PARTIDO
POPULAR (PP)
Partido político nacional criado em dezembro de 1979, após a
aprovação pelo Congresso Nacional, em 29 de novembro, da reforma partidária que
abriu caminho ao restabelecimento do pluripartidarismo no país. Incorporou-se
em 1982 ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB).
Origens e programa
Diante da iminente extinção da Aliança Renovadora Nacional
(Arena), partido de apoio ao regime militar, e do Movimento Democrático
Brasileiro (MDB), partido de oposição, um grupo de arenistas de tendência
liberal e de emedebistas moderados resolveu se unir para fundar um novo partido.
A denominação Partido Popular só foi definida praticamente nas vésperas de seu
lançamento oficial, e até poucos dias antes de isso ocorrer a imprensa
referia-se à nova agremiação como Partido Democrático Brasileiro (PDB), ou
Partido Popular Brasileiro (PPB).
Por sua composição política e pela conduta cautelosa de seus
principais dirigentes, o PP contava com a simpatia de eminentes membros do
governo do presidente João Batista Figueiredo (1979-1985), como os ministros
Petrônio Portela e Golberi do Couto e Silva, que o viam como uma peça
importante em uma futura transição do poder dos militares para os civis. Por
conta disso, por diversas vezes o PP foi caracterizado, na imprensa e entre os
demais setores políticos brasileiros, como o partido da “oposição confiável”.
Entre
os seus principais líderes e articuladores destacavam-se dois antigos
adversários políticos em Minas Gerais: o senador Tancredo Neves, ex-membro do
Partido Social Democrático (PSD) e a seguir do MDB, e o ex-governador e então
deputado federal Magalhães Pinto, anteriormente ligado à União Democrática
Nacional (UDN) e à Arena. Adversários na política regional e representantes
destacados das duas correntes que deram origem ao PP, Tancredo e Magalhães Pinto
rivalizavam também na nova agremiação, disputando espaços políticos em seu
interior. O papel central desempenhado no partido por Magalhães Pinto, diretor
do Banco Nacional, bem como por outros destacados nomes do empresariado
nacional, como o diretor do Banco Itaú Olavo Setúbal, presidente da seção
paulista do partido, fez com que por vezes o PP fosse caracterizado
pejorativamente como “partido de banqueiros”.
Em
seu manifesto de lançamento, divulgado em solenidade realizada na sede da
Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no Rio de Janeiro, em 20 de dezembro
de 1979, o PP apresentava-se “como um partido de oposição — popular,
progressista e nacionalista — que visa a conquistar democraticamente o
governo”. Ao ato de lançamento do manifesto estiveram presentes as principais
lideranças políticas que aderiram ao partido, como o governador fluminense
Chagas Freitas, o senador Tancredo Neves, os deputados federais Magalhães
Pinto, Tales Ramalho e Miro Teixeira, e os ex-governadores Jaime Canet, do
Paraná; Paulo Egídio Martins, de São Paulo; e Roberto Santos, da Bahia. Além de
contar em seus quadros com o governador do estado do Rio de Janeiro, o PP
nascia como a terceira força do Congresso Nacional. Segundo a revista Veja, em
fevereiro de 1980 o partido possuía seis senadores e cerca de 70 deputados
federais.
Entre
os principais pontos contidos no manifesto de lançamento destacavam-se: a
defesa do voto livre e direto para todos os cargos eletivos; reformas na
Constituição visando ao restabelecimento do regime democrático e à restauração
das prerrogativas do Congresso nas iniciativas legislativas; revisão da Lei de
Segurança Nacional e recomposição do Conselho de Segurança Nacional, de modo a
compatibilizá-los com o estado democrático; livre organização sindical e
estudantil; maior controle sobre as atividades das empresas multinacionais,
incluindo restrições à remessa de lucros para o exterior; restrição das
atividades das empresas estatais aos setores considerados indispensáveis, e
estruturação de uma nova organização rural para promover a prosperidade no
campo, com a eliminação do latifúndio improdutivo e do minifúndio
antieconômico. O manifesto exigia ainda o “rigoroso cumprimento do calendário
eleitoral”, referindo-se explicitamente à realização das eleições municipais
previstas para 1980. Apesar disso, pressões das bases do próprio partido,
principalmente em Minas Gerais, levaram os dirigentes pepistas a desistir de
combater o projeto do governo que cancelava as eleições e prorrogava os
mandatos de prefeitos e vereadores até 1982.
Na
primeira quinzena de fevereiro de 1980, a comissão nacional provisória do PP anunciou o Plano de Ação Política do partido, que reafirmava a plataforma
contida no manifesto de lançamento e detalhava alguns pontos. O novo documento
defendia, entre outros aspectos, o restabelecimento do poder aquisitivo dos
salários e a estabilidade no emprego; a gratuidade do ensino em todos os níveis
e a aplicação de 16% dos orçamentos da União e dos estados no setor
educacional; uma política nacional de saúde e saneamento básico; a reforma do
sistema previdenciário; o apoio à empresa nacional, em especial as de médio e
pequeno porte; medidas emergenciais para o Nordeste; iniciativas de apoio ao
setor agrícola; a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte; a eleição
direta para todos os cargos eletivos, inclusive para a presidência da
República; a reforma tributária em benefício dos estados e municípios; o acesso
gratuito dos partidos políticos ao rádio e à televisão durante as campanhas
eleitorais; a plena liberdade de imprensa; a legalização da União Nacional dos
Estudantes (UNE); o fim da tutela estatal sobre os sindicatos; a revogação do
dispositivo constitucional que permitia ao executivo legislar em matéria
econômico-financeira por decreto-lei, e o controle das contas públicas e da
dívida externa pelo Poder Legislativo.
Atuação
Ainda em 1980, no mês de setembro, a comissão nacional
provisória do partido manifestou apoio à ação do governo contra os atentados
terroristas praticados por adversários da abertura política. Ao contrário de
outros setores da oposição, porém, os pepistas evitavam atribuir a
responsabilidade de tais atentados aos grupos de extrema direita que atuavam nos
órgãos de informação do governo e nas forças armadas. Em 30 de abril do ano
seguinte, contudo, um frustrado atentado a bomba a um show em comemoração ao
Dia do Trabalho, no Riocentro, evidenciou a participação de elementos das
forças armadas nos atentados terroristas. Nos dias seguintes, Tancredo Neves,
presidente nacional do PP, declarou que o governo tinha “a obrigação moral de
esclarecer em detalhes e pormenorizadamente todas as ocorrências à nação”,
aconselhando ainda o presidente Figueiredo a não se deixar intimidar pelos
atentados. Em um comício realizado pelo PP no Rio de Janeiro, Tancredo
manifestou sua crença na consolidação do processo democrático e caracterizou os
atentados como sendo “a reação em seus estertores de agonia”.
Embora
constasse do programa do PP a defesa das eleições diretas em todos os níveis,
em março de 1981 Tancredo Neves admitiu que as eleições indiretas também
poderiam ser democráticas. Afirmando não acreditar que o governo convocasse as
diretas para 1984, o senador mineiro propunha que o sucessor de Figueiredo
fosse escolhido por um colégio eleitoral ampliado, composto não só por
deputados e senadores, como era previsto, mas também por representantes das
categorias profissionais. Dessa forma, segundo então se expressou, se chegaria
a um “colégio eleitoral autêntico”. Durante aquele ano, em diversas ocasiões, a
candidatura presidencial de Tancredo foi lançada por seus correligionários.
Ainda em março de 1981, foram realizadas as convenções
municipais do partido, que segundo o deputado Tales Ramalho contava com
diretórios em 2.142 municípios. Em maio foram realizadas as convenções
estaduais, seguidas pela nacional, em junho. Na ocasião, o PP encontrava-se organizado em 19 dos 22 estados brasileiros, além do território de Rondônia. A
comissão executiva nacional, então eleita, era composta por Tancredo Neves,
presidente, Magalhães Pinto, presidente de honra, Aluísio Alves,
primeiro-vice-presidente, e Miro Teixeira, secretário-geral. O líder do partido
na Câmara era o deputado pernambucano Tales Ramalho, enquanto o catarinense
Evelásio Vieira exercia a liderança da bancada pepista no Senado. Nesse
processo de convenções, foram definidos ainda os candidatos do partido às
eleições para governador em diversos estados: Miro Teixeira, no Rio de Janeiro;
Olavo Setúbal, em São Paulo; Tancredo Neves, em Minas Gerais; Jaime Canet, no Paraná; Aluísio Alves, no Rio Grande do Norte; Sinval
Guazzelli, no Rio Grande do Sul; Alberto Silva, no Piauí; Roberto Santos, na
Bahia, e Antônio Mariz, na Paraíba.
Em
maio de 1981, foi fundado o Instituto de Estudos Políticos Juscelino
Kubitschek, com o objetivo de promover a discussão permanente dos temas
constantes do manifesto e do programa do PP, bem como fornecer subsídios
ideológicos e programáticos à ação partidária.
O
ano de 1981 foi marcado por debates entre governo e partidos oposicionistas em
torno das eleições estaduais e municipais previstas para o ano seguinte.
Preocupado com a possibilidade de perder a maioria no Congresso Nacional, o
governo propôs diversas mudanças nas regras eleitorais, que a oposição
qualificava de “casuísmos”. Em abril, o PP cogitou de propor a dissolução dos
partidos de oposição caso fosse aprovado o projeto do deputado governista
Bezerra de Melo que estabelecia a prorrogação dos mandatos parlamentares
federais (o que acabou não ocorrendo). Diante das indefinições em torno da
legislação eleitoral, o PP chegou a defender o emprego da tática de obstrução
dos trabalhos parlamentares como forma de forçar o governo a apressar o envio
de suas propostas ao Congresso, onde deveriam ser negociadas. Na convenção
nacional do partido, em junho, o governo sofreu críticas de Tancredo Neves,
para quem a nação estava “amordaçada pela pequena minoria que usurpou o poder
pela força e dele não quer sair senão pela força”. Radicalizando suas críticas
ao governo, o senador denunciou ainda a interferência do grande capital
internacional na vida do país ao afirmar que a própria nomeação dos ministros
de Estado era feita “por indicação das nossas nações credoras”. O deputado
Magalhães Pinto também criticava o governo, mas o fazia de forma menos
veemente, ressaltando que faria o possível para que o PP crescesse dentro dos
princípios pelos quais sempre havia lutado, expressos, segundo ele, no
Manifesto dos mineiros e na Revolução de 1964.
Ainda em junho de 1981, diante das dificuldades colocadas
pelo governo à organização dos partidos, foi cogitada a fusão do PP com o
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), dirigido pela deputada federal paulista
Ivete Vargas. A proposta de fusão não foi à frente, porém, sendo duramente
criticada por alguns destacados líderes pepistas, como Olavo Setúbal,
contrariado com a possibilidade de ter que dividir espaço político em São Paulo com o ex-presidente Jânio Quadros, do PTB.
Em
10 de setembro de 1981, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) concedeu o registro
definitivo ao PP. Em novembro, finalmente, o governo aprovou no Congresso a sua
reforma eleitoral, estabelecendo as regras para as eleições de 1982, quando
seriam eleitos os novos governadores, senadores, deputados federais, deputados
estaduais e vereadores, além dos prefeitos da maioria dos municípios brasileiros.
O “pacote de novembro”, como ficou conhecida a reforma eleitoral, proibia as
coligações partidárias através da vinculação dos votos, que obrigava os
eleitores a votar em candidatos de um mesmo partido para todos os cargos em disputa. Com tais medidas o governo forçava a divisão entre os partidos oposicionistas e
reduzia as possibilidades eleitorais das agremiações que não possuíssem bases
municipais sólidas. O PP, apesar de ser o terceiro maior partido do país, apresentava
ainda uma estrutura organizacional precária na maioria dos estados, mesmo
naqueles em que alimentava expectativas de vencer a disputa pelo governo
estadual. Nesses casos, os dirigentes pepistas contavam com a possibilidade de
coligarem-se com outras forças políticas de oposição ou forças governistas
dissidentes.
Frustrado
o projeto de alianças regionais com outros partidos, ganhou força rapidamente
no interior do PP a proposta de fusão com o PMDB, principal herdeiro do antigo
MDB e agremiação oposicionista que se apresentava mais solidamente implantada.
Apesar de combatida por algumas das mais expressivas lideranças do partido,
como Olavo Setúbal, Magalhães Pinto, Tales Ramalho e Herbert Levy, a proposta
de fusão acabou se tornando majoritária entre os pepistas. Em reunião realizada
a 3 de dezembro de 1981, a bancada do partido na Câmara manifestou-se favorável
à tese da fusão dos partidos oposicionistas. No dia 21 do mesmo mês, em
convenção nacional extraordinária, os pepistas decidiram, por 162 votos a 96,
aprovar a incorporação do partido ao PMDB, já que a legislação vigente colocava
obstáculos ao processo de fusão entre as duas legendas. Em 14 de fevereiro do
ano seguinte, uma convenção conjunta dos dois partidos confirmou a
incorporação.
Insatisfeitos
com essa decisão, alguns membros do partido negaram-se a se juntar aos
“radicais” que diziam existir no PMDB. Olavo Setúbal, que optou por manter-se
sem filiação partidária, afirmou então que a incorporação do PP ao PMDB
extinguia a proposta original de um partido reformista de centro e significava
a volta ao bipartidarismo. Magalhães Pinto e algumas outras destacadas
lideranças do partido, como Tales Ramalho e Herbet Levy, optaram por se filiar
ao governista Partido Democrático Social (PDS).
O
governo, por seu turno, preocupado em impedir a reunificação das forças
oposicionistas, tentou impugnar a incorporação junto ao TSE, alegando a sua
insconstitucionalidade. A mesma iniciativa foi tomada por alguns pepistas
insatisfeitos, como o ex-deputado federal gaúcho Clóvis Stenzel. Em março de
1982, porém, o TSE considerou legal o processo de incorporação. Passados apenas
cerca de dois anos de sua fundação, chegava ao fim a trajetória do PP sem que o
partido tivesse tido a oportunidade de disputar qualquer eleição.
André
Couto
FONTES: Estado
de S. Paulo (7 e 10/10/80, 15 e 24/1, 26/2, 29 e 31/3, 9, 11, 14, 28 e
30/4, 3 e 5/5, 23/6, 26/7, 3/9, 2/10, 15, 26 e 28/11, 10, 11 e 20/12/81, 14 e
21/2 e 23/3/82); Folha de S. Paulo (29/3, 5/4, 1 e 3/5, 18, 23, 24 e
27/6, 2 e 26/7 e 11/12/81, 14/2/82); Globo (12/9, 7 e 16/10/80, 29, 30 e
31/3, 12/4, 3, 4 e 8/5, 8/6, 27/9, 26/11, 2, 8, 11, 19 e 21/12/81, 14/1 e
3/3/82); Jornal do Brasil (11/1, 13/2, 10/4, 28/6, 9/10 e 15/11/80,
26/2, 29 e 30/3, 9 e 12/4, 3, 4 e 5/5, 5, 25 e 27/6, 23, 25 e 26/8, 5, 6, 11 e
13/9, 8 e 10/11, 3, 11, 16, 18, 20, 21 e 22/12/81, 14/2, 3 e 10/3/82).