REFORMAS
DE BASE
Propostas
de mudanças consideradas necessárias à renovação das instituições
socioeconômicas e político-jurídicas brasileiras que tinham como objetivo
remover os obstáculos à marcha do processo de desenvolvimento do país. Essas
propostas foram a base do programa de governo do presidente João Goulart
(1961-1964), assumindo o caráter de bandeira política durante a fase
presidencialista daquela gestão. As reformas consideradas prioritárias eram a
agrária, a administrativa, a constitucional, a eleitoral, a bancária, a
tributária (ou fiscal) e a universitária (ou educacional).
Origens
A
expressão “reformas de base” foi empregada formalmente pela primeira vez em
março de 1958, no governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961), quando o Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB) apresentou um documento que discutia as reformas —
incluindo a agrária, a urbana e a constitucional — e destacava também a
disciplina do capital estrangeiro no país, o que implicava uma nova Lei de
Remessa de Lucros. O documento, que viria a constituir o programa do partido,
serviu de base à pregação de João Goulart, vice-presidente da República e
presidente nacional do PTB, em sua campanha para a reeleição à vice-presidência
em 1960.
No ano de 1961, já com Jânio Quadros na presidência do país e
Goulart na vice-presidência, os trabalhistas procuraram estabelecer uma linha
de ação política e doutrinária, elaborada por Hermes Lima e pelo deputado
federal Francisco Clementino de San Tiago Dantas, na qual era ressaltada a
necessidade de o partido transformar-se “num instrumento de reforma, de
mudança, de superação da estrutura social brasileira”.
As
reformas também foram objeto de discussão — dessa vez em âmbito continental —
naI Reunião Extraordinária do Conselho Interamericano Econômico e Social
(CIES), realizada em Punta del Este, no Uruguai, entre 5 e 17 de agosto de
1961. Durante o encontro, foram lançados os fundamentos da Aliança para o
Progresso, programa de ajuda à América Latina patrocinado pelo governo
norte-americano. Entre as reformas básicas anunciadas como necessárias para a
melhoria do nível de vida dos países do continente figuravam as reformas
agrária, tributária, bancária e administrativa.
A renúncia de Jânio e a fase parlamentarista do governo
Goulart
Em 25 de agosto de 1961, o presidente Jânio Quadros
apresentou seu pedido de renúncia, gerando grave crise político-institucional.
O vice-presidente João Goulart, sucessor legal, que se encontrava em
viagem oficial à República Popular da China, não contava com o apoio dos
ministros da Guerra, general Odílio Denis, da Marinha, vice-almirante Sílvio
Heck, e da Aeronáutica, brigadeiro Gabriel Grün Moss, os quais procuraram
impedir sua posse. Em contrapartida, o governador do Rio Grande do Sul, Leonel
Brizola, e o comandante do III Exército, sediado em Porto Alegre, general José
Machado Lopes, insurgiram-se contra a posição dos ministros militares e
mobilizaram o estado em defesa da posse de Goulart.
O impasse só foi superado no dia 2 de setembro, quando o
Congresso aprovou a Emenda Constitucional nº 4 que instituiu no país o sistema
parlamentarista de governo. A instalação do novo regime político retirava do
presidente parte de suas atribuições definidas na Constituição de 1946,
passando-a para a responsabilidade do Conselho de Ministros, cujos integrantes
deveriam ter seus nomes ratificados pelo Congresso. A emenda previa também a
realização de um plebiscito, marcado para o início de 1965, através do qual
seria decidida a manutenção do parlamentarismo. Finalmente, em 7 de setembro
Goulart foi empossado na presidência, indicando o deputado federal por Minas
Gerais, Tancredo Neves, do Partido Social Democrático (PSD), para o cargo de
primeiro-ministro.
Em novembro de 1961, realizou-se um congresso camponês em
Belo Horizonte — que contou com a presença de Goulart — no qual foi lançado o
slogan “Reforma agrária na lei ou na marra”. O equacionamento legal dessa
reforma esbarrava no artigo 141 da Constituição de 1946, que condicionava a
desapropriação de terras ao pagamento prévio de uma indenização em dinheiro. No
Congresso, a maioria dos parlamentares recusava-se a modificar a Carta,
cerrando fileiras em torno da sua inviolabilidade.
No decorrer de 1962, tomou vulto a pressão de setores
nacionalistas e de esquerda identificados com as reformas de base. Nesse ano
surgiu a Frente de Mobilização Popular (FMP), movimento liderado por Leonel
Brizola, que congregava diversos parlamentares, líderes sindicais e
representantes de organizações camponesas e de entidades como a União Nacional
dos Estudantes (UNE), o Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) e o Pacto de
Unidade e Ação (PUA). Brizola e outras lideranças chegaram a pedir o fechamento
do Congresso, instando Goulart a atuar à margem da Constituição para efetuar as
reformas. No interior do Congresso, a Frente Parlamentar Nacionalista (FPN) —
bloco suprapartidário contrário às concessões ao capital estrangeiro e às
remessas de lucro e favorável ao monopólio estatal na exploração do petróleo e
dos minérios brasileiros — incluía entre suas principais teses a defesa das
reformas de base.
Em meio a um clima de grande inquietação social, em junho de
1962 o gabinete Tancredo Neves caiu. As dificuldades para a formação do novo
gabinete evidenciaram a deterioração das relações entre o Executivo e o
Legislativo, estando Goulart disposto a apontar para o cargo de
primeiro-ministro apenas nomes comprometidos com as reformas de base. Nesse
sentido, o presidente indicou San Tiago Dantas, cujo nome, no entanto, foi
vetado pelo PSD e pela União Democrática Nacional (UDN), os dois partidos com
maiores bancadas na Câmara. Com a recusa da Câmara, Goulart teve que propor
outro nome, dessa vez o do pessedista Auro de Moura Andrade, presidente do
Senado. O movimento sindical reagiu, ameaçando paralisar o país, quando o
Congresso aprovou a indicação de Moura Andrade. E a despeito da renúncia deste,
provocada pela recusa de Goulart em aceitar os ministros por ele indicados, os
órgãos sindicais decretaram greve geral por 24 horas. Finalmente, em 10 de
julho o petebista Francisco de Paula Brochado da Rocha assumiu o cargo de
primeiro-ministro.
Em setembro de 1962, após a renúncia de Brochado da Rocha e a
posse de Hermes Lima, Goulart conseguiu arrancar do Parlamento a antecipação,
para janeiro de 1963, do plebiscito que consultaria a opinião pública sobre o
retorno ao presidencialismo. O presidente lançou-se à campanha do plebiscito,
tomando as reformas de base como principal bandeira.
Nas eleições realizadas no mês seguinte, os setores
partidários das reformas se fortaleceram no Congresso. O PTB praticamente
duplicou sua bancada — que passou de 66 para 116 deputados — e a FPN também
aumentou seu número de integrantes, o que conferiu maior intensidade à luta pelas
reformas de base, associada à campanha pelo restabelecimento do
presidencialismo.
Ainda
em outubro foi criada a Superintendência da Política Agrária (Supra), órgão
destinado, entre outros pontos, a planejar e executar a reforma agrária,
promovendo a desapropriação de terras por interesse social. A criação da Supra
vinculava-se estreitamente ao avanço da organização política dos trabalhadores
rurais, manifesto na proliferação de ligas camponesas e sindicatos e nas lutas
pela posse da terra, reivindicando, além da reforma agrária, direitos
trabalhistas para os trabalhadores do campo.
O período presidencialista do governo Goulart
A ampla vitória de Goulart no plebiscito de 6 de janeiro de
1963 representou também o endosso popular às reformas de base. Pouco depois foi
constituído um ministério, disposto, em sua maioria, a executá-las. Esse
ministério refletia o fortalecimento do PTB, partido que recebeu não apenas o
maior número de pastas, como também as mais importantes.
Visando solucionar a crise econômica, que incluía um
acentuado declínio da taxa de crescimento econômico, aliado a uma elevação dos
índices de inflação, o governo Goulart tentou pôr em prática uma política
econômica planificada capaz de atender às necessidades do momento. As
principais diretrizes dessa política foram expressas através do Plano Trienal
de Desenvolvimento Econômico, elaborado em fins de 1962 pelo economista Celso
Furtado, ministro extraordinário do Planejamento.
O Plano Trienal propunha combater a inflação e,
simultaneamente, atingir um alto índice de desenvolvimento econômico. Ao mesmo
tempo seriam implementadas as reformas que eliminariam as barreiras
institucionais. As reformas sugeridas no Plano Trienal eram de dois tipos:
racionalização da ação governamental, em cujo âmbito destacavam-se as reformas
administrativa e bancária, e a eliminação dos entraves institucionais à
“utilização ótima dos fatores de produção”, destacando-se as reformas agrária e
fiscal.
Em
março de 1963, San Tiago Dantas, ministro da Fazenda, viajou a Washington para
discutir um plano de ajuda do governo norte-americano ao Brasil e a negociação
das dívidas do país. Os Estados Unidos condicionaram o auxílio à execução de um
programa de estabilização econômica e de medidas antiinflacionárias, que seriam
avaliadas por uma comissão do Fundo Monetário Internacional (FMI), e à solução
do problema criado com as desapropriações de empresas concessionárias de
serviços públicos, subsidiárias de firmas norte-americanas.
Diante
dessa orientação, setores mais radicais do PTB, liderados por Brizola, passaram
a combater o Plano Trienal e a denunciar o comportamento de San Tiago Dantas
como submisso às exigências norte-americanas. O plano também contou com a
oposição do movimento sindical, devido à política salarial que ele pressupunha.
Em junho foi abandonado.
Paralelamente, no primeiro semestre de 1963, o Executivo
enviou ao Congresso alguns projetos de lei relativos às reformas de base. Em
março Goulart encaminhou um anteprojeto de reforma agrária, no qual alegava ser
impossível a apresentação formal da proposta sem o dispositivo prévio de
alteração dos textos constitucionais. Como competia ao legislativo a iniciativa
em matéria constitucional, o presidente sugeriu que o Congresso promovesse a
emenda visando a alteração da Carta. O PTB encarregou-se de elaborar a emenda
que, no entanto, foi rejeitada em maio no Congresso. Ainda no início de 1963, o
Executivo enviou um anteprojeto de reforma bancária que propunha a criação do
Conselho Monetário Nacional e do Banco Central.
No
mês de maio, as pressões dos setores nacionalistas e de esquerda sobre o
governo se intensificaram. O CGT ameaçou decretar greve geral para exigir do
Congresso a aprovação das reformas, através de mudanças na Constituição, e para
obter um aumento de 70% para os funcionários públicos. Ainda em maio, a
discussão sobre a elegibilidade dos cabos, sargentos e suboficiais — que se
ligava à questão da reforma eleitoral — mobilizou a classe. Durante reunião da
categoria, o subtenente Gelei Rodrigues Correia chegou a declarar que os
sargentos e suboficiais poderiam lançar mão de seus “instrumentos de trabalho
(os fuzis)... para exigir as reformas de base do governo federal”.
Outro tema que provocou muita discussão no Congresso, na
imprensa e na sociedade em geral foi a Lei de Remessa de Lucros, que, embora
tivesse sido aprovada em setembro de 1962 pelo Parlamento, ainda não fora
regulamentada. Goulart determinou então a reativação dos debates sobre a lei,
regulamentada afinal pelo presidente em janeiro de 1964 através do Decreto nº
53.451. Por esse decreto foram aprovados os artigos mais polêmicos, como o 31,
que limitava em 10% sobre o capital registrado as remessas de lucro para o
exterior, e o 32, que considerava as remessas em excesso a esse limite como retorno
de capital.
Com a permanência do impasse no Congresso, que se recusava a
modificar o artigo 141 da Constituição, condição considerada indispensável para
viabilizar a reforma agrária, Goulart determinou à Supra a elaboração da minuta
de um decreto desapropriando as terras situadas às margens dos açudes e das
rodovias e ferrovias federais. A iniciativa governamental provocou reação por
parte do patronato rural, que ameaçou impedir pela força qualquer tentativa de
reforma agrária. A questão agrária, radicalizando as posições políticas, levou
a uma situação de impasse entre o governo e o Congresso, que entravou o
andamento da discussão de todas as demais reformas.
Nesses primeiros meses de 1964, Goulart procurou
estrategicamente mobilizar as massas para a implementação das reformas. Nesse
sentido, determinou a elaboração da mensagem que enviaria ao Congresso por
ocasião da abertura da sessão legislativa de 1964, e convocou um comício,
apoiado pelos sindicatos e por organizações populares, a ser realizado no dia
13 de março, no Rio de Janeiro, pouco antes da abertura dos trabalhos do
Congresso. Outros comícios foram programados para algumas capitais, sendo o
último em São Paulo, onde a campanha pelas reformas culminaria com uma
concentração de um milhão de trabalhadores no dia 1º de maio.
Como
principal orador da manifestação popular que ficou conhecida como Comício das
Reformas, Goulart anunciou a adoção de importantes medidas através de decretos,
entre elas a desapropriação das terras mencionadas no decreto da Supra. O
governador de Pernambuco, Miguel Arrais, e o deputado federal, Leonel Brizola —
além de muitos outros representantes de sindicatos, partidos e organizações de
esquerda e nacionalistas —, compareceram ao ato, buscando consolidar a formação
de uma frente popular de apoio às reformas de base.
Dois
dias após o Comício das Reformas, Goulart enviou ao Congresso mensagem
presidencial a fim de “dar contas da situação do país e solicitar as
providências necessárias à definitiva erradicação dos obstáculos institucionais
e estruturais que impedem a aceleração e consolidação de nosso progresso”. A
mensagem afirmava a “necessidade imperiosa de reformas estruturais e
institucionais... para atender a velhas e justas aspirações populares, ora em
maré montante, que ameaça conduzir o país a uma convulsão talvez sangrenta”.
Ao
longo da mensagem, o presidente referiu-se a uma série de proposições
apresentadas ainda durante a sessão legislativa de 1963 e para as quais tornava
a solicitar a atenção do Congresso, nomeando explicitamente as reformas
bancária, fiscal e administrativa. A mensagem de 1964 propunha também
diretrizes para a “adoção de uma reforma constitucional” que viabilizasse as
demais reformas de base: a agrária, a política e a universitária, para as quais
foram apontados princípios básicos.
A reforma agrária
A
proposta do Executivo consagrava o direito de propriedade, mas seu uso era
condicionado ao bem-estar social, o qual se baseava na “justa distribuição da
propriedade, com igual oportunidade para todos”. Para tal, era necessário
tornar a terra acessível a um maior número de pessoas e promover sua exploração
de forma adequada, visando um aumento da produtividade. Ao mesmo tempo, o
trabalhador rural devia ser objeto de promoção social que o integrasse aos benefícios
da civilização.
A indenização da desapropriação dos latifúndios improdutivos,
efetuada por interesse social, deveria ser feita em títulos da dívida pública,
de valor reajustável pela cotação do mercado, para o que deveria ser
apresentada uma emenda constitucional nos artigos 141 e 147 da Carta de 1946.
A
reforma tornava ilícito manter a terra improdutiva “por força do direito de
propriedade”. O governo poderia desapropriar todas as terras não exploradas ou
“parcelas não exploradas de propriedades parcialmente aproveitadas, quando
excedessem a metade da área total”.
A produção de gêneros alimentícios para o mercado interno
teria prioridade sobre qualquer outro emprego da terra, tornando-se obrigatória
em todos os estabelecimentos agrícolas ou pastoris. O governo também fixaria a
proporção mínima da área de cultivo de produtos alimentícios para cada tipo de
exploração agropecuária nas diferentes regiões do país. E em todas as terras
destinadas a culturas haveria rodízio, sendo a quarta plantação, forçosamente,
de gêneros alimentícios para o mercado interno, de acordo com as normas fixadas
pelo Poder Executivo.
A mensagem presidencial acentuava a esperança nas “grandes
medidas legislativas que, pela abolição da ociosidade de nossas terras férteis,
darão à agricultura a capacidade de produção reclamada para a abundância
desejável”. Segundo o texto, apenas 22% do número total de estabelecimentos (74
mil em números absolutos) com área igual ou superior a quinhentos hectares
atingiam 58% da superfície agrícola total do país, ou seja, 154 milhões de
hectares, num total de 265 milhões. A mensagem considerava o alto índice de
ociosidade da terra, já que nos estabelecimentos de elevada extensão a área
cultivada correspondia a apenas 3,5% da área total.
Para a concretização da reforma agrária, era imprescindível
modificar o parágrafo 16 do artigo 141 e o artigo 147 da Constituição Federal.
A exigência, nele contida, de pagamento prévio e em dinheiro da justa
indenização no caso de desapropriação de terras por interesse social
dificultaria em muito a reforma agrária por torná-la excessivamente onerosa. A
revogação dessa exigência teria que ser feita através de uma emenda
constitucional, facultando o pagamento da justa indenização a prazo ou em
títulos do Estado.
A mensagem presidencial de março de 1964 propunha ao
Congresso incorporarem-se à Carta os seguintes preceitos: supressão da palavra
“prévia” e da expressão “em dinheiro” do texto do parágrafo 16, artigo 141, e
nova redação para o artigo 147: “O uso da propriedade é condicionado ao
bem-estar social. A União promoverá a justa distribuição da propriedade e o seu
melhor aproveitamento mediante a desapropriação por interesse social, segundo
os critérios que a lei estabelecer.”
A reforma administrativa
Assinalando a “necessidade urgente e indeclinável de
reestruturação da máquina administrativa federal”, a mensagem mencionava as
providências tomadas no ano anterior pelo governo para a reestruturação da
administração pública federal, entre as quais a nomeação de um ministro
extraordinário (Ernâni Amaral Peixoto) para a reforma administrativa. Esse
ministério, reunindo técnicos e especialistas, formulou diretrizes
consubstanciadas em quatro anteprojetos de lei, que o governo havia submetido à
apreciação do Congresso ainda na sessão legislativa de 1963: o da Lei Orgânica
do Sistema Administrativo Federal, o da lei que reorganizava o Sistema de
Material do Serviço Público, o da lei que dispunha sobre o Sistema de Mérito no
Serviço Civil Brasileiro e o da lei que alterava a Lei Orgânica do Tribunal de
Contas da União.
Ainda em decorrência dos estudos promovidos por aquele
ministério, havia sido submetido ao julgamento do Congresso um anteprojeto
dispondo sobre a organização administrativa do Distrito Federal, considerada
imprescindível para a consolidação de Brasília como sede do governo.
O
texto presidencial referia-se também ao Decreto nº 52.256, de 11 de julho de
1963, que criara a Coordenação do Planejamento Nacional, órgão aparelhado para
orientar as providências governamentais e estabelecer os critérios a serem
observados na execução de projetos prioritários, possibilitando o desdobramento
do Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, aprovado
anteriormente.
A reforma educacional ou reforma universitária
Para a consecução dessa reforma, era necessária a modificação
dos “dispositivos constitucionais disciplinadores da educação nacional, a fim
de ampliarem-se as garantias de liberdade do docente e redefinir-se o instituto
da cátedra”.
A mensagem presidencial sugeria a conveniência de serem
integrados ao texto constitucional os seguintes princípios: “É assegurada ao
professor de qualquer dos níveis de ensino plena liberdade docente no exercício
do magistério; é abolida a vitaliciedade de cátedra, assegurada aos seus
titulares a estabilidade na forma da lei; a lei ordinária regulamentará a
carreira do magistério, estabelecendo os processos de seleção e provimento do
pessoal docente de todas as categorias, e organizará a docência, subordinando
os professores aos respectivos departamentos; às universidades, no exercício de
sua autonomia, caberá regulamentar os processos de seleção, provimento e acesso
de seu pessoal docente, bem como o sistema departamental, ad referendum do
Conselho Federal de Educação.”
A reforma bancária
A
mensagem do presidente mencionava a proposta do Executivo enviada ao Congresso
em 1963, visando a implantação de um órgão autêntico e centralizado, com
autonomia de decisões, para a direção da política monetária e bancária,
dispondo de maior força coercitiva para o controle de processos inflacionários.
A proposta visava ao mesmo tempo dotar o governo de condições que melhor lhe
permitissem “selecionar o crédito para o impulso das verdadeiras forças de
produção”. A mensagem solicitava que os princípios básicos norteadores do
projeto governamental de reforma bancária fossem mantidos em suas linhas
mestras.
A reforma política ou reforma eleitoral
Essa reforma visava a democratização do processo de
constituição do poder “a fim de que o poder político se torne expressão
legítima dos interesses populares e não da minoria dominante”, num país em que
a população votante não excedia a 21% dos 80 milhões de habitantes em 1963.
Dirigida às “normas discriminatórias da Constituição de 1946,
que provocam a limitação numérica dos quadros eleitorais” impedindo o voto dos
praças, sargentos e analfabetos, a reforma política exigia a alteração da Carta
a fim de nela incorporar as seguintes normas: “São alistáveis os brasileiros
que saibam exprimir-se na língua nacional e não hajam incorrido nos casos do
artigo 135 (incapacidade civil absoluta e condenação criminal) da mesma Carta;
são elegíveis os alistáveis.”
A reforma fiscal ou reforma tributária
A
mensagem presidencial mencionava dois projetos de reforma fiscal enviados ao
Legislativo no ano de 1963. O primeiro, remetido juntamente com a mensagem de
março daquele ano, visando combater a sonegação fiscal, “que defrauda o Tesouro
Nacional a níveis alarmantes”, e o segundo, enviado em dezembro e relacionado
ao anterior, instituindo normas para a cobrança do imposto de renda e
estabelecendo medidas para a modernização do aparelho arrecadador.
Anteriormente,
ainda no período parlamentarista do governo de Goulart, o Executivo havia
apresentado a proposta de reforma tributária, consubstanciada no Projeto nº
3.612, de 1961. Essa proposição governamental dividia-se em oito capítulos,
englobando os seguintes assuntos: imposto de renda, imposto de consumo, imposto
do selo, imposto único sobre lubrificantes líquidos e gasosos, imposto único
sobre energia elétrica, contribuições de melhoria, disposições sobre conselhos
de contribuintes, conselho superior de tarifas e processo fiscal e disposições
diversas.
Os objetivos do projeto eram aumentar a taxa de poupança,
melhorar a composição dos investimentos, obter melhor distribuição da renda
nacional e eliminar o déficit de caixa do Tesouro.
A reforma constitucional
A mensagem de março de 1964 solicitava ao Congresso o exame
das diretrizes formuladas pelo governo “para as modificações do texto
constitucional, visando à consecução pacífica e democrática das reformas de
base”.
A
reforma da Carta Magna de 1946 constituía-se em pré-requisito para a
viabilização de outras reformas como a agrária, a universitária e a eleitoral,
estas duas últimas, como referido acima, constando exclusivamente da
incorporação de algumas normas à Constituição.
Nos dias subseqüentes ao Comício das Reformas e ao envio da
mensagem presidencial ao Congresso, a reação dos setores oposicionistas civis e
militares se intensificou, recrudescendo a conspiração que conduziu ao
movimento político-militar de 31 de março, que depôs João Goulart.
Heloísa Menandro
FONTES: BANDEIRA,
M. Governo; CARONE, E. Quarta; CARVALHO, A. Reforma; CORBISIER, R. Reforma;
Desenv. e Conjuntura (7/62); GOULART, J. Mensagem; SILVA, J. Reforma; SKIDMORE,
T. Brasil; VIANA, C. Reformas; VÍTOR, M. Cinco.