RÁDIO
CLUBE DO BRASIL
Emissora
de rádio carioca, inaugurada em1º de outubro de 1924, uma das primeiras no
Brasil e a segunda no Rio de Janeiro. Quando a Rádio Clube do Brasil começou a
funcionar, já existiam a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, a Rádio Clube de
Pernambuco, a Rádio Clube do Paraná e a Rádio Educadora Paulista. A Rádio Clube
do Brasil foi fundada pelo campista Elba Dias, funcionário dos Telégrafos, que
havia recebido autorização do governo para adaptar uma emissora telegráfica de
quinhentos watts, dando início à nova rádio, instalada em frente ao largo da
Carioca, no alto da Livraria Globo. Operava sob as mesmas condições das
emissoras da época, que, no início do rádio no Brasil, funcionavam como
associações ou clubes, sobrevivendo da contribuição financeira dos ouvintes,
que também participavam emprestando discos.
Em 1926 foram iniciadas as transmissões em cadeia entre a
Rádio Clube do Brasil, no Rio, e a Rádio Educadora, de São Paulo.
Posteriormente, no início dos anos 1930, a Record paulista e a Mayrink Veiga, carioca, também estabeleceram programas em cadeia de forma mais efetiva. No
dia 2 de janeiro de 1930, a Rádio Clube do Brasil transmitiu, da Esplanada do
Castelo no Rio de Janeiro, o primeiro grande comício da Aliança Liberal,
durante o qual Getúlio Vargas apresentou sua plataforma eleitoral. Foi a
primeira vez que o rádio foi utilizado como veículo de propaganda política no
Brasil.
No início da década de 1930, quando a radiodifusão brasileira
começou a ganhar um perfil mais comercial e a se popularizar (com a autorização
oficial para a veiculação de anúncios, em 1932), a Rádio Clube do Brasil
disputava a preferência dos ouvintes do Rio de Janeiro com a Rádio Philips do
Brasil, a Rádio Sociedade, a Rádio Mayrink Veiga e a Rádio Educadora. Waldo de
Abreu, que mantinha o Esplêndido programa na Rádio Clube, improvisava no
ar histórias para exaltar as qualidades dos produtos anunciados e enaltecer as
excelências dos patrocinadores.
Em 12 de julho de 1933, participou da primeira greve de
emissoras radiofônicas no Brasil. Naquela data, a Rádio Clube, a Rádio
Sociedade do Rio de Janeiro, a Rádio Philips e a Rádio Educadora, entre outras,
saíram do ar em represália a uma medida tomada pelas sociedades arrecadadoras,
considerada exagerada: a cobrança dos direitos autorais.
A
Rádio Clube do Brasil foi a pioneira nas transmissões esportivas, com as
irradiações de Amador Santos. Em 1938, o Cassino da Urca investiu duzentos
contos de réis para patrocinar a transmissão direta e exclusiva da Copa do
Mundo daquele ano, realizada na França, através da voz de Gagliano Neto e pelas
ondas da Rádio Clube do Brasil. A rádio fazia então parte das Emissoras
Byington, de Alberto Byington Júnior, uma cadeia que incluía também as rádios
Cruzeiro do Sul do Rio e de São Paulo e a Rádio Kosmos paulista. Sob o comando
de Alberto Byington Júnior, a Rádio Clube do Brasil — então com o prefixo PRA-3
— foi transferida para a avenida Rio Branco, nº 181.
A
Rádio Clube do Brasil foi a primeira emissora em que trabalhou César de Alencar,
um dos mais famosos radialistas brasileiros. Em 1938 César de Alencar começou
como assistente de Renato Murce, locutor esportivo e diretor artístico da
estação durante oito anos. César de Alencar acabou se tornando locutor
esportivo, chegando a locutor-chefe da rádio na década seguinte. Já em 1939
apresentou seus primeiros programas individuais na Rádio Clube, como A hora
dos bairros e Broadway melody.
No final dos anos 1930, o diretor Gagliano Neto tentou formar
nas emissoras Byington um enorme cast com os grandes nomes do rádio
daquele tempo. Gagliano Neto contratou Francisco Alves, Linda e Dircinha
Batista, as irmãs Pagãs e o conjunto regional de Benedito Lacerda, entre
outros. Mas as emissoras não conseguiram manter todas as contratações, fracasso
que levou à saída do diretor.
Na
década de 1940, alguns dos programas de maior sucesso foram: Audições Matias
Rosa, patrocinado pelas Casas Pernambucanas, Mundo de atrações e
Bazar de novidades, programas de auditório com João de Freitas, Música e
romance, rádio-teatro musicado, com originais de Sílvia Regina e
colaboração de Dilermando Reis e José Maria de Abreu, Fim-de-semana,
programa de auditório com Aérton Perlingeiro, o humorístico Cadeira de
barbeiro, apresentado por Aluísio Silva Araújo, sob o patrocínio da revista
O Cruzeiro, os programas esportivos apresentados por Arnaldo Amaral e o
noticiário na voz de Galhardo Guyanaz. Papel carbono — uma espécie de
programa de calouros criado por Renato Murce, em que iniciantes faziam
imitações de artistas consagrados — revelou vários talentos, como Luís Gonzaga,
Baden Powell e José Vasconcelos.
Durante
o período do Estado Novo, o programa Cenas escolares, dirigido por
Renato Murce, foi proibido pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP),
sob a alegação de que o modelo humorístico de escola ali apresentado funcionava
como um mau exemplo para os ouvintes. Proibido o programa, Murce conseguiu
ludibriar os censores, apresentando-o sob novo formato e título, passando a se
chamar Piadas do Manduca. O personagem Manduca era interpretado pelo
comediante Lauro Borges e o sucesso levou o programa a ficar 25 anos no ar.
Lauro Borges e Castro Barbosa desenvolveram na Rádio Clube o programa PRK-20,
que originou o programa PRK-30, de grande sucesso nas rádios Mayrink
Veiga e Nacional, quando os dois comediantes se transferiram para estas
emissoras, e uma referência do humor radiofônico brasileiro.
Em
1942, durante a Segunda Guerra Mundial, Renato Murce escreveu um programa que
ridicularizava o nazismo e o fascismo. Era uma paródia da peça A ceia dos
cardeais, de Júlio Dantas, e que foi denominada O regabofe dos Vândalos.
Veiculado pela Rádio Clube, o programa causou impacto, sendo retransmitido por
emissoras de outras cidades. Esta repercussão levou a Rádio Clube a publicar o
programa em folhetos, cujo lucro da venda foi destinado à Cruz Vermelha
Brasileira. No ano seguinte, Renato Murce e o maestro Arnold Gluckmann (um
alemão antinazista) criaram um novo programa, A epopéia do mundo, também
motivado pelos acontecimentos internacionais. Novamente, a bem-sucedida venda
de folhetos foi revertida para os fundos da Cruz Vermelha. Ainda durante a
Segunda Guerra, a Rádio Clube do Brasil promoveu campanhas de apoio aos
pracinhas brasileiros na Europa, como a “Campanha do Milhão”, em que a emissora
se comprometeu a arrecadar um milhão de cigarros para os soldados da Força
Expedicionária Brasileira (FEB). Em apenas um mês, a Rádio Clube superou o
número previsto.
No
princípio de 1945, já na crise final do Estado Novo, o ministro Souza Costa
sugeriu ao empresário Hugo Borghi que este comprasse a Rádio Clube do Brasil e
as rádios Cruzeiro do Sul do Rio e de São Paulo, que estavam à venda, e as
convertesse em instrumento de defesa do governo. Para tanto, Borghi recebeu uma
contribuição governamental de cinco milhões de cruzeiros. Passou então a
escrever artigos e a falar pelo rádio, arrendando ainda outras emissoras e
formando uma cadeia nacional de 130 estações coligadas. Borghi colocou suas
emissoras a serviço do Movimento Queremista, a partir de sua formação em junho
de 1945.
Com a queda de Vargas em outubro de 1945, Borghi investiu seu
poderio radiofônico em favor da candidatura do general Dutra à presidência da
República. Foi de autoria de Borghi a afirmação de que o brigadeiro Eduardo Gomes
teria declarado não precisar dos votos dos “marmiteiros”. Na verdade, Borghi
aproveitou um discurso de Eduardo Gomes, caracterizando o brigadeiro como uma
figura política antipopular.
O poder de mobilização do rádio brasileiro no período ficou
evidente em 1947, quando da realização das primeiras eleições para a Câmara
Municipal do Distrito Federal após a queda do Estado Novo. Radialistas de
diferentes emissoras foram eleitos vereadores, entre eles Sagramor de Scuvero,
da Rádio Clube do Brasil, que saiu candidata pelo Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB).
Na
classificação do IBOPE em 1950, a Rádio Clube do Brasil aparecia em décimo
lugar no ranking da preferência dos ouvintes no Rio de Janeiro, com
apenas 2% do total, o que indica seu declínio. Nos três primeiros lugares
figuravam a Rádio Nacional, a Rádio Tupi e a Rádio Tamoio, com —
respectivamente — 34%, 20% e 10,3% do total. Em 1951, o faturamento da Rádio
Clube do Brasil com propaganda somava 4,8 milhões de cruzeiros, enquanto as
rádios maiores, como a Nacional e a Tupi, alcançavam 50 milhões e 24 milhões,
nesta ordem.
Em
1951 a Rádio Clube do Brasil foi adquirida por Samuel Wainer, dono do jornal
governista Última Hora. Hugo Borghi havia contraído dívidas junto ao
Banco do Brasil para a importação de equipamentos para a emissora e então
encontrava-se em dificuldades financeiras. Wainer assumiu a rádio e seus
débitos, tendo ao seu lado, como principais acionistas, Lutero Vargas, Mário de
Oliveira Brandão e Luís Fernando Bocaiúva Cunha. A nova diretoria era formada
por Wainer (diretor-presidente), Júlio Cosi (diretor-superintendente), Orlando
Forin (diretor comercial) e Arnaldo Amaral (diretor artístico). Nesta época,
além dos estúdios no centro do Rio de Janeiro, a rádio possuía um terreno à
margem da rodovia Rio-São Paulo, onde se erguia uma torre de 50kw.
Em
1952, o superintendente passou a ser Sérgio Vasconcelos e o escritor e
jornalista Marques Rebelo assumiu o controle acionário da emissora, em uma
estratégia de Wainer para driblar seus inimigos políticos. Carlos Lacerda e
Assis Chateaubriand acusavam Wainer de ter sido beneficiado com financiamentos
ilícitos pelo presidente Getúlio Vargas, na aquisição da Rádio Clube e na
fundação do jornal Última Hora. Carlos Lacerda liderou uma campanha
contra Samuel Wainer que culminou com a instalação de uma comissão parlamentar
de inquérito (CPI) na Câmara dos Deputados, em abril de 1953, para apurar as
transações feitas pelas empresas de Wainer. A CPI na verdade buscava elementos
para envolver Vargas na concessão do empréstimo do Banco do Brasil e com base
nessa relação pedir o impeachment do presidente. A CPI concluiu que o
financiamento se realizara à margem das condições normais, o que obrigou Wainer
a quitar sua dívida. No entanto, a CPI não comprovou nenhum envolvimento de
Vargas.
Ainda
em 1953, Lacerda e Chateaubriand descobriram irregularidades no processo de
transmissão das ações de Wainer para Marques Rebelo, o que pressionou Vargas a
confiscar a concessão da rádio, que foi repassada a Emílio Carlos Kyrillos,
então deputado federal por São Paulo na legenda do Partido Trabalhista Nacional
(PTN). Assim, em 1953 a Rádio Clube do Brasil deixou de existir, surgindo em
seu lugar a Rádio Mundial, que absorveu parte de seus funcionários. A direção
da Mundial foi formada por Arnaldo Amaral (diretor-secretário e de broadcasting)
e Orlando Forin (diretor comercial), integrantes da extinta Rádio Clube, além
de Salim Mansur (tesoureiro), Luís Quirino (diretor artístico) e Raul Longras
(diretor da equipe esportiva).
Carla
Siqueira
FONTES: Anuário
do Rádio-Revista PN (3/50, 8/51, 10/52, 1954); BRANCO, R. C. História;
CASÉ, R. Programa; O livro branco de Última Hora contra a imprensa
amarela (1953); MOREIRA, S. V. O rádio; MURCE, R. Nos bastidores;
Nosso século; Revista Alô — Tudo de Rádio (1949); Revista
Carioca RJ (1937); Revista Rádio Ilustrado (1954); Revista
Radiolândia (1953, 1954); SAMPAIO, M. F. História; WAINER, S.
Minha.