BLOCO
OPERÁRIO-CAMPONÊS (BOC)
Organização vinculada ao Partido Comunista Brasileiro (PCB),
então chamado Partido Comunista do Brasil, criada em 1928 em São Paulo e a seguir em outras capitais do país com o objetivo de se transformar em partido
político. Foi extinto após as eleições presidenciais de março de 1930.
Origens
Nos anos de 1925 e 1926, foi discutida a possibilidade de o
PCB apresentar candidatos às eleições municipais de Santos (SP) e do Rio de
Janeiro, então Distrito Federal. Já nessa ocasião, o jornal A Classe
Operária defendeu a formação de um bloco operário.
Através de uma carta da comissão central executiva do PCB,
endereçada a algumas organizações operárias do estado do Rio de Janeiro e do
Distrito Federal e a deputados como Maurício de Lacerda e João Batista Azevedo
Lima, o partido procurou formar uma Frente Única Proletária no Rio de Janeiro
visando às eleições legislativas de 24 de fevereiro de 1927. Entre os objetivos
da frente, figuravam a defesa de uma política de classe independente, o combate
ao imperialismo, a luta pelo estabelecimento de relações com a União Soviética
e a aplicação das leis sociais. Com a adesão de Azevedo Lima, do Centro
Político Proletário da Gávea e do Centro Político Proletário de Niterói,
formou-se o Bloco Operário, pelo qual se candidataram João da Costa Pimenta e o
próprio Azevedo Lima.
Em
12 de agosto de 1927, foi promulgado o Decreto Legislativo nº 5.221, também
conhecido como Lei Celerada, permitindo a utilização de instrumentos cada vez
mais repressivos contra os sindicatos e os centros operários. Os líderes
comunistas procuraram então fortalecer o Bloco Operário, criando núcleos em
todo o país. Ainda com o objetivo de estender sua penetração e de obter
uma cobertura legal para sua atuação, o PCB procurou se aproximar dos
trabalhadores do campo. Por essa razão, o Bloco Operário passou a se chamar
Bloco Operário-Camponês, defendendo a proposta de uma revolução
democrático-burguesa baseada na aliança operário-camponesa para o combate ao
feudalismo e ao imperialismo.
Atuação
O BOC de São Paulo foi oficialmente criado durante um comício
realizado no dia 1º de fevereiro de 1928. Apesar de o PCB pretender que a
direção do BOC coubesse a líderes locais do partido, foi eleito presidente da
organização Nestor Pereira Júnior, dirigente da Associação de Empregados do
Comércio de São Paulo.
No dia 16 de fevereiro do mesmo ano, pouco antes das eleições
para a Câmara estadual previstas para o dia 24, o BOC paulista organizou um
comício visando a promover o candidato Nestor Pereira Júnior. Ao final da
manifestação, a polícia interveio e prendeu os oradores Ísis de Sílvio e Plínio
Gomes de Melo, representantes respectivamente dos jornais O Combate e
Folha da Noite. Ainda durante a campanha eleitoral, o jornal O
Internacional declarou que os candidatos representativos do proletariado,
uma vez eleitos, deveriam estar sujeitos ao controle do PCB, atuando na Câmara
segundo as diretrizes do partido.
Entretanto,
devido à repressão policial que se vinha abatendo sobre seus militantes, o BOC
paulista retirou a candidatura de Nestor Pereira Júnior às vésperas das
eleições e recomendou a seus eleitores que votassem no Partido Democrático (PD)
de São Paulo. Tal decisão provocou a indignação do comitê central do BOC,
sediado no Rio de Janeiro, que, além de não ter sido consultado, soube da
notícia pela imprensa dois dias antes do pleito.
Para concorrer às eleições municipais de 28 de outubro de
1928, o BOC lançou as candidaturas de Otávio Brandão e Minervino de Oliveira no
Rio de Janeiro, de Everardo Dias, membro da União de Trabalhadores Gráficos de
São Paulo, nessa cidade, e de João Freire de Oliveira em Santos. A polícia interveio num comício eleitoral realizado no dia 27 de setembro no Rio de
Janeiro, prendendo durante alguns dias os candidatos Brandão e Minervino. Na mesma
ocasião, foi morto um trabalhador do Arsenal Naval. No dia seguinte, alguns
deputados, entre os quais Henrique Dodsworth, Azevedo Lima, Adolfo Bergamini,
Paulo de Morais e Barros e José Adriano Marrey Júnior, solicitaram uma
declaração de pesar da Câmara pelo acontecido, não sendo atendidos.
Durante a apuração dos votos no Rio de Janeiro, foi intensa a
luta entre o governo e a oposição, traduzida sobretudo na disputa entre os
candidatos Sirínio Carreiro de Oliveira e Minervino de Oliveira. Embora surgissem
inúmeras denúncias de fraude contra os candidatos do BOC, tanto Otávio Brandão
como Minervino foram eleitos, esse último com pequena vantagem sobre Carreiro
de Oliveira. Iniciou-se então a luta, apoiada por A Classe Operária, para
que a eleição de Brandão e Minervino fosse reconhecida.
Em fins de dezembro de 1928, a morte em acidente aéreo de Ferdinand Labouriau Filho, eleito em outubro para o Conselho
Municipal do Rio de Janeiro na legenda do Partido Democrático, deu novo rumo à
disputa entre Minervino e Carreiro de Oliveira. Com o intuito de evitar uma
nova eleição para preencher a vaga de Labouriau, o intendente municipal Nélson
Cardoso propôs que Carreiro de Oliveira a ocupasse. O deputado Castro Rebelo,
do PD, apoiado por Azevedo Lima e Maurício de Lacerda, discordou da proposta,
pois Carreiro de Oliveira não havia sido eleito. A desavença levou o PD a
promover um comício de protesto em frente ao Conselho Municipal. A polícia
interveio sob as ordens do delegado Pedro de Oliveira Sobrinho, que exigiu a
transferência do ato para o Teatro Municipal. Participaram do comício Adolfo
Bergamini, Maurício de Lacerda, Paulo de Morais Barros e Otávio Brandão. A
despeito dos protestos do BOC e do PD, entretanto, o Conselho Municipal aprovou
o projeto de Nélson Cardoso.
Por
ocasião do III Congresso Nacional do PCB, realizado entre os dias 29 de
dezembro de 1928 e 4 de janeiro de 1929 na sede da Federação Operária do Estado
do Rio de Janeiro, em Niterói, foi discutida a posição do partido frente ao
BOC. A direção do congresso procurou deixar claro que o PCB era um partido
revolucionário que devia limitar sua atuação às atividades do BOC, ou seja, às
“formas de luta legais”. Para que o controle do PCB sobre o BOC fosse
reforçado, foi proposta a formação de comitês que mobilizariam as massas mesmo
fora do período eleitoral. Na mesma ocasião, o BOC de São Paulo e do Rio de
Janeiro foi acusado de exercer “uma política de conciliação e cooperação com a
burguesia” devido à aliança com o PD durante o período eleitoral.
Segundo Edgar de Decca, o BOC se constituíra em 1928 como um
interlocutor aceito pelo acordo de oposições ao governo federal e como o único
porta-voz da classe operária considerado legítimo. Entretanto, a partir dos
primeiros meses de 1929, a atitude do BOC de apoio à greve dos gráficos de São
Paulo, somada à defesa das leis sociais e ao incentivo à organização de uma
confederação geral do trabalho e à arregimentação do operariado em torno dos
sindicatos, constituiu, segundo o mesmo autor, uma “transgressão às normas do
jogo político” vigente, que acabou por levar as demais forças políticas
antioligárquicas até então aliadas “a redefinirem suas posições em relação ao
proletariado”.
Em meados de março de 1929, foi criado o BOC do Rio Grande do
Sul, tendo como principal articulador o escritor e jornalista Plínio Gomes de
Melo. Pretendendo “fazer a política dos trabalhadores contra a burguesia”, o
BOC gaúcho se propunha a lutar em defesa do salário mínimo, da jornada de oito
horas de trabalho, de melhores condições de trabalho e de vida para a população
e do contrato coletivo de trabalho.
No
decorrer de 1929, os discursos dos intendentes municipais Otávio Brandão e
Minervino de Oliveira foram cuidadosamente analisados pelos líderes do PCB.
Enquanto Brandão, além dos trabalhos no Conselho Municipal, dirigia A Classe
Operária ao lado de Danton e José Jobim, Minervino de Oliveira dedicava-se
a tarefas de organização. Ambos apresentaram projetos de lei em favor dos
trabalhadores do município, relativos sobretudo às questões de salário mínimo e
férias, que nem chegaram a ser postas em votação. Por outro lado, o militante comunista Leôncio Basbaum atacava a atuação de Brandão e
Minervino, acusando-os de desenvolver uma política de conciliação com a
burguesia e de desprezar questões políticas de interesse mais geral.
Em meados de 1929, Otávio Brandão e Minervino de Oliveira,
eleito em abril secretário-geral da Confederação Geral do Trabalho, foram
presos por terem liderado através do BOC a greve da Companhia Manufatora
Fluminense, em Niterói. Nessa mesma época, por não acreditar que a Aliança
Liberal pudesse cumprir um programa comprometido com “a libertação das massas
proletárias e pequeno-burguesas”, o PCB decidiu lançar um candidato próprio
para concorrer às eleições presidenciais de março de 1930. No dia 6 de
novembro, a polícia dissolveu uma reunião na casa de Otávio Brandão, na qual
seriam escolhidos os candidatos do BOC. No entanto, em reunião secreta
realizada na mesma noite foram finalmente escolhidos os candidatos comunistas:
Minervino de Oliveira concorreria à presidência da República, o ferroviário
Gastão Valentim Antunes à vice-presidência, Fenelon José Ribeiro ao Senado e o
advogado Paulo de Lacerda, ao lado do gráfico Mário Grazini, à Câmara Federal.
No dia 7 de novembro, foram realizadas manifestações no Rio
de Janeiro e no Rio Grande do Sul em comemoração ao aniversário da Revolução
Russa. No Rio, onde o BOC aproveitou para apresentar seus candidatos às
eleições, a polícia dispersou a concentração e prendeu várias pessoas.
Por outro lado, era crescente a oposição aos comunistas no
Conselho Municipal. A partir de dezembro de 1929, Otávio Brandão passou a
expressar suas opiniões somente através de apartes. No início do ano seguinte,
até mesmo os apartes lhe foram negados.
Com o slogan “Votar no BOC é votar na revolução”, os
comunistas procuraram convencer seu eleitorado a não votar na Aliança Liberal,
que recebia amplo apoio devido ao seu programa social. Em 19 de março de 1930,
o BOC indicou para concorrer pelo estado do Rio de Janeiro ao Senado Federal
José Francisco da Silva e à Câmara dos Deputados, o gráfico Duvitiliano
Ramos e o tecelão Domingos Brás. Em São Paulo, Aristides Lobo foi escolhido para concorrer ao Congresso Federal, e no Rio Grande do Sul foi lançada a
candidatura de Plínio Gomes de Melo.
Na primeira quinzena de março, Domingos Brás foi preso em
Petrópolis (RJ) e enviado ao Rio, onde permaneceu detido até as vésperas das
eleições. Em São Paulo, Aristides Lobo foi preso e expulso da cidade. O BOC
denunciou a prisão de centenas de trabalhadores no estado de São Paulo, na
capital e nas cidades de Santos, Ribeirão Preto, Sertãozinho e Catanduva. Em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul os comícios do BOC foram proibidos. Plínio Gomes de Melo
foi preso e deportado para o Uruguai.
Minervino de Oliveira foi preso enquanto presidia um
congresso de trabalhadores agrícolas em Ribeirão Preto. Foi solto e novamente detido no Rio de Janeiro, ao lado de Paulo de Lacerda e Mário Grazini. A polícia invadiu ainda a casa de José Francisco da Silva,
mantendo-o incomunicável até o dia das eleições.
O
resultado das eleições foi desfavorável ao BOC. No Distrito Federal, seu
candidato à presidência recebeu apenas 1% dos votos, enquanto os candidatos ao
Congresso recebiam 2%.
Nos meses seguintes, sob a orientação do secretariado
sul-americano da Internacional Comunista, o PCB passou a adotar uma política de
“proletarização” do partido. Acusado de desenvolver uma política burguesa, o
BOC foi extinto. Essa extinção suscitou os protestos de Otávio Brandão, que era
contra o abandono de uma política de frente popular. Posteriormente, Otávio
Brandão foi expulso do comitê central do PCB.
Mônica
Kornis
FONTES: CARONE, E. República
velha; DECCA, E. 1930; DULLES, J. Anarquistas; PEREIRA, A. Formação.