista
ao Coojornal, que foi publicada em dezembro. Nela declarou que havia ligação entre os exilados brasileiros no Uruguai e em Cuba, e que Leonel Brizola teria
recebido dinheiro daquele país para financiar a guerrilha. Esse dinheiro,
todavia, não chegara a tempo de ser aplicado na chamada Operação Três Passos,
nome pelo qual se tornou conhecido o movimento que liderara. Responsabilizou
também o ex-governador do Rio Grande do Sul pelo fracasso do movimento, na
medida em que não garantira a infra-estrutura e o apoio que lhe prometera.
Ainda nessa entrevista declarou que o ex-embaixador do Brasil em Buenos Aires, Antônio Azeredo da Silveira, então ministro das Relações Exteriores, assinara
um recibo para os militares argentinos contra a sua entrega em 1970 à FAB. Em
dezembro de 1979, através do Jornal do Brasil, o chanceler desmentiu a
informação, negando que ele ou qualquer funcionário de sua embaixada tivesse
participado do episódio. Nos dias subseqüentes, foram publicados na imprensa
diversos desmentidos da versão de Jefferson e Alberi. Ex-exilados e pessoas
ligadas a João Goulart e Brizola, entre os quais Darci Ribeiro, Décio Freitas,
Josué Guimarães e Luís Alberto Muniz Bandeira, negaram, entre outros fatos, que
houvesse dinheiro cubano e que Brizola estivesse a par dos planos de Jefferson
Osório. Acusaram ainda Alberi de ser um “agente provocador”, infiltrado pelos
órgãos de informação brasileiros entre os exilados no Uruguai.
Beneficiado
em agosto de 1979 pela Lei da Anistia, Jefferson Osório foi readmitido em março
do ano seguinte na reserva remunerada do Exército. No dia 26 desse mês, ao
visitar o Rio Grande do Sul para assinalar a passagem do 15º aniversário da
Operação Três Passos, concedeu entrevista coletiva na Assembléia Legislativa
gaúcha, na qual reiterou as acusações feitas a Brizola. Em agosto de 1980 teve
sua anistia anulada por decisão do STM, que reformou a sentença da Auditoria
Militar de Curitiba por entender que ele havia cometido “crimes de sangue”. Em
fins desse mesmo mês, pediu asilo à embaixada da Venezuela, em Brasília, considerando
que seus direitos tinham sido violados, pois já havia cumprido pena. Em
seguida, transferiu-se para aquele país. Em dezembro de 1980 teve seus direitos
novamente suspensos pelo ministro do Exército, general Válter Pires, tendo
perdido inclusive os vencimentos de oficial reformado em conseqüência da
sentença do STM, que foi mantida em 3 de junho de 1981 pela mesma corte.
Ainda em 1981, deixou a Venezuela seguindo para a França.
Residiu nesse país até 1985, quando regressou ao Brasil e teve sua anistia
ratificada pelo presidente da República José Sarney (1985-1990) e pelo ministro
do Exército, general Leônidas Pires Gonçalves.
Faleceu no Rio de Janeiro no dia 29 de janeiro de 1995.
Do seu casamento com Rosa Lopetegui de Alencar Osório, teve
três filhos.
FONTES: ARQ. DEP.
PESQ. JORNAL DO BRASIL; Coojornal (12/78 e 1/79); Diário Oficial
(11/4/64); Estado de S. Paulo (4/9/80); Globo (26/3 e 28/12/80,
4/6/81 e 30/1/95); INF. Jefferson Lopetegui de Alencar Osório; Jornal do
Brasil (20/5/75, 23/11/76, 19/12/78, 3/3, 20 e 22/8/80); MIN. GUERRA.
Almanaque (1958); Veja (9/12/77).