SOCIEDADE NACIONAL
DE AGRICULTURA
Sociedade
civil, com sede na cidade do Rio de Janeiro, fundada a 16 de janeiro de 1897 e
considerada instituição de utilidade pública pelo governo federal através do
Decreto nº 3.549 de 16 de outubro de 1918.
De acordo com seus estatutos, “a SNA tem por finalidade o
exame, o estudo e a colaboração para a solução dos problemas de interesse dos
agricultores, dos pecuaristas e dos industriais das indústrias extrativas e
correlatas, à exceção dos outorgados por lei às entidades sindicais no que se
refere à defesa e representação classistas”.
A instituição, integrada por pessoas físicas e jurídicas,
mantém a Escola de Horticultura Venceslau Belo, no Rio de Janeiro, uma
biblioteca especializada, e a revista A Lavoura, bimensal, publicada desde 1897.
Estruturação
A diretoria da Sociedade Nacional de Agricultura é composta
de 11 membros: presidente, quatro vice-presidentes, três secretários e três
tesoureiros. A diretoria é eleita pela assembléia geral por um período de
quatro anos, sendo permitida a reeleição.
O
órgão máximo da SNA é o conselho superior, formado por 40 sócios titulares,
escolhido pela diretoria e tendo à frente o presidente da instituição. Cada
membro do conselho superior tem como patrono vultos representativos — já
falecidos — da sociedade que tiveram destacada atuação na vida pública
nacional, particularmente no que se refere à agricultura.
A organização administrativa da SNA compreende ainda uma
diretoria técnica, constituída de 15 membros, e uma comissão fiscal, composta
de três titulares e três suplentes.
Primeiros tempos
A Sociedade Nacional de Agricultura surgiu “como um
desenvolvimento natural da campanha dos comícios rurais, das assembléias
agrícolas e das exposições e manifestações” promovidos por elementos ligados à
agricultura durante a década de 1890.
Uma das principais atribuições da sociedade era preencher o
vazio deixado pela extinção do Ministério da Agricultura em 1892 por lei do
governo republicano. A ausência desse ministério se fazia sentir de modo
particularmente grave devido à desorganização provocada pela abolição da
escravatura. Dentro desse contexto, a SNA deveria servir de centro congregador
de todos os esforços e tentativas de melhoria da situação agrária do país.
Sua primeira diretoria, tendo como presidente Antônio Enes de
Sousa, foi eleita a 7 de fevereiro de 1897. Em maio, foi publicado o primeiro
número do jornal A Lavoura, órgão oficial da sociedade, em circulação até hoje. O jornal
era impresso nas oficinas da Casa da Moeda, no Rio de Janeiro, onde a SNA
instalou-se provisoriamente.
Desde
o início de sua história, a SNA se preocupou com o associativismo rural,
incentivando a criação de entidades representativas da classe rural nos
estados, como a Sociedade Agrícola e Pastoril da Bahia, a Sociedade Agrícola de
Pernambuco, a Sociedade Agrícola Fluminense, entre outras.
A SNA dedicou-se também à realização de congressos e
exposições agropastoris e agroindustriais de âmbito nacional, destacando-se o I
Congresso Nacional de Agricultura de 1901, cujas resoluções tiveram grande
impacto sobre a agricultura do país. O congresso, que reuniu representantes de todos os estados
brasileiros, contou com a presença do presidente Campos Sales na cerimônia de
instalação. Outra iniciativa importante foi a implantação do ensino agrícola
prático no país, através da criação em 1899 do Horto Frutícola da Penha, no Rio
de Janeiro.
Por sugestão da sociedade, de acordo com uma das resoluções
do congresso de 1901, o Congresso Nacional sancionou o Decreto nº 979, de 6 de
janeiro de 1903. Esse decreto legislativo foi aprovado pelo Decreto nº 6.532,
do Poder Executivo, de 20 de junho de 1907, que estabelecia que os sindicatos
agrícolas (congregando patrões e empregados) podiam organizar-se,
independentemente da autorização do governo, em sindicatos locais, uniões e
sindicatos centrais.
Com a aprovação em 1905 dos seus novos estatutos, os
propósitos da sociedade de criar um órgão central que defendesse efetivamente
os interesses rurais ganharam impulso. A SNA pensava em fundar uma confederação
agrícola, formada de associações espalhadas por todos os estados brasileiros.
Esse associativismo poderia ter a forma tanto de agremiação (associação civil),
como era o caso da própria sociedade, quanto de sindicato agrícola (associação
profissional), em conformidade com o Decreto nº 979.
Em 1907, o governo atendeu a uma antiga reivindicação da SNA,
criando o Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, implantado durante a
administração do presidente Nilo Peçanha (1909-1910).
A campanha de promoção do associativismo rural continuava no
estado que apresentava resultados mais concretos: o Rio Grande do Sul. Em 1909
foi fundada a Federação das Associações Rurais do Rio Grande do Sul (Farsul),
e, em 1913, a União dos Criadores do Rio Grande do Sul. Em 1914, as duas
entidades se fundiram, adotando a sigla Farsul, e passaram a apoiar a SNA em
sua luta pela criação de uma confederação rural no Brasil.
Em
1915, a sociedade formou uma comissão para estudar a possibilidade de se criar
nos estados uniões rurais que posteriormente se incorporariam à SNA. Em um
longo parecer, a comissão mostrou-se favorável à fundação de associações rurais
estaduais, que se fundiriam em federações, seguindo o modelo já existente no
Rio Grande do Sul. As federações estaduais se filiariam à sociedade, que
serviria de núcleo à futura Confederação Rural Brasileira. Modelos de estatutos
de associações, federações estaduais e de confederação foram redigidos e
distribuídos em todo o país.
Entretanto,
de 1916 a 1919 a SNA — atendendo ao apelo do governo para aumentar a produção
agrícola, aproveitando a guerra na Europa — lançou-se a empreendimentos mais
imediatos, como a promoção de conferências e exposições de produtos agrícolas e
da pecuária. Por esse motivo, os projetos relativos à confederação ficaram
temporariamente em segundo plano.
Em
1926, os estatutos da SNA foram alterados, mantendo-se porém a orientação
básica da instituição, que tinha como objetivo central a organização da classe
rural em associações locais e a filiação destas a órgãos estaduais que, por sua
vez, se filiariam a uma entidade nacional, com sede na capital federal.
Ildefonso Simões Lopes, eleito presidente da SNA em 1926,
retomou o movimento em prol da confederação, enviando para todo o Brasil delegados
itinerantes que lograram estruturar os organismos locais em bases sólidas.
Assim, com a situação alterada, foi fundada a 7 de dezembro de 1928, na sede da SNA, a Confederação Rural Brasileira. No entanto, essa
entidade recém-fundada não cumpriu as atribuições que lhe foram confiadas — a
de órgão centralizador da classe rural brasileira — levando uma existência
formal, à sombra da SNA.
Período pós-1930
Em
meados de 1930, Ildefonso Simões Lopes licenciou-se da presidência da
sociedade, que passou a ser exercida por Augusto Ferreira Ramos. Com a vitória
do movimento revolucionário de outubro de 1930, do qual participou ativamente,
Simões Lopes foi indicado em novembro para presidir uma diretoria do Banco do
Brasil. No início de 1931, por ocasião da escolha da nova diretoria da SNA,
Ildefonso foi mais uma vez conduzido à presidência da instituição. Em
fevereiro, licenciou-se do cargo, sendo substituído pelo primeiro
vice-presidente, Artur Eugênio Magarinos Torres Filho.
Os
revolucionários de 1930 cortaram as subvenções que a SNA recebia do governo
federal, deixando-a em difícil situação financeira. Ainda assim, em 1931 a sociedade promoveu cerca de 20 conferências e debates sobre assuntos agrícolas e econômicos em
geral, procurando chamar a atenção do novo governo para os problemas que
atingiam o país.
A crise econômica mundial, detonada pelo crack da Bolsa de Valores de Nova Iorque em 1929, atingiu com
intensidade variável todos os países capitalistas. O Brasil, frente à retração
da demanda internacional, viu-se às voltas com uma séria crise de superprodução
cafeeira. Em 1932, o Governo Provisório, considerando indispensável o controle
do plantio do café para atenuar a superprodução e o aviltamento do preço do
produto, aprovou a regulamentação de 30 de abril daquele ano, baseada em
parecer da SNA, que estabelecia as bases em que se daria esse controle.
Em 1933, o ministro do Trabalho, Salgado Filho, acolhendo
sugestões da sociedade, nomeou uma comissão para estudar uma lei que protegesse
o trabalho agrícola; a SNA foi representada nessa comissão por seu primeiro
secretário, Antônio de Arruda Câmara. Ao contrário da indústria e do comércio,
que estavam se estruturando nesse período em sindicatos patronais e de
empregados, sob a égide do Estado, a agricultura permanecia praticamente
infensa a esse processo organizativo.
Em
1934, foi criado o Conselho Federal do Comércio Exterior (CFCE), um dos mais
importantes órgãos de política econômica do governo, e Getúlio Vargas convidou
Torres Filho para ser o representante da lavoura. Por intermédio do presidente
em exercício da SNA, a classe rural apresentou várias propostas e sugestões às
autoridades, destacando-se o plano para o desenvolvimento da cultura do trigo
no país, visando diminuir as importações do cereal. Em 1937, o Horto Frutícola
da Penha, mantido pela sociedade, foi transformado na Escola de Horticultura
Venceslau Belo, dedicada à formação de técnicos em agricultura.
Em 1938, a SNA encaminhou à Presidência da República uma
sugestão — endossada pelo governo — para que a Carteira de Crédito Agrícola do
Banco do Brasil fornecesse empréstimos aos agricultores através de cooperativas
agrícolas. Seu objetivo era incentivar, com essa medida, o cooperativismo e a
difusão do crédito agrícola no Brasil.
A eclosão da Segunda Guerra Mundial em 1939 prejudicou
sensivelmente a importação de máquinas e implementos agrícolas da Europa e dos
EUA, causando graves transtornos à agricultura nacional. Em 1941, a sociedade convocou uma reunião com industriais brasileiros com a finalidade de estudar a
possibilidade de as máquinas serem produzidas no país. As conclusões dessa
reunião foram levadas ao CFCE, que ficou encarregado de tomar as medidas
necessárias.
Em
1942, em assembléia geral, a SNA conferiu ao presidente Getúlio Vargas o título
de presidente de honra da instituição. Em julho desse ano, um incêndio reduziu
a cinzas o edifício Parc Royal, no centro do Rio de Janeiro, onde estava
instalada a sociedade, e destruiu todo o seu patrimônio, inclusive a
biblioteca.
A
SNA, na condição de representante da classe rural, participou do I Congresso
Brasileiro de Economia, realizado no Rio em 1943. Das diversas sugestões que
apresentou, foram aprovadas pelo plenário as referentes ao crédito agrícola e
ao plano de desenvolvimento de uma política agrária que permitisse ao país
atender às necessidades decorrentes do estado de guerra. O congresso também
apoiou a resolução da sociedade, relativa à criação de um conselho nacional de
economia agrária, vinculado ao Ministério da Agricultura, que teria como
objetivo traçar a política rural brasileira.
Com
a morte de Ildefonso Simões Lopes em 1943, o presidente em exercício da
instituição, Torres Filho, passou a presidente efetivo (4 de dezembro de 1944).
Em 4 de janeiro de 1945, segundo os termos do Decreto-Lei nº 2.227, o
presidente Getúlio Vargas doou à SNA um terreno nas proximidades do aeroporto
Santos Dumont, onde foi construída sua sede definitiva — a Casa da Agricultura
— inaugurada oficialmente em abril de 1954.
A
questão da organização da classe rural passou a merecer maior atenção do
governo em 1941, quando foi constituída uma comissão, presidida por Torres
Filho, para discutir o assunto. O tema foi intensamente debatido e em 24 de
outubro de 1945, através do Decreto-Lei nº 8.127, foi criada a Confederação
Rural Brasileira (CRB), constituída pelas federações da agricultura de diversos
estados do país. Com a deposição de Getúlio Vargas (29/10/1945), o decreto-lei
sofreu cerrada oposição, adiando a implantação definitiva da confederação para
1951, quando Vargas voltou ao poder.
O período 1945-1964
No início da década de 1950, começou a ser discutida no país
a questão da reforma agrária. Em janeiro de 1952, o ministro da Agricultura
João Cleofas criou a Comissão Nacional de Política Agrária (CNPA), que tinha
por meta organizar e desenvolver a agropecuária nacional e estimular o
bem-estar no campo. A Sociedade Nacional de Agricultura manifestou sua
confiança no governo Vargas, afirmando que “a classe agrícola do país poderá
trabalhar tranqüila, certa de que em vez da chamada ‘reforma agrária’, teremos
uma Lei Agrária que satisfará os interesses econômicos e sociais
do país”.
Outra questão muito discutida pela sociedade no período foi a
criação do Serviço Social Rural, órgão de amparo ao trabalhador do campo. A SNA
colocou-se contra o projeto do governo, que não permitia a intervenção dos
empresários no órgão: “Os agricultores não se recusam a custear os serviços,
mas é justo que, se pagam, tenham o controle. Assim já acontece com os serviços
da indústria e do comércio e seria odioso abrir uma exceção quanto à classe
agrícola.” A instituição frisou que, com a fundação da CRB, o argumento do
Ministério da Agricultura de que não podia entregar o serviço aos agricultores
porque eles não estavam organizados deixava de ter validade.
O
insuficiente desenvolvimento agrícola do Brasil também foi motivo de
preocupação. A SNA defendia a criação de cursos práticos no campo sob a
responsabilidade da CNPA, dos municípios e dos estados. A crise do setor era,
no entender da sociedade, agravada pelos baixos preços pagos aos produtos
agrícolas que, não oferecendo lucros aos produtores, desestimulavam as
inversões. Outro fator desfavorável eram as “taxas cambiais arbitrárias,
favorecendo as importações em detrimento da agricultura”.
Em
1954, a SNA voltou a se posicionar em relação à reforma agrária, advogando a
assistência técnica, social, econômica e financeira do governo aos
trabalhadores e aos proprietários rurais e condenando a subdivisão das grandes
propriedades, medida considerada antieconômica já que a mecanização da
agricultura — elemento essencial para o aumento da produtividade — não podia
ser introduzida, por razões técnicas, em pequenas propriedades.
A instituição se pronunciou contra a extensão do
salário-mínimo ao campo, argumentando que seus cálculos não haviam sido feitos
sobre bases realistas e que o plano do governo atendia a fins políticos. Na III
Conferência Rural Brasileira, realizada em São Paulo em dezembro de 1954, a sociedade e outras entidades ligadas à agricultura admitiram a ampliação de
dispositivos trabalhistas ao campo, mas com a condição de “... que não ocorra
súbita e violenta subversão nas relações da empresa com o empregado”.
Em
junho de 1955 os estatutos da SNA foram alterados, passando a sociedade a
“dedicar-se mais profundamente às atividades de natureza cultural”, já que a
parte política e de defesa da classe se achava desde 1951 a cargo da CRB. Além disso, o mandato da diretoria foi ampliado para quatro anos. Em setembro,
foi aprovada a Lei nº 2.613, que criou o Serviço Social Rural nos moldes
preconizados pela SNA, ou seja, com a participação direta dos empresários.
Em 1956, a Federação das Associações Rurais do Distrito
Federal, reconhecendo as prerrogativas legais da sociedade, cessou definitivamente
suas atividades, transferindo a responsabilidade de zelar pela classe rural do
Distrito Federal à SNA. A federação transformou-se em Departamento das
Associações Rurais do Distrito Federal, passando a fazer parte da SNA.
Com o falecimento de Artur Torres Filho, em agosto de 1960, o
primeiro vice-presidente Luís Simões Lopes foi conduzido à presidência da SNA.
Os primeiros
anos da década de 1960 foram marcados pela intensificação da discussão sobre a
reforma agrária, acompanhada de uma maior organização política dos
trabalhadores agrícolas. A SNA, da mesma forma que as demais entidades
patronais do campo, desenvolveu uma campanha de oposição sistemática às
tentativas de mudança da estrutura fundiária brasileira. Em setembro de 1961,
Edgar Teixeira Leite, primeiro vice-presidente da sociedade, em palestra no
Instituto dos Advogados do Brasil, afirmou que os problemas agrários do país
não seriam solucionados por uma reforma agrária. O essencial era uma “renovação
agrícola, que proporcionasse amparo e proteção ao rurícola que explora e vive
em terra alheia”. Teixeira Leite acusou as ligas camponesas, entidades formadas
por assalariados agrícolas e pequenos proprietários, surgidas em Pernambuco em
meados da década de 1950, de estarem infiltradas de comunistas que procuravam
subverter as relações de trabalho no meio rural. Defendeu ainda a elaboração de
uma legislação adequada sobre parceria e a locação rural e a implementação de
uma justiça
agrária menos morosa. A SNA já havia redigido, a esse respeito, um anteprojeto
que previa a criação de juntas de conciliação rural com o objetivo de resolver
as questões decorrentes do arrendamento e da parceria agrícolas.
Em 1962, a sociedade apresentou ao Congresso um projeto de
lei que criava o Serviço do Registro de Produção, órgão que teria como
principal atribuição estudar a fixação dos preços mínimos dos cereais e de
outros gêneros da produção agrícola nacional. A crise de abastecimento no Rio
de Janeiro, naquele ano, motivou severa crítica da SNA à Comissão Federal de
Abastecimento e Preços (Cofap), que tabelava os gêneros “a preços que não
cobrem os custos de produção nem as despesas de comercialização”.
O
triunfo do movimento militar de março de 1964 tranqüilizou a classe rural. A
animosidade da SNA para com o governo João Goulart devido à questão da reforma
agrária foi substituída por uma política de franco apoio ao novo grupo no
poder, tendo à frente o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco. A partir
de então, a SNA colocou-se a favor das orientações gerais seguidas pelo regime
militar, discordando apenas em pontos específicos.
Período pós-1964
Em
1967, a SNA pediu investidura sindical ao governo, como Federação da
Agricultura do Estado da Guanabara, não sendo atendida. Para se tornar órgão
federativo, a sociedade teria de sofrer uma transformação estrutural, passando
a aceitar como sócios apenas os agricultores ou empresas agrícolas sediadas
profissionalmente na Guanabara. Como o corpo social da instituição era formado
por pessoas físicas e jurídicas de todo o país, abrangendo categorias não
admitidas no diploma sindical, a SNA preferiu não alterar seus estatutos.
Ainda
em 1967, a linha adotada pelo regime militar com relação aos problemas do campo
foi consubstanciada no Plano Qüinqüenal da Reforma Agrária Brasileira
(1967-1971), elaborado pelo Instituto Brasileiro de Reforma Agrária (IBRA),
órgão criado pela Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964 (Estatuto da Terra).
O objetivo central do plano, que vinha ao encontro do que a sociedade entendia
por reforma agrária, era transformar progressivamente os trabalhadores do
campo, arrendatários e parceiros numa classe média rural, basicamente por meio
da modernização da agricultura. A estrutura fundiária permanecia intocada.
Se,
durante os dois primeiros governos militares (dos marechais Castelo Branco e
Artur da Costa e Silva), ocorreram eventuais pontos de atrito da SNA com o
Estado, a administração do general Emílio Garrastazu Médici (1969-1974) —
caracterizada pelo “milagre econômico” e pela repressão política — recebeu da
instituição um apoio sem reservas e uma grande cobertura para as suas
realizações. Apenas esporadicamente a sociedade se manifestou contra as
determinações do governo. Foi esse o caso quando do congelamento dos preços dos
produtos alimentícios básicos, decretado pelo ministro da Agricultura Luís
Fernando Cirne Lima em 1971, face às previsões de boas safras no país. A
instituição argumentou que aquela medida só daria resultado prático se
abrangesse também os serviços de utilidade pública e os produtos
industrializados.
A posição da SNA frente à atuação do governo foi revista no
período presidencial do general Ernesto Geisel (1974-1979). As taxas de
crescimento da economia brasileira começaram a declinar a partir de 1974, e o
impacto da recessão econômica mundial se fez sentir rapidamente dentro do país.
A política do Estado passou a ser alvo de críticas de diversos setores
econômicos. Na IV Conferência Nacional das Classes Produtoras (IV Conclap),
realizada no Rio em novembro de 1977, a sociedade afirmou que “o elevado grau
de intervencionismo estatal sobre a agricultura deixou o setor sem
representatividade”. Em 1978, nova crítica: “Resta saber se o próximo ministro
da Agricultura poderá gerir os negócios da pasta sem a interveniência dos burocratas
da chamada área econômica do governo, que, na maioria dos casos, nunca viram um
pedaço de terra arável.”
A SNA reivindicou também o fim de todos os controles
governamentais, deixando funcionar livremente as leis do mercado, o que
implicava a extinção de órgãos controladores e tabeladores, como a
Superintendência Nacional de Abastecimento (Sunab) e o Conselho
Interministerial de Preços. Para os produtos de exportação, advogou uma
política cambial capaz de assegurar preços mais estimulantes. O governo deveria
garantir preços mínimos que englobassem os custos do plantio, assim como
crédito adequado e melhor infra-estrutura para o escoamento da produção.
Em junho de 1979, depois de 19 anos no cargo, Luís Simões
Lopes deixou a presidência da SNA, sendo substituído por Otávio Melo Alvarenga.
O período pós-1980
Entre 1980 e o final da década de 1990, sob a gestão de
Otávio Melo Alvarenga, a atuação da SNA foi marcada pela ênfase na promoção de
eventos públicos e na busca da retomada da importância que a entidade já havia
tido nas discussões nacionais acerca de temas como crédito agrícola,
cooperativismo, educação agrícola e justiça agrária, de interesse tradicional
da entidade. Esses anos também foram caracterizados pelo investimento
sistemático da SNA no tema estratégico do meio ambiente e das práticas
ecológicas, que passaram a constar de seus seminários, do currículo de seus
cursos. De outra parte, nesse período a área educacional ganhou destaque e nela
se concentrou a ênfase de seu aparelhamento material e das suas relações com
órgãos e políticas governamentais.
Dentro dos temas tradicionais da sua pauta de discussões, em 1980, a SNA promoveu o Encontro Estadual de Dirigentes de Cooperativas de Produtores do Estado do Rio
de Janeiro, com o objetivo de preparar o temário do Congresso Nacional de
Cooperativismo, e, em parceria com a Sociedade Brasileira de Economia e
Sociologia Rural e a Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Estado do Rio
de Janeiro, realizou o XVIII Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia
Rural, dedicado ao exame do modelo fundiário brasileiro, da política agrária,
da agroindústria e dos mercados interno e externo. Em 1982, a SNA organizou o Painel Ecológico-Econômico sobre o rio Paraíba e o Seminário Internacional de
Crédito Rural, com a presença de representantes de países da América do Norte e
da Europa, de Israel e da Austrália e ministros do governo brasileiro. No
evento, foram debatidas, além das questões relativas ao crédito propriamente
dito, as relativas aos instrumentos legais necessários à sua adequação, como a
criação de uma Justiça agrária especializada, há muito advogada pela SNA.
Três
anos depois, a entidade promoveu o Seminário Nacional de Reforma
Agrária/Justiça Agrária, em parceria com o Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (INCRA) e com o Ministério da Reforma Agrária, no bojo da
divulgação do I Plano Nacional de Reforma Agrária. O documento apresentado
causou descontentamento aos proprietários rurais e foi a tônica das discussões
do evento. O debate prosseguiu em 1986, no I Encontro Internacional de
Jus-Agraristas, em Belém, conclave organizado pela SNA, em parceria com o
governo do Pará, o Instituto de Terras do Pará e a Associação Latino-Americana
de Direito Agrário. Nessa ocasião, foi também discutida a repercussão do Plano
Cruzado — plano de estabilização econômica implantado em 1986 pelo ministro da
Fazenda, Dílson Funaro, do governo do presidente José Sarney (1985-1990) —
sobre o setor, em especial os produtores de leite e hortifrutigranjeiros. Em 1987, a SNA participou da Frente Ampla da Agricultura Brasileira, que promoveu marcha de produtores
rurais em Brasília. Os organizadores do movimento reivindicavam uma definição
governamental sobre a situação do crédito agrícola, garantia de preços mínimos,
estabelecimento de estoques reguladores e tabelamento dos preços.
Por intermédio da revista A Lavoura, a SNA denunciou a escalada inflacionária, que resistia aos
sucessivos congelamentos de preços e salários, e a alta de juros, que
praticamente inviabilizou o crédito agrícola. A intensa crise econômica que
atingiu em cheio o setor no fim da década de 1980 e no início da seguinte
refletia-se não apenas na redução da área plantada no país e na queda
vertiginosa dos preços reais dos principais produtos agrícolas.
Na área educacional, a SNA assinou convênios com o poder
público voltados ao incremento das atividades da Escola Venceslau Belo, ligada
ao ensino agrícola e à difusão de tecnologia: em 1982, com o Ministério da
Agricultura, e, em 1986, com o Ministério da Educação e com a Prefeitura do Rio
de Janeiro. Em 1990, a SNA firmou protocolo de intenções com o governo estadual
que previa a contribuição das secretarias estaduais de Educação, Agricultura e
Meio Ambiente e Ciência e Tecnologia para a revitalização dos 140 mil metros
quadrados de área verde da Escola Venceslau Belo. Suas metas eram a formação de
técnicos agrícolas, a criação de cursos de ecologia e conservação da natureza,
a formação de recursos e treinamento na área de tecnologia rural aplicada, a criação
de visitas orientadas para a rede estadual de escolas públicas e a promoção de
palestras, simpósios e outros eventos destinados ao aperfeiçoamento de
professores. Ao final de 1991, a SNA firmou convênio com a Prefeitura do Rio de
Janeiro destinado à implantação de uma horta-escola no campus da escola agrícola, na Penha, onde deveria ser desenvolvido
o projeto Hortas Comunitárias Ecológicas, dirigido às famílias de baixa renda.
Em
sua nova área estratégica, a ecológica, a entidade criou, em 1987, a Sociedade Brasileira de Proteção Ambiental, organização sem fins lucrativos dedicada ao
incentivo das ações culturais e educacionais no campo da ecologia e que passou
a ocupar um espaço fixo em A Lavoura. Preocupada com a questão ambiental na Amazônia, dois anos depois, a SNA convocou reunião com diferentes
entidades ligadas a essa temática, entre as quais a Associação de Defesa do
Meio Ambiente, ligada ao Museu Nacional do Rio de Janeiro, e a Fundação
Brasileira para a Conservação da Natureza.
Em
1990 foi organizado o Seminário de Reforma Agrária e Direito Ambiental, evento
que sintetizou as principais preocupações da SNA naquele momento. Com a
participação de jus-agraristas nacionais e internacionais, empresários,
ambientalistas e representantes do Ministério da Agricultura e da Secretaria
Nacional de Reforma Agrária, o seminário dividiu-se em quatro módulos: a
produção de alimentos e a reforma agrária, o meio ambiente e o direito agrário,
a experiência latino-americana de reforma agrária, e a função social no direito
agrário.
Em 1991, a SNA realizou o painel Meio Ambiente e
Desenvolvimento, no qual foi dada especial atenção à responsabilidade
empresarial e governamental sobre o tema, preparando as discussões para a
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida
como Rio-92. Nessa ocasião, a SNA promoveu a mostra Espaço Ecológico
Latino-Americano em sua sede social, com o apoio dos consulados do Peru e do
Equador, com exposição de peças de arte e vídeos ecológicos desses países e do
Brasil durante todo o mês de junho.
Ainda
em 1991, a entidade firmou convênio com o Ministério da Agricultura e Reforma
Agrária, com o objetivo de oferecer treinamento gerencial aos responsáveis pela
gestão das cooperativas de produção no estado do Rio de Janeiro, assim como
divulgar, através de A
Lavoura, material de interesse do
setor cooperativista.
Em
1992 a SNA voltou aos temas relacionados à política agrícola, organizando na
Fazenda-Escola Venceslau Belo uma reunião dos membros da Pleninco, instituição
que congrega entidades empresariais fluminenses, assim como a mesa-redonda
Mercosul — suas decorrências no agribusiness
no Brasil e no Uruguai, com a participação do embaixador uruguaio no Brasil e
de empresários fluminenses. Em 1993, promoveu o I Fórum Nacional da
Agricultura, que reuniu empresários, autoridades e especialistas do setor rural
para diagnosticar problemas e procurar soluções para a modernização do modelo
agrícola brasileiro. No fórum, as propostas de produtores e técnicos acerca da revisão
da política de subsídios e crédito rural foram entregues ao ministro da
Agricultura, Abastecimento e Reforma Agrária. Seus anais foram lançados no ano
seguinte, durante o II Fórum Nacional de Agricultura, no qual mais de 30 grupos
temáticos discutiram aspectos da política agrícola nacional e setorial,
fornecendo um painel sobre as posições do setor e dos órgãos governamentais
presentes.
A
partir de 1994, a SNA iniciou os cursos do recém-criado Centro de Estudos
Avançados em Meio Ambiente e Desenvolvimento, responsável pela pesquisa e pelas
atividades educativas da sociedade, e em 1995 deu início às atividades da
Escola de Pós-Graduação em Administração e inaugurou a Faculdade de Ciências
Agroambientais. Ainda em 1994, firmou convênio com a Universidade Federal
Fluminense para desenvolver programa conjunto de pesquisa, ensino e extensão
nas áreas de agricultura, meio ambiente e desenvolvimento sustentável. Já em
1997, novo convênio foi firmado com a Universidade Castelo Branco, para a
implementação e o desenvolvimento de cursos de graduação e pós-graduação nas
áreas ligadas à zootecnia e à veterinária.
Finalmente, como parte das comemorações por seu centenário, a
SNA promoveu, em 1997, o I Congresso de Agribusiness do Rio de Janeiro, no auditório da Federação das Indústrias
do Rio de Janeiro. Desse congresso resultaram propostas relativas às políticas
governamentais: uma ação mais firme do governo brasileiro nas negociações
internacionais pela abertura dos mercados, frente aos subsídios agrícolas
proporcionados em outros países; uma política de modernização e adequação da
infra-estrutura interna; e uma política de “segurança alimentar” que cuidasse,
de forma sistêmica, da relação entre produção, consumo, economia e bem-estar.
Em 2008 a SNA e sua Incubadora de Agronegócios, em parceria
com o Fundo Multilateral de Investimento (MIF/FUMIN), o International
Development Research Centre (IDRC), e o Sebrae/RJ, lançou o projeto
OrganicsNet, “Rede Comunitária Para Acesso ao Mercado Pelos Produtores
Orgânicos”. Tratava-se de um site que visava divulgar e apoiar projetos
em agricultura orgânica. Atualmente a SNA conta com uma diretoria especializada
em agricultura orgânica.
No ano de 2009 o advogado Otávio Melo Alvarenga completou 27
anos na presidência da SNA. Uma de suas principais preocupações em todo esse
período foi a criação da Justiça Agrária com o objetivo de dar maior celeridade
principalmente as embates concernentes a posse e propriedade rural, bem como
passivos relativos à reforma agrária. Em meados de 2009 o Instituto dos
Advogados do Brasil nomeou Otávio Melo Alvarenga presidente de uma comissão de
estudos visando preparar a criação da justiça agrária no Brasil.
A SNA mantém um portal na internet no endereço:
http://www.sna.agr.br.
Sérgio Lamarão/José Maurício Andion Arruti
FONTES: Lavoura; POLIANO, L. Sociedade.