SOL,
O
Jornal diário lançado em 21 de setembro de 1967, no Rio de
Janeiro, pertencente à empresa Jornal dos Sports S.A. Até o seu nº 57, datado
de 26 de novembro daquele mesmo ano, O Sol circulou encartado no Jornal
dos Sports. A partir do número seguinte, passou a circular de forma
independente. Nessa segunda fase deixou de ser um matutino para se tornar um
vespertino.
A
iniciativa da criação de O Sol coube ao jornalista Reinaldo Jardim, que
já trabalhava no Jornal dos Sports e era o responsável, naquele órgão,
pela publicação dos suplementos “Cultura JS” e “Cartum”. Aproveitando-se do
espaço que o Jornal dos Sports então abria às inovações jornalísticas,
Jardim se propôs a produzir o que ele mesmo chamava de “jornal-escola”. A idéia
básica dessa iniciativa era produzir um jornal que fosse dirigido por
jornalistas experientes, ficando o trabalho de reportagem a cargo de estudantes
universitários. Conforme as palavras de um de seus editoriais, O Sol
pretendia ser “uma escola superior de jornalismo, onde os alunos não só
ouvissem falar de jornal, mas produzissem um”.
A jornalista Ana Arruda era a editora-chefe do jornal, que
era presidido por Célia Rodrigues. Entre seus editores encontravam-se figuras
expressivas do jornalismo tais como Carlos Castilho (internacional), Ronald de
Carvalho (problemas brasileiros), Estela Lachter (cidade), Carlos Heitor Cony
(polícia), Pedro Paulo Lomba (economia), Marta Alencar (cultura), Fernando
Duarte (fotografia) e Adolfo Martins (educação). Oto Maria Carpeaux e Sérgio Lemos eram os conselheiros do jornal, que contava ainda com as colaborações de Nélson
Rodrigues, que escrevia contos infantis, Henfil, Torquato Neto, Mister Eco e
Fernando Lobo, entre outros.
O Sol procurava veicular
uma linguagem inovadora, buscando uma identificação com o público mais jovem.
Já em seu primeiro número, o jornal afirmava: “Nossa linguagem será a palavra
viva do homem da rua, do estudante. Para maior clareza do que temos a dizer não
temeremos o uso do vernáculo mais purista, nem temeremos o papo legal
hipercalibrado da juventude.”
Nas páginas de O Sol encontravam-se os assuntos
normalmente tratados por um órgão da grande imprensa. Apesar do país já viver
nessa época sob o regime militar, a imprensa desfrutava ainda de um razoável
grau de liberdade. O noticiário político recebia especial destaque, explicitando
um posicionamento de esquerda. A cobertura da política nacional, por exemplo,
dava ênfase à movimentação dos setores oposicionistas. Mereceu destaque, nesse
sentido, a polêmica gerada em torno da proposta do ex-governador Carlos
Lacerda, dissidente do regime militar, que convocava toda a oposição a se
unificar em uma Frente Ampla. O Sol manifestou, então, uma posição
nitidamente contrária à proposta de Lacerda e criticou o ex-presidente João
Goulart por aceitá-la. Em seu editorial de 26 de setembro, afirmou que “essa
união de fogo e água é um absurdo” e, no dia seguinte, acusou Goulart de ter
traído a memória de Vargas. As disputas políticas no meio estudantil também
recebiam atenção, enquanto um manifesto da Juventude Operária Católica (JOC) e
a atuação social da Igreja Católica mereciam elogios.
A mesma perspectiva de esquerda pode ser notada no tratamento
dispensado à realidade social brasileira, freqüentemente focalizada em
reportagens que denunciavam a situação em que vivia a classe trabalhadora, com
críticas freqüentes ao arrocho salarial, ou através de denúncias sobre o
problema habitacional vivido pela população. Era freqüente também a publicação
de reportagens diárias em série, que normalmente focalizavam problemas sociais
como a prostituição, a disseminação do consumo de drogas ou a existência de
grupos de extermínio na Baixada Fluminense.
O
jornal mantinha ainda uma linha de defesa da economia brasileira, com denúncias
sobre a violação do território nacional por empresas multinacionais.
Denunciava-se, também, a cassação de prefeitos promovida pelo regime militar e
defendia-se a reforma agrária.
O noticiário internacional também demonstrava uma clara
simpatia pelas correntes de esquerda. É sob essa perspectiva, por exemplo, que
a Guerra do Vietnã era tratada. No mesmo sentido, a morte do revolucionário
latino-americano Che Guevara na Bolívia, em outubro de 1967, causou
consternação na redação de O Sol, que a princípio se negou a aceitar a
veracidade das informações fornecidas pelas autoridades bolivianas e, em
seguida, argumentou que “não é com balas que se matam as idéias”.
O movimentado panorama cultural e artístico do período também
merecia destaque no jornal. O surgimento de grandes talentos da música popular
brasileira naquele momento, como Gilberto Gil, Chico Buarque de Holanda,
Caetano Veloso e Edu Lobo, entre muitos outros, era comentado com entusiasmo em
suas páginas. Caetano faz uma homenagem ao jornal em sua canção Alegria,
alegria (“O Sol na banca de revista/me enche de alegria e preguiça/Quem lê
tanta notícia?”). Da mesma forma, O Sol concedia espaços significativos
ao que acontecia em outras áreas culturais, como o cinema, o teatro e a
literatura.
No
interior da Jornal dos Sports S.A., contudo, manifestavam-se receios de que a
linha oposicionista de O Sol pudesse vir a comprometer a imagem da
empresa. Em virtude disso, a partir do final do mês de novembro O Sol
deixou de circular encartado no Jornal dos Sports e adquiriu vida
própria. Sua linha editorial, contudo, foi mantida, permanecendo como um órgão
prioritariamente destinado ao público jovem. De acordo com o editorial
publicado em sua última edição conjunta com o Jornal dos Sports, O
Sol definia-se como “um jornal feito por jovens, alicerçado no Poder
Jovem”.
Iniciada essa segunda fase de O Sol, logo ficaria
demonstrada a sua inviabilidade econômica, evidenciada pela enorme dificuldade
com que o jornal obtinha anunciantes. Por outro lado, seus diretores
continuavam a enfrentar pressões no interior do Jornal dos Sports, onde O
Sol continuava sendo impresso. Essas pressões se acentuariam a partir do
final de 1967, quando morreu Célia Rodrigues, que presidia a Jornal dos Sports
S.A. As mudanças pelas quais então passou a empresa favoreceram o grupo que em
seu interior mostrava-se hostil a qualquer vinculação com um órgão de caráter
oposicionista. No final de janeiro de 1968, O Sol deixou de circular.
Logo em seguida, seus diretores reuniram-se em cooperativa
para lançar o Poder Jovem, jornal que apresentava propostas semelhantes
às de O Sol. Circulando semanalmente, o Poder Jovem não durou,
porém, mais do que cinco números.
André
Couto
FONTES: INF. ANA
ARRUDA; Revista de Comunicação (12/87); Sol (1 a 67).