MOURA,
Nero
*militar; min. Aer. 1951-1954.
Nero Moura nasceu
em Cachoeira do Sul (RS) no dia 30 de janeiro de 1910, filho de Gilberto Moura
e de Maria Emília Marques Moura. Seu pai era proprietário rural.
Fez
seus estudos básicos no Ginásio Rio Branco, em sua cidade natal, e no Colégio
Militar de Porto Alegre. Em abril de 1927, ingressou na Escola Militar do
Realengo, no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, sendo declarado
aspirante-a-oficial da arma de aviação em novembro de 1930. Nessa ocasião
conheceu Getúlio Vargas, chefe do recém-empossado Governo Provisório oriundo da
revolução que, no mês anterior, derrubara Washington Luís da presidência da
República. O encontro entre ambos ocorreu através de amigos gaúchos que
trabalhavam com João Batista Luzardo, nomeado chefe de polícia do Distrito
Federal
Promovido
a segundo-tenente em janeiro de 1931, Nero Mouta combateu em 1932 a Revolução Constitucionalista de São Paulo, realizando 60 missões aéreas na frente de combate
do vale do Paraíba entre julho e setembro. Depois da vitória sobre os
revoltosos, foi designado instrutor de pilotagem da Escola de Aviação Militar
do Campo dos Afonsos, no Rio, cargo que ocupou até setembro de 1934. Nesse
período, recebeu duas promoções: em junho de 1933, a primeiro-tenente e, um ano depois, a capitão.
Em
outubro de 1934, foi escolhido pelo Comando de Aviação Militar para fazer um
curso de aperfeiçoamento na École d’Application de l’Air, situada em Versalhes,
perto de Paris, onde permaneceu durante um ano. De volta ao Brasil, foi
indicado para servir como instrutor de tiro e bombardeio da Escola de Aviação
Militar. Participou da repressão à Revolta Comunista deflagrada no Rio em 27 de
novembro de 1935, bombardeando as instalações do 3º Regimento de
Infantaria (3º RI), localizado na Praia Vermelha e ocupado pelos rebeldes.
Deixou a Escola de Aviação Militar em fins de 1937, sendo designado para
comandar o 3º Regimento de Aviação, sediado em Canoas (RS).
Nero Moura foi chamado de volta ao Rio em 1938, já durante o
Estado Novo, para assumir a função de piloto de Getúlio Vargas, recebendo
treinamento específico no avião presidencial Lockheed 12 A, recém-adquirido nos Estados Unidos. Nos anos seguintes, exerceu essa atividade cumulativamente
com outras funções. Entre 1939 e 1940, foi instrutor-chefe de pilotagem da
Escola de Aviação Militar e, junto com outros oficiais do Exército e da
Marinha, participou das discussões que antecederam a criação, em janeiro de
1941, da Força Aérea Brasileira (FAB) e do Ministério da Aeronáutica. O
primeiro titular dessa pasta foi o civil Joaquim Pedro Salgado Filho, ministro
do Trabalho, Indústria e Comércio entre 1932 e 1934 e grande amigo de Vargas, o
qual não designou um oficial de aviação oriundo do Exército ou da Marinha para
evitar ressentimentos entre esses militares.
Em
janeiro de 1941, ainda como piloto de Vargas, Nero Moura foi nomeado assistente
militar do ministro da Aeronáutica e chefe da Seção de Aviões de Comando,
embrião do Grupo de Transporte Especial (GTE) para autoridades, que funcionou
baseado no aeroporto Santos Dumont, no centro do Rio. Promovido a major-aviador
em dezembro desse ano, permaneceu nessas funções até dezembro de 1943 quando,
por designação de Salgado Filho, foi nomeado comandante do recém-criado 1º
Grupo de Aviação de Caça (1º GAC) da FAB, que acompanhou os efetivos da Força
Expedicionária Brasileira (FEB) enviados no ano seguinte para lutar contra as
potências do Eixo na Segunda Guerra Mundial. O 1º GAC contava com quase
quinhentos integrantes, entre os quais 50 pilotos, e ficou conhecido pelo seu
lema “Senta a pua!”, expressão que conclamava os membros do grupo a enfrentarem
o inimigo com determinação.
Em
janeiro de 1944, Nero Moura viajou para os Estados Unidos acompanhado por 32
homens, que constituíam o núcleo do 1º GAC. Depois de um período de treinamento
na School of Applied Tactics of the Army Air Force, localizada em Orlando,
Flórida, esses militares foram enviados ao Panamá, onde se reuniram ao restante
do Grupo de Caça que se encontrava nesse país desde fevereiro. Em junho, Nero
Moura foi promovido a tenente-coronel aviador e partiu com seus comandados para
a base aérea de Suffolk Fields, ao norte de Nova Iorque, onde os militares
brasileiros realizaram treinamento nos caças Thunderbolt P-47, um dos mais
modernos aviões então utilizados pela força aérea norte-americana.
O 1º GAC desembarcou no porto italiano de Livorno, em outubro
de 1944, integrando-se ao 350º Regimento de Caça da Força Aérea Americana e
participando ativamente da campanha contra as tropas alemãs que operavam no
vale do rio Pó. Nero Moura realizou 62 missões aéreas contra o inimigo, que se
rendeu aos exércitos aliados no início de maio de 1945. Cerca de dois meses
depois, partiu da Itália para os Estados Unidos comandando um grupo de oficiais
brasileiros encarregado de buscar em San Antonio, Texas, 19 aviões P-47 que a força aérea norte-americana havia reservado para a FAB. Nero Moura e seus
homens chegaram ao Rio de Janeiro a bordo desses aviões em 16 de julho de 1945
e, dois dias depois, compareceram ao Desfile da Vitória, que congregou nas ruas
da capital grande número de oficiais e soldados que haviam participado da
guerra.
Em 27 de agosto seguinte, assumiu o comando do 1º Regimento
de Aviação, um dos mais importantes da FAB, sediado em Santa Cruz, no Rio. Estava nesse posto quando foi deflagrado o golpe militar de 29 de outubro
de 1945 que, liderado pelos generais Eurico Gaspar Dutra e Pedro Aurélio de
Góis Monteiro, derrubou Getúlio Vargas e pôs fim ao Estado Novo. Na tarde desse
dia, Nero Moura foi chamado ao gabinete do comandante da III Zona Aérea e seu
superior hierárquico, brigadeiro Fábio Sá Earp, que estava envolvido na
conspiração contra Vargas e lhe perguntou sua posição sobre o golpe. Nero Moura
declarou-se fiel a Getúlio. Em conseqüência, foi recolhido a uma dependência do
quartel-general da III Zona Aérea, onde ficou detido até a partida de Vargas
para o exílio em São Borja (RS), dois dias depois. Deixou formalmente o comando
do 1º Regimento de Aviação em 6 de novembro e, solidário com o
ex-presidente, abandonou a vida militar, passando para a reserva no mês
seguinte.
Entre
1946 e 1950, dedicou-se à iniciativa privada, recebendo, em julho de 1948, a patente de coronel-aviador. Nesse período, ocupou dois cargos de direção em empresas ligadas
à aviação: de 1946 a 1948 foi diretor-técnico da Aerovias Brasil, e, nos dois
anos seguintes, diretor-superintendente do Lóide Aéreo Nacional.
No Ministério da Aeronáutica
Em outubro de 1950, Getúlio Vargas foi eleito presidente da
República, derrotando nas urnas, entre outros, o brigadeiro Eduardo Gomes, seu
antigo oponente e principal figura da FAB desde sua criação. Diante da
dificuldade em encontrar um brigadeiro que lhe inspirasse confiança política,
Vargas chamou Nero Moura para ocupar a pasta da Aeronáutica em seu novo
governo, empossado em 31 de janeiro de 1951. O mal-estar causado por essa
indicação entre os brigadeiros, que chegaram a discutir o lançamento de uma
nota de protesto, era contrabalançado pela popularidade de Nero Moura entre a
oficialidade de menor patente. Eduardo Gomes, convidado, não aceitara o
convite.
Em agosto de 1951, Nero Moura foi promovido ex officio
a brigadeiro, com base em uma lei que permitia uma segunda promoção na reserva
aos oficiais que haviam participado da repressão à Revolta Comunista de 1935.
Sua gestão à frente do Ministério da Aeronáutica foi marcada por um grande
número de realizações, como a criação do Comando de Transporte Aéreo (Comta), a
introdução da aviação a jato no Brasil, a implantação de dois centros de
Instrução Militar (CIMs) um deles no Campo dos Afonsos, no Rio, o outro em
Natal, a construção e inauguração do campo de Cachimbo (PA) que deu apoio aos
aviões que faziam a rota comercial Rio-Manaus, a ativação do Centro Técnico da
Aeronáutica (CTA). Em sua gestão, as instalações da Escola de Especialistas foram
transformadas no primeiro aeroporto internacional do país, o Galeão, no Rio.
Nero Moura também procurou imprimir maior eficiência aos serviços do Correio
Aéreo Nacional e às unidades aéreas, dois importantes setores da FAB.
A crise político-militar latente desde o início do segundo
governo constitucional de Vargas agravou-se depois do atentado desfechado na
madrugada do dia 5 de agosto de 1954 na rua Toneleros, no Rio, contra o
jornalista e líder oposicionista vinculado à União Democrática Nacional (UDN),
Carlos Lacerda. Além de um ferimento em Lacerda, o incidente resultou na morte
do major-aviador Rubens Vaz, seu acompanhante na ocasião. Subitamente, a
Aeronáutica foi colocada no centro dos acontecimentos. No mesmo dia, Nero Moura
designou o coronel-aviador João Adil de Oliveira para acompanhar o inquérito
policial então instaurado, que rapidamente reuniu provas contra membros da
guarda pessoal do presidente. Começou nesse momento a fase decisiva do
confronto entre o governo e a oposição. A posição de Nero Moura perante seus
comandados tornou-se cada vez mais delicada, pois o antigetulismo tradicional
da força aérea evoluiu para uma aberta contestação ao governo, claramente
expressa nas reuniões que se sucediam no Clube da Aeronaútica desde a morte do
major Vaz.
As
ligações dos criminosos com elementos do governo se tornavam cada vez mais
evidentes. Na noite de 12 de agosto, por sugestão do coronel Adil, Nero Moura
baixou uma portaria instaurando um inquérito policial-militar (IPM) a ser
conduzido diretamente pela FAB e chefiado pelo próprio Adil. A partir daí,
militares da Aeronáutica passaram a atuar de maneira cada vez mais incisiva na
elucidação do atentado, prendendo e interrogando membros da guarda pessoal de
Vargas, revistando dependências do palácio do Catete (sede do governo) etc.
Em 16 de agosto, Nero Moura pediu demissão do ministério.
Para substituí-lo, Getúlio chamou o brigadeiro Altair Rozsanyi, que declinou do
convite. Acreditando que o clima de tensão reinante na Aeronáutica só poderia
ser dissipado ou, pelo menos, atenuado caso o seu substituto fosse alguém não
identificado com o governo e, de preferência, detentor da confiança de Eduardo
Gomes, Nero Moura sugeriu a Vargas o nome do brigadeiro Henrique Dyott
Fontenele, muito considerado entre seus companheiros de farda. O presidente
concordou com a indicação, desde que Fontenele mantivesse em seus postos os
oficiais que integravam o gabinete anterior. Procurado pelo ministro
demissionário, Fontenele aceitou os termos da proposta.
Entretanto, na manhã de 18 de agosto, o chefe do Gabinete
Civil da Presidência da República, Lourival Fontes, informou a Nero Moura que
Getúlio, contrariando a combinação anterior, convidara o brigadeiro Epaminondas
Gomes dos Santos, comandante da III Zona Aérea, para assumir a pasta. Além de
inimigo pessoal de Eduardo Gomes, Epaminondas era extremamente impopular dentro
da corporação. Em depoimento ao Centro de Pesquisa e Documentação de História
Contemporânea do Brasil (Cpdoc), Nero Moura atribuiu essa repentina mudança de
Getúlio às pressões exercidas por elementos do governo — entre os quais o
ministro da Guerra, o general Zenóbio da Costa — contrários a qualquer
entendimento com a oposição. Nero Moura deixou o ministério poucos dias antes
do desfecho da crise, ocorrido em 24 de agosto, com o suicídio de Vargas, que
estava nesse momento virtualmente deposto devido à perda do apoio militar ao
seu governo.
Afastado da vida pública, Nero Moura adquiriu uma fazenda em
Goio-Erê (PR) onde se dedicaria até 1965 à lavoura de café e à criação de gado.
A partir de 1955, tornou-se assessor da diretoria da Refinaria de Petróleo
Ipiranga S.A., função que exerceu até 1982.
Faleceu no Rio de Janeiro no dia 17 de dezembro de 1994.
Era casado com Marieta Fabrício Moura, com quem teve uma
filha.
A seu respeito, foi publicado Um vôo na história
(1996), resultado do depoimento prestado pelo biografado aos pesquisadores do
Setor de História Oral do Cpdoc, da Fundação Getulio Vargas (FGV).
O arquivo de Nero Moura encontra-se depositado no Cpdoc/FGV.
Sérgio
Lamarão
FONTES: COSTA, M. Cronologia;
DULLES, J. Getúlio; Encic. Mirador (1954); ENTREV. BIOG.; Globo
(18/12/94); Grande encic. Delta; Jornal do Brasil (18/12/94);
LIMA, R. Senta; MACHADO, F. Últimos; SILVA, H. 1935;
SOUSA, J. Ministros; WANDERLEY, N. História.