PACTO
DE UNIDADE E AÇÃO (PUA)
Organização
intersindical de trabalhadores ferroviários, marítimos e portuários, não
reconhecida pelo Ministério do Trabalho, constituída formalmente no Rio de
Janeiro, então estado da Guanabara, em maio de 1961. Juntamente com outras
organizações de trabalhadores consideradas ilegais, foi extinta pelo movimento
político-militar de 31 de março de 1964.
Antecedentes
De
acordo com a legislação sindical brasileira estabelecida na década de 1930, só
eram reconhecidas pelo Ministério do Trabalho as associações de trabalhadores
que representavam grupos de “profissões idênticas, similares e conexas”. Essas
associações estavam submetidas a uma estrutura rígida, marcadas por três níveis
de organização: os sindicatos locais, as federações estaduais e as
confederações nacionais.
Em 1946, numa tentativa de fazer frente a essa legislação,
foi criada a Confederação dos Trabalhadores do Brasil (CTB). Organização
intersindical de orientação comunista, a CTB teve seu funcionamento suspenso
por decreto em maio de 1947.
Em 1951, reconduzido à presidência da República, Getúlio
Vargas procurou mobilizar e ao mesmo tempo controlar as massas trabalhadoras,
estimulando a ampliação da organização sindical. Entretanto, a crescente
deterioração dos salários e a conseqüente perda do poder aquisitivo do
trabalhador desencadearam uma série de movimentos de protesto que culminaram
com a Greve dos Trezentos Mil, realizada em São Paulo em 1953.
Nesse momento, foi constituída uma comissão intersindical de
greve, que no ano seguinte deu lugar ao Pacto de Unidade Intersindical (PUI).
Até o ano de 1958, o PUI comandou as ações políticas e sindicais dos
trabalhadores paulistas. Nessa data, além de o PUI ter sido substituído pelo
Conselho Sindical dos Trabalhadores (CST) de São Paulo, foi criada no Rio de
Janeiro a Comissão Permanente de Organizações Sindicais (CPOS), para coordenar
as atividades dos sindicatos da área.
Ainda em 1958, os ferroviários, os marítimos e os portuários
do Rio de Janeiro passaram a promover campanhas salariais conjuntas,
constituindo a Frente de Unidade Intersindical de Ferroviários, Marítimos e
Portuários, verdadeiro embrião do PUA. Em agosto de 1960, esses setores se
fizeram representar no III Congresso Sindical Nacional dos Trabalhadores por
Osvaldo Pacheco da Silva, presidente da Federação Nacional dos Estivadores. Ao
lado de outros líderes comunistas, Pacheco defendeu nesse encontro a formação
de uma central intersindical nacional.
No mês de novembro de 1960, em protesto contra a disparidade
salarial existente entre funcionários civil e militares, os ferroviários,
marítimos e portuários — funcionários civis de empresas controladas pelo Estado
deflagraram uma greve conhecida como Greve da Paridade. O presidente Juscelino
Kubitschek imediatamente declarou o movimento ilegal. Vários elementos
envolvidos na greve foram presos. Entre eles figuravam os líderes sindicais
comunistas Rafael Martinelli, presidente da Federação Nacional de Ferroviários,
e Hércules Correia dos Reis, dirigente da Federação dos Operários Têxteis do
Rio de Janeiro. Embora reconhecessem a justeza da causa defendida pelos
grevistas, os dirigentes da Confederação Nacional dos Trabalhadores na
Indústria (CNTI), da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio (CNTC)
e da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres (CNTTT)
condenaram a ação dos líderes sindicais comunistas, declarando-se solidários ao
governo. A greve terminou ao final de três dias, quando os participantes do
movimento aceitaram voltar ao trabalho sob a condição de que o Congresso
procedesse à revisão de seus vencimentos.
Atuação
Em maio de 1961, durante uma reunião de representantes de 45
sindicatos filiados à Federação Nacional dos Portuários, à Federação Nacional
dos Marítimos, e à União dos Portuários do Brasil, os ferroviários, marítimos e
portuários que haviam participado da Greve da Paridade criaram o PUA. Osvaldo
Pacheco e Rafael Martinelli tornaram-se os principais dirigentes da nova
organização.
Com
a renúncia do presidente Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961, iniciou-se uma
luta entre os ministros militares, que se opunham à posse do vice-presidente
João Goulart, e os defensores da “legalidade”, entre os quais se incluíam os
setores nacionalistas e comunistas. No mesmo dia 25, 18 mil empregados da
Companhia Estrada de Ferro Leopoldina entraram em greve. No dia 26, os
trabalhadores na construção naval dos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro,
assim como os trabalhadores do porto de Santos, paralisaram o trabalho. No mês
de setembro, como solução para a crise política, foi adotado o regime
parlamentarista com Goulart na presidência da República e Tancredo Neves como
primeiro-ministro.
Em janeiro de 1962, temendo a participação crescente dos
trabalhadores na luta pelas reformas de base, os jornais O Globo, Tribuna da
Imprensa e Diário Carioca publicaram denúncias sobre um plano de greves e
sabotagens preparado para o mês de fevereiro pelos líderes dos ferroviários,
marítimos e portuários. O ministro da Justiça, por sua vez, ameaçou reprimir
qualquer tentativa nesse sentido. Procurando desmascarar a provocação feita
pela imprensa, os líderes do PUA Osvaldo Pacheco, Rafael Martinelli, Raimundo
Castelo de Sousa, presidente da Federação Nacional dos Marítimos, Válter
Meneses, presidente da Federação Nacional dos Portuários, e José Paulo da
Silva, presidente da União dos Portuários do Brasil, lançaram uma nota pública
negando qualquer plano de greve e reiterando seu apoio ao governo de João
Goulart.
Recebendo
um aumento salarial de 40% em maio de 1962, os ferroviários, marítimos e
portuários cariocas de início foram impedidos de realizar uma manifestação de
vitória. O governador da Guanabara, Carlos Lacerda, só permitiu a comemoração
um pouco mais tarde, quando os ferroviários paralisaram o trabalho.
Prosseguindo
sua luta em favor da implantação das reformas de base, as organizações
sindicais lideradas pelos setores nacionalistas e comunistas lançaram
manifestos no mês de junho reivindicando a formação de um novo conselho de
ministros “nacionalista e democrático”. No dia 16, o PUA divulgou um manifesto
de apoio a Goulart na eventualidade de um golpe de Estado. Além disso, propôs
uma plataforma da luta contendo 18 pontos, em sua maioria de caráter político —
entre eles figuravam a rejeição da política financeira do Fundo Monetário
Internacional (FMI), a aprovação pelo Senado do projeto de lei de greve de
Aurélio Viana, a participação dos trabalhadores nos lucros das empresas e a
expropriação das empresas estrangeiras que operavam no setor público.
Ainda em junho, com a renúncia do primeiro-ministro Tancredo
Neves e o início das negociações para a escolha do novo ministério, vários
órgãos sindicais, entre os quais o PUA, se mobilizaram. Diante da recusa da
União Democrática Nacional (UDN) e do Partido Social Democrático (PSD) em
aceitar a indicação de Francisco de San Tiago Dantas para primeiro-ministro,
Goulart sugeriu o senador Auro de Moura Andrade. As lideranças do PUA, da CPOS,
da CST, da CNTI e da Confederação Nacional dos Trabalhadores em
Estabelecimentos de Crédito (Contec) reagiram prontamente, ameaçando deflagrar
uma greve geral caso o Congresso aprovasse Moura Andrade. A indicação do
senador foi de fato aprovada e esses mesmos órgãos sindicais constituíram o
Comando Geral de Greve (CGG). No dia 5 de julho, a despeito da renúncia de
Moura Andrade devido à negativa de Goulart em aceitar os ministros por ele
indicados, o CGG decretou greve geral por 24 horas.
No mês de agosto, o CGG transformou-se no Comando Geral dos
Trabalhadores (CGT), organização intersindical que tinha por objetivo dirigir
as ações políticas e sindicais dos trabalhadores do país. Osvaldo Pacheco
tornou-se o secretário-geral do CGT.
Por outro lado, as tentativas do PUA de ampliar seu raio de
ação, tornando-se um órgão de representação nacional, não tiveram bons
resultados. A não ser por alguma penetração entre os trabalhadores da Estrada
de Ferro Santos-Jundiaí e das docas de Santos, a organização restringiu-se ao
Rio de Janeiro.
Em fins de 1962, o PUA ameaçou promover uma greve geral de
protesto contra o bloqueio norte-americano a Cuba durante a crise dos mísseis,
ocorrida em outubro do mesmo ano. Embora essa greve nunca tenha sido decretada,
o general Peri Bevilacqua, comandante do II Exército, ameaçou intervir no porto
de Santos caso os trabalhadores se recusassem a descarregar navios
norte-americanos.
Em
março de 1963, a CPOS promoveu o I Congresso Sindical dos Trabalhadores da
Guanabara, pretendendo durante o encontro unificar num único comando a própria
CPOS e o PUA. No mês de maio, a atuação da Frente de Mobilização Popular,
integrada pelo PUA, pelo CGT, pela Frente Parlamentar Nacionalista, pela União
Nacional dos Estudantes e pela União Brasileira de Estudantes Secundaristas foi
intensificada pelo deputado federal Leonel Brizola, que procurou assim
manifestar seu desacordo diante do projeto econômico do governo.
No mês de setembro, por ocasião da Revolta dos Sargentos da
Força Aérea e da Marinha, em Brasília, o ministro da Guerra, Jair Dantas
Ribeiro, comunicou ao CGT que não toleraria uma greve geral em solidariedade
aos revoltosos. Segundo o general Bevilacqua, o movimento teria recebido apoio
do PUA, do CGT e do Fórum Sindical de Debates, organização sediada em Santos
(SP). Em resposta, o PUA, o CGT, a CPOS e a CNTI emitiram ordens a todos os
seus membros no sentido de que permanecessem em estado de alerta para uma greve
geral em caso de golpe militar.
Com a repressão desencadeada pelo movimento político-militar
de março de 1964, todas as organizações intersindicais foram fechadas e muitos
de seus líderes presos. Entre estes incluiu-se Osvaldo Pacheco, que foi detido
na sede do Sindicato dos Estivadores do Rio de Janeiro e pouco depois teve seus
direitos políticos cassados.
Mônica Kornis
FONTES: DULLES, J.
Unrest; ERICKSON, K. Sindicalismo; GRIECO, J. Union; HARDING, T. Political;
TELES, J. Movimento; VÍTOR, M. Cinco.