PARTIDOS
POLÍTICOS (Extinção)
A
extinção de partidos políticos foi uma medida governamental adotada em três
ocasiões a partir de 1930: em dezembro de 1937, logo após a implantação do
Estado Novo; em outubro de 1965, quando o Ato Institucional nº 2, que encerrou
o sistema pluripartidário, abriu caminho para a adoção do bipartidarismo, e em
novembro de 1979, quando a reforma promovida pelo governo determinou o fim dos
dois partidos em atividades, a Aliança Renovadora Nacional (Arena) e o
Movimento Democrático Brasileiro (MDB), reintroduzindo o pluripartidarismo na
vida política brasileira.
O
Estado Novo
A proibição ao livre funcionamento dos partidos políticos foi
uma das muitas medidas de cunho repressivo explicitadas pela Constituição
outorgada em 10 de novembro de 1937, que implantou o Estado Novo no Brasil. A
extinção dos partidos só foi entretanto formalizada em 2 de dezembro de 1937,
através do Decreto-Lei nº 37, assinado pelo presidente Getúlio Vargas conforme
a atribuição que o artigo 180 da Carta Magna lhe conferia. A lei facultava aos
partidos subsistirem apenas enquanto “sociedade civil para fins culturais,
beneficentes ou desportivos, desde que não o [fizessem] com a mesma
denominação” com que se apresentavam enquanto partidos políticos. A
transformação dos partidos em sociedades civis foi regulamentada pelo Decreto
nº 2.229, de 30 de dezembro de 1937.
Por
outro lado, a reorganização político-partidária foi um dos elementos que
marcaram o fim do Estado Novo. Em 28 de fevereiro de 1945, o governo emitiu a
Lei Complementar nº 9, que emendava a Constituição de 1937. A lei previa,
entre outros pontos, a promulgação dentro de 90 dias de um decreto fixando a
data das eleições diretas para a presidência da República, a Câmara dos
Deputados, o Senado, os governos e as assembléias estaduais. Outro passo
importante no caminho da redemocratização foi o Decreto-Lei nº 7.474, de 16 de
julho de 1945, concedendo a anistia e restituindo os direitos políticos a todos
os envolvidos nos crimes políticos posteriores a julho de 1934.
Em 28 de maio, cumprindo o disposto na Lei Complementar nº 9,
o governo baixou o Decreto-Lei nº 7.586 — conhecido como Lei Eleitoral —
regulando “o alistamento eleitoral e as eleições”. A essa altura, o brigadeiro
Eduardo Gomes e o general Eurico Gaspar Dutra já haviam sido lançados —
respectivamente pela oposição e pelo governo — como candidatos à presidência.
Em seu artigo 109, o Decreto-Lei nº 7.586 referia-se à criação
de partidos políticos nacionais, definindo-os como “toda associação de pelo
menos dez mil eleitores, de cinco ou mais de cinco circunscrições eleitorais,
que tiver adquirido personalidade jurídica em termos do Código Civil”. Essa
disposição representava uma mudança substancial na situação vigente no país
entre 1930 e 1937, quando a grande maioria dos partidos políticos em
funcionamento era de âmbito estadual. A Lei Eleitoral fixava ainda a data das
eleições presidenciais e parlamentares em 2 de dezembro de 1945 e das eleições
para os governos e as assembléias dos estados em 6 de maio de 1946.
Diante
da transformação do quadro político-institucional, os agrupamentos que vinham,
segundo Hélio Silva, “tomando forma, de modo simultâneo com a retomada democrática,
a partir de fevereiro de 1945”, deram início às providências formais para a
obtenção de registro junto à Justiça Eleitoral, capacitando-se assim a
concorrer como partidos às eleições. Os dois principais pólos de aglutinação
partidária foram o Partido Social Democrático (PSD), de tendência governista, e
a União Democrática Nacional (UDN), de caráter oposicionista, reunida em torno
da candidatura de Eduardo Gomes. Além dessas duas agremiações, destacavam-se o
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), que procurava atrair os votos dos
trabalhadores, e o Partido Comunista Brasileiro (PCB), então chamado Partido
Comunista do Brasil. Ao contrário dos demais partidos, formados no bojo do
processo de redemocratização, o PCB existia desde 1923 em nível nacional, tendo
atravessado um largo período na clandestinidade. Voltando a atuar legalmente
nos primeiros meses de 1945, recebeu registro da Justiça Eleitoral em novembro
daquele ano. Em 1947, entretanto, teve seu registro cassado pelo Tribunal
Superior Eleitoral, sob acusação de que seus estatutos contrariavam os
princípios do regime democrático.
O
movimento militar de 1964
O pluripartidarismo, tal como foi instaurado em 1945, vigorou
até outubro de 1965, sobrevivendo mais de um ano ao movimento militar de 31 de
março de 1964, que afastou o presidente João Goulart do poder. Em 15 de julho
de 1965, o governo federal baixou a Lei nº 4.740, a Lei Orgânica dos Partidos
Políticos ou Estatuto dos Partidos Políticos que, resumidamente, visava limitar
o número de agremiações partidárias no país através de uma série de restrições
ao seu funcionamento. Essa lei foi o resultado do projeto de estatuto orgânico
dos partidos políticos, enviado pelo presidente da República, marechal Humberto
de Alencar Castelo Branco, à apreciação do Congresso no mês de abril.
De
acordo com o artigo 7º da Lei nº 4.740, para se criar um partido político seria
necessária a apresentação de uma proposta contendo as assinaturas de, pelo
menos, 3% do eleitorado nacional, dos quais pelo menos 2% deveriam estar
distribuídos em 11 ou mais estados. O artigo 47 prescrevia que o partido
perderia seu status legal se não alcançasse 3% de votos numa eleição
legislativa nacional, ou não elegesse um mínimo de 12 deputados federais,
distribuídos em pelo menos sete estados.
Um dos principais objetivos da Lei Orgânica dos Partidos
Políticos era alterar radicalmente o sistema pluripartidário, uma vez que a lei
até então em vigor (Lei nº 1.164, de 24 de agosto de 1950) requeria apenas 50
mil votos ou um deputado federal para manter o status legal do partido.
Das 13 agremiações políticas em atividade no país, na época,
apenas quatro — o PSD, a UDN, o PTB e o Partido Social Progressista (PSP) —
tinham condições de atender às exigências da nova legislação.
A reformulação partidária teve continuidade em 27 de outubro
de 1965, quando foi decretado o Ato Institucional nº 2 (AI-2), diploma legal
que ampliava consideravelmente os poderes conquistados pelo Executivo em março
de 1964 às expensas do Legislativo e do Judiciário. Em seu artigo 18, o AI-2
extinguiu todos os partidos políticos então reconhecidos, submetendo a
organização de novos às normas da Lei nº 4.740. Na época em que foi lançado o
ato, oito dos dez pequenos partidos já estavam praticamente extintos (sobravam
apenas o PSP e o Partido Democrata Cristão), ao passo que os três grandes —
PSD, UDN e PTB — estavam empenhados na reorganização de suas estruturas.
Apesar de a Lei Orgânica dos Partidos não se referir à
limitação do número de agremiações em apenas duas, e de o artigo 18 do AI-2 não
conter qualquer disposição quanto à criação de um sistema de dois partidos, era
evidente a intenção do governo de institucionalizar o bipartidarismo. A base
legal desse sistema foi alcançada por meio do Ato Complementar nº 4, de
20 de novembro de 1965, que definiu as regras a serem seguidas para a
reorganização partidária. O ato era necessário para regulamentar as eleições
previstas para novembro de 1966, uma vez que seria impossível aplicar, daquela
data até as eleições, os dispositivos da lei eleitoral.
A
principal cláusula do Ato Complementar nº 4 estabelecia que cada novo partido
teria de obter, para se estruturar, o apoio de um mínimo de 120 deputados e 20
senadores num prazo de 45 dias. Os parlamentares, naquele momento sem legenda,
foram autorizados a se organizar em entidades partidárias provisórias, com o
objetivo de disputar as eleições de 1966.
Apesar de aritmeticamente ter sido possível a constituição de
três agremiações — o Congresso contava na época com 409 deputados e 66
senadores —, foi tão maciça a adesão dos políticos ao agrupamento patrocinado
pelo governo, a Aliança Renovadora Nacional (Arena), que se tornou difícil
estruturar até mesmo um segundo partido. Com efeito, para que o Movimento
Democrático Brasileiro (MDB) pudesse se tornar viável, dois senadores
governistas foram praticamente instados a aderir à agremiação oposicionista.
Em 3 de janeiro de 1966, o Ato Complementar nº 6 prorrogou
até 15 de março daquele ano o prazo para a criação e o registro das novas
organizações partidárias, devido a problemas surgidos dentro da Arena em vários
pontos do país. Em 24 de março, o MDB obteve registro junto ao Tribunal
Superior Eleitoral, o mesmo acontecendo com a Arena no dia 4 de abril.
Formalizava-se, dessa forma, o bipartidarismo no Brasil, com a Arena e o MDB
preenchendo o vazio deixado pela extinção das 13 antigas agremiações
partidárias.
A
volta do pluripartidarismo
Em 22 de novembro de 1979, o Congresso aprovou a reforma
partidária promovida pelo governo do general João Batista de Oliveira
Figueiredo, que extinguia a Arena e o MDB e possibilitava o retorno do
pluripartidarismo à vida política brasileira.
Contando com o apoio maciço da bancada arenista e com a
oposição da maioria dos parlamentares emedebistas, o projeto do Executivo,
apresentado pelo senador arenista Aderbal Jurema, determinava que para a
formação de um novo partido seria indispensável o concurso de, no mínimo, 10%
dos congressistas, ou seja, pelo menos um senador e 47 deputados federais.
No decorrer de 1980, seis partidos obtiveram registro
provisório junto ao Tribunal Superior Eleitoral: o Partido Democrático
Social (PDS), de apoio ao governo, o Partido do Movimento Democrático
Brasileiro (PMDB), o Partido Popular (PP), o Partido Democrático Trabalhista
(PDT), o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Trabalhista Brasileiro
(PTB), todos de oposição.
Sérgio Lamarão
FONTES: CARONE, E.
Terceira; FIECHTER, G. Regime; Jornal do Brasil (21, 22 e 26/11/79); MOTA, P.
Movimentos; SILVA, H. 1938; Veja (21/11/79).